Insegurança e o Outro Lado da Moeda

Do outro lado do lago o clima também não estava dos melhores, enquanto as moradoras faziam um acordo silencioso sobre não comentar o que tinha ocorrido, as duas amigas conversavam na grande varanda. Chaeyoung suspirou pesadamente após contar tudo o que precisava para Jeongyeon que estava ao seu lado.

A brisa leve que balançava os galhos e o barulho da correnteza já eram comuns naquele lugar, mas no momento, a paisagem por mais bonita e agradável que fosse, não era suficiente para relaxar a morena.

— Uau. — Jeongyeon disse depois de alguns segundos em silêncio.

— É... — Chaeyoung repuxou os lábios. Imaginou-se contando tudo para a amiga, mas não naquela situação. Não daquela forma.

Chaeyoung mantinha os braços apoiados no parapeito de madeira do deck, o seu olhar tentou não encontrar o da outra durante toda a conversa, talvez por se sentir um pouco constrangida, mas ao olhar de soslaio viu um quase sorriso desenhar os lábios de Jeongyeon.

— O que é esse sorriso?

Com a pergunta, o repuxar dos lábios da outra tornou-se um pouco mais nítido.

— Sei que o momento não pede isso, mas no final parece que a Nay sempre esteve certa. — Revelou Jeongyeon. Não que achasse graça da situação, mas pensar que toda aquele implicância resultou nisso era no mínimo irônico.

Chaeyoung concordava, mas não é como se mudasse algo.

— Do que adianta se agora 'tá tudo uma merda. — Ela constatou.

— Sinceramente eu não sei o que soa mais surreal. — Jeongyeon acariciou o queixo com uma das mãos. — Você ter tomado a iniciativa de beijar ela mesmo sendo lerda ou ela ter gostado de você por tanto tempo.

Eu não sou lerda. Chaeyoung pensou.

— Posso contar uma coisa? — Chaeyoung perguntou, virando-se para a amiga e ignorando completamente o que a outra havia falado.

— E ainda tem mais? — A mais alta arqueou as sobrancelhas. Achava que toda aquela história já tinha sido o suficiente.

Chaeyoung acabou soltando um riso abafado, mesmo que de forma descontente.

— No dia que aconteceu aquele jantar, eu tinha a achado interessante. — Admitiu pela primeira vez. — Antes dela começar a implicar com tudo que eu falava e a gente acabar discutindo em plena mesa.

As memórias daquele dia eram frescas na memória das duas garotas, mas Yoo não imaginou que a melhor amiga havia se interessado por Mina, afinal, a discussão daquele dia tinha roubado a cena completamente.

Aquelas duas já aprontaram muito, não sabia como aguentava. Talvez tenha sido por isso que a sua namorada criou aquele plano. Depois de tanto constrangimento por discussões em horas inoportunas quem aguentaria?

— Vocês nos fizeram passar vergonha, nunca vou me esquecer. — Jeongyeon lembrava bem dos olhares dos outros cliente para a mesa delas, nunca quis tanto enfiar a cabeça em um buraco quanto naquele dia.

— Ela não tinha pra que discordar sobre meu campeão favorito no League of Legends. — Chaeyoung sorriu de leve lembrando do ocorrido.

— Vocês discutiram por um jogo, Chaeyoung. Foi patético. — Era óbvio que Chaeyoung concordava com isso também, mas não diria em voz alta.

As brigas sempre foram por motivos como aquele, fosse um personagem em um jogo, um gosto para comida ou até mesmo na escolha da casa onde elas fariam uma sessão de filmes.

— Eu não entendia bem toda aquela raiva que ela demonstrava ter de mim, sempre pareceu algo muito gratuito e eu acabei retribuindo as provocações. Afinal, chumbo trocado não dói. — Chaeyoung explicou. — Sabe... acho que eu preferia nossas discussões por besteira do que essa situação.

A morena realmente não se lembrava da loira em seu passado, para ser sincera, desde que saiu do ensino médio não manteve contanto com ninguém. Tinhas alguns colegas que conversava aqui e ali, mas nunca foi o tipo de pessoa sociável, sequer lembrava o nome deles.

Todavia aquilo não impedia que algumas pessoas, em sua maioria garotas, se interessassem por ela. Vez ou outra chegava aos seus ouvidos que uma aluna de outra turma gostava dela, ou que algum garoto qualquer planejava se declarar. Ninguém nunca o fez, seu jeito fechado parecia repelir isso. As fofocas pelos corredores sempre corriam rápido demais, provavelmente por isso preferia ficar na dela, tinha receio de que qualquer passo seu fosse exposto.

As pessoas adoram falar sobre o que não sabem.

Perguntava-se mentalmente se Mina também sentiu aquilo como os outros, se nunca contou por medo das fofocas ou se foi por saber que ela era completamente fechada e ignorava aquele tipo de coisa.

— Ela precisa de um pouco de tempo... — Jeongyeon disse.

Chaeyoung apenas suspirou.

— Quanto mais o tempo passa, mais ela vai ter conclusões erradas sobre mim. — Ela direcionou para a casa do outro lado, encarava como se pudesse ver através das paredes.

— Talvez apressar as coisas também torne tudo pior. — Jeongyeon aproximou-se, colocando seu braço sobre os ombros da outra.

— Me pergunto se tudo seria diferente caso eu lembrasse dela. — Chaeyoung desviou o olhar para as próprias mãos.

— Provavelmente, mas quem garante que seria um diferente bom? — Jeongyeon deixou a pergunta no ar, fazendo a outra pensar sobre aquilo. — A gente não consegue prever o futuro, acho que as coisas ocorrem da forma que precisa acontecer.

— Como se fosse algo do destino? — Chaeyoung perguntou baixo e olhou para a amiga.

Jeongyeon negou com a cabeça.

— Não acredito em destino, mas sim em um conjunto de acasos que nos levam até onde estamos hoje. — Explicou lentamente. — Acredito que a gente precisa viver mais o presente porque não podemos mudar o passado e lamentar por ele não vai mudar o que vivemos agora. — A mais velha concluiu.

Chaeyoung assentiu processando, mas acabou deixando um riso baixo escapar.

— Você falando esse tipo de coisa é engraçado. — Brincou.

— Você que não leva a sério meu lado intelectual. — Jeongyeon bagunçou o cabelo de Chaeyoung com a mão que antes estava no ombro dela.

A mais baixa respondeu com uma careta, embora não ligasse. Sentiu saudade da amiga.

— Certo, mas onde ouviu tudo isso? Te conhecendo bem sei que não saiu da sua mente.

— Em uma palestra da faculdade. — Jeongyeon respondeu simples.

— Agora sim parece mais você. — Chaeyoung rebateu.

Um silêncio seguiu pelo que pareceu ter sido um minuto, mas não foi desconfortável. Com os olhares entre as águas calmas e sentindo a brisa, quase podiam relaxar com a quietude do lugar.

Quase.

— Em dois anos de relacionamento com a Nayeon, aprendi que a conversa é sempre o melhor caminho. — Jeongyeon repousou a mão novamente sobre o ombro da amiga, acariciando levemente. Chaeyoung também achava, mas não é como se tivesse escolha no momento. — Lembro que no início do nosso namoro, a gente brigava com uma certa frequência.

— Se a Mina quisesse ao menos me ouvir... — Ela suspirou.

— Vocês ainda vão ter a oportunidade de conversar, eu sei disso. — Jeongyeon assegurou. Sabia que Mina era teimosa, mas torcia para que a namorada a convencesse.

— É, mas você e a Nayeon estão em um relacionamento, a Mina e eu não. — Chaeyoung disse por fim.

Ela realmente achava que aquilo era um argumento válido? Jeongyeon pensou.

A coreana conhecia a melhor amiga há um bom tempo e mesmo assim ainda conseguia se surpreender com o quanto ela era lenta, até mesmo com os próprios sentimentos.

— Você se ouviu falar? — Perguntou, agora apoiada de lado no parapeito do deck, encarando o rosto confuso da outra.

— O quê? — Chaeyoung claramente não havia captado seja lá o que ela queria dizer.

Jeongyeon suspirou e passou os dedos por entre os fios de seu cabelo, uma mania que pegou com a namorada.

— Eu entendo você se frustrar com toda a situação, mas a sua própria insegurança também é passada para ela. — Tentou explicar.

— Q-que insegurança?

— Seu receio de estar em um relacionamento. Você nunca namorou, Chaeyoung. — Jeongyeon foi mais direta.

Chaeyoung ponderou por milésimos de segundos, a boca entre aberta deu lugar a um prensar de lábios. Havia ficado pensativa.

— Nunca me apaixonei, Jeong. É quase impossível não ter receio sobre isso, não sei como eu lidaria. — A resposta saiu em um tom baixo.

— Nunca se apaixonou ou nunca até agora? — O olhar de Chaeyoung rapidamente desviou do da amiga, buscando um outro ponto. — É sobre isso, talvez ela tenha sentido sua insegurança e acabou entendendo as coisas de outra forma.

Aquilo nunca tinha passado por sua mente antes.

— Não sei o que fazer... — Chaeyoung choramingou, usando de um tom que raramente usava. Jeongyeon sabia que a amiga tentava se manter forte sempre e costumava esconder o que sentia.

Chaeyoung sentiu o corpo ser rodeado pelos braços da melhor amiga em um aperto aconchegante. Jeongyeon afagou as costas da melhor amiga, em um carinho singelo, mas que transmitia todo o cuidado que tinha com ela.

— Eu estou aqui para o que precisar, ok? — Chaeyoung apenas assentiu. Não chorava, mas sentia um bolo se formar em sua garganta. — Tudo vai se acertar no tempo certo. — Jeongyeon afastou-se para segurar o rosto da amiga com ambas as mãos.

O olhar da mais baixa mantinha-se firme ao seu.

— Eu espero que sim. — Chaeyoung disse quase em um sussurro.

Jeongyeon deixou um beijo na bochecha dela e sorriu com a careta em desgosto que a outra fez.

— Vou entrar 'pra falar com as meninas, vamos dar mais um tempo aqui e depois podemos nos despedir porque vamos pegar a estrada de volta amanhã.

— Vou ficar mais um pouco aqui, entro daqui a pouco. — Jeongyeon a olhou um pouco desconfiada. — De verdade, nada demais, só quero aproveitar mais um pouco essa paisagem.

Afinal, não a veria por um bom tempo.

— Certo... não demora muito, as meninas querem saber sobre você.

Chaeyoung apenas assentiu.

Ao ver Jeongyeon caminhar até a porta de vidro que dava acesso a sala de estar, notou uma figura conhecida parada em frente a mesma. Dahyun parecia ter acabado de chegar ali, quando seu olhar encontrou o dela, a garota pressionou os lábios em um sorriso simples.

— Posso falar com você? — Dahyun perguntou.

— Claro. — Chaeyoung sentia-se um pouco envergonhada lembrando da cena que a outra presenciou na outra casa.

— Se roubar a minha melhor amiga eu vou te visitar só pra te bater. — Jeongyeon brincou com Dahyun ao passar por ela.

Dahyun levantou as mãos em rendição e riu. Jeongyeon continuava a mesma.

— Ela sempre foi assim? — Chaeyoung perguntou.

— Sempre, quase insuportável. — Dahyun respondeu em meio ao riso, aproximando-se.

— Não deixa ela te ouvir. — A morena brincou. Dahyun, agora ao seu lado, olhou para a porta para se certificar que Jeongyeon realmente não tinha ouvido.

— Acho que escapei dessa. — Ambas riram baixo. — E então... como 'tá se sentindo? — Dahyun perguntou.

— Não sei dizer ainda. — Foi tudo o que a morena disse.

— Vai sentir falta daqui?

Chaeyoung agradeceu mentalmente pela garota não ter insistido no assunto. Dahyun parecia a entender bastante para alguém que conheceu há duas semanas.

— Com certeza vou... — Chaeyoung divagou um pouco, encarando o lago pela incontável vez naquele dia. — Vou sentir falta do luau, do riacho, do acampamento e até mesmo de ficar em casa curtindo a calmaria. É bom ficar um pouco longe do barulho da cidade.

Dahyun sorriu ladino ao ouvir, a garota ao seu lado não notou que todas as respostas envolviam coisas que tinha feito ao lado de Mina.

— Eu prefiro estar aqui, talvez por ter crescido passando muitas férias nessa casa. — A vizinha sorriu lembrando-se da infância naquele lugar.

— Dá pra ver nos seus olhos o quanto ama esse lugar. — Desde que chegou ali, notou a forma apaixonada que a vizinha falava.

— Fico feliz que tenha gostado. — Dahyun deu uma pausa. — E também por ter te conhecido, sinto que uma grande amizade vai crescer daqui.

Definitivamente. Chaeyoung pensou.

— Pode apostar que sim. — A morena brincou bagunçando o cabelo da garota a sua frente.

Dahyun fez uma careta e empurrou levemente o ombro de Chaeyoung.

— Você 'tá com seu celular? — A vizinha perguntou.

— Hm? — Chaeyoung notou que raramente tocou em seu celular durante toda a viagem, embora sempre estivesse com ele. Afinal, para que serviria se não possuía sinal. — Espera... — Ela pediu enquanto procurava pelos bolsos da calça. — Aqui. — Entregou o aparelho.

Dahyun anotou algo por alguns segundos e logo devolveu.

— Esse é o meu número, não esquece de me ligar quando você e eu estivermos com sinal. — Avisou. — Não aceito perder o contato contigo, se fizer isso vou atrás da Jeongyeon até te encontrar.

A frase soou como uma brincadeira, mas não era. Chaeyoung sabia disso e aquilo a fez rir.

— Confia em mim, vizinha. — Brincou. — Quando vocês vão?

— Daqui a dois dias. — Dahyun respondeu.

Os dias ali estavam mesmo contados, não somente para ela.

Chaeyoung e Dahyun permaneceram ali por mais alguns minutos, entre um assunto e outro a morena viu um pouco de distração em meio ao caos que estava a sua mente. Ao voltarem para a sala de estar, Chaeyoung notou a presença de Momo ao lado das namoradas, pensou em conversar ou até mesmo esclarecer o que tinha tentado dizer no porão, mas o olhar da tatuada dizia que ela tinha entendido tudo.

Momo sempre foi muito observadora, ela sabia que a outra não tinha intenções ruins, apenas parecia um pouco perdida. Torcia para que tudo se acertasse, afinal, nunca viu um acaso que não fosse prometido.

E o dia que começou de forma agradável iria se encerrar com a incerteza do dia seguinte.

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