A Salvação
Apoiando-se em um poste, Max pôde ver seu inimigo do outro lado da rua recarregando mais uma vez sua pistola. Daquela distância ele o podia acertar até mesmo de olhos fechados, então o rapaz procurou se movimentar de forma que sempre algo ficasse entre ele e os tiros. Seu braço esquerdo estava inutilizado, o tiro em seu ombro parecia que havia arrancado um pedaço dele e a ferida doía como um banho escaldante no inferno. Uma tontura ameaçava abatê-lo e ele se esforçava para manter-se acordado, enquanto os ferimentos sangravam sem parar. Outro tiro explodiu bem próximo de sua cabeça, aparado por um poste de concreto que tivera a estrutura atravessada pela bala. "O filho da mãe abandonou sua 9 mm. Está me atacando com uma arma mais poderosa!". Seu raciocínio estava lento naquele momento, e ele percebeu que o homem loiro já atravessava a faixa de pedestres correndo feito um demônio para alcançá-lo. A balbúrdia chamara a atenção de novas viaturas de Polícia cujas sirenes ecoavam pela cidade, mas nada mais daquilo importava. Max atirou-se contra a porta da loja de penhores e caiu com o rosto estalado no chão de assoalho esverdeado, chamando por seu mentor:
- Melvin! Eu consegui!
Com a mente confusa, Max não entendia como aquele homem o havia alcançado tão rápido, e de repente, se viu rolando no chão da loja com ele, segurando seu punho a muito custo, impedindo que ele usasse sua pistola. Extremamente forte, o loiro não demorou a subjugar Max, que quase desfaleceu com um cruzado de direita, que por pouco não deslocou seu maxilar. Arrastando-se no chão segurando o queixo, ele viu o adversário levantar-se habilmente e uma voz rouca irrompeu:
- Entregue a caixa, idiota. Acabou pra você. Nada que possa fazer vai impedir o que está para acontecer.
Max dedilhou a caixa por sob o bolso da calça. Não podia entregá-la. Lá fora as sirenes estavam cada vez mais próximas.
- Não percebe que se me impedir vai condenar a todos? Vai condenar a você, a sua família?
Custara pronunciar aquelas palavras, e Max sentiu um gosto de sangue na garganta.
- A Programação é uma farsa, garoto. Eles não podem impedir o fim do mundo. Dê-me a caixa para que eu a entregue para seus verdadeiros donos.
Um relógio na parede da loja, sobre a porta de entrada marcava 17:11. Max tinha pouco menos do que cinco minutos para agir. Olhando desesperadamente para os lados, ele procurava alguma coisa que pudesse usar contra seu algoz, mas nada parecia-se suficientemente com uma arma. A loja de penhores possuía apenas um sofá velho para que os clientes esperassem e um balcão de atendimento.
- De que adianta tomar posse da caixa? Em alguns minutos tudo estará acabado! – Gemeu Max, sentindo o ombro esquerdo latejar.
- Você não entende mesmo no que está metido, não é? O que está prestes a acontecer. Cada um de nós escolheu seu lado, e a destruição dessa Terra fétida e pútrida dará início a uma nova existência. Uma era mais próspera e justa, onde seres fracos como você não terão mais espaço.
Max ouvia a voz cheia de ódio de seu inimigo e o viu recarregar mais uma vez a arma. Não havia nada entre ele e a morte certa agora, e com pesar ele se perguntava onde estaria Melvin naquele momento. Por que ele o havia abandonado? Por que ele não o havia esperado?
- Dei a chance para que você mesmo entregasse a caixa e você não obedeceu. Não terei problemas em recolhê-la de seu cadáver, já que prefere assim.
Dois tiros à queima-roupa teriam atingido em cheio a cabeça de Max se uma bengala não tivesse se espatifado contra a nuca do homem loiro naquela fração de segundos. As balas acertaram o balcão, e naquele exato momento, enquanto abria os olhos vagarosamente para saber o que o havia salvado da morte, Max viu a figura grisalha de Melvin a observá-lo da porta da loja. O homem arfava parecendo exausto, sua longa barba dava-lhe um ar desleixado e envelhecido, mas havia algo de vigoroso em seus olhos negros. O relógio acima de sua cabeça marcava 17:14.
- A caixa, Max. Leve-a para o porão e faça o que tem que fazer!
Ele ainda balbuciou:
- Mas eu achei que você é que--
- Não há mais tempo. FAÇA!
Tirando forças de um lugar invisível, Max colocou-se de pé pela última vez, e abriu a porta atrás do balcão. Um porão iluminado escondia-se por detrás daquela porta, e por um momento ele achou que iria rolar a escada, tal qual foi a velocidade com que desceu os degraus. Entre as estantes abarrotadas de antiguidades, estava uma mesa velha com uma espécie de ânfora sobre ela. Havia uma fechadura lacrando a tampa do objeto que parecia emanar um brilho fosco e amarelado de seu corpo. Max aproximou-se da mesa e retirou a caixa de seu bolso. Com o mais leve de seus toques, o pequeno invólucro de madeira abriu-se, exibindo uma chave dourada com adornos em vermelho. Não o admirava agora que ele sabia o que continha aquela caixa, que tal objeto lhe parecesse tão simplório, e por um segundo Max conseguiu sorrir, um segundo longo demais.
A chave estava há poucos milímetros da fechadura da ânfora quando um tiro estourou a mão direita de Max. Perdido em meio a um bolsão de sangue, o objeto caiu lentamente no chão, enquanto o rapaz gritava de agonia. Ele estivera tão perto, e agora sabia que tudo estava acabado. Por um instante o belo rosto de Natália surgiu em meio às memórias daquilo que parecia o roteiro de sua vida, passando por seus olhos. No instante seguinte ouviu-se uma explosão e uma luz branca engolfou tudo no caminho, arrastando aquela que seria a salvação, aprisionada dentro da ânfora sobre a mesa velha, para seu fim.
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