Onze anos...
Acima um som da Janis Joplin que, igual ao conto, é a maior viagem, kkk. Depois de Tina Turner ou no mesmo patamar de melhores vozes femininas (em minha opinião) está essa boba que foi morrer tão jovem.
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Foi assim...
Foi exatamente assim que nos conhecemos.Hoje relembro com carinho de como aquele rapaz abusado, que hoje chamo de companheiro, mansamente entrou em minha vida. Um peste abusado, levemente egoísta, nada perfeito... ele é apenas meu lado bom e minha parte perfeita.
Então, foi clichê e assim... há onze anos atrás.
.......
Todo inverno eu conciliava o recesso da faculdade com as férias do banco. Era aproximadamente três horas da manhã na rodoviária de Itajaí, quando começaria a viagem mais interessante da minha vida. A única coisa planejada era visitar minha família lá para as bandas de Concórdia.
Se no litoral estava frio, no oeste o clima era gelado, por isso levei uma manta leve e quentinha para enrolar-me e dormir umas boas horas.
O ônibus com leito era um luxo que eu me permitia uma vez por ano, mas estava atrasado uns vinte minutos, fazendo-me olhar ansioso no relógio de pulso os minutos que pareciam voar.
Atrasado, mas antes tarde que nunca, adentra o terminal, meu ônibus com a plaquinha luminosa: Florianópolis/Concórdia, fazendo o coração saltar animado, pois agora cada minuto passado e cada quilometro rodado, minha família ficava mais perto daquele abraço apertado.
Depois da praxe de conferir o bilhete, bagagem acomodada e cumprimentar o motorista era hora de achar meu lugar, a poltrona próxima a janela da metade pro final do ônibus que fiz questão de reservar.
Quando encontrei meu lugar, achei ter havido algum engano a princípio, pois estava ocupado. Ocupado por um ser que nem fez questão de tirar os fones ou levantar os olhos de seu discman para perguntar o que afligia "o jovem" ali parado a lhe encarar.
Sou um cidadão de boa, não brigaria jamais por uma poltrona de ônibus próxima a janela, caso o ocupante tivesse um mínimo de educação.
Até me fiz de bobo e fui olhando as outras poltronas ocupadas, fingindo estar meio perdido. Penso: "é uma vez por ano e paguei pelo "privilégio" de poder apreciar a paisagem com o dia a amanhecer".
— Amigo, não querendo ser chato, mas comprei essa poltrona aí. — Reclamo.
O rapaz que ouvia música no discman, tirou os fones e se mobilizou sem olhar me olhar na cara. Se levantou, como se fosse um cara alto ou grandão, se empinou todo e se espreguiçou, mas continuou mudo e com uma expressão aborrecida.
— Obrigado. — Agradeci sem receber uma palavra de retorno. Sem estresse, pensei. Sentei na poltrona da janela, arrumei meu travesseiro e me cobri com o leve cobertor.
Meu "colega" de viagem, pelo que notei, era do tipo pequeno com pinta de atrevido. Guri novo de traços bonitos, negro, magrinho como tem muitos por aí.
Pensei em puxar um ronco e coloquei o celular para despertar lá por seis horas da manhã, pra eu curtir a paisagem de Rio do Sul para frente. Virei o rosto para a janela e fechei os olhos, contente por não ter sido abordado pelo cara ao meu lado.
Um creck-creck alto, fez-me abrir os olhos assustado, outros creck-creck se repetiram até eu levar umas pancadinhas no ombro.
— Moço. — Alguém me abordou e foi o cara sentado ao meu lado. — Quer Doritos?
Virei e encarei o rapaz...Ainda meio surpreso, acabo aceitando.
— Desculpa por antes, é que subi lá em Tijucas e nunca fiz uma viajem em ônibus assim tão longa, aí nem me liguei nesse lance de poltrona. — Ele disse.
— Ah, sim, tá tranquilo. — Acabei rindo e enfiei a mão no pacote de Doritos tirando alguns nachos.
— Vai pra onde? — Ele me pediu.
— Concórdia. Estou aproveitando as férias de julho para ir ver o pai e a mãe.
— Eu vou até Chapecó visitar uma pessoa, entende? Ele foi embora e fica quase impossível continuar o nosso lance. Só vim mesmo porque quero saber se está firme ou se a gente resolve e fica por aqui mesmo.
— Deve ser importante o sujeito para você ir até ele... — Comentei e ele riu dengoso.
— É que eu gosto dele... Será que posso te pedir uma coisa?
— Opa, claro. — Respondi contagiado pelo sorriso branco e largo.
— Como é seu nome?
— Ah... João, só.
— Só é sobrenome? — Ele perguntou rindo como se realmente tivesse graça.
— Nazário é sobrenome. E o seu?
— Samuel. Ah deixa eu te contar uma coisa...
Fiquei satisfeito com a alegre companhia do tal do Samuel, mas uma parte minha se arrependeu por ter dado corda.
Quem já ficou ao lado de uma pessoa falante, estando louco para ficar em silencio, entende perfeitamente o que eu senti...
— Foi assim quando eu me assumi. — Esse foi um dentre muitos assuntos que Samuel emendou. — Meu pai disse: você morreu pra gente, mas hoje tá supertranquilo. Esse pessoal tem que abrir a cabeça. Depois, eu moro sozinho, sou técnico em enfermagem e não devo satisfação a ninguém, por isso que estou indo atrás do meu namorado ou ex... sei lá... Ele não caga e nem desocupa a moita, eu não vou ficar preso em um cara que mora há setecentos quilômetros de onde moro. Desculpa João, acho que falo um pouco demais.
Não tive coragem de ser xarope porque gostei do colega de viagem, então dei aquela coçada na nuca que significava que concordava e sorrimos um para o outro.
— Pode falar de boa. Falo pra caramba, eu sei. Sua família é do litoral?
— Concórdia. E a sua?
— São João Batista. O meu pai tinha olaria e vendeu. Coitado. O povo acha que quem tem uma fábrica de tijolos é rico. Se fudeu com um funcionário que botou no pau. Sabe aquele tipo que trabalha seis meses em cada lugar só pelo seguro desemprego, aí avacalha um monte só para ser mandado embora. Sacanagem você não acha?
Eu estava louco para dormir um pouco, mas não ia ser difícil.
— É foda, eu acho.
Samuel terminou de comer seu Doritos e chupou os dedos demoradamente, sem tentar ser sensual nem nada, apenas estando distraído. Só que eu não consegui ficar imune, senti aquele arrepio que levantou os pelos do corpo e o "garoto" cabeçudo acordou dentro da cueca.
Um efeito físico e nada mais. De repente tomei consciência que poderia ser a última vez que ia ver o Samuel e tive uma louca ideia.
— Samuel. Posso te dar um beijo?
— Hã? Ah pode... — Me responde meio tímido. Mas aceitou o beijo e até que eu dividisse meu cobertor com ele... e compartilhamos até algumas "ousadias" no decorrer daquelas (muitas) horas no ônibus.
Paixão nasceu, evoluiu e amor cresceu. Flerte, namoro, casório, amizade e companheirismo. Onze anos...
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Oii hoje fiquei com vontade de postar um conto bem levinho, o tal do clichê, doce e sem tanto enfeite.
Fiz até um cartãozinho de aniversário pra leitora Tamiresbcarvalho que me é muito preciosa!
Um abração carinhoso a todos! =^.^=
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