Quarenta e cinco
Ao cair da noite, eu e meus amigos permanecemos no mesmo lugar: sentados em um dos banquinhos próximos a praça.
Minhas unhas já estavam quase na metade e meus lábios sangrando, além das minhas pernas parecerem baquetas de bateria de tanto tremerem.
Meu estômago estava doendo de nervosismo e minha cabeça trabalhando mais rápido do que nunca, só que uma peculiaridade disso tudo, é que eu não chegava em lugar nenhum. A única coisa que me vinha a mente, era o medo de falhar e de acabar pondo e risco meus amigos, que agora, são minha família.
Hyuna passou seu braço pelos meus ombros e me puxou para um abraço lateral. Ficamos em silêncio, apenas observando algumas pessoas passando para lá e para cá, despreocupados.
Meus cabelos estavam sendo soprados para trás a todo momento e meus olhos espremidos para poder enxergar melhor naquele breu. As horas foram passando e já eram quase uma da manhã, horário perfeito para se invadir um lugar que não é de sua propriedade.
- Você sabe que é o único que pode fazer isso, não sabe? - Ela perguntou - Você é o mais forte de nós, só falta você acreditar nisso.
Me levantei, percebendo o quão fria minha barriga estava em ansiedade. Aproveitei que não havia muitas pessoas circulando por ali e entrei em um dos banheiros públicos por perto, nenhum dos dois vieram atrás de mim e agradeci mentalmente por isso.
Entrei em uma das cabines e retirei o vestido e a peruca. Criei uma veste preta colada e com muitos bolsos, que facilitasse meus movimentos caso precisasse correr ou me esconder, além de ser prático, caso eu precisasse guardar alguma coisa. Abri a porta com a roupa e a cabeleira de Hyuna em mãos, me atrapalhando no processo. Parei assim que vi meu reflexo no espelho.
E neste momento, muitas coisas rondaram minha cabeça e uma delas era a pergunta que sempre fiz a mim mesmo, mas que, no entanto, nunca obtive uma resposta concreta que me convencesse e que me fizesse discordar de qualquer coisa contrária a ela:
Quem eu sou, afinal?
Fugi, quebrei regras, arrastei duas pessoas junto comigo a este caos, me disfarcei e agora estou prestes a entrar em um lugar escondido porque não tenho permissão. Tudo isso são coisas que eu sequer imaginava em fazer há um ano atrás. Estava completamente fora de cogitação, eu sequer tinha motivos para isso.
Mas quando disse que seria capaz de tudo por aqueles que amo, eu estava falando a verdade.
Eu queria muito ir para casa agora e dar de cara com meu irmão me esperando com dois Kimbap's¹. Eu queria muito acordar pela manhã e ter a certeza de que tudo isso foi só um sonho. Ou então, que tudo isso não passou de uma brincadeira de muito mal gosto.
Ah, eu estaria disposto a perdoar todo mundo agora, se isso fizesse tudo voltar a ser como era antes.
Eu queria muito sentar, chorar, espernear e fazer birra para ver se o mundo teria compaixão de mim e trazer Jimin e meu irmão de volta.
É demais pedir para que as coisas estejam nos seus devidos lugares e não bagunça em uma grande bola de neve? Sempre fui alguém organizado e até meio metódico em certos pontos e, do dia para noite, eu vi as coisas mudarem em ângulos opostos. Meu mundo virou de pernas para o alto e eu, como estava dentro dele, virei junto.
Meus olhos estavam úmidos, denunciando que uma lágrima poderia escorrer facilmente por ali, mas eu segurei. Não vou chorar agora. Tenho algo para descobrir e se eu derramar, minha visão pode ficar embaçada e atrapalhar tudo.
Sai do lugar abafado e voltei aos meus amigos, que me esperavam ainda sentados, mas que se levantaram assim que me viram.
- Está pronto? - Tae confrontou, me olhando com cuidado.
- Pronto ou não, vou ter que fazer isso de qualquer forma, não é?
- Você pode desistir se quiser.
- Não, noona. Tudo o que fizemos até agora foi por este momento, não podemos falhar agora.
- Certo...
Ela pegou as roupas e a cabeleira de minhas mãos e deu-me um meio sorriso. Seus olhos estavam vermelhos, então tive a certeza de que ela também estava com medo do que poderia acontecer. Tae me entregou a pedra violeta que refletiu em nossos olhos pela tamanha claridade.
Eu poderia facilmente passar o dia inteiro estudando esta pedra e me perder em suas características únicas. Tão únicas que nem mesmo o maior falsificador de joias conseguiria um resultado aproximado ao original. Ela é tão bela, é definitivamente uma pena que pertença a pessoas, em sua maioria, tão maldosas.
Ela brilha mais que um diamante e provavelmente é bem mais rara também. Tão rara que você não encontra em exposições e nem em livros de gemologia².
Agradeci-o com um aceno e comecei a caminhar em direção ao grande circulo que se encontra pouco iluminado. Apenas pelo meu senso direção, fitei o chão para poder encontrar a rachadura que possuía o tamanho perfeito para o encaixe do metal.
Agachei-me com as mãos trêmulas e pedi baixinho para que se por algum acaso o destino decidisse ouvir meus pedidos, para que tudo aquilo fosse um sonho, aquele seria um momento perfeito para acordar com meu despertador fritando ao som de Gangnam Style do Psy.
Mas como eu já esperava, eu não fui teletransportado para meu quarto de alguns meses atrás e muito menos meu celular passou a tocar. Infelizmente.
Encaixei-a e esperei para ver se algo aconteceria ou se tudo aquilo ela apenas uma mera coincidência aquela rachadura estar exatamente ali e ser exatamente do tamanho da pedra.
Alguns segundos se passaram e nada acontecia, até sentir o chão sob meus pés tremerem. Um círculo menor se formou no meio do grande no qual estava. Formou-se uma espécie de buraco, no qual caminhei para olhar mais de perto, percebendo que havia uma escada feita de barras horizontais metálicas ali.
Olhei para trás uma última, vendo meus amigos tensos me encarando com um misto de emoções. Decidi entrar logo, porque se pensasse demais, poderia correr o risco de desistir.
Assim que firmei meus pés nas escadas e minhas mãos estavam seguras também, o chão fechou-se novamente me deixando num escuro amedrontador, daqueles típicos de filmes de terror. Quando desci alguns poucos degraus, uma luminosidade incomodou meus olhos que já haviam se acostumado a escuridão.
Quando forcei minha visão com veemência, pude perceber que era a pedra violeta, que havia encaixado lá fora. Certo, então isso significa que eu muito provavelmente vou precisar dela para sair daqui.
Respirei fundo e continuei descendo, rezando para aquela escada não dar no inferno.
Logo abaixo, perto do final da escada, encontrei luz novamente, juntamente de passos e conversas de pessoas que pareciam falar minha língua.
Forcei meus ouvidos para tentar ouvir o que tanto diziam. A única coisa que conseguia visualizar, eram os sapatos das pessoas. Que inclusive eram todos padronizados: botas cinzas cintilantes de salto fino para as mulheres e sapatos sociais com fivelas da mesma cor para os homens. Padronização é uma merda.
Estava numa espécie de túnel vertical, onde os degraus da escada acabavam aproximadamente a um metro do chão, ou seja, eu teria que pular, e se fizesse isso, chamaria atenção pelo impacto. Algo me diz que isso é calculado, eles não iriam tirar degraus dali se não houvesse um propósito.
Minha hipótese é que exista apenas uma saída e que se caso alguém tente invadir aqui, essa pessoa chame atenção ao entrar ou então tenha dificuldade para sair. Ou seja, eu estou muito ferrado.
Me concentrei o máximo que pude para conseguir flutuar e chegar ao solo sem fazer nenhum escândalo ou chamar atenção, o que é totalmente desprezível agora.
Uau, nunca achei que ficaria tão feliz em não ser visível. É só ser eu mesmo que ninguém me nota. Quem diria, eu, um ser imperceptível pela a maioria, fazendo de tudo para ser ainda mais não perceptível. Todas as minhas chances de ser popular ou então, de ter pelo menos meia duzia de pessoas sabendo meu nome, foram por água abaixo. Não que eu queira ser popular, mas saber que as pessoas pelo menos sabem da minha existência, poderia ser legal de vez em quando.
Soltei minhas mãos das barras de metal e lentamente pousei meus pés no chão, tomando o maior cuidado para não se pego. Me escondi atrás de uma das paredes cinzas, que me causou aquela famigerada sensação se tensão. Podia ouvir a música de ação soando em minha mente, enquanto fazia de tudo para não ser notado.
Com minhas costas coladas na parede, passei a observar o lugar e tentar gravar o máximo de coisas possíveis que poderiam me ajudar, caso algo desse muito errado. E acredite, a chances são altas disso acontecer.
À minha direita, havia uma porta com uma placa branca colada nela. Tinha o desenho de uma cobra em preto, parecia muito ser algum tipo de stencil³.
Andei em passos leves, me aproximando aos poucos. Toquei a maçaneta devagar e a abaixei e, para minha surpresa, estava aberta. Estranho, por que eles deixariam uma porta aberta por aqui? Pensei que a segurança fosse muito melhor, no entanto, não acredito que eles sejam tão bobos ao se descuidarem nisso.
Certo, ou isso pode dar muito certo, ou muito errado.
Dei uma última olhada por cima do ombro, vendo se havia alguém atrás de mim e abri a porta de vez, passando para o outro lado dela.
Não tinha ninguém ali, exceto por alguns tubos gigantes que caberiam facilmente meu corpo ali dentro. Botões e telas também preenchiam o local. Bem ficção cientifica. Por que ver coisas parecidas na TV me parece muito mais convidativo do que ao vivo?
Olhei tudo, admirado. Por apenas alguns segundos me imaginei aqui, trabalhando e entendendo tudo o que os botões e alavancas fazem... Não, eles são ruins, não posso me juntar a eles.
Continuei observando à minha volta, até ver um tubo separado dos outros, coberto por um pano preto. Me aproximei lentamente, curioso e com medo do que poderia encontrar debaixo daquela coisa que se assemelhava muito a uma cortina limpa demais.
Poderia ser um E.T? Algum tipo de experimento? Um mutante? Um peculiar? Oh, céus. Você não tem ideia do medo que eu estou de encontrar coisas nada convidativas debaixo disso.
Pelos deuses, que não seja um ser humano sem roupa.
Segurei firme o pano e puxei de uma vez, deixando-o cair no chão, sobre meus pés.
Pressionei os olhos com força, me preparando para encontrar algo talvez não muito agradável aos meus olhos e que ferisse minha integridade que já não está mais tão integrada.
Os abri devagar, apenas um pouquinho de cada vez, somente para não me assustar caso visse algo que não deveria.
E eu encontrei algo que deveria, mas não da forma como deveria.
Ele não deveria estar ali. Não, definitivamente não. De maneira alguma.
Respire. Apenas respire.
Não entre em pânico. Certo, tudo bem... Está... Tudo bem.
Há inevitáveis coisas que acontecem nas nossas vidas e isso é completamente normal. Acredite, é normal ocorrer coisas que não planejamos antes, é normal sairmos do controle algumas vezes. Mas, tanto assim, eu não sei.
Minha vida não saiu do meu controle, quem saiu do controle, na verdade, fui eu e a vida foi quem continuou. A vida é quem me controla, não ao contrário. Pelo menos é isso o que parece na maioria das vezes.
Eu só ando vivendo com o que a vida decide me dar de presente, mas nem sempre os presentes são bons. Meias e cuecas, por exemplo. Sua tia passa o ano inteiro dizendo que vai te dar algo memorável no seu aniversário, para no dia receber meias, sem contar, que muitas são idênticas as que seus primos ganharam também. E é exatamente assim que estou vivendo nos últimos tempos, esperando que presente a titia vida vai me dar.
E até agora, não ganhei muita coisa além de cuecas e as meias, propriamente ditas.
Seokjin estava ali. Ele estava. Mas com uma faixa nos olhos e com as mãos amarradas em frente ao corpo. Seu rosto está tão pálido, mas ele está ali. Ele está bem, tem que estar.
- Hyung! Você me ouve? - Perguntei, depois de sair do transe que me instalei sem perceber - Eu estou aqui, eu te encontrei. Vou te tirar daqui, mas como faço isso? - Olhei ao redor, procurando alguma forma de executar o que pretendia. - Por favor, diz que está me escutando, acena com a cabeça, qualquer coisa. Por favor.
Ele não estava acordado, ou talvez o tubo fosse a prova de som e ele não estivesse me ouvindo. É isso, tem que ser isso.
Ah, ele estava tão magrinho também. Meu coração apertou e eu só queria quebrar aquele vidro e o abraçar forte pelo tempo que passei longe.
Minhas mãos estavam tremendo e minha visão embaçada pelas lágrimas que se acumulavam para sair, mas ainda assim continuei estudando uma maneira de conseguir tirá-lo dali. Haviam botões e alavancas sem nenhuma legenda do tipo "ligue/desligue" ou "puxe".
Me senti tão inútil por não entender nada daquilo.
Droga, droga, droga.
Meus olhos alteravam entre o monte de sensores e Jin, que mesmo diferente, parecia-se com o mesmo. O mesmo que me acolheu no meu pior momento e permaneceu ao meu lado até o último minuto que pode. E eu serei eternamente grato.
O desespero bateu quando eu não conseguia chegar a conclusão nenhuma sobre como abrir aquela capsula. Eu só queria tirá-lo de lá e voltar com ele ao meu lado. Eu quero ele de volta, quero abraçar e ser abraçado pelos melhores braços do mundo, quero sentir o carinho dele nos meus cabelos quando meu dia não foi bom. Tenho até saudade das broncas por eu não me alimentar direito, às vezes.
Envolvi meus braços envolta do objeto de vidro e metal a minha frente, como se tentasse abraçá-lo, se fosse possível. Mas não é a mesma coisa, o comprimento dos meus braços esticados sequer chegam a metade da circunferência do objeto.
Raiva. Eu senti raiva. Não duvido que meus olhos estejam púrpura agora.
Fechei minhas mãos em punho, disposto a ter meus dedos cortados caso conseguisse quebrar aquilo, no entanto, aquilo poderia machucá-lo e o que eu menos quero no mundo e que ele se machuque. Sem contar que isso faria o maior barulho e chamaria a atenção de todo mundo.
No meio dos meus soluços, frustrados, ouvi gritos. Uma visão de tortura passou em minha mente, um lugar escuro, mas não consegui ver muita coisa. Alguns segundos depois, outra visão, porém, desta vez, haviam homens de preto, parecidos com os que correram atrás de nós na mata.
Fiquei tonto e minha cabeça deu algumas pontadas, meu coração apertou e eu senti que deveria agir. Por um motivo eu deveria.
Com algumas lágrimas escorrendo e um sentimento de insuficiência no peito por não conseguir fazer nada, peguei o pano novamente e joguei sobre a capsula, vendo ela ser coberta novamente. O que será que fazem com ele aqui? Não tive visões com meu irmão, então significa que ele não corre perigos, certo?
Eu só queria protegê-lo, assim como ele fez comigo, mas eu não consegui. Eu falhei, eu falhei miseravelmente. Eu deveria ter ido junto dele naquele dia. Eu deveria ter sido pego no lugar dele. Não é justo. Podem ouvir meu peito estilhaçar?
Mais gritos foram ouvidos por mim e eu poderia jurar que reconhecia essa voz.
Eu nunca tinha a ouvido gritando em agonia, mas me lembrava um certo alguém.
- EU NÃO CONSIGO! - Um estalo e então mais um grito - Me deixe comer, só um pouco. Não como nada desde ontem pela manhã. - A voz parecia mais baixa e fraca.
A voz... Aquela voz.
A mesma voz que eu gostava tanto de ouvir, mas que nunca admiti diretamente quando podia.
A mesma voz que faz meu corpo entrar em combustão, exceto na barriga, porque ela continua gelada quando estou perto de si, ou então, quando meus pensamentos me levam até ele.
A mesma voz que faz meu corpo travar e gaguejar. O dono da voz mais doce e mais linda que já ouvi em toda minha vida.
Os sons vinham debaixo de meus pés, o que me levou a acreditar que havia mais um andar aqui em baixo, o problema é como vou chegar até lá.
Eu poderia usar o dom da Transparência e ficar invisível e, assim, ninguém me veria. O problema, é que meus poderes não funcionam com os peculiares das Trevas. E nem o deles comigo. Uma troca justa, certo?
Segui para fora daquela sala estranha pela mesma passagem que entrei. Desta vez, não havia ninguém ali, exceto por uma moça que parecia ter esquecido algo e voltou para buscar, logo saindo novamente. Estava escondido e não consegui ver onde ela entrou, mas pelo falatório, parecia ter vindo da porta à esquerda da do meio, na parede oposta na qual estava me esgueirando.
Esperei que seus passos cessassem para que eu pudesse sair de trás de lá e observar com mais calma. O lugar parecia-se muito com o outro no qual estava, no entanto, não haviam capsulas, apenas telas grandes e muitos, muitos botões.
Tinham três portas ali e uma abertura maior que deveria dar ao refeitório ou algo do tipo, já que dava para ouvir barulhos de talheres contra o prato. Será que eles não comem comidas típicas coreanas?
A última porta da direita havia uma plaquinha escrito "cuidado, degraus" pregada logo ao lado.
Novamente, em passos pequenos e tentando fazer o menor barulho possível, caminhei até ela a abrindo com calma.
Era um corredor com uma escada em espiral que se perdia de vista. Ouvi mais alguns barulhos, pareciam tapas estalados. Ele estava apanhando. Park Jimin estava apanhando por algo que provavelmente não tem culpa.
Comecei a descer as escadas numa ânsia enorme em correr para encontrá-lo logo e saber o que estava de fato acontecendo.
Cada grito, cada estalo que ouvia, meu interior se contraia cada vez mais em pura fúria. Passei de degrau em degrau, o que demorou aproximadamente dez minutos, que poderiam ser reduzidos caso eu não estivesse morrendo de medo de ser pego e acabar com tudo.
Tem duas pessoas aqui dentro que dependem de mim e se me pegarem, não quero nem imaginar o que lhes pode acontecer.
Ao chegar no final do lance, percebi a presença de dois guardas em frente a uma porta que estava aberta. Ambos vestiam uniformes marrom claro. O que mais me chamou a atenção, é que eles estavam armados, ambos com uma espingarda sendo descansada na mão direita.
Pareciam-se muito com aquelas armas antigas, no entanto, não duvido que o design seja apenas para disfarce.
Dois homens vestidos de preto e com capas, que iam até a cintura, saíram de dentro da sala no qual os guardas vigiavam. Um segurava um chicote enquanto outro um pano comprido, que deduzi ser uma venda.
Um deles tinha uma cicatriz vertical no olho direito, no entanto, seria mentira dizer que ele era feio por causa disso, pelo contrário, apenas o deixava com um ar mais sombrio e perigoso.
Eles estavam conversando sobre algo que não consegui escutar pela distância. Forcei meus ouvidos para tentar descobrir alguma coisa, no entanto, minha tentativa de xeretar a conversa alheia foi por água abaixo quando ouvi tosses constantes. Elas eram secas e altas.
O homem com a cicatriz fuçou os bolsos da calça e tirou de lá uma chave grande demais para as convencionais que usamos em casa, e atirou a um dos guardas que a pegou desajeitado. Assim que ele puxou a porta, a pessoa do lado de dentro correu até a mesma, batendo com força no metal resistente.
- NÃO! Me deixa sair daqui, por favor! - As batidas continuaram - Eu faço o que vocês quiserem, eu posso trabalhar aqui, uh? Prometo que me esforçarei mais se me deixarem tomar um pouco de sol ou comer alguma coisa. - Sua fala foi cortada por soluços, os guardas não demonstravam reação e os caras de preto apenas riam da cena - O que vocês querem de mim? Me deixem voltar para casa! - Gritou, desesperado - Tem tenta gente melhor que gostaria de estar aqui, por que eu?
- Ninguém gostaria de estar no seu lugar, Park. Não tem ninguém melhor do que você: poderoso e vulnerável. Só sairá dai quando deixar de ser mimado e fazer tudo o que deveria fazer há muito tempo. - Berrou, autoritário, se divertindo com a desgraça - Agora cale a boca ou ficará preso as correntes durante o restante da semana, é isso o que você quer?
O outro se calou na hora e eu nunca quis tanto voar no pescoço de alguém como quis agora. Minha vontade era de pegar cada um deles e fazer picadinhos, do tamanho das cebolinhas que meu irmão picava para fazer comida.
Ainda dava para ouvir seu choro e algumas tosses, estas que eram abafadas, provavelmente para evitar fazer barulho.
- Ótimo, assim que eu gosto. Quietinho.
O cara com a cicatriz bateu nas costas alheias e ambos saíram rindo, como se estivessem saindo de algum parque ou de um shopping qualquer.
O corredor é extenso e possui muitas salas idênticas, no entanto, a maioria tem uma pequena janelinha, que revela o interior da sala que aparenta ser minuscula, exceto pela de Jimin, que era inteira fechada. Me perguntei se havia ventilação lá dentro.
Os guardas continuaram em frente a porta, olhando fixamente para frente, numa postura ereta demais.
No final do passadiço, havia uma porta, no qual os dois sujeitos passaram, deixando todo o clima pesado para trás.
A tensão era palpável e me senti sufocado apenas em ouvir e presenciar aquela cena. Não sei se seria forte o suficiente para aguentar metade do que Jimin pareceu passar por aqui por todo este tempo.
Minha cabeça estava trabalhando a mil, tentando pensar um jeito de conseguir tirar o Park de lá sem ser notado. Eu precisava distraí-los.
Concentrei-me o máximo que pude e criei algumas moedas falsas e em seguida um saquinho para colocá-la dentro. Olhei-as de perto, vendo se eram realmente parecidas com as originais. Com telecinese, levei o saco de pouquinho em pouquinho até próximo dos pés dos soldadinhos, mais ou menos uns três metros de distância do da direita.
Esperei para ver se algum dos dois desviaria o olhar da parede para se tocar de que havia uma saca com aproximadamente onze mil wons* com moedas de quinhentos.
Ansioso demais para ficar esperando, ainda com a telecinese, empurrei a arma do carinha da esquerda, o fazendo se desequilibrar pelo espanto, batendo no da direita.
- Qual seu problema? - Ri.
- Desculpe, eu me desequilibrei.
- Percebi. - Ironizou - Olha, James, eu já disse para você não beber antes vir para cá.
- O quê? Eu não bebi hoje.
- Ah, não? Está caindo de maduro?
- Definitivamente não dá para conversar com você Bae.
- O que você quer dizer com isso?
Meus olhos rolaram para fora do rosto. Eu odeio brigas, por mais que às vezes seja engraçado ouvir, entretanto, acho que Tae e Hyuna conseguiram me traumatizar o bastante.
- Que você não confia em mim!
- Como quer que eu confie em você se...
- O que foi?
- O que é aquilo? - Finalmente! - É seu? - Aproximou-se do saquinho, tendo seu companheiro indo logo atrás, ambos de costas para mim. Certo, esta é minha chance de agir.
Ainda com usando a telecinese, puxei a chave que estava em seu bolso, a mesma no qual o cara de capa havia jogado para que trancasse a porta do quarto no qual estava Park.
Peguei-a com cuidado para que nenhum dos guardas vissem e confesso que eles deveriam oferecer um treinamento melhor aos que cuidam daqui. Eles se distraíram com um saco de moedas de quinhentos wons, não se pode esperar muita coisa.
Coloquei a chave dentro do bolso da calça e sai de trás da parede na ponta dos pés. Andei lentamente até perto deles.
Eles estavam discutindo sobre com quem ficaria com o dinheiro que provavelmente nem daria tempo de ser gasto antes de sumir.
Limpei a garganta, na espera que eles me ouvissem e me vessem.
Eles se viraram de uma vez, assumindo uma feição medrosa de quem havia se metido em uma encrenca das grandes. Imagino que eles pesaram ser algum chefe ou superior, alguma coisa assim.
- Quem é você? - Ferrou!
Ambos puxaram as armas, que estavam penduradas pelas alças nas costas, para frente, as apontando em minha direção para dar o primeiro disparo em qualquer movimento em falso que eu fizesse.
Meu coração foi parar na boca e não tenho dúvida de estar parecendo uma criança assustada que perdeu o caminho de casa.
Levantei minhas mãos para o alto, com minha cabeça trabalhando e rodando as engrenagens tão rápido que poderia sair fumaça pelos meus ouvidos
- Eu te fiz uma pergunta! Responda ou eu atiro!
- Eu... - Parece que faz mais de um ano que não bebo água - Eu sou novo aqui e me mandaram descer aqui em baixo para conversar com... - Olhei para seus uniformes e vi uma tala horizontal com seus nomes escritos - James e Song Kang, o primeiro tinha um leve sotaque estrangeiro, no entanto, possuia traços orientais -, vocês conhecem?
Os dois abaixaram as armas, com feições metidas o rosto. Eles são definitivamente uns babacas.
- Somos nós. - Disse o da direita, James - Então você é novato? - Assenti - Oh, fizeram muito bem te mandar aqui. Sabia que somos os melhores guardas da cidade?
- Oh, é mesmo? - Perguntei, me aproximando, fingindo interesse.
- Sim, agora diga, que dom você tem? - Perguntou, o gringo.
Engoli em seco, tentando desviar o assunto.
- Wow, isso é uma arma de verdade? Parece um tanto antiga para fazer um trabalho eficiente.
- Essas armas? - Vangloriou-se, o mesmo - Elas são iradas, têm uma cara retrô para enganar os intrusos que acham que nossas armas são fracas. Eles mal perdem por esperar.
Minhas entranha contraíram e parecem ter sugado todo o líquido e sanidade do meu corpo.
- E vocês... Poderiam me mostrar como usá-las? - Perguntei.
- Claro! - Respondeu, levando um tapa no braço de Song, que parecia ser um pouco mais esperto - Ai!
- Você está louco? O garoto mal chegou, não acha que ele é muito suspeito? - Cochichou, em vão, já que eu estava no meio dos dois.
Se Hyuna fosse a treinadora deles ou até mesmo Tae, com certeza eles estavam na linha há muito tempo.
- O garoto não deve ter mais de treze anos, relaxa cara! - Céus, eu tenho quinze! QUINZE! Vou fazer dezesseis ainda este ano.
- Ele pode ter algum poder ligado a juventude, eu sei lá.
- Peça para ele mostrar a marca, ai saberemos.
Marca, a porcaria de marca de cobra que eu não tenho no meu corpo por não ser das Trevas.
Como eu não pensei nisto antes? E deveria pelo menos ter pintado de canetinha ou de sei lá o que.
- Boa ideia.
- Eu sei. E isso significa que eu fico com dinheiro. - Puxou o saquinho do bolso fundo do outro, que ficou com uma cara de pura indignação.
Quando suas atenções foram voltadas para mim novamente, emiti minha maior cara de inocência do mundo. Talvez ter Hyuna me enchendo o saco vinte e quatro horas por dia, para eu treinar minhas expressões faciais em frente ao espelho minúsculo do banheiro, tenham servido para alguma coisa.
- Certo, garoto, primeiro nos diga seu nome. - Pediu Kang, assumindo um semblante sério, daqueles de filmes policiais.
- Meu nome...? Jeon Seojoong...
Só espero lembrar deste nome depois.
- Certo, Jeon. Agora nos diga sua idade.
-Treze. - Menti outra vez.
- Olha, ai. Eu te disse! - James cochichou de volta ao comparsa - Eu fico com isso. - Puxou outra vez para si o saco de moedas e enfiou no bolso oposto, no qual o outro não conseguiria alcançar com facilidade.
- E agora me diz: o que uma criança de treze anos estaria fazendo em um lugar tão perigoso como esse? Ele nem deve ter passado pelo processo de fortificação de seus poderes ainda. - Voltou-se para mim -Mostre-nos sua marca.
Meu sangue gelou e eu deveria cair durinho aqui mesmo. Sério, sem exagero. Agora seria o momento perfeito para morrer, bater as botas, pendurar a chuteira, ir para o beleléu. Mas eu não posso, não agora.
Vamos deixar para abotoar o paletó mais tarde, primeiro eu tenho que dar um jeito de tirar Jimin e meu irmão daqui. Como, eu não sei.
- Ela fica aqui. - Apontei para meu cotovelo, simulando erguer a manga da blusa para mostrar-lhes, no entanto, quando seus olhos estavam fixos em meus movimentos, aproveitei-me do momento e certei o nariz de Song, que estava mais próximo. Ele gritou um xingamento que não entendi muito bem pela música de ação ter começado a tocar em minha mente.
Ele se contraiu e cobriu seu nariz com a mão direita, já que a esquerda possuía a arma, na qual eu arranquei de sua mão imediatamente. O estrangeiro estava vindo para cima de mim quando olhei para si. Me abaixei um pouco antes de seu punho acertar meu rosto. Agachado no chão, puxei seus pés numa rasteira desajeitada.
Ele caiu ao meu lado, com a espingarda debaixo de seu corpo e eu estava morrendo de medo que ele fizesse um movimento e esbarrasse no gatilho.
Me levantei rapidamente, ainda com a arma em mãos sem saber muito bem como utiliza-la. E eu nem queria, a usaria de outra forma.
Mesmo com o nariz sangrando, Kang tentou pegar a arma de mim, que eu ergui sobre minha cabeça com os braços esticados. O mais velho segurou no meio do cano e acertou seu joelho na minha barriga, me fazendo abaixar de dor, ainda segurando a arma com as mãos.
Ergui-me e novamente, vendo que o outro guarda também vinha em minha direção com a arma em punhos.
Ouvi batidas que vinham da porta de Jimin, em seguida de uma fala sua: - Ei! O que está acontecendo ai?
- Devolva a arma para ele, enquanto ainda pode respirar, baby.
Então aquele seria meu fim? Invadindo um lugar denominado das Trevas tentando salvar duas pessoas importantes para mim? Talvez eu já estivesse morto a muito tempo e só não queria admitir. O que eu sou sem aqueles que eu amo?
Eu sei que tem todo aquele discurso sobre amar a si mesmo antes do outro e ser você mesmo o motivo da sua sobrevivência, mas eu não consigo. Eu não consigo deitar minha cabeça no travesseiro e relaxar sabendo que tem duas pessoas no qual eu amo sofrendo aqui e longe de casa.
Eu me sinto egoísta em ter o que comer e beber enquanto claramente Jimin está passando fome aqui dentro e sofrendo torturas físicas e psicológicas.
Não, eu não voltaria em paz se eu não voltasse com eles ao meu lado.
Eu tenho que tentar mais um pouco, certo? Não posso me render assim tão fácil.
O problema é que meus dons não funcionam com eles, apenas com objetos que eles usam. Por exemplo, eu não posso usar meu poder de transparência com eles, não funcionaria, mas eu poderia usar com as armas. Eu não poderia levitá-los com a telecinese, mas eu poderia levitar suas armas. Seria este o raciocínio.
Puxei a arma de uma vez, posicionando-a igual ao do outro a minha frente, ameaçando atirar também. Eu nunca teria coragem para tal ato, puxar um gatilho, tendo a total consciência de que eu poderia matar alguém apenas fazendo um simples movimento com o dedo e mirando no lugar certo.
É apena um estouro e, pronto. Ali acaba uma história, uma vida, uma família. Mesmo que a pessoa seja uma das piores do mundo e não pense duas vezes antes de puxar o gatilho para alguém, não podemos ser iguais a elas, não é mesmo?
Meu interior estava revirando apenas em pensar na possibilidade de estar no poder de fazer isso ou não. Eu poderia disparar primeiro e acabar com tudo isso de uma vez. Eu tenho poder agora. Se eu mover o dedo por um centímetro, uma porra de centímetro, eu posso acabar com um deles e em seguida com o outro.
Como já dizia Abraham Licoln: "Se quiser por à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder".
Num raio, levitei a arma para cima, ao mesmo tempo que usei da transparência para ficar intocável a qualquer coisa, exceto por seus toques. James apertou o gatilho e a bala atravessou-me, próximo ao pulmão, caindo atrás de mim, no final do corredor.
A sensação de ter uma bala atravessando sua pele e interior é estranha, no entanto, eu tive a sorte de ser privilegiado por este dom, que permite que eu possa tocar em coisas (ou coisas me tocarem) e atravessar-me semelhante a filmes de fantasmas.
Lembro-me do dia em que descobri isso e surtei, quebrando todas as janelas do meu quarto e até mesmo quase machucando meu irmão. Quem diria que se aquilo não houvesse acontecido, eu poderia estar mortinho agora.
Parecendo confuso, o guarda disparou mais uma vez, me fazendo encolher pelo barulho alto dos estouros. Só espero que estes sons não chamem a atenção de mais ninguém.
O outro guarda me segurou pela cintura quando avancei alguns paços. Isso é covardia, dois contra um.
James deixou a arma de lado e correu para perto, mas antes que ele fizesse alguma coisa, aproveitei-me dos braços em minha cintura e me pendurei neles, usando as pernas para afastar o outro que provavelmente me daria uma bela de uma surra. Ele caiu sentado. Me perguntei como estaria seu cóccix.
Me debati de todas as maneiras possíveis para tentar escapar de seu aperto. Seus braços que não aparentam muitos músculos, estavam me deixando sufocado pressionando minha barriga.
- Fique quieto, seu moleque! Se você desistir agora, prometo que te deixo sair sem ser visto.
- Que tipo de promessa é essa? - Revidei.
Dei uma cotovelada acertando sei lá onde. Mas pareceu dar certo, afinal, ele se afastou e me deixou cair de joelhos. Apoiei minhas mãos no chão recuperando as forças. A arma ainda estava flutuando próximo ao teto. Peguei a outra espingarda e fiz o mesmo. Se eles não pudessem pegar nenhuma das duas, seria uma vantagem. Se conseguir destrancar aquela porta para que Jimin saia, eles podem atirar nele. Já se eles não conseguirem pegá-las, não tem como dispararem.
O homem do exterior levantou-se, com a mão em uma das bandas do bumbum. Seria até cômico se eu não estivesse num nível alto de adrenalina.
Ele mirou meu rosto, entretanto eu barrei com o antebraço, em seguida, ele fez o mesmo com o outro punho e me defendi da mesma maneira. Ele riu, tirando sarro da minha cara e chutou meu estômago. Como reflexo, rodeei meus braços no local ficando totalmente vulnerável a qualquer ataque. Se aproveitando do meu momento de fragilidade, ele desferiu-me um tapa na minha bochecha, que me fez cair igual um saco de batatas no chão.
Ele me pegou pela gola da blusa e me levantou novamente. Minhas mãos estavam segurando as suas, por medo dele desistir da gola e ir direto para o pescoço.
Me engasguei com a própria saliva que estava amarga e com gosto de sangue. Provavelmente meus lábios estavam sangrando. Espero que só os lábios.
Ele me jogou no chão com força. Ouvi meu pulso direito estralar e arder quando o usei para aparar a queda. Então era por isso que Hyuna me dizia para fazer um rolamento para trás quando cair de costas, semelhante as jogadoras de vôlei, ao invés de apoiar com as mãos. E eu achando que era apenas charme.
Os dois se juntaram lado a lado, com olhares intimidadores que me fariam ficar emotivo à alguns anos atrás.
Desviei minhas orbes por alguns instantes e o que eu encontrei ao meu lado me deixou mais contente do que achei que ficaria caso isso acontecesse.
Esteva deitado próximo a parede oposta da porta de Jimin, que voltou a bater na porta.
Pela fresta da porta, pude ver seus dedinhos dos pés descalços, encolhidos de medo.
- O que você quer aqui? - O coreano colocou seu pé calçado com um coturno bem encerado sobre meu peito.
Segurei seu pé que me pressionava, tentado não deixá-lo afundar demais em mim.
- Achou que iria ganhar da gente? Ninguém nunca ganha. - Continuou - Talvez aparentamos ser idiotas, bobos, lesados, distraídos, bobocas, mulas, burros...
- Acho que ele já entendeu, hyung. - Sussurrou James, passando a mão perto do pescoço, como se estivesse pedindo para cortar aquilo e eu revirei os olhos.
- Mas apenas fingimos para que pense que somos otários, ok? Tudo o que você viu de babaquice foi encenação, entendeu? - Ele não estaria tão desesperado para me fazer entender isso se fosse realmente verdade.
Retirei uma das mãos de seus coturnos e abaixei até o bolso da calça, tetando alcançar a chave sem fazer muito muitos movimentos suspeitos.
Meus olhos estavam enchendo de lágrimas pela pressão em meu peito, meu ponto sensível.
Eu valorizo demais a respiração, porque quando ela falta durante alguma crise, é difícil fazer de tudo para procurá-la e não encontrar de jeito nenhum. E agora eu não estava precisando de uma crise para tirá-la de mim, tinha um cara feio fazendo esse trabalho.
- Oh, o neném vai chorar? - Afinou a voz em pua zoação - Me diz, em que momento você achou que poderia acabar com a gente? - Ah, a voz irritante era de James.
- Ele é só uma criança com imaginação fértil bancando o super-herói. Ele até esqueceu a toalha que ele deve amarrar nas costas para brincar com o papai dele.
Consegui retirar a chave do bolso e tentei escondê-la dentro da mão, entretanto, ela é um tanto grande demais para caber inteira em minha mão.
Certo, é agora ou nunca.
Mirei a fresta por baixo da porta. Tinha que ser preciso. Só havia uma única tentativa e caso falhasse, tanto eu quanto o plano de resgatar Jimin e Seokjin iriam junto comigo para cemitério.
Eu só tinha que deslizar aquela chave porta abaixo e gritar para Jimin que aquilo era para abrir a porta. Além de rezar para ter tranca por dentro, é claro, ou então, eu estaria frito de qualquer jeito.
Estava num misto de medo e esperança quando joguei o objeto preteado na direção certa, adentrando o comodo correto.
- Jimin! - Usei todo o fôlego que ainda me restava para dizer alto o suficiente - Abra, rápido.
- Ora, seu...! - Soong me puxou para cima novamente, me prendendo contra parede, mas desta vez, segurando meu queixo com força, marcando seus dedos sujos nele.
Apertei meus olhos e segurei seus pulsos, implorando em pensamentos que me soltasse e que o Park saísse de lá logo.
Conseguia sentir a pressão que seus dedos exerciam em minhas bochechas, encostarem em meus molares e pré-molares. Ou eu ficaria sem dentes ou com eles tortos, no mínimo. Alô, aparelhos.
Ele balançou meu rosto e chegou com o seu bem perto do meu, em uma encarada mortal. Seus olhos mudaram de um castanho escuro para um preto, com a pupila semelhante a de uma cobra. Sua língua saiu de sua boca, era bifurcada e deveras fina.
Era uma imagem realmente perturbadora, ainda mais para mim, que morro de medo de cobras.
Que ironia, não é mesmo? Tenho medo de cobras e tenho dons que vieram de uma.
Ah, o destino é uma vadia má.
Ele continuou me olhando com aquele olhar venenoso que me arrepiava até mesmo em lugares que nunca tinha arrepiado antes. É como estar frente a frente com uma cobra, uma cobra com braços, pernas e cabelos. Cabelos estranhamente sedosos, vale ressaltar.
- Larga ele! - Jimin estava parado logo atrás de si.
Ah, hyung. Você não tem ideia do quanto eu estou feliz em ver você de volta.
Esquece o que eu te disse, destino. Você não é uma vadia má. É apenas vadia.
- Eu mandei soltar! - Enfatizou e minhas pernas tremeram. Não sei se de alívio ou por ouvir sua voz grosseira.
O outro guarda andou em sua direção, pronto para trancá-lo novamente, no entanto ele posicionou as mãos bem abertas em frente ao corpo. Suas palma foram ficando vermelhas, até arder em brasa. Meus olhos se arregalaram, pasmo.
- Ou, nem tente. - Riu, vitorioso para o outro que recuou rapidamente - E quanto a você? Prefere soltar ele por bem ou por mal? - Estralou os dedos estilo pianista, fazendo emitir algumas faíscas.
O homem soltou meu rosto e virou-me de trás para si, prendendo meus braços em minhas costas em uma posição nada confortável.
- Chegue perto ou ameace fazer alguma coisa que eu quebro os dois braços do seu amiguinho. - Forçou-os, me fazendo grunhir.
- Você não teria coragem...
- Chegue mais perto que vai descobrir se tenho coragem ou não. Eu posso não ter piedade dele.
Pela primeira vez em tanto tempo, olhei diretamente em seus olhos. Aqueles mesmos que eram brilhantes e transbordavam felicidade agora eram opacos e sem brilho. Não havia mais o adorável eye smile em seu rosto e sim, olheiras fundas. Suas roupas caras agora foram substituídas por uma regata branca encardida com furos na barra e shorts largos demais que parecem já terem sido justos um dia.
Suas bochechas estavam escondidas em algum lugar do seu rosto e seu sorriso parece ter sido enterrado há muito tempo. Ah, como eu queria ver aqueles dentinhos tortinhos de novo. Só uma vez mais.
Ele mudou muito neste tempo, mas para mim, ainda continua sendo o mais lindo. O mesmo Park Jimin que faz meu coração bater rápido dentro do peito e que faz meu estômago gelar cada vez que eu vejo.
Mesmo sem perceber, sorri para ele. Com dor e com meus braços sendo puxados nada gentilmente para trás, eu sorri.
E ele sorriu de volta.
Não mostrou-me seus dentinhos nem seus olhinhos. Mas ele sorriu e isso é mais que o suficiente para mim. Faz toda essa luta ter valido apena. Mesmo que eu fique sem meus braços por algum tempo, eu me façam de prisioneiro aqui. Até mesmo se este for o meu fim, eu poderia dizer que morri feliz, pois o vi uma última vez.
Óbvio que este não é o melhor lugar para pensar em coisas melosas, mas é impossível você não ter pensamentos boiolas quando se trata de Park Jimin, um anjo.
Meu anjo.
Uma borboleta passou por entre nós, ela possuía rosa e roxo em suas asas batentes. Ela parecia serena demais para estar em um lugar como este, sujo, tenso e torturante.
Acho que é sobre isso, não importa onde ou como eu esteja, se eu ver Park Jimin, minha calmaria se eternizará por todo o tempo em que ele estiver comigo.
Ele desviou o olhar para os pés de Kang, que estavam perto dos meus. Acompanhei sua visão e tentei seguir sua linha de raciocínio. Ele bateu o pé discretamente duas vezes no chão.
Ele queria que eu pisasse no pé dele? Oh, sim!
Assenti para ele, que me devolveu um olhar cúmplice.
Ele levantou três dedos da mão direita. Seu braço estava abaixado ao lado do corpo, uma pose normal.
Segui a contagem de seus dedinhos pequenos que já não ardiam mais e quando sua mão fechou-se em punho, juntei todas as minhas forças e pisei em seu pé. Não sabia se adiantaria alguma coisa, afinal aquele coturno parecia ser à prova de balas. Deus me livre ficar perto desse cara quando ele resolver tirar os sapatos.
Ele me soltou, gemendo pela dor no pé. Yes! Devo ter acertado algum calo.
Jimin puxou o outro guarda e deu-lhe um soco certeiro e eu apenas virei-me para o que me segurava e chutei o meio de suas pernas.
- Isso é por quase quebrar meus dentes e meus braços, seu babaca. - Disse, o vendo cair de joelhos, com as mãos protegendo sua intimidade.
O guarda que Jimin havia batido estava esticado no chão, desacordado. Pus minhas mãos sobre a boca, surpreso.
- Você matou ele?
- O quê? Não! - Riu, gostoso - Ele só desmaiou. - Veio para perto de mim e agarrou o outro guarda a minha frente que estava quase derramando lágrimas. Desferiu-lhe um soco parecido com o do outro, e ele logo caiu, também em um sono profundo, digamos assim.
- Onde você aprendeu essas coisas?
- Quando se passa vinte e quatro horas sendo tratado pior que cão de guerra, você acaba apendendo algumas coisinhas para defesa pessoal. - Jogou-me uma piscadela e o chão sob meus pés parece ter virado poeira.
Ficamos nos olhando por alguns segundos. É como se todo aquele cenário de terror e tortura houvesse se dissipado e sobrado apenas nós dois, juntinhos. Ele deu um passo a frente e eu não fui louco de desviar.
Podia ouvir sua respiração pesada e seu hálito quente soprar em minha face e eu nunca quis tanto beijar alguém como eu quis agora. Universo, eu sei que eu disse que gostaria de estar sonhando, mas se você decidir me acordar, espera só mais um pouquinho, depois desgraça com a minha vida.
Seus lábios cheiinhos e rosados estavam molhados de saliva e parecia realmente quente. De onde veio todo esse calor? Aqui embaixo é abafado, mas não me lembro de ter soado tanto brigando, quanto estou prestes a soar agora. Jimin, por outro lado, estava com os cabelos úmidos e com o colo soado. Seu abdômen estava marcado pela regata branca, não era algo muito chamativo, no entanto, poderia facilmente esfregar minhas roupas em seu tanquinho e ter a certeza de que elas sairiam branquinhas de lá.
Para que máquinas de lavar, não é mesmo?
Me aproximei um pouco mais, quebrando praticamente todo espaço que havia entre nós. Meu Deus, o que eu estou fazendo? Isso está errado, era para mim estar desmaiado agora. Como assim eu não morri na frente dele?
Certo, ainda dá tempo de morrer, se meu coração continuar acelerado assim, logo, logo eu bato as botas.
Seus olhos estavam fixos nos meus e os meus nos seus, com carinho. Sua mão alcançou a minha e posicionou em seu peito, me fazendo sentir a escola de samba que residia ali. Seus batimentos cardíacos estavam tão acelerados quanto os meus. Pareciam em sincronia, como uma perfeita valsa. E ah, como eu queria poder dançar esta valsa.
Ele se aproximou mais um pouco, quase roçando nossos lábios. Fechamos os olhos ao mesmo tempo. Senti mais uma vez sua respiração, no entanto, esta percorreu por meu pescoço e parou em minha orelha, onde sussurrou soprado, me fazendo arrepiar: - Temos que sair daqui antes que nos peguem, baby.
Ele ficou mais alguns segundos ali, aquecendo meu lóbulo com seu hálito quente, para depois sair e deixar um beijo perto dos meus lábios, porém, ainda sem encostar neles.
Abri meus olhos pela surpresa e a primeira coisa que vi, foi seu sorriso sapeca dançando nos lábios carnudos. Ele pegou em minha mão e me puxou para correr com ele escada acima.
Conforme chegávamos mais perto da porta, mais ouvíamos vozes, vozes estas que não pareciam as mais calmas do mundo.
- Sabe que vai ter que correr muito, não sabe? - Perguntou, parando no meio de um dos degraus.
- Não saio daqui sem você e meu irmão.
- Seu irmão? Espera, como você entrou aqui? Você também é um peculiar das Trevas? - Botou a mão que não segurava a minha no rosto - Por que nunca me disse?
- Isso é uma longa história, prometo que te conto tudo depois se sairmos vivos daqui. O que é importante agora é que eu não sou das Trevas, portanto meus poderes não funcionam com vocês.
- Certo, eu vou proteger você. - Beijou as costas da minha mão e respirou fundo, assim como eu.
- Se tiver a oportunidade de sair, apenas saia.
- E ter deixar sozinho com esse monte de gente louca? Nunca! - Disse, contragosto a minha sugestão - Não me peça uma coisas dessas nunca mais, ok? Só de pensar na possibilidade de ficar longe de você novamente, me deixa fora de órbita. - Assenti, bobo.
Continuamos subindo pelos poucos degraus restantes, rezando para que quando abríssemos a porta, não déssemos de cara com as pessoas que devem querer fazer picadinho de nós agora.
Me pergunto como Hynuna e Tae devem estar lá fora, me pergunto se alguém já deve ter me visto pelas câmeras e também me perguntava se caso tudo isso desse errado, Jimin e meu irmão sofreriam as consequências.
Quando eu achava minha vida sem graça e pedia por mais emoção enquanto assoprava as velas de aniversário, não era exatamente este tipo de emoção que eu estava pedindo. O sinônimo de emoção na minha mente era algo como assistir algum filme de terror à noite em um cinema, fazer a lição de casa antes da professora entrar na sala ou então, descer a ladeira próxima a casa de Taehyung com a sua bicicleta sem freio.
Mas pelo visto, a única ladeira que estou prestes a descer, é a ladeira da minha vida.
Onde foi que eu errei? Eu sei que eu já pedi isso muitas vezes e que agora o destino deve estar enjoado de ouvir a voz dos meus pensamentos, mas eu gostaria de insistir apenas mais uma vez: - Senhor destino, se isso tudo for um sonho, eu desejo acordar agora. E se não for, por favor, tenha piedade da minha sanidade e se ainda não for pedir demais, que eu senha daqui com vida, de preferência.
E lá vamos nós, se eu sobreviver, volto para terminar de contar minha história. Caso contrário, toquem love scenario no meu velório, se eu tiver um.
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¹Gimbap ou Kimbap ( 김밥 ) é um prato coreano feito de arroz cozido e outros ingredientes que são enrolados em gim (algas comestíveis), na maioria das vezes tendo legumes, ovo e algum tipo de carne, são servidos em fatias do tamanho da mordida. É aquela mesma comida que o Jimin e o Jungkook fizeram na live:
²Gemologia é a especialidade da geologia que estuda as pedras preciosas, ou seja, o caráter físico e químico dos materiais de valores gemológicos, sejam esses de origem inorgânica ou origem orgânica. Um gemólogo é capaz de identificar pedras naturais, sintéticas, artificiais, além de imitações
³Estêncil em geral, é quando recortamos uma superfície (geralmente plástico, sulfite ou papel cartão, quando feito em casa) e passamos tinta por cima, com a finalidade de imprimir o a parte em vácuo do desenho. Como não sou boa para explicar, essa é uma foto que deve ser muito mais auto-explicativa do que eu tentei ser:
*Onze mil wons é uma quantia aproximada de quase cinquenta reais.
~(🌺)~
Oieeeee
I'M BACK
(kkkkkkkk meu professor de inglês chora)
Desculpa a demora, procastinei demais e acabei ficando mais de um mês sem postar :(
Porém, para tentar compensar (embora não acho que isso seja compensável, afinal, fui irresponsável!), pretendia postar um fic nova!!!
Estive pensando seriamente sobre postá-la ou não, porque queria fazer algo mais interativo, como por exemplo, um twitter para os personagens 🙃 e ter dias definidos de postagem.
Seria uma fic Jikook também, porém com um enredo mais clichê e fluffy, diferente desta.
Pensei em postar os avisos hoje e postar o prólogo no sábado, que seriam os dias da Att's. Já perguntei isso lá nas conversas, mas se caso postasse, vocês leriam ou teriam interesse na interação pelo Twitter? 👉👈
Bom era isso, xuxus.
Não sei se gostaram do capítulo e nem se as cenas de "briga" ficaram claras :') (ou se chegou parecer uma briga).
Se cuidem e cuidem do próximo porque todos somos importantes.
Beijos do Jin e até a próxima 😘😘
(E views nas lendas)
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