Hold on - Chord Overstreet


Baseado em histórias reais, contem gatilhos( mortes e brigas, dependência emocional. )

2107 palavras

Observo a porta da casa e respiro fundo. Foi uma discussão, uma besteira, que desencadeou uma bola de neve. Palavras duras foram ditas em meio a gritos e murmúrios, um ultimato por parte dela.

Sei que a magoei. Disse que não a amava, a acusei de algo que também era minha culpa, mas meu ego nunca me deixaria admitir em voz alta. Neguei minha parcela de culpa, apontei meu dedo sem motivos, a coloquei para baixo, a fiz chorar e, por fim, cedi ao ultimato, fui embora, bati a porta e a deixei lá.

O vento frio da tarde daquela sexta-feira bagunçava meus cabelos enquanto eu caminhava rápido pela rua. Lágrimas teimosas desciam pelo meu rosto. A adrenalina da briga estava passando e só sobrou aquele aperto, remorso, culpa, arrependimento por ter falado coisas tão duras a alguém que eu amava.

E aqui estou, meus devaneios me trouxeram de volta para o lugar onde tudo acontece, porque mesmo com toda a raiva eu não imaginaria um mundo em que ela se foi.

Sempre tivemos brigas. A vida tem sido difícil. É fácil descontar problemas externos em pessoas próximas, mas sempre estivemos juntos, na alegria e no caos, dividindo cada um dos demônios de que somos feitos. Eu estaria tão perdido se ela me deixasse sozinho.

Então, antes mesmo de entrar, escuto o telefone tocar. E a partir daí, minha vida desacelera. Não sei mais que horas são, nem que dia é. Só presto atenção a cada palavra.

"Sei que não me ama mais, porém eu te amo. Não imagino uma vida sem você. Por isso, eu desisti. Me perdoa. Mesmo com todas as nossas discussões, você é meu melhor amigo, e eu te amo."

Eu penso em falar para ela que a culpa é minha, que ela não tem do que se desculpar.

O choro baixinho e um baque alto. O telefone caiu. Algo aconteceu, algo está acontecendo. Seu tom calmo, calmo demais, denuncia algo errado. Isso não foi um pedido de desculpas, foi uma despedida.

Subo os degraus correndo, dois de cada vez. O ar queima o caminho até meu pulmão. Estava exausto por andar sem rumo, e a escada era grande, mas em momento algum desacelerei, precisava chegar, se ela se fosse eu nunca me perdoaria.

Abro a porta de casa. Não tem malas de viagem prontas, muito menos bilhete. Confiro o guarda-roupa, e está tudo lá, como sempre esteve, mas não parece a mesma casa. Está vazia, mesmo que nada esteja faltando, é como se um filtro cinza revestisse cada cômodo. O sol já tinha desaparecido no horizonte, a noite estava a caminho, mas eu sabia que tinha algo errado no silêncio predominante ali.

Então um barulhinho, não tão baixo que, se o silêncio não estivesse me incomodando tanto, eu nunca escutaria, como uma tosse, de dentro do banheiro.

Tento abrir a porta, porém está trancada. Forço um pouco, e mesmo assim não se abre, e então me desespero, pois abaixo do pequeno vão entre a porta e o piso de madeira, era visível gotículas rubras.

Forço e empurro a porta até estourar o fraco fecho do banheiro. Não tenho tempo de pensar, não sei de onde tirei tanta força e como eu tinha tanta certeza de que tinha algo errado, por que eu estava certo.

Você se trancou no banheiro por vontade própria. Estava caída no chão quando eu entrei, o chão outrora branco mármore agora tingido com uma o líquido espesso escarlate.

Em toda minha vida, de todas as surras que eu levei, doenças que eu tive, notícias que eu recebi, coisas que eu vi, nada nunca me causou tremenda dor, o aperto no peito, a sensação da garganta seca e o frio no pé da barriga, enquanto minha mente acusava "a culpa é sua".

Eu te puxo para sentir seus batimentos, não importa de me sujar, não me importo com mais nada. O sangue em minhas mãos era tanto, como alguém poderia ter tanto sangue?!

Me debruço sobre seu corpo. Os olhos que a horas atrás estavam tão vivos e ferozes, agora fechados transmitem uma paz que nunca tivemos. Seus cabelos, ela sempre teve tanto cuidado com esses cabelos, e agora estão manchados e grudentos, espalhados por toda sua face angelical, os membros frios pelo contato com o chão gelado.

"Por favor, não me deixe!"

Sussurro com os lábios grudados a seu ouvido e como se me ouvisse, solta um soluço, os olhos piscam devagar e voltam a se fechar.

Vejo o celular caído e penso o mais rápido que consigo, abro o aplicativo do telefone, mas antes de conseguir discar observo os números, o celular está sujo, o sangue nele tem o formato de carimbos de digitais.

"Esse não é meu telefone".

Minha ficha cai, quando ela me ligou já estava sangrando, se eu tivesse chegado mais rápido... Se eu tivesse entendido o que estava acontecendo antes... Se eu não tivesse dado corda àquela discussão... Se eu não tivesse dito aquilo.

Viro a cabeça para tentar me distanciar de tais pensamentos assustadores e encaro o box do banheiro. "Ela sempre gostou de deixar tudo limpo", penso ao conseguir ver meu reflexo. Os olhos inchados e vermelhos, as lágrimas grossas descendo pelo meu rosto. Desde quando eu estava chorando? Sua cabeça em meu colo virada na direção oposta, as poças davam ao banheiro um tom rubro. Os braços em posições estranhas, foco em minhas mãos.

Ainda tremendo, conforme as lágrimas caíam, me forcei a discar os números. Geralmente, eu consigo discar mais de sei lá quantos números por minuto, mas aqueles 3 números, 3 malditos números, demoraram uma eternidade. Minhas mãos não me obedeciam, minha respiração estava desregulada, e eu não fazia questão de regular. As únicas frases que saíam eram:

"Eu ainda te quero."
"Volte."
"Eu ainda preciso de você."
"Eu te amo."

E se repetiam, cada vez mais, na minha fala e na minha cabeça. Não sabia se estava gritando ou sussurrando, não sabia nem se o som da minha voz estava saindo. Então, a voz feminina, que de certa forma parecia robótica, como se repetisse aquilo sempre, cortou o ar, e eu agradeci, pois mesmo que não fosse uma voz acolhedora, ainda era uma voz humana, interrompendo o silêncio que tanto me incomodava.

"Você ligou para a central de emergências, qual o problema?"

Choro e me forço a dizer alguma coisa, mas as palavras que saem não respondem aos questionamentos da atendente.

"Por favor, não me deixe."
"Espere."
"Eu ainda te quero."
"Volte."
"Eu ainda preciso de você."
"Eu vou consertar tudo."
"Juro te amar por toda minha vida."
"Espere."
"Eu ainda preciso de você."

"Senhor, se acalme e me diga o que houve, precisa de ajuda?"

Do meu lado da linha só são ouvidos soluços.

"Uma ambulância ou uma viatura?... Senhor?"

Não fico tempo o suficiente para continuar ouvindo. Uma luz acende em minha cabeça, como um choque sinto a adrenalina voltar a pulsar nas minhas veias. Chega de vitimismo, ela não vai morrer aqui, eu ainda vou dizer "eu te amo", eu preciso.

Levanto e corro com ela em meus braços. A cabeça pende de um lado para o outro enquanto desço as escadas com pressa. Tento não esbarrar em nada, o que é muito complicado quando minha cabeça está cheia com um milhão de possibilidades. Cada pegada minha marca o clássico caminho até sua casa, um caminho que antes parecia se passar em um piscar de olhos, um caminho que hoje mais cedo eu percorri ansioso e animado, agora sujo com pegadas sangrentas rápidas, e mesmo assim, mesmo que eu esteja correndo e tudo aconteça a 1000 por hora na minha cabeça, tudo ainda parece devagar demais, rápido e devagar, os dois juntos, um misto de sensações que me enlouquece e me desespera.

A coloco no banco do carro e dou a volta para o banco do motorista. Olho para ela, apagada, e mesmo assim vez ou outra soltava murmúrios como se tossisse ou engasgasse.

"Eu ainda preciso de você."

"Me deixe pegar a sua mão."

"Eu vou consertar tudo."

Seguro sua mão mesmo sem resposta. Preciso saber que ela ainda está aqui enquanto dirijo, mas me assusto com a temperatura. Era morna, quase gelada. Sabia que não deveria estar assim. Pisei fundo no acelerador.

Numa longa estrada sem fim, desvio dos carros e corto o trânsito. Ela é jogada de um lado para o outro, caindo com a cabeça para a direita quando eu corto um carro preto à frente. Solto sua mão e tento prender o cinto nela com uma mão só, enquanto a outra está no volante. Minha visão está embaçada, as lágrimas pesadas insistem em cair.

Conduzindo um pesadelo do qual não posso escapar, preciso resolver, preciso de mais uma chance, preciso dizer que te amo.

Estou rezando sem esperança. Nunca acreditei em uma força maior, ela sim, era uma crente convicta, com uma fé radiante como o sol da manhã. Então eu rezo, por ela, pelo que ela acredita, para qualquer deus ou divindade que permita que a luz não apague.

Tento me focar em prender seu cinto. Não posso deixar que se machuque mais, não por minha causa, não posso te machucar mais.

E então uma luz forte, mesmo no meio da noite. Não entendo até ouvir o barulho alto e ensurdecedor, e então tudo escurece.

Preto, escuro, vazio.

Escondendo o choque e o frio em meus ossos, consigo olhar para os lados. Estou deitado. Olhando para cima, vejo os pneus do carro à minha esquerda. Tento me levantar, mas sou deitado de novo.

"Onde ela está?"

É o único pensamento que tenho. Vejo um homem acima de mim. Ele prende meu corpo em um pedaço de plástico duro. Acho que tenta falar comigo, não o escuto, o barulho se faz predominante, como um "Tim" constante dentro da minha mente, mas ele aponta e sigo seus dedos.

Eles a levaram, deitada em uma mesa, estavam arrumando ela. A cabeça pende para trás, e seus olhos antes tão vivos agora escureceram. Levanto, mesmo que eles tentem me segurar. Preciso vê-la, preciso falar com ela.

Caminho para lá e para cá enquanto a vejo imóvel na mesa. Tento me aproximar. Eles a pegam para sentir os batimentos. Vejo em seu semblante que a situação não é boa.

Então eu grito, torcendo para que ela me ouça gritando:

"Por favor, não me deixe!"

Será que ela pode me ouvir gritando? Sou preso de volta na maca, mas não paro, continuo gritando. Ela vai me ouvir, tem que me ouvir.

"Por favor, não me deixe!"

"Espere!"

"Eu ainda te quero."

"Volte, eu ainda preciso de você!"

"Eu vou consertar tudo."

"Juro te amar por toda minha vida!"

"Espere! Eu ainda preciso de você."

"Eu não..."

estou pronto para desistir. Não quero e não posso ficar sem ela. Não sou forte o suficiente para aguentar isso, eu falhei, tudo o que houve foi porque eu falhei com ela.

Só o que quero é levá-la para casa, é reparar meus erros. Porém, sei que não é possível. Pisco algumas vezes.

Minha cabeça e corpo doem, mas nada comparado à angústia sentimental. Então, um clarão, e tudo passa. O mundo parece mais leve, e a sensação é como a de flutuar.

Lá está ela, em pé, com um sorriso no rosto. Radiante e feliz como eu me lembrava. Os cabelos soltos voando atrás de seu corpo, com roupas brancas tão puras que pareciam brilhar. A imagem mais linda que já vi, como eu queria eternizá-la.

"Amor, vamos para casa."

Ela estende a mão. Tudo que eu quero é tocá-la, uma última vez.

Mas antes de me render, sussurro:

"Espere, eu ainda quero você. Volte, eu ainda preciso de você."

"Não posso mais, nem você."

"Vamos para casa."

E eternamente eu me rendo.

Nota do autor :

Esse foi um dos contos mais complicados de escrever, e o primeiro que me deu coragem de postar, meu objetivo foi fazer o leitor repensar, como uma fala pode atingir a pessoa pra quem a mesma é direcionada.
Os personagens não tem nomes e nem descrição clara (cor dos olhos, cabelos, tipo físico, nível de relacionamento) para melhor identificação, queria que o leitor se colocasse no papel de personagem principal, imagine tal situação acontecendo com alguém amado, e repense certas atitudes.
As falas estão entre parênteses para que pensamentos se confundam com falas, pois em momentos de desespero como o narrado é difícil diferenciar o que passa na cabeça e o que está acontecendo.
Esse texto foi, em um nível extremo, pessoal pessoal para mim, espero que entendam a mensagem

ate a próxima

—Sunny

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