[7]

"Você não tira os olhos desse celular"

Levanto o olhar. Mark está sentado na poltrona ao lado da minha, me encarando com o que parece ser curiosidade. Ele está com uma guitarra cor creme no seu colo. Estamos no auditório do Foutman que  parece meio assombrado sem quase ninguém ali. A banda está dispersa no grande palco.

Mark foi definitivamente incluído no 'The Fleet', a banda criada nos corredores do  Foutman há 2 anos atrás. A antiga guitarrista, Jude Holt (melhor amiga de Anne-Marie, crush da Gillian) precisou sair e Mark foi um forte candidato para a substituição, principalmente por ser próximo de Sean, o baterista. E ele é bom, claro. Meu namorado é excelente no violão e na guitarra.

"Só estou dando uma checada nas minhas mensagens", digo, atualizando mais uma vez o aplicativo de mensagens. Nada. "Mandei mais mensagens para Cornélia. Estou esperando ela ficar online para falar com ela."

"Ela ainda não te respondeu? Você já mandou umas 30 mensagens pra ela nesses últimos dias. Se ela quisesse mesmo falar com você, teria te respondido. Por que não tenta ligar para ela?"

"Já tentei hoje mais cedo, mas sempre cai na caixa postal", guardo o celular na mochila e deixo escapar um suspiro. "Quer saber? Vou esperar vocês terminarem o ensaio e vou dar um pulo lá na biblioteca. Quero ver como ela vai conseguir se esquivar de mim presencialmente."

"Você quem sabe", Mark diz e estica o braço direito, passando o polegar suavemente na minha bochecha. "Quer subir ali em cima e cantar algo?"

"Eu, cantar? Você está enlouquecendo!", a risada vem instantaneamente. "Não sou cantora, seu bobo. Além disso, vocês já tem uma vocalista com uma voz maravilhosa."

"Não estou falando pra você ocupar o lugar de um integrante.", ele aponta com a cabeça para o palco. A vocalista da banda, Jamie Tyler, está na frente do microfone conversando com o baixista, David Knight. A banda deu uma pausa no ensaio porque Sean precisou sair para buscar a irmã de 6 anos na escola e levá-la para a casa.

"Só vamos subir lá e nos divertir um pouco. Ou você tem medo de se divertir?"

"Tabóm, eu vou", eu aceito só porque ele está me encarando com um olhar desafiante. Mark abre um sorriso vitorioso.

Largo minhas coisas na poltrona aveludada e subo com Mark no palco.

"Vamos tocar alguma coisa pessoal?", diz Mark, fazendo Jamie e David olharem para ele. "Enquanto Sean não volta, podíamos brincar um pouco. A Ashe também quer participar."

"Ele está me forçando a participar, isso sim", eu disse e Jamie riu. "Eu sou cantora de chuveiro, ponto. Canto para meus produtos de higiene pessoal, ponto. Não tenho nenhuma habilidade vocal, ponto."

"Relaxa, Ashe", Jamie me encara com um olhar tranquilizador. Ela é baixinha tanto quanto eu e tem uma aura tímida e fofa. Na verdade de fofa ela só tem o rosto porque quando ela abre a boca pra cantar, soa como uma rockstar. O timbre dela me lembra um pouco o da Taylor Momsen e da Fiona Apple. "Vamos cantar alguma coisa, só pra descontrair. Aqui não é o The Voice ou qualquer coisa assim. Tem alguma sugestão de música? Você pode escolher, se quiser."

"Hmm...", todos estão olhando para mim. Tenho vontade de rir, mas me seguro. "Qualquer coisa do One Direction, sei lá. Ou Harry Styles."

"Adore You, conhecem?", David pergunta, enquanto marca alguns acordes no baixo. Balanço a cabeça em positivo. Mark e Jamie também assentem.

"Ok, no três então", Mark diz, fazendo contato visual com David. Jamie me conduz delicadamente para o único microfone que está encaixado no pedestal. "Um, dois, três!"


Mark começa um riff curtinho que é seguido pelo baixo de David. A junção dos dois instrumentos produz um groove gostoso que dá vontade de dançar. Jamie se aproxima do microfone segundos depois e começa a cantar. Entrelaço minhas mãos na frente do meu corpo, me sentindo nervosa.

"Walk in your rainbow paradise", ela se afasta e olha rapidamente para mim. Ela quer que eu cante o outro verso, claro.

"Strawberry lipstick state of mind", minha voz sai com bastante insegurança, mas sai e é isso que importa. O som está tão bom que eu digo a mim mesma que ele está salvando qualquer desafinação da minha parte.

"I get so lost inside your eyes", a voz de Jamie é a melhor coisa que já ouvi ao vivo. Emana confiança, emoção e potência.  Desenvoltura também. Ela tem muita desenvoltura, o canto dela é carregado de confiança. "Would you believe it?"

"You don't have to say you love me",  cantamos juntas, cada uma ocupando um espacinho do microfone. "You don't have to say nothing, you don't have to say you're mine... honey!"

"I'd walk through fire for you, just let me adore you", Jamie canta me olhando com um sorriso e é impossível não sorrir também. Balanço a cabeça no ritmo da música. "Oh, honey... I'd walk through fire for you, just let me adore you... Like it's the only thing I'll ever do..."

Nos afastamos do pedestal e eu olho para os garotos. Mark faz um pequeno solo na guitarra, enquanto a linha de baixo tocada com a maior concentração do mundo por David, dita o ritmo da canção. É incrível ver eles tocando. Mark desliza os dedos com agilidade nas cordas e nas casas do instrumento. Nem sequer olha para a guitarra para se certificar que está tocando de forma correta - ele sabe que está. Na verdade, ele passa todo o tempo do solo olhando para mim.

"Isso foi ótimo!", Jamie bate palmas quando os meninos finalizam a música. "Não foi tão complicado assim, né Ashe?"

"Uau, isso foi... muito legal. Ok, não por mim, porque não sou música nem nada assim, mas vocês", divido o olhar entre os três. "Vocês são incríveis. Deviam ser reconhecidos pelo mundo inteiro."

"Olha aí, já temos uma fã eu acho", David solta uma risadinha anasalada. David é um cara bem alto, pálido e magro que usa roupas grandes e largas demais. Sempre está usando uma touca preta, acho que nunca vi seu cabelo. Gillian comentou uma vez que ele foi para reabilitação pouco tempo atrás porque quase teve uma overdose.

Mark se aproxima de mim e me dá um beijo na bochecha.

"E aí, achou divertido?"

"Definitivamente sim", eu provavelmente estava sorrindo de orelha a orelha. "Eu me arriscaria até cantar outra-"

"Ei, olá pessoal!", uma voz feminina reverbera pelo auditório, cortando minha frase. Olho na direção dos bancos e me deparo com uma Kira Rosemary sorridente chegando à primeira fileira. Meu sorriso murcha em meio segundo. "Estava passando pelo corredor e ouvi vocês tocando Harry Styles. O som de vocês é demais!"

"Fico feliz que tenha gostado, Kira", diz Jamie dando um sorriso rápido a ela. "Bem, enquanto o Sean não chega, acho que vou lá fora respirar um pouco de ar puro. Já volto."

"Eu vou junto com você", David tira a correia que segura o baixo das costas e
e sai atrás dela. Abro a boca e fecho. Também queria falar que iria junto, mas isso implicaria em deixar meu namorado e a ex dele sozinhos, em um auditório vazio.

"Você está na banda, Marky?", ela olha para Mark. Nem passou o olhar em mim, apesar de eu estar encarando-a como se dependesse disso para viver. "Me lembro que você tocava violão, mas guitarra? Simplesmente incrível."

"Na verdade os dois são instrumentos bem parecidos", disse Mark.

"Oi Kira, tudo bem?", eu disse, chamando atenção dela.

"Ah oi Ashe! Nem tinha prestado atenção em você, me desculpa", ela me olhou com certa surpresa e abriu um sorriso gentil. "Era você mesmo que eu estava procurando. A professora Bareilles quer conversar com você. Na verdade é com todo o pessoal dos bastidores, ela quer definir algumas coisas para a próxima peça. Ela está lá na sala dela."

"Ah sim", eu assinto sem sair do lugar. Mark limpa a garganta e segura o braço suspenso da guitarra com uma mão.

"Quer que eu te acompanhe até lá?", indaga ele, com o olhar hesitante.

"Não amor, não se preocupa. A Kira vem junto comigo, não é Kira?", lanço um rápido olhar para a garota. Ela balança a cabeça em positivo.

"Sim, sim. Estou indo para lá também."

"Viu? Vou indo então. A gente se encontra depois, se você quiser. Me manda mensagem quando o ensaio terminar", eu inclino a cabeça na sua direção e lhe dou um selinho.

"Até mais", Mark diz em um tom estranho.

Desço do palco, pego minha bolsa e acompanho Kira. Quando estamos no corredor, ela vira a cabeça para me olhar.

"Você estão juntos a quanto tempo?", é o que ela pergunta. Depois balança a cabeça em negativo. "Não, desculpa. Não precisa responder. Estou sendo intrusiva."

"Ouvi dizer por aí que vocês já namoraram", comento, me sentindo a pessoa mais bobinha do planeta. Ouvi dizer... dá para ser menos óbvia? Aghr, sou muito idiota.

"Sim, mas eu não rotulo o que tivemos como um namoro", ela para a caminhada, me forçando a parar também. Cruzo os braços, sustentando seu olhar. "Ficamos juntos por um mês, no máximo. Ele era fofo comigo. Mas me deixava sem ar no pior sentido da palavra, sabe? Era chato demais, muito grudento. Ele cresceu sem mãe, né? Talvez estivesse carente ou coisa assim."

"Hum", é o que eu digo. Ela dá de ombros.

"Fazia tempo que não o via tão assim de perto", ela volta a caminhar e eu sigo seu ritmo."Tipo, às vezes eu ia a alguma partida de futebol americano e o via jogando, mas era só. Agora descubro ele está em uma banda! Faz muito mais sentido. Sabia que futebol americano não combinava com ele. Quer dizer, ele tem porte para jogar futebol, mas ele é realmente bom com as  músicas. Me lembro que uma vez-", ela suspira e balança a cabeça. "Deixa pra lá,  estou falando demais, né? Vamos a sala da senhora Bareilles, sim?"

Assinto e finalmente chegamos a sala da senhora Bareilles. Fico com vontade de dar as costas e sair correndo - correndo de volta ao auditório, de volta a Mark. Quero voltar lá e perguntar coisas, minha cabeça está pipocando indagações, uma atrás da outra. Você cantava músicas para ela? Ela te incentivava a tocar algum instrumento? Você ensinou ela a tocar violão? Você já escreveu uma música para ela? Perguntas que denunciam minha curiosidade incomum sobre a relação dos dois.

Claro que não saio correndo, isso seria estranho. Na verdade, eu bato na porta da sala e deixo que Kira entre primeiro quando a senhora Bareilles abre. É sobre isso, sabe? Fingir que a vida está fluindo normalmente quando você está paranóico por dentro. Você pode extravasar o que quiser mais tarde, no seu quarto sozinha ou pode contar para alguém. Mas enquanto o dia não termina, sorria e só finja. Você pode surtar depois.


N.A: Olá! Passando para avisar que os personagens da banda 'The Fleet' tem uma história própria! A crush da Gillian também está lá kkkk. Desplugados é o nome do livro e ele está disponível aqui no meu perfil do Wattpad pra quem tiver interesse em ler ❤️

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top