10 - Cabidan

Seguiram para o norte pelo deserto por mais três dias, mas ao contrário do que Cláudio desejava os diálogos se arrastaram curtos e evasivos. O Sr. Ninguém demonstrou ser um homem de poucas palavras e um eterno vigilante, vezes por conta girando lentamente os olhos por toda a paisagem. No final do terceiro dia do acampamento que armaram dava para ver um local povoado não muito longe dali, numa área verde que indicava o término do deserto, que Cláudio já visitara outras vezes e que se chamava Cabidan.

"Quando eu era mais jovem e por aqui passei o deserto era menor e onde estamos agora o solo ainda era coberto de grama."

"Conheço este lugar." – disse simplesmente o Sr. Ninguém – "É Cabidan, onde moram os homens do deserto."

"Foram estes homens que atacaram o local onde te encontrei? Eles são o que na verdade, algum tipo de saqueadores?"

"São homens do deserto e possuem suas regras."

Cláudio calou-se. Com certeza não arrancaria mais informações dele e na verdade nem precisaria, pensou, pois no próximo amanhecer estariam dentro dos muros do lugar e teria todas as respostas.

Na manhã seguinte o Sr. Ninguém já se encontrava pronto para seguir quando o loiro se preparou para levantar e sentiu que o corte que o capitão Deiron já não doía tanto, mas precisaria de uma nova vestimenta, pois a que tinha agora estava velha, rasgada e manchada de sangue.

Do chão ainda ao abrir os olhos dava para perceber mais facilmente que o Sr. Ninguém era o homem aparentemente mais forte que ele já conhecera e logicamente essa constatação trazia também uma dúvida: se ele aparentava toda essa força quem o deixara para morrer no deserto deveria ser mais forte ainda, não que isso fosse impossível. É claro que podia provavelmente se tratar de um grupo de homens do deserto, mas dava para imaginar o estrago que o Sr. Ninguém faria com um machado na mão àqueles que se aventurassem a atacá-lo. E era por isso que se encontrava tão intrigado, mas certamente suas dúvidas seriam sanadas em Cabidan, para onde seguiam agora silenciosamente como sempre.

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O local parecia uma enorme feira que vendia de tudo, desde panos coloridos até belíssimas armas fabricadas com os mais diversos materiais. Suas construções não seguiam um padrão específico, eram irregulares, alternando entre muros altos e outros que facilmente seriam escalados. Até neste ponto não se poderia dizer que o lugar possuía alguma diferença de outras aldeias que Cláudio visitara antes. O que mais chamava a atenção em Cabidan era a quantidade de pessoas que circulava por suas ruas estreitas, bem como a variedade das raças dessas pessoas, que muitas vezes podiam ser consideradas inimigos perigosos. Mas neste povoado sem dono nem juiz somente uma lei existia: qualquer luta devia ser travada fora dos seus portões, ou dentro de uma área reservada especialmente para isso. Essa área era um tipo de arena onde o prêmio a ser conquistado muitas vezes era simplesmente sair vivo, somado ao respeito que se adquiria junto aos frequentadores assíduos.

Apesar de já ter presenciado várias lutas na arena, que estupidamente, pensou, o inspiraram a achar um dia que poderia se tornar também um guerreiro, Cláudio desconhecia todas as regras do local, que se tornara famoso pelos grandes guerreiros que revelava ao mundo em seus diversos torneios mensais. O primeiro local que realmente visitaram nesse dia foi a arena onde novamente o Sr. Ninguém surpreendeu o loiro com sua voz de trovão.

"Quero me inscrever para o próximo torneio!" – disse ele para um garoto que se encontrava numa tenda montada junto à entrada da arena.

O garoto o mediu dos pés à cabeça consultando a seguir um pergaminho que devia possuir um tipo de tabela de preços e acabou por declarando sorrindo.

"Você parece forte, porém mais cansaço que força revela no olhar. Não deverá ser um grande peso para os ótimos competidores de amanhã, portanto cinquenta moedas de bronze pagam facilmente sua participação."

Se ele ficou humilhado não deu a menor demonstração e antes que ele pudesse dizer qualquer coisa a mais, o loiro se adiantou.

"Uma moeda de prata deve pagar da mesma forma, não?"

"Paga com sobra até a sua participação!" – respondeu o garoto que ao julgar pelo modo como encarou Cláudio o deixaria participar de graça.

"Não sou covarde, mas também não sou um lutador. Inscreva somente meu amigo Sr. Ninguém como participante e ficarei agradecido."

"Espere." – Interrompeu o Sr. Ninguém dando um leve susto no garoto – "Coloque Sr. Ninguém e Cláudio, o Loiro."

"Assim está feito. Logo pela manhã começará o desafio e que a sorte os acompanhe..."

Como sempre Cláudio não entendeu a atitude do Sr. Ninguém, mas não era ele o estrategista ali quando o assunto era combate e preferiu ficar calado.

Procuraram um lugar para passar a noite, mas ao relento tiveram que dormir uma vez que todas as hospedarias se encontravam abarrotadas de gente. Parecia que todos esperavam um grande desafio para as próximas horas. Cláudio tentou arrancar algum detalhe sobre o interesse do companheiro em participar do torneio, principalmente porque não havia dinheiro para os vencedores, mas como sempre o Sr. Ninguém foi evasivo nas respostas e ele desistiu, resolvendo descansar.

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O loiro acordou assustado com alguém lhe chamando por um nome diferente que ele tinha certeza de já ter sido tratado antes. Olhou ao redor e o estranho ainda dormia e nas proximidades de onde se encontravam não existia outra pessoa. Deduziu então que sonhara provavelmente com sua mãe, a única pessoa que poderia conhecer tal tratamento. Deu o assunto por encerrado e chamou o Sr. Ninguém, visando saírem para se alimentarem antes do início do torneio, que deveria estar próximo.

De volta à arena, após se apresentarem como participantes, Sr. Ninguém como lutador principal e Cláudio, o Loiro, como um lutador de apoio, foram conduzidos para um dos aposentos que abrigavam os demais concorrentes e suas equipes, onde ficaram sabendo de outras peculiaridades do torneio. Os participantes não podiam acompanhar as demais lutas e somente quando chegava o momento de lutarem eram chamados para a arena e ao término de cada confronto, sagrando-se vencedores, eram reconduzidos aos aposentos, aguardando nova chamada. Seus oponentes eram escolhidos através do sorteio dos nomes e as únicas armas que podiam ser utilizadas eram as armas pessoais de cada lutador, ou as recolhidas dos oponentes derrotados. Nesse momento da explicação Cláudio pensou que poderiam ter adquirido diversos tipos de armas antes de rumarem para o local, mas analisou que o Sr. Ninguém provavelmente tinha raciocinado sobre isso e chegara à conclusão que não precisaria de uma arma. Pelo menos era o que ele esperava que tivesse acontecido.

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