D o i s
Jungkook correu tanto.
Jungkook correu até que as solas dos sapatos ficassem quentes. Correu até casa e, quando parou, sentia que o limite entre os seus pulmões aguentaram mais um pouco e uma explosão era muito ténue.
As suas costas estavam encostadas contra a porta larga e pesada de madeira da entrada, a casa escura, o peito subindo tanto que quase arqueava a coluna enquanto tentava respirar. O seu olhar escurecia, sem conseguir mantê-lo aberto e a mão correu para as costelas, sentindo dor lá. Sentiu nos lábios o sabor do salgado, das lágrimas que nem percebia que estavam ali.
Era um tonto.
Estava chorando por um garoto que amava há anos. Estava chorando pelo seu melhor amigo ter um namorado, como se isso não fosse coisa para o qual devia estar mais do que preparado. Tinha uma ponta de surpresa, porque Jungkook sempre achou que Jimin gostasse apenas de meninas e, mesmo que às vezes entre eles comentassem a aparência de alguns garotos ou coisas assim, Jungkook nunca suspeitou. Conhecia o melhor amigo como a palma da sua mão, mas não sabia de uma coisa daquelas, que ridículo.
Jungkook cessou a respiração pesada e os gemidos cansados quando a porta em que estava encostado abanou com um encontrão.
– Jungkook! – como se soubesse que o moreno estava ali, Jimin chamou, não em um grito, mas como um chamado no tom perfeito.
Jungkook negou com a cabeça, pressionando as mãos sobre os ouvidos. Não alucinaria com uma coisa que não queria, certo? Porque não queria Jimin ali, não queria vê-lo agora e muito menos queria conversar.
– Jun, por favor abra a porta...
Jungkook olhou o all-star ainda encostado no canto, a lama seca escurecendo o tecido desde o dia anterior. Estava tão triste e chateado que podia atirá-lo para longe, acertar no candeeiro da mesinha do lado do sofá e não se arrepender quando o visse partido no chão. O seu corpo não se mexeu, embora implorasse por conforto.
– Você está aí? – Jimin perguntava e Jungkook sabia que se não mexesse um músculo, ele iria embora rapidamente.
Acima de sua cabeça, Jimin realmente tentou abrir a porta, sem sucesso.
Pela primeira vez desde que criara o seu mundo de fantasia, Jungkook imaginou um cenário em que Jimin não marcava presença. Em sua cabeça, imaginou que estava ali, mas estava ali por outro motivo qualquer. Jimin não estava, Jungkook não estava ouvindo a sua voz. Jungkook tinha corrido porque começara a chover ao voltar da casa de Yoongi e Hoseok e correra tanto que quando entrou em casa se sentou no chão. A sua mãe aparecia, gargalhando de si e o mandando tomar banho antes que apanhasse uma gripe. Ao subir as escadas, esbarrava numa barbie da irmã e a jogava pelas escadas abaixo. E, no seu quarto, tinha paz, completamente sozinho e numa realidade em que Park Jimin não tinha acabado de lhe mentir.
– Jun... – Jimin ainda dizia do outro lado da porta, paciente.
Por um momento, Jungkook desejou não se ter apaixonado por ele. Desejou que o desejo de o beijar nunca tivesse nascido, que o dia em que o olhou de forma diferente nunca tivesse acontecido.
– Vai embora, por favor. – Jungkook disse, mas disse tão baixo que era impossível que Jimin tivesse ouvido. O objetivo não era que o fizesse, mas que ficasse marcado ali que, pela primeira vez em dezoito anos, não queria ver Park Jimin.
– Jun, eu vou voltar amanhã... – ele disse então, convencido de que o Jeon estava mesmo ali, o ouvindo – Vamos conversar e vou... vou te explicar tudo.
Jungkook mordeu os lábios. A sua alucinação não estava resultando mais, Jimin não deixava. Com raiva, agarrou o all-star sujo e o atirou contra as escadas à frente. Depois, se levantou de forma rápida, subindo as mesmas e entrando no quarto.
O corpo caiu de forma dramática contra o colchão e suas mãos taparam os olhos, soltando então um grande gemido de frustração.
Talvez se, no dia anterior, Jimin tivesse simplesmente lhe dito que tinha um namorado... talvez não fosse doer tanto. Talvez quando o visse, quando visse a forma com que ele parecia superior a si, Jungkook já estivesse preparado. Talvez aquela noite tivesse podido correr bem. No final não vira nem os amigos nem o pai.
Não foi perceber que o corpo cedeu ao cansaço antes que ele quisesse. Adormeceu por cima dos cobertores, ainda com as roupas da noite e calçado.
Quando acordou no dia seguinte de manhã, Jungkook sentia algo estranho no estômago. Estava de lado na cama, os pés calçados pendendo para fora, com frio e desconfortável por ainda ter as calças justas no corpo. Ao abrir os olhos, piscando várias vezes até perder o efeito desfocado, Jungkook ergueu o corpo em um salto ao perceber que alguém estava ali. Ao fazê-lo no entanto, desequilibrado e sem noção de onde estava na cama, o corpo caiu para fora do colchão, levando-o a embater com o chão.
– Porra... – ele murmurou, acariciando o próprio cotovelo e depois a cabeça, que doíam pela queda. Depois estreitou o olhar para a pessoa que vira, garantindo que sua mente não lhe tinha pregado nenhuma partida – Tae... Taehyung?
– Desculpe, eu te assustei? – ele se apressou para o lado do mais novo, puxando-o por um braço para ajudá-lo a ficar de pé.
– Um pouco... – confessou, olhando em volta, procurando por sinais do porquê de o ruivo estar ali – O que está... – ele engoliu em seco – ...fazendo aqui?
Foi ao perguntar que tudo voltou para Jungkook como uma memória longínqua e dorida. Suas mãos subiram para os olhos, percebendo no inchaço deles que tinha adormecido entre a choradeira de bebê que não conseguia conter. Virou as costas ao amigo, envergonhado, tentando pensar em alguma coisa que não fizesse o outro perceber aquilo.
– Jungkook... eu lamento. – o Kim começou, tocando-lhe no ombro e tentando com que se virasse de novo para si.
– Lamenta? Lamenta o quê? – ele fingiu, desviando-se do corpo do outro e procurando por lenços humedecidos.
Taehyung suspirou, sentando-se na ponta da cama e cruzando uma perna por cima da outra.
– Não estou aqui para defender Jimin, é só... – mais um suspiro, interrompido quando o moreno desistiu, sem solução, e se virou novamente para o ruivo – Ele não sabia como te contar. – concluiu então.
Jungkook estudou suas hipóteses por um tempo. À visão dos outros, o que havia de tão errado para Jeon Jungkook não aceitar que o melhor amigo tivesse um namorado?
– Está tudo bem.
– Não está nada.
– Jimin tem um namorado. Eu espero que ele o faça feliz. – disse seguido, caminhando até o amigo e sentando-se do seu lado, as pernas separadas e as mãos pousadas no colo – O que te leva a pensar que não está tudo bem? Está tudo bem.
Taehyung o estudou por alguns segundos antes de rebater:
– Você saiu correndo.
– Fiquei muito surpreso. – contou a meia verdade e, logo depois, para seu arrependimento disse: – Não sabia que Jimin-hyung gostava de... meninos também.
– Você não é assim. – Taehyung insistiu – Foi outra coisa qualquer, porque nunca te incomodou que eu também gostasse de garotos, Junnie.
Jungkook fixou o olhar na estante do outro lado do quarto. Só escaparia daquela se começasse a contar verdades, porque odiava mentiras e não sabia levá-las avante. Então, como uma lâmpada em sua cabeça, achou a solução.
– Ele me mentiu.
Taehyung pareceu aceitar aquela resposta, pensando sobre ela enquanto acenava em concordância. Taehyung podia vangloriar-se ali que tinha dito a Park Jimin para que não mentisse, que tudo seria pior se ele mentisse.
– Jungkook. – Taehyung se virou, desfazendo as pernas cruzadas e segurando uma das mãos do Jeon entre eles – Eu sei do seu segredo. – disse baixo, uma mão subindo para lhe afastar os cabelos da testa e depois pousar em seu ombro – E ele está seguro comigo.
Jungkook piscou duas vezes antes de perguntar:
– Qual segredo, hyung?
Taehyung pareceu cabisbaixo por um segundo. Entendia que Jungkook quisesse esconder aquilo a sete chaves, tanto que, naquele momento, provavelmente nem desconfiava que Taehyung sabia mesmo sobre o assunto. Deixando-o pensar assim, baixou a mão do ombro e recolheu-a para si.
– Vocês deviam conversar...
Jungkook lhe deu um aceno, mas para si estava pensando que não podia garantir nada. Não estava nada pronto para ver o melhor amigo e se ele lhe aparecesse à frente era capaz de voltar a correr a sete pés para longe dele outra vez.
– Vai fazer isso?
Jungkook o olhou, sem esperar que fosse ter de mentir. Incapaz, limitou-se a dizer:
– Estou um pouco ocupado hoje...
Ele podia tornar aquilo uma verdade, certo? Arranjar o que fazer, naquele sábado fatídico.
– Não esquece do que temos combinado para hoje, hum? – Taehyung fingiu acreditar, levantando-se e olhando o agora menor confirmar. Jungkook o olhou estranho, sem saber – Acho que você e Jimin estavam demasiado ocupados antes de ontem...
– O que é? – curioso, perguntou logo.
– Veja o chat e não pense em faltar! – ele ia dizendo, já recuando para sair do quarto e deixar o moreno sozinho – Te vejo logo.
Jungkook o viu sair do quarto e, mal ele saiu, buscou pelo celular, se atualizando na conversa de grupo que tinha com os amigos. Não estavam esquecidos da tradição que tinham de se juntarem pelo menos uma vez quando todos estavam na cidade e, sim, normalmente acontecia logo a seguir à festa dos Park.
No celular, Jungkook subiu a conversação até encontrar os planos para aquele dia. Iriam se encontrar na casa dos Jung antes da hora de jantar, reunir-se no quintal com algumas cervejas e um grelhador. Os amigos estavam conversando naquele momento, notificações estavam chegando e talvez por Jungkook não estar respondendo é que Taehyung atravessou a rua e foi até eles.
Os olhos se focaram numa das mensagens de Yoongi.
Só nós, certo? Não vamos quebrar a tradição.
Jungkook esperou pela resposta de todos enquanto roía uma unha. Todos os amigos estavam soltando coisas como "claro!" e "só nós" e depois havia Jimin, que estava digitando. O dedo bateu contra o lábio de forma insistente e, quando a resposta do loiro apareceu diante de seus olhos, teve vontade de atirar o telemóvel contra o chão e calcá-lo.
#saudades
Que porra, saudades era o que Jungkook tinha e sentia! Morria de saudades. Nenhum de seus planos para o recesso de natal implicava se chatear com o melhor amigo, nenhum dos planos estava preparado para o facto de Jeon Jungkook não conseguir encarar Park Jimin. Só de pensar nisso, na hipótese de o ver antes que estivesse preparado, o fazia querer correr para a casa de banho e vomitar.
– Ei. – a mãe batucou os nós dos dedos na porta que Taehyung tinha deixado aberta, depois entrando em passos lentos.
Jungkook a olhou, ainda sentado na ponta da cama. Provavelmente a mulher queria uma explicação para a noite anterior e ao vê-la ali, encolhida ainda no pijama, os braços cruzados dentro do casaco de lã, com frio, Jungkook não conseguia pensar numa.
Jungkook não sabia é que a mãe vinha daquela forma porque estava escondendo do filho a visita de Park Jimin à sua casa naquela manhã.
– Bom dia. – desejou à mãe.
– Eu deixei o Taehyung subir, achei que... – ela interrompeu a fala, estreitando o olhar para o filho – Você dormiu com as roupas de ontem?
Jungkook olhou para si mesmo, como se já não tivesse notado aquilo. Deu um pequeno aceno à mulher.
– Me desculpe por ontem.
– Está tudo bem. – ela afirmou – Mas não volte a sair assim sozinho pela noite.
– Certo, me desculpe. – voltou a pedir, pousando o celular do lado do corpo e sorrindo para a mãe.
Ela se virou, aceitando aquilo e pronta para deixar o filho sozinho novamente. No entanto, o seu corpo parou em um tropeço e ela se virou de novo, lembrada de algo.
– Ah, quando Eve te vir ela vai te encher de desculpas.
Jungkook ergueu o canto do lábio. Quis sorrir, mas quando ouviu o nome da mulher só se lembrou das últimas palavras que escutou sair de sua boca.
– Não tem pelo que pedir desculpa.
A mãe lhe deu mais um aceno e, por um segundo, pareceu que ela não quis conversar.
Sozinho no quarto, Jungkook finalmente tirou os sapatos, sentindo os pés gelados. Depois tirou as calças, porque eram demasiado apertadas. Ao encarar a cama se questionou se podia voltar a dormir. Por outro lado, tinha poucas horas para assegurar um plano que fizesse com que tudo voltasse ao normal. Tinha de preparar-se para ver Jimin, ouvi-lo falar do seu namorado e explicar o porquê da mentira.
Isso era o que Jungkook tinha de meter na cabeça. O único motivo pelo qual podia estar triste ou chateado era o facto de Jimin lhe ter mentido e nada mais. Ele podia mentir sobre isso para um bem maior, podia inventar qualquer coisa, certo? Ele podia perdoar Jimin num instante se ele tivesse uma boa desculpa.
Quando deixou o corpo cair para trás, no colchão, esperou sentir alguma tranquilidade. Esperou que o conforto da cama, o aconchego dos cobertores, chegasse para substituir a parte de si que parecia ter perdido. Era isso que sentia. Todas as suas fantasias, evaporadas como um pedaço de gelo no deserto.
Seu momento de paz foi interrompido. Aquela manhã começava a parecer muito mais longa do que realmente era. Na tela do celular apareciam as faces dos seus amigos em fotos de perfil milimetricamente perfeitas. Eles estavam ligando, por ligação de vídeo e Jungkook se questionou o porquê. Só faziam aquilo em aniversários, quando não podiam estar devidamente juntos, mas não era o aniversário de ninguém.
Jungkook atendeu, ainda deitado na cama, os cabelos perdidos contra o colchão e segurando o celular acima da face.
– Aqui está ele! – Yoongi barafustou, mostrando que estavam o esperando.
Yoongi e Hoseok estavam na mesma divisão, era notável, mas cada um em seu celular. Taehyung estava caminhando pela rua, talvez indo em algum lugar ou voltando e, de forma curiosa, Jimin estava sentado na mesa da cozinha de sua casa, vestido. Isso era coisa que Jungkook podia estranhar, porque não era nada a cara do amigo acordar cedo a um sábado e muito menos estar vestido antes das três da tarde.
– Bom, nós estamos ligando porque os planos foram completamente alterados. – Hoseok disse, claramente contente com as alterações.
– Quais planos... – Jungkook murmurou, esfregando o olho e engolindo em seco quando o olhar do Park mudou ao ouvir a sua voz.
– Sh, criança não tem lugar de fala. – Yoongi, apenas uns meses mais velho, comentou.
– Cancelamos o churrasco. – Hoseok se apressou.
– Como assim cancelaram o churrasco, cara? – Taehyung falou pela primeira vez.
Cansado de estar com os braços no ar, Jungkook se virou na cama, encolhendo o corpo e segurando o aparelho contra o colchão ainda na frente do rosto e atento.
– Vamos à feira de natal. – Hoseok ainda dizia – Vai ser muito mais divertido e nunca fomos!
– Mas a carne... – foi quase como se o estomago de Taehyung tivesse tomado o controle.
– Não é a primeira vez que há uma feira de Natal na cidade? Claro que nunca fomos... – Jimin arrumou-lhe o argumento para canto, gargalhando baixo quando Yoongi lhe lançou um olhar de morte através da tela.
– Vamos nos encontrar mais cedo e depois podemos voltar para o churrasco... – Jung Yoongi finalmente cedeu, fazendo com que Taehyung festejasse com um grito de guerra sussurrado por ainda estar na rua. – Mas nos encontramos às seis!
Jungkook mexeu na tela para conseguir ver as horas, contando em sua mente quantas horas tinha para encontrar um plano. Perdido nesse tópico, quando deu conta, seus amigos estavam fugindo do assunto.
– Sim, porque vestir roupa igual seria mesmo o que...
Jungkook estreitou as sobrancelhas, porque tinha perdido demasiada conversa para entender aquilo agora. Assim sendo, arranhou a garganta e disse:
– Minha mãe está me chamando.
– Você é um mentiroso tão ruim, deus nos livre... – Yoongi revirou o olhar, sem se conter – Vai logo embora, traidor! Apareça a horas!
– É Jimin quem sempre chega atrasado e normalmente é porque...
– Tchau! – ele exclamou então, sem ficar para ouvir o resto.
Era como se toda aquela conversa estivesse enchendo o seu peito com ar que ele não estava pedindo. Era como se o seu ecrã dividido em cinco quadrados fosse demais para suportar quando só se focava num deles.
Jungkook acabou desperdiçando as horas que tanto queria poupar... dormindo. Estava sem calças ainda, de meias e camisa branca quando apagou de novo contra o colchão. A mãe não o acordou para o almoço e embora isso o fizesse ter mais energia para a noite que lhe esperava, Jungkook não ficou agradado com a situação quando acordou.
Seu corpo se espreguiçou contra o colchão, manhoso, sentindo frio nas pernas. Mirou o olhar na porta aberta e depois buscou pelo celular perdido.
– Porra! – sua cabeça bateu contra o colchão de forma proposital, como um castigo, e logo depois se levantou – Porra, porra, porra...
Ia se amaldiçoando baixinho enquanto corria pelo quarto, pegando uma boxer na mesinha de cabeceira, umas meias no cesto do canto e roupas no armário. Correu para o banheiro, no fundo da sua mente a cabeça matutando no porquê de a sua mãe não o ter chamado para almoçar e ao mesmo tempo pensando no quanto seria xingado pelos amigos se chegasse atrasado.
Tinha menos de uma hora para tomar um banho, se vestir e pôr pés a caminho. Aquele era um problema, porque Jungkook era o tipo de pessoa que tinha de lavar o cabelo duas vezes. Provavelmente quando a sua irmã tomava banho a seguir a si tinha toda a razão quando reclamava que o irmão gastava a água quente toda. Como claramente não era o seu dia de sorte, a água ficou gelada antes de Jungkook poder alcançar o frasco de champô. Sem tempo para ficar irritado, ele apenas seguiu em tremeliques até o quarto enquanto puxava as calças jeans pelas pernas. Ao enfiar o pé num dos rasgos do tecido no joelho, tropeçou a entrar no quarto, não caindo por um triz, segurando-se na porta.
Estava amaldiçoado, de certeza.
O frio causado pela água fê-lo vestir duas camisolas, uma mais fina por baixo da sweater. O seu cabelo não era completamente esticado e Jungkook costumava deixá-lo desse modo com a ajuda do secador. Como não havia tempo para isso, amaçou-o com as mãos até que ficasse frisado e bonito.
Depois de toda a correria, estava pronto para sair e caminhar até a feirinha que Hoseok mencionara. Com sorte, ainda chegava a tempo, só tinha de apressar o passo.
Quando se virou do espelho para a porta do quarto, viu a irmã, mais pequena do que era, o olhando.
– O que foi? – ele perguntou, mexendo-se pelo quarto para agarrar a carteira e o celular – Você brincou com a água de novo? Eu posso ficar doente porque a água estava fria e a culpa... – ele parou, a irmã sem tentar interrompe-lo o chamando à atenção – O que foi?
– Quero te contar uma coisa... – ela balbuciou, espreitando por cima do ombro.
Jungkook estreitou o olhar, tentando interpretar a forma como ela tinha as mãos na frente do corpo, os ombros encolhidos. Pensou em perguntar se tinha mesmo de ser agora, os seus olhos atentos no horário que a tela do celular mostrava. Com calma, guardou a carteira no bolso traseiro e o celular no da frente, se aproximando um pouco da mais nova.
– O que é?
Jungkook jurava que se ela tivesse estragado alguma coisa sua que ele iria surtar.
A menina se mexeu pela primeira vez, fechando a porta do quarto e ficando na frente do maior, que se abaixou, ficando agachado.
– O pai...
– O pai o quê? – percebendo que era sério segurou uma das mãos da irmã com calma, preocupado.
– O pai levou uma menina com ele, ontem...
Jungkook arregalou o olhar, sem saber o que dizer.
– Uma mulher? – ele quis ter a certeza, impaciente pela resposta. Ela acenou, acanhada – Isso te deixa triste?
– Ele não falou comigo porque essa... mulher estava lá?
– Papai não falou com você?
Ela voltou a acenar, sendo puxada pelo irmão para o seu colo e abraçando-o pelos seus ombros. Jungkook não soube o que dizer, sem esperar que aquilo fosse acontecer.
Sem conseguir justificar as atitudes do pai, se limitou a abanar os cabelos da irmã depois do abraço.
– Tenho a certeza de que ele não te viu porque você é uma pirralha minúscula. – ele comentou, ficando de pé e ainda despenteando os cabelos da menor – Eu preciso de sair, ok?
– Posso ir?
Jungkook engoliu em seco, a sua mente criando um cenário perfeito. Jimin nunca quereria conversar em frente de Yang e se Jungkook a levasse então eles não conversariam...
Ele abanou com a cabeça. Ia sair com os seus amigos, tinha de aprender a excluir os seus problemas pessoais com Jimin do grupo de amigos. Uma coisa que nunca esperava ter de fazer, honestamente, afinal era a primeira vez que ele e Jimin enfrentavam um tão sério.
– Hoje não dá, desculpa. – ele então caminhou em frente, saindo do quarto e, já nas escadas, gritou: – E saia do meu quarto!
A sua mãe não ficou muito preocupada quando Jungkook avisou que sairia, limitou-se a elogiar-lhe os cabelos. Jungkook ficava bem com eles assim, mas raramente os usava daquele modo.
No meio do caminho até a feira, Jungkook percebeu que já estava atrasado. Não se atreveu a tirar o celular do bolso, a um quarteirão do local, mas sabia que eram os seus amigos resmungando no groupchat que estava causando toda aquela vibração. Encontrou-os logo na entrada, debaixo do grande arco de iluminação que ia de um lado da rua ao outro, esta fechada para aquele propósito.
– Atrasado! – Yoongi bateu-lhe logo nas costas, o puxando para perto dos amigos, sem deixar que o fizesse sozinho mal de aproximou.
– Foram só uns minutos... – ele tentou, enfiando as mãos no bolso da sweater e sorrindo curto – Olá. – e levantou as duas mãos, acenando a todos.
Claro que os seus olhos já tinham pousado em todos os amigos, mas inteligentes, evitaram os de Park Jimin a todo o custo.
– Podemos ir comer? – Taehyung perguntou, os olhos curiosos já procurando por alguma rulote que parecesse de confiança.
– Isso é tão típico da sua parte... – Hoseok comentou, o puxando – Vamos lá.
– Eu também ainda não comi nada. – Jungkook informou, apressando o passo para caminhar do lado dos outros dois.
Não tinha tido tempo para pensar em qualquer plano, por isso agora tinha um criado à pressa: Evitar Park Jimin. Podia fazer isso, podia colar-se aos amigos pelo tempo que fosse e se Jimin quisesse, em algum momento, conversar, então ele iria ser firme e dizer "agora estamos com os nossos amigos".
Quando dois deles se sentaram nas mesas de madeira bem assentes no relvado da praça e outros dois ficaram responsáveis por pedir comida, Jungkook se viu dividido. Queria ir escolher a sua comida, mas quem estava tratando disso era Kim Taehyung e Park Jimin.
Ao ver Jungkook olhar a rulote de forma curiosa, tentando decidir dali o que queria, Jimin ficou do seu lado, tocando-lhe o braço e dizendo apenas para ele:
– Posso escolher o seu?
Jungkook, sem pensar, subiu o olhar para ele, se afastando involuntariamente do toque e levando o outro a deixar o queixo cair. Depois de engolir em seco e sem saber o que dizer, Jungkook acenou com a cabeça, sem outra alternativa que fizesse com que ele não tivesse de responder com palavras.
Então Jungkook se sentou em frente dos irmãos, que o olhavam curiosos.
– Não pense que eu não estou curioso sobre o que se passou ontem. – Yoongi cantarolou, levando um pataleco do mais velho entre eles – O que foi? Eu também sou amigo dele, mereço saber! – rapidamente retrucou para o irmão.
– Como assim? – Jungkook se fingiu, os olhos nas costas dos outros dois enquanto eles pediam, mais longe dali.
– Cara, você passou por nós na entrada quando... – Yoongi balbuciou.
– Te vimos correr de lá para fora. – Hoseok explicou – Nós estávamos chegando... Não se lembra?
Jungkook nem se lembrava de os ver, quanto mais. Pensando numa mentira fácil, ele acenou que sim e depois disse:
– Eu estava aflito para ir ao banheiro.
Para quem odiava mentiras, Jungkook estava as contando demais. Felizmente eram tão idiotas que ninguém acreditava nelas e por isso não precisava sentir culpa pelas mesmas.
Yoongi soltou uma grande gargalhada, mas foi Hoseok quem disse:
– Sabemos que aconteceu algo com Jimin. – ele confessou – Mas esperaremos até estar pronto para nos contar.
– Mas se puder ser agora, eu agradecia.
Jungkook sorriu de canto, confirmando com a cabeça e ignorando o comentário do irmão mais novo.
Quando os outros dois voltaram, segurando tabuleiros com comidas gordurosas e refrigerantes, Jungkook sorriu grande. Sua barriga estava fazendo barulho, não comia nada desde o dia anterior e ao ver aqueles pães repletos de carne fazia com que desse voltas no banco.
Enquanto comia, concentrado em enfiar tudo na boca e empurrar com a bebida, ouvia os amigos conversarem. Ouviu algumas histórias engraçadas de Taehyung que já tinha ouvido antes, quando se encontraram. Ouviu Yoongi dizer que quando fosse para a faculdade queria fazer daquelas coisas e depois se juntaram ideias mais bobas, como criarem uma fraternidade todos juntos.
A meio do plano fantabulástico de Jung Yoongi, Jungkook ouviu o seu nome como um aviso.
Seus olhos esbugalhados foram para Hoseok, quem o chamara, e notou todos os seus amigos calados. Tinha a boca cheia e molho nos lábios quando sentiu um toque no seu ombro. Ele se virou, ansioso e sem esperar que fosse Sun-Hee, a sua colega de escola.
– Jungkook? – ela perguntou, se querendo certificar.
Com esforço, o moreno engoliu em seco, apanhando um guardanapo às cegas de cima da mesa e limpando os lábios.
– Olá. – ele disse, surpreso.
– Tenho o seu caderno... – ela disse, piscando lentamente, mas sem o mostrar.
– Ah. – entendendo, Jungkook se levantou, puxando o copo de refrigerante para o levar consigo e dando um par de passos para o lado, a menina o seguindo – Serviu para alguma coisa?
– Sim. – ela sorriu, tímida, puxando da sua bolsa o caderno do moreno e o estendendo entre eles – Eu acho que você... Os desenhos são muito bonitos, mas acho que... é demasiado pessoal. Não sabia que você... Me desculpe, eu provavelmente não devia ter pedido.
– Não... Não entendi. – Jungkook segurou o caderno com uma mão e a outra coçou o couro cabeludo, sem entender o porquê de ela dizer aquilo.
– Não vi todos os desenhos, porque acho que você esqueceu de...
– O quê?
De forma cúmplice, Jungkook foi quando a garota o puxou levemente para sentar numa das mesas vazias, um em frente do outro. O moreno pousou o refrigerante entre eles, confuso, e a menor puxou o caderno de suas mãos, folheando com calma e mostrando ao moreno o que se referia.
Jungkook se lembrava de ter desenhado aquilo, mas não se lembrou quando, apressado e atrapalhado, deu o caderno para as mãos da garota. Não era possível que por tantos anos o seu segredo estivesse longe de ser descoberto, e agora, em um par de dias, estava tão perto.
– É ele, não é? – ela, de forma discreta, olhou para a mesa dos amigos do Jeon, encontrando facilmente as semelhanças entre o desenho e o rosto de Park Jimin.
Jungkook esfregou a têmpora com o dedo indicador e do meio, pensando numa forma de dar a volta àquilo. Sem conseguir raciocinar, fechou o caderno, sentindo-se nervoso e sem saber o que fazer. O seu pé já estava batucando na relva e sua mão não parava de esfregar o rosto.
– Você não precisa se preocupar. – Sun-Hee disse, tocando a mão pousada na mesa e Jungkook a olhou, surpreso por ela fazer aquilo e fazendo-a retirar com o olhar nervoso – Só eu vi e não... Não vou contar a ninguém, prometo.
Como se confiasse nela, Jungkook se viu perguntando:
– Promete?
O seu coração mole e atingido não percebeu que, pela primeira vez, estava admitindo em voz alta.
A garota acenou, concordando.
– Você desenha muito bem. – ela mudou de assunto, sorrindo tímida.
– Eu...
Jungkook parou quando ouviu um pigarreio. A alguns metros dali estavam os seus amigos, o esperando e o chamando com a mão. Ele sorriu torto para a menina, se levantando.
– Obrigado e... Nos vemos por aí. – Agarrou o refrigerante e se virou.
– Jungkook! – Ela chamou, no entanto, tomando a sua atenção de novo.
Estava de pé, ao lado da mesa, esticando o caderno para si. Todos os seus amigos estavam vendo aquilo e temendo pelo pior, Jungkook disse:
– Eu realmente não tenho onde guardar agora... – contou, medindo as opções – Você pode me dar depois?
Ela pareceu agradecida pelo voto de confiança, acenando com a cabeça e voltando a guardar o caderno dentro da bolsa.
– Mas agora vem aí o recesso... – mencionou, lembrada – Vai ficar sem ele por tanto tempo?
Jungkook pareceu pensar. Não queria passar a noite com o caderno na mão e, mesmo que quisesse, não queria correr o risco de algum dos amigos o tirar de si, ou ele cair e abrir exatamente naquele desenho, tendo em conta a sua sorte.
– Posso te dar o meu número e... – Jungkook pigarreou também, sem saber como fazer aquilo – E podemos combinar algum dia, se você quiser.
Ela pareceu feliz, puxando o celular da bolsa e olhando o moreno em seguida.
– Qual é?
Jungkook ditou, os olhos voando para os amigos, que ainda esperavam, não impacientes, mas curiosos com aquela conversa. Logo depois, se despediu da menina, apontando para os amigos e caminhando até eles. Assim que viram Sun-Hee se afastar, Hoseok e Yoongi o puxaram para o meio deles, dando-lhe tapas nas costas.
– Que engatatão! – Hoseok dizia – Nem quando está com os amigos as meninas o deixam!
– Isso é mentira... – ele praguejou, tentando fugir do meio deles.
– Você lhe deu o seu número! – Yoongi barafustou, puxando-o pelos braços enquanto começavam a caminhar para o interior da festa – Sim, senhor! Um homem!
– O orgulho... – Kim Taehyung comentou, entre eles, puxando Jungkook para si de forma dramática – Ainda ontem um bebê...
– Ah, calem a boca! – ele mandou, o seu olhar caindo em Jimin involuntariamente.
De repente, todos pareciam esperar algo dele. Sem pensar, Jimin sorriu de canto, dizendo:
– O pirralho finalmente cresceu.
Jungkook desviou o olhar dele, ajeitando as suas roupas.
– Não é nada disso, hyungs. – ele explicou – Vocês ouviram...
– Ouvimos sim, Kook. – Taehyung pareceu defendê-lo – Você tem um encontro.
Jungkook se soltou deles todos, caminhando na sua frente e negando com a cabeça.
Na frente dos amigos, Jungkook comprou fichas para os carrinhos de choque. Sabia que nas outras festas da cidade, principalmente as do verão, os amigos passavam horas naquilo e sabia que os calaria daquele jeito. Dividindo a primeira rodada entre eles, foram poucos minutos até que estivessem cada um em um dos carrinhos coloridos, prontos para embaterem uns nos outros.
Claro que fazer aquilo logo após comerem, não foi a melhor ideia. A primeira vitima foi Jungkook, o azarado, que saiu numa das rodadas, espantando os amigos ao deixar o carrinho e entregando as suas fichas para Yoongi.
– Eu já volto, é só... – e esfregou a mão na barriga, por cima da sweater.
Em cambaleios tontos, como se estivesse bêbado, Jungkook se retirou, indo para o lado da diversão, puxando o capuz para os cabelos numa tentativa de bloquear todas as luzes.
Não podia mentir e dizer que não era uma festa bonita, toda iluminada com as decorações de Natal, pessoas vestidas de papai noel para animarem as crianças, mas, naquele momento, as luzes estavam o deixando zonzo.
Tinha mesmo azar, porque bastou apenas mais uma rodada de carrinhos de choque para que Jimin viesse até ali. A respiração vinha acelerada, tonto como Jungkook, parando junto dele.
– Jun. – ele chamou, o corpo se encolhendo para espreitar por baixo do capuz alheio – Está tudo bem?
– Estou bem, você pode ir... – encostado na árvore dali, Jungkook gesticulou para os carrinhos, sem se atrever a subir o olhar e encará-lo.
– Jun, eu... – ele suspirou, interrompido.
– Os pombinhos querem tirar uma fotografia?
Jungkook subiu o olhar para ver uma mulher vestida de elfo, numa mão segurava uma máquina fotográfica e na outra uma cesta com vária bandoletes festivas.
– Estão no lugar ideal! – ela exclamou e quando os dois se mostraram confusos, ela apontou com o dedo coberto por uma luva às listras para cima.
Os dois subiram o olhar para cima, vendo o azevinho típico da época pendurando num dos ramos da árvore. Eles se olharam depois, sem pensar, ficando presos naquilo. Depois Jimin sacudiu a cabeça, levando Jungkook a desviar o olhar.
– Não, obrigado. – ele disse, virando-lhe as costas e pousando uma mão no ombro do amigo. Antes que pudesse perguntar novamente, foi interrompido.
– E uma bandolete? – o elfo perguntou, abanando a cesta cheia delas – É para ajudar a junta da cidade.
Jimin suspirou, puxando do bolso traseiro a carteira e lhe entregando uma nota. Quando lhe foi estendida a cesta para que escolhesse uma, ele as encarou, puxando a de rena e sorrindo depois à mulher.
Jungkook ainda não o olhava e por isso Jimin não teve dificuldade nenhuma em colocar-lhe as orelhas de rena nos cabelos, fazendo com o que o mais novo mexesse a cabeça para cima. Pegando-lhe nas mãos, Jimin perguntou:
– Podemos conversar?
Jungkook voltou a encarar o azevinho.
Numa de suas fantasias, Jungkook podia ver aquilo de uma forma diferente. Podia ter as dores de barriga na mesma, não se importava, mas mal Jimin viesse ver de si, Jungkook o puxaria para si, o deixaria entre suas pernas e descansaria no seu abraço. Quando o elfo aparecesse, eles se beijaram debaixo do azevinho. Jimin lhe daria um lindo beijo na bochecha, porque não eram o tipo de casal que se beijaria em frente de um estranho. Jungkook guardaria a fotografia revelada na carteira, onde nunca a perderia e onde poderia olhar para ela sempre que tivesse saudades do namorado.
– Podemos? – Jimin voltou a perguntar, olhando em seco.
Incapaz de ficar naquele lugar, Jungkook rolou as costas contra a árvore até encontrar o outro lado, onde estava escuro porque a árvore era larga o suficiente para bloquear as luzes da festa.
Jimin o seguiu, ficando na sua frente. Sem querer deixar que a conversa tomasse rédeas que não conseguiria controlar, Jungkook fez a primeira pergunta:
– Porque me mentiu?
Viu Jimin engolir em seco, afastar os cabelos loiros para trás da orelha.
– Não foi por mal... – ele começou, sem saber bem como. Tinha os braços na frente do corpo, cruzados sobre o peitoral – Você é o meu melhor amigo e eu te conto tudo, você sabe...
– Não tudo. – Jungkook corrigiu logo.
– Foi só isso e foi só porque...
– Porque o quê?
Jungkook era rápido porque queria arrumar com aquilo. Odiava estar chateado com Jimin, odiava vê-lo assim perante si, confuso, nervoso.
– Não sei como explicar.
– Porra, não sabe como explicar? – ele se irritou. Esperava que Jimin tivesse uma boa desculpa, que o pudesse perdoar ali e agora, mas ele não tinha? Não tinha mesmo? – Sou a porra do seu melhor amigo, qual é a dificuldade em...
– Não sabia como dizer! – ele exclamou, o interrompendo e afastando os cabelos para trás logo de seguida.
– Se alguém ia me fazer passar por idiota, eu não achei que fosse você. – Jungkook admitiu, ainda magoado por ter passado por aquilo.
– Você não fez figura de idiota... – Jimin murmurou, se aproximando um pouco.
– Pois não! – ele foi irónico – Só fiquei olhando feito idiota para aquele porra de homem sem saber que ele era a porra do seu namorado!
– Jun. – Jimin chegou a soltar uma risada. Esperou algum tempo para que Jungkook se acalmasse e deixou que ele levasse o que precisava. E então confessou: – Quero te apresentar o meu namorado quando tiver a certeza de que ele é... uma boa pessoa. Foi mais isso, sabe? Não quero te apresentar alguém que vou deixar depois de um tempo porque...
– Porque eu sou seu filho de cinco anos que não sei lidar com a saída e entrada de pessoas na sua vida?
Jimin revirou o olhar, enfiando a mão fria no bolso da sweater, onde tinha as do moreno, e juntando-a às dele.
– Porque você é especial para mim. – corrigiu – É tão especial que não quero... te apresentar um cara qualquer. Quero te apresentar um cara que seja tão seu amigo quanto eu sou e que... que possa aceitar o jeito chegado que nós temos.
E, para provar o seu ponto, se aproximou mais.
Jungkook o olhou ali, sem poder evitar, vidrando nos olhos dele e no seu brilho.
Seu segredo estava a salvo, seu melhor amigo estava ali e aquela era uma boa desculpa, não era?
Querendo mostrar que estava no meio caminho para o perdão, Jungkook perguntou:
– Ia esperar o quê? Um mês?
Brincalhão, Jungkook soltou uma risada seca, esquecido da dor na barriga, mas que ainda estava lá. Sua expressão divertida cessou quando Jimin segurou os lábios para dentro, a expressão séria.
– Não acredito... – Jungkook murmurou.
– Me desculpe. – Jimin pediu, apressado, tentando segurar as mãos dele dentro do bolso mas tendo as suas expulsas de lá e Jungkook se arrastando para o lado, ainda no tronco da árvore, saindo da sua frente. – Me desculpe, Jun.
– Quanto tempo?
Jimin negou com a cabeça, sem querer responder.
– Quanto tempo, porra? – Jungkook insistiu, irritado – Quanto tempo?
Encolhido, Jimin murmurou:
– Quatro meses. – foi quase inaudível, mas não para os ouvidos desesperados de Jungkook.
Seu corpo desceu contra a árvore até o sentir embater com o chão. As pernas dobradas contra o peito e o olhar se fechando. Jungkook estava vendo ali uma de suas alucinações se formando, toda distorcida porque estava tentando a manter longe, abanando a cabeça e tentando focar-se em outra coisa qualquer. Atrás de si eram só barulhos distorcidos, os gritos das pessoas, as conversas aleatórias e, na sua frente, era Jimin. Sem saber o que fazer, puxou as orelhas de rena e as jogou para longe.
Quatro meses atrás Jungkook estava fazendo dezoito anos. Se lembrava perfeitamente de como tivera de convencer a mãe de Jimin a deixá-lo vir para o aniversário, que acontecera a uma terça-feira, um dia complicado para perder na vida de universitário. Se lembrava da tristeza imensa ao receber um não direto da mulher, mulher essa que mais tarde estava na sua casa, rindo da sua cara porque Jimin já lhe tinha dito que iria semanas antes.
Jungkook podia ver tudo agora. Se lembrava dos sorrisos do menor, ao seu lado, sempre do seu lado, não o largou por um segundo. Mas agora, ali, também o podia ver no trem da noite, indo embora, cansado. Mesmo cansado, ainda podia ver Jimin sair do trem, umas horas depois, abraçar-se ao namorado e deixar-lhe um beijo nos lábios. Quase que sentia dali quando a pele fria dele chocou com a quente de Ravi, que o esperava há alguns minutos. Podia vê-los correr para o carro do mais velho, porque de certeza que Ravi tinha um carro. Foram juntos para a casa dele e no caminho Jimin comentou o quanto era hilário que o seu melhor amigo só estivesse atingindo a maioridade agora, quando ele já estava no segundo ano da universidade. Talvez ele devesse procurar amigos da sua idade.
– Jun, pare. – ouviu Jimin dizer, na sua frente, segurando as bochechas do seu rosto – Sei que está viajando, mas pare.
E então a mente de Jungkook entrou em combustão. Estava recebendo imagens que não queria, não conseguia controlá-las.
Os viu apressados, entrando em casa, perdidos em beijos sedentos de saudade, pelo dia longe um do outro, em tropeços descoordenados. Sentia as mãos de Ravi marcando a cintura do loiro como sentia as de Jimin apertando as suas bochechas, o seu maxilar, ali, tentando puxá-lo de sua imaginação. E depois, tudo o que aconteceu. Esbarraram na mesa de centro da sala antes de caírem para o sofá, um por cima do outro, sem descolar suas bocas.
– Jun.
Como Jimin podia estar chamando pelo seu nome enquanto sua boca estava tão... ocupada?
Jungkook queria parar, mas o seu corpo só tentava se afundar mais no relvado, as costas doendo contra o tronco duro e não sabia mais onde tinha as mãos.
Imaginou a cena toda. Quando Ravi puxou o Park para cima de si, quando pararam para tirar as camisas, quando não conseguiram manter os olhos abertos. Tudo.
– Jungkook! – Jimin gritou, segurando os ombros do mais novo, puxando-os para si e os batendo contra a árvore uma vez.
Jungkook então parou, vendo o ar afobado do loiro, completamente alarmado e preocupado à sua frente. Engoliu em seco, finalmente livre daquelas imagens e esticou as pernas para a frente, deixando as mãos caírem ao lado corpo e sentindo as costas doerem pelo impacto.
– Caramba, onde... – Jimin sussurrou, sem ar, a mão segurando a lateral da cabeça do maior, os dedos perdidos entre os cabelos frisados – Onde você se perdeu agora?
Jungkook nunca poderia dizer, mas havia uma lágrima no canto do seu olho.
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