Chuva
Quando criança, fitava o céu de chumbo, quase negro
E me tremia dos ossos à carne, apreensivo
Escutando o estralar dos trovões na cúpula sobre minha cabeça
Era como se fosse o fim do mundo, meus últimos momentos de vida
Então, para minha grandiosa surpresa,
Depois que o silêncio se instaurava e o céu abria, azul
Eu saía de casa e perscrutava o quintal
Havia cheiro de terra molhada por toda a parte
Meu braço arrepiava. Era a melhor coisa que eu já sentira na vida
O modo como as borboletas purpúreas erguiam-se da mata
e o modo como os vagalumes brilhavam e competiam com as estrelas
e também o modo como as folhas e as flores e a grama
suspiravam e enverdejavam o terreiro todo
Aprendi, com a chuva, algumas coisas importantes
Não espero sorrisos francos para a eternidade
Não espero ódios pungentes para a eternidade
Pois, como a chuva, todos os sentimentos são passageiros
Não espero ser amado incondicionalmente a vida toda
Não espero chorar todos os dias, nos 365 do ano
Não espero encontrar um amigo eterno,
Nem mesmo um inimigo eterno,
Pois, como a chuva, todos os sentimentos e pessoas são passageiros
Não espero encontrar um poço de infinita pureza
Nem um poço de amarga culpa
Pois as pessoas — tal como as nuvens de chuva
Não são brancas nem pretas, mas cinzas
Do brotar da flor à sua decomposição na terra úmida
Nada permanece branco ou preto
Os heróis têm defeitos, sim
Tanto quanto os vilões têm qualidades
E todos somos heróis e vilões em algum momento da vida
Pois, como as nuvens de chuva, somos cinza
E relampejamos, trememos e choramos gotas d'água
Mas somos como a chuva:
Caímos e caímos e caímos
Para receber o sol do novo dia
E subirmos
e subirmos
e subirmos...
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