O Sangue e o Coração


A história a seguir é uma triste história de amor

Sobre o modo como o líquido vital, vermelho batom

E a bomba muscular, de persistência invejável

Se amavam, mas não podiam estar

Ali um pelo outro


Começa-se do princípio, onde um dia

Quis o sangue apaixonar-se por um órgão de pompa

No lado esquerdo do peito, encorujado entre os pulmões

Tímido, à vista, e imponente, quando tremia

Era uma paixão juvenil, logo se via

Porque, por nenhum dia, podiam estar juntos ali


A paixão era efêmera, mas nunca desaparecia

E as hemácias, que queriam abraçar, beijar, morder

Aquelas fibras carnosas do coração

Passavam, velozes, já pra lá, e que tempo, então

Havia para que ficassem ali?


Acontece que o amor entre sangue e coração

Foi se desenhando com o tempo

E os anos foram se passando, e a paixão

Tornou-se desejo. Insuportável. Tormento.


E eis que chegou um dia muito especial

Tanto para sangue quanto para coração

Um dia em que, de repente, o sangue parou ali

E nunca mais saiu


E coração e sangue pensaram, juntos

"Oh, e é agora que nos amamos, por certo!"

E então o coração morreu.


Ouviu-se um lamúrio denso

Que se alastrou pelos corredores

Pelas veias, pelas artérias

Pelas portas com mais gente

E as células, o povo, todo mundo

Parou.


Estava morto. Que dor, mas estava morto!

E o amor, de repente, virou pó

E desapareceu. 

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