Trauma e conforto.

Minjeong agarrava-se a Jimin como se ela fosse seu farol particular, a luz que iria lhe guiar naquela noite de chuva intensa e trovões tão altos que a faziam tremer nos braços da garota de cabelos negros.

Jimin tinha uma das mãos na costa da loira e a abraçava mais forte sempre que a sentia estremecer, a outra mão fazia um carinho singelo em seu cabelo. Era a primeira vez que tinham um contato íntimo como aquele, sem brigas, sem indiretas, era apenas Jimin ajudando alguém em um momento difícil e ainda assim, era estranho.

Estava tão acostumada a trocar insultos com Minjeong que ter a garota ali, tão frágil no seu abraço, era totalmente inusitado, ela soluçava com a cabeça deitada em seu peito, as lágrimas pareciam não ter fim, o barulho do vento na janela do quarto faziam a menina se encolher ainda mais, quase ao ponto de virar uma pequena bola humana no colo de Jimin.

Vê-la daquela forma a fazia sentir falta da Minjeong irritante, queria que ela parasse de chorar e arrumasse qualquer motivo para implicar consigo, mas enquanto este motivo não vinha, continuava a fazer carinho no cabelo dela, esquecendo que os seus estavam ensopados da chuva que tomou no caminho, da blusa também molhada e do frio que sentia.

Minjeong não sabia, mas seu corpo também a esquentava.

O silêncio no ambiente não era incômodo, apenas alguns ruídos eram ouvidos pelas duas garotas sentadas sobre a cama. A tempestade do lado de fora ainda era forte e muito possivelmente havia acabado com o luau do outro lado do lago.

Os ventos faziam com que alguns galhos de árvores próximas batessem em um ritmo repetitivo no vidro da janela. Aquele clima poderia ser o ideal para muitas pessoas que gostavam de sentir a sensação fria e o cheiro de terra molhada. Todavia, a loira apenas queria que aquilo acabasse o mais urgente possível.

Minjeong ponderou alguns segundos com as mãos trêmulas agarrando a camisa da morena, mas ao ouvir o vento soprar mais forte do lado de fora, fazendo os barulhos no vidro da janela voltarem a acontecer, ela agarrou ainda mais o tecido, como se dependesse daquele ato. Minejong não havia notado até aquele momento, mas as roupas de Jimin estavam molhadas.

Não ensopadas, mas ainda assim, suficiente para que pudesse causar um desconforto em usar.

Fechou os olhos com força, o medo cedendo um pouco de espaço para a vergonha, mas não se afastou de Jimin, a pele fria da garota era confortável e não queria ter que olhar as orbes negras e assumir em voz alta seus medos já escancarados. Contudo, uma batalha interna começava a se iniciar no seu peito, ficar ali quieta e deixar Jinin a proteger do mundo lá fora ou a encarar e evitar que a menina pegasse um resfriado por sua causa.

Preferiu a segunda opção mesmo que isso significasse uma exposição inevitável, então afastou-se um pouco de Jimin, o suficiente para que pudesse olhar em seus olhos e se perder neles, negros como uma noite sem estrelas. Manteve as mãos na barra da camisa da garota e por alguns instantes esqueceu o que falaria.

— Jimin. — O tom em sua voz era quase inaudível. Quase. Mas Jimin havia escutado o chamado em forma de um sussurro.

Os olhos negros procuraram algo de errado na expressão da loira, além das lágrimas marcadas em seu rosto e do olhar cansado. Jimin queria certificar-se de que ela estava bem.

A morena respondeu com um leve aceno de cabeça, em um pedido silencioso para que a mais baixa prosseguisse.

— V-você está molhada. — Minjeong praguejou-se mentalmente por ter gaguejado. Ela não sabia se era parte do medo que ainda sentia ou por estranhar estar tão próxima a Jimin.

— Desculpe. — Jimin imaginou que havia molhado a garota com as suas roupas e afastou-se alguns centímetros para retirar o casaco que era a peça mais fácil naquele momento. — Eu molhei você? — Indagou com um tom preocupado.

— Não é isso. Você pode pegar um resfriado assim. — A loira desviou o olhar alguns milésimos de segundos para encarar a peça de roupa agora no chão, não que fosse o ponto mais interessante naquele momento, mas olhar nos olhos da morena era uma tarefa difícil e ela estava descobrindo isso agora.

Jimin riu baixinho de forma abafada.

— Não precisa se preocupar comigo. — Levou a ponta dos dedos gélidos até o rosto de Minjeong de forma delicada para limpar algumas lágrimas.

Jimin tinha as duas mãos em seu rosto e elas estavam um pouco geladas, mas a loira não se importava. O carinho que recebia agora a confortava e fazia suas bochechas ganharem um tom mais rosado.

Elas agora não estavam tão próximas, não o suficiente para que ainda fosse um abraço, mas Jimin não sairia de perto de Minjeong naquela noite.

E ali, frente a frente com ela, sabia que a loira tinha consciência disso.

Minjeong agradecia internamente pelos trovões terem parado, mas ainda sentia um desconforto e angústia por ouvir claramente o barulho da forte chuva no teto. Ela enlouqueceria dentro daquele cômodo caso não tivesse a morena ao seu lado.

Era sempre assim, Kim Minjeong se sentia protegida em meio as suas crises sempre que tinha alguém para abraçar e para fazê-la se distrair, nem que fosse por alguns poucos minutos. E a pessoa responsável por isso era Ningning, sempre a melhor amiga.

Apenas ela.

Até aquele momento.

— Por que veio? — Minjeong decidiu fazer a pergunta que tanto rondava a sua mente.

Não queria soar grossa, mas não imaginava que Yoo Jimin estaria com ela ali.

— Eu fui uma idiota durante todo o dia de hoje. — Jimin iniciou, vacilando o olhar para a janela. As mãos que antes tocavam o rosto da loira, agora pareciam inquietas juntas sobre seu colo. — Eu queria me retratar no luau. — Falou referindo-se a tentativa de conversa com a loira na sacada da casa vizinha.

Nem mesmo a morena entendia o porquê de ter seguido o dia ignorando a existência da mais baixa e sendo rude. Talvez pelo fato de ter se acostumado a ser daquela forma com ela e quando se viu cedendo, colocou a pose defensiva de volta.

— E você não iria embora, mesmo que a minha presença te incomodasse. Não me daria o gosto da vitória. — Jimin concluiu. A loira teve que admitir mentalmente que ela estava certa. — Quando você foi… Eu senti que algo estava errado.

Parecia algo bobo, mas admitir preocupação com Minjeong foi algo que fez Jimin corar. Ela voltou a encarar a loira após terminar e notou que a mesma ouvia tudo atentamente.

O que ela estava pensando? Era a única pergunta que se passava em sua mente.

Um breve silêncio fez-se presente. Durou apenas alguns segundos, mas pareceu uma eternidade para a morena que se sentia analisada pelo olhar da outra.

— Obrigada. — Minjeong agradeceu em um sussurro, como uma confissão. E era quase isso.

Jimin sentiu-se estranhamente aliviada ao ouvir aquela simples palavra.

A morena levou uma das mãos até os fios dourados da outra e delicadamente colocou uma mecha atrás de sua orelha, em um ato involuntário que fez Minjeong segurar a respiração por alguns segundos e em seguida Jimin arrepiar-se ao sentir o ar quente dos pulmões da loira ser solto pesadamente próximo ao seu pulso.

— Acho melhor eu trocar essas roupas. — Jimin comentou, sentindo apenas agora o desconforto de estar com uma roupa gelada colada ao seu corpo.

Minjeong assentiu e sem perceber acabou inclinando seu rosto sentindo o toque da mão fria da morena em sua bochecha, agora lhe fazendo um breve carinho.

— Eu vou ao meu quarto. — Jimin anunciou de maneira desconcertada pelo contato sem aviso prévio.

A morena não queria deixar a outra sozinha, mas seria rápido, então fez menção de seguir até a porta para descer as escadas, mas foi impedida pela pequena mão da Kim agarrando a barra de sua camisa.

— P-posso… Ir com você? — E lá estava Kim Minjeong mais uma vez gaguejando.

Jimin assentiu sem ponderar e seguiu com uma Minjeong encolhida em seu encalço. Os dedos da loira brincavam entre si em um ato de desconforto e ao mesmo tempo nervosismo. Minjeong encarou a mão de Jimin, que andava poucos centímetros a sua frente agora já no andar de baixo, definitivamente não teria coragem de tocá-la naquele momento, mas admitia que se sentiria mais segura segurando na mão da garota de cabelos negros.

Jimin adentrou ao seu quarto acompanhada da loira, que mesmo receosa por estar em um ambiente novo, sentou-se sobre sua cama a seu pedido.

— Não vou demorar. — A Yoo disse para passar segurança. Minjeong assentiu e passou a varrer os olhos pelo cômodo, fugindo sempre da visão da janela que ficava mais ao fundo.

No banheiro, Jimin encarava seu reflexo no espelho, já com o short de pijama tentava entender toda a situação. Minjeong parecia um filhote com a pata machucada e ter de se afastar por alguns instantes a fez ficar preocupada e um tanto culpada, então pegou a blusa em cima da pia e começou a vesti-la à medida que também deixava o banheiro.

Encontrou Minjeong sentada na beira da cama olhando de forma fixa para a porta, abraçava os joelhos e apoiava a cabeça neles como uma criança, o vento continuava forte do lado de fora e os galhos ainda batiam na janela.

Minjeong, por sua vez, sentiu um alívio ao ver a porta do banheiro abrir. Jimin a olhou,  ainda vestindo uma camisa larga de cor cinza e expondo um pouco de pele enquanto ajeitava a peça no corpo, a blusa era tão grande que chegava a cobrir o short que ela usava dando a impressão de não usar nada por baixo.

A jovem Minjeong petrificou com o pensamento, as bochechas já vermelhas pelo choro adquiriram um tom ainda mais rubro e a colcha da cama passou a ser bem mais interessante do que qualquer coisa naquele quarto.

Jimin, sem saber do pequeno desespero interno da garota com quem dividia a casa, sentou na frente dela da mesma forma que a menina estava, abraçando os joelhos. Pela primeira vez, ela reparou no rosto de Minjeong, pequeno e delicado, os lábios eram cheinhos e o nariz afilado, os olhos mesmos inchados — por causa do choro — também eram bonitos, a mão brincava com um fio solto da colcha e hesitante, ela colocou sua mão sobre a dela, era quente e bem menor que a sua que agora, a cobria por completo.

As duas encararam as mãos juntas por um momento até enfim se olharem, o quanto pode ser dito apenas com o olhar?

Jimin queria ter voz para dizer que esqueceria tudo aquela noite e manteria Minjeong segura de tudo, que ali naquele quarto nada seria capaz de fazer mal a ela, enquanto estivesse ali ela estaria segura.

Minejong queria deixar claro que era grata, sabia do esforço de Jimin para lhe apoiar nesse momento, um dia quem sabe pudesse retribuir, mas agora só podia olhar para as orbes escuras e esperar que ela entendesse as palavras não ditas.

— Aconteceu quando eu era criança. — Começou Minieong sem tirar os olhos de Jimin. — Eu sei, parece tolo, mas eu carrego isso comigo até hoje.

— Você não precisa falar nada se não quiser. — Apertou um pouco a mão sob a sua.

— Eu sei, mas eu quero. — Sorriu um pouco, fazendo os olhos inchados quase fecharem. — Eu deveria ter um pouco mais de sete anos, minha mãe disse que eu já não tinha mais idade para bonecas e escondeu a minha no sótão e bem... você sabe como crianças são, eu fui atrás e acabei ficando presa, chovia naquela noite e o resto você já pode imaginar.

Jimin assentiu lentamente, saiu da frente de Minjeong e sentou ao seu lado, puxando a menina para um abraço desajeitado.

Não podia imaginar o medo que ela vivenciava desde tão nova, estava acostumada a ver uma garota implicante e de língua afiada, aquela Minjeong frágil e que necessitava de cuidados era algo novo e seu corpo agia por instinto buscando trazer aquela menina para perto.

— Vai ficar tudo bem agora. — Disse a mantendo no abraço.

— Eu sei que vai. — Minjeong retribuiu como podia, ainda existia um pouco de receio em tocar a outra.

Jimin olhou para a janela, o vento enfim começava a dar uma trégua, cessando os barulhos que incomodam Minjeong e apenas as gotas de chuva ainda eram presentes.

— Ei, olha só. — Chamou a atenção de Minjeong que olhou para o seu rosto, a deixando nervosa com tamanha proximidade, e apontou para a janela — A chuva está passando.

— Finalmente. — A loira respirou fundo e esfregou o olho, ato acompanhado de um bocejo.

Tanto choro resultou em uma garota sonolenta, mas não queria dormir sozinha aquela noite então se esforçava para manter os olhos abertos. Notando o trabalho da menina para se manter acordada, Jimin não conseguiu conter o sorriso.

— Você precisa descansar, hoje foi um dia e tanto. — Disse se afastando e saindo da cama — Eu vou dormir em outro quarto, pode ficar aqui.

— Não! — Minjeong segurou o braço dela antes que ficasse longe demais. — Fica comigo, só essa noite, por favor.

O pedido quase desesperado de Minjeong não deu opções para Jimin, sem dizer nada ela arrumou os travesseiros na cama e se deitou na mesma, Minjeong continuou sentada até criar coragem para se deitar de frente para a outra.

Existia uma distância considerável entre os corpos, mas não entre os olhos, estes estavam presos um no outro e assim ficaram até a mais baixa finalmente ceder ao sono que lhe consumia adormecer. Jimin pensou que finalmente dormiria, só não esperava ter o sono roubado por uma pequena ação da garota a sua frente.

Minjeong esticou o braço e entrelaçou a mão na de Jimin, para ter a garota junto de si enquanto dormia.

E aquela noite se encerrou trazendo a incerteza de como seria o amanhã.

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