• Capítulo 5 •
A tempestade uivava lá fora, sacudindo árvores, derrubando placas e soterrando as ruas. Dentro do bar, onde era quente e confortável, Gavin tinha certeza que a qualquer momento o telhado sairia voando pelos ares.
Sentado na cadeira velha de encosto alto, ele observava as dezenas de cabeças de animais selvagens pendurados nas paredes do bar. Animais que, em sua maioria, ele mesmo havia caçado e matado. Agora, suas cabeças eram como troféus para Gavin, que pensava tolamente que era um herói por ter conseguido domar todos aquelas feras.
Sempre que olhava para os animais na parede, Gavin era tomado por uma enorme onda de felicidade e orgulho de si próprio, mas, naquela noite, as fitava com desinteresse, sentindo-se patético.
"Eu não consigo acreditar", ele falou pela centésima vez em menos de uma hora, levando a caneca de cerveja espumante à boca. "Fui repudiado, rejeitado... Fui...", ele afundou-se na cadeira, sentindo a raiva inflar seu peito, "fui publicamente humilhado! Isso é demais para qualquer um..."
"Quer mais cerveja?", uma voz hesitante ofereceu ao seu lado. Era Leif, sempre tentando agradá-lo. "Ou quem sabe parar de se lamuriar por conta da garota e investir em outras? Vamos lá, Gavin, contatos não faltam no seu celular."
Gavin rugiu, desejando pegar o pequeno rapaz pela gola da camisa e arremessá-lo bar a fora.
"Não tenho tempo para garotas fáceis. Ainda mais aquelas que não me interessam", respondeu ele, bebendo o último gole de sua caneca.
No bar, os murmúrios dos homens e os guinchos de uma ou outra mulher, preenchiam o ambiente, tornando impossível que Gavin ao menos relaxasse um pouco, que era o que geralmente acontecia quando iniciava suas noites ali.
Apesar de três dias já terem se passado, Gavin ainda não conseguia tirar da cabeça a conversa que tivera com Beatrice na calçada, depois que ela saíra do café.
Como foi mesmo que ela havia dito?
"Sei que vai ser difícil para você ouvir isso, mas... eu não vou nunca ter algo com você. Então, por favor, faça a gentileza de parar de tentar."
Nunca ter algo com ele?! Como ela podia dizer uma asneira daquelas?
Gavin realmente não conseguia entender.
Todas as garotas de Roseville – sem exceção – praticamente rastejavam aos seus pés, implorando por um segundo ou dois de sua atenção. Beatrice, porém, parecia imune a todos os seus encantos e tentativas de conquistá-la.
Flores? Ele já tinha dado para ela mais de vinte espécies de buquês diferentes. Joias? Colares e brincos eram frequentes, que Beatrice, por sinal, sempre recusava. Isso sem falar de todas as tentativas de ter um tempo sozinho com ela, ou impressioná-la de algum jeito.
Gavin tinha certeza que conseguiria fisgá-la facilmente se os dois tivessem um encontro, mas com ela trabalhando como uma escrava o dia todo, isso estava um pouco complicado.
Beatrice Morgan parecia imune as suas tentativas de conquistá-la; justo ela, a garota que Gavin mais desejava. A beleza de Beatrice não passava despercebida aos olhos de ninguém, muito menos aos dele.
Mas Gavin não iria desistir. De jeito nenhum.
Ao seu lado, Leif parecia tentar encontrar algo para dizer, enquanto tomava um gole da sua bebida que mais parecia ser vodka.
Leif, embora tivesse a mesma idade de Gavin, tinha vários centímetros a menos que ele, além de ser mais troncudo. Com um nariz achatado e dentes enormes, Leif nunca fizera sucesso no colégio de Roseville. Ele era mais como o nerd isolado e atrapalhado, sempre tropeçando por aí.
Gavin não se recordava muito bem de como a amizade entre eles florescera, dois anos antes. Talvez tivesse acontecido naturalmente, já que Leif era um dos grandes fãs dele e parecia disposto a fazer qualquer coisa para agradá-lo. Gavin, então, acabou transformando Leif em seu fiel escudeiro, e devia dizer que a companhia dele era bem útil na maioria das vezes.
Leif sabia sempre o que dizer, além de fazer tudo que Gavin mandasse e frequentemente tomasse seu lugar nas enrascadas diárias.
Talvez tê-lo tomado por sua guarda tanto tempo antes não tivesse sido de todo uma má ideia.
"Ei, Gavin", ouviu a voz do amigo dizer ao seu lado.
"O que é?"
"Você tem que voltar logo a ser o que era, sabia disso?", ele falou, levantando-se de seu banquinho de madeira e ajeitando o moletom que vestia. "Não pode deixar uma... qualquer abalar sua confiança desse jeito."
"Minha confiança não está nem um pouco..."
"Tem noção de que qualquer um aqui queria ser como você?", ele continuou, sem deixar que Gavin o interrompesse. Pelo bar, sussurros de confirmação percorreram. Aquilo o agradou.
Apesar de jovem, Gavin era admirado por todos da cidade, pelo seu enorme porte físico, coragem, beleza e... Bem, ele tinha tido mais garotas do que qualquer outro homem mais velho ali.
"Ninguém aqui é respeitado, admirado ou invejável como você, acredite", Leif disse, dando-lhe palmadinhas no ombro e fazendo com ele se erguesse da cadeira, apoiando-se no balcão.
"Isso aí, Gavin", gritou Russ do outro lado do bar, um cinquentão bêbado e barbudo, indicando as trigêmeas loiras que frequentemente estavam por ali, sentando no colo de todos e jogando charme para qualquer homem que estivesse por perto. "Se a filha de Marco não te quis, há muitas outras disponíveis por aqui."
As trigêmeas suspiraram e concordaram com o comentário, olhando-o admiradas.
"Diga quem é melhor do que você aqui, Gavin", falou Leif, tentando animar o amigo.
"Quem é mais forte?", perguntou a dona do bar, debruçando-se sobre o balcão e exibindo o busto farto.
"Quem é mais corajoso?", guinchou uma das trigêmeas, com um grande sorriso.
"Quem é mais homem?", emendou a outra.
"Quem é mais belo?"
Como em um acordo tácito, todos do bar gritaram em uníssono:
"Gavin!"
Ele realmente estava começando a se sentir melhor.
"Bem, de fato é difícil encontrar alguém com tantas qualidades", sussurrou Gavin para si mesmo, o que fez com que todas as pessoas próximas soltassem uma gargalhada.
"Você não é admirado em toda nossa pequena cidadezinha atoa, Gavin, há um motivo para isso", falou Leif com um sorriso, pegando a mão de uma das mulheres próximas e a girando pelo bar, na imitação de uma dança fajuta.
"Vários motivos!", gritaram as trigêmeas.
"Já viu a si mesmo caçando?", perguntou Rory Frost, um dos velhos amigos de seu pai. "Ou dirigindo por aí naquele seu carrão? E é certo que ninguém em toda a história de Roseville empalhou tantas cabeças!"
"Você é o herói daqui", disse Liz, a dona do bar. "Não deveria ficar desse jeito por causa da filha de Marco. Sinceramente, ela não é lá muito interessante."
Realmente não é, pensou Gavin, pelo menos não para ele ou para o resto da cidade. Mas sua beleza... Bem, no seu ponto de vista aquele fato compensava todo o resto.
Beatrice trabalhava o dia todo e tinha um amor pelos livros que Gavin não compreendia, além de ser tão... diferente do resto das pessoas da cidade. Isso para não falar estranha.
Para Gavin, havia coisas melhores na vida do que ficar se matando de tanto trabalhar e virar páginas e mais páginas de um livro qualquer. Eram atividades cansativas e entediantes.
"De todo modo", recomeçou Leif, trazendo mais duas canecas de cerveja, "Beatrice provavelmente vai ficar um tempo sem dar as caras por aqui. Todos os jornais locais já estão anunciando que, se essa tempestade continuar, as estradas do interior ficarão interditadas. Ela ainda está na mansão, por causa de toda a coisa dos lobos, você sabe, e pelo jeito ficará presa lá por um bom tempo."
Ao ouvir aquilo, Gavin teve vontade de socar a mesa.
Agarrando sua caneca de cerveja, ele dirigiu-se até uma mesa afastada, com Leif aos calcanhares.
A alegria que antes tomava conta do bar parecia ter morrido naquele instante.
"Ela não pode ficar presa lá", disse Gavin, assim que os dois se sentaram na mesinha redonda. "Isso atrapalharia completamente os meus planos!"
"Então realmente não desistiu dela?", perguntou Leif, quase como se estivesse decepcionado.
"É claro que não", rebateu Gavin, dando um tapa na cabeça dele. Como podia ser tão idiota? "Beatrice vai se apaixonar loucamente por mim, isso eu garanto."
"Você está obcecado por Beatrice justamente por ela ter sido a primeira garota a te rejeitar, sabia?", disse Leif, desenhando círculos imaginários na mesa. Assim que percebeu a bobagem que havia dito, levantou as mãos para o ar em resposta ao olhar gélido de Gavin. "Desculpe. Esqueça que eu disse isso."
"Seja como for, essa tempestade vai atrapalhar tudo", falou Gavin, bebendo um gole de sua cerveja. "Pretendia visitá-la amanhã."
Gavin lembrou-se das informações que havia arrancado de Marco Morgan naquele dia mais cedo, quando fora até sua loja no centro da cidade.
Beatrice, aparentemente, tinha surtado de vez e decidido dar uma volta pelas colinas ao redor de Roseville, com o inverno se aproximando e cheio de lobos famintos nas redondezas.
Aparentemente, ela não tinha muita noção de perigo.
Resultado? Ela fora perseguida por lobos. Algo que realmente poderia tê-la matado se não tivesse conseguido chegar a um lugar seguro primeiro.
Na correria, ela acabou batendo a cabeça e ganhando uma concussão que a manteria em repouso absoluto por cinco dias inteiros.
Ela não pôde voltar para a casa, mas Gavin soube por intermédio de Marco que o dono da enorme mansão nas redondezas de Roseville tinha deixado claro que ela poderia ficar na casa quanto tempo precisasse.
"Sabe, desde o momento em que Marco mencionou o dono da mansão notei algo estranho", sussurrou Gavin para Leif, que se inclinou para ele.
"Hein? O dono da mansão? Bem, Marco só deve estar preocupado com a filha", Leif disse, tamborilando os dedos na mesa. "Mas, sinceramente? Qualquer pessoa que more em um palácio daquele tamanho em um lugar isolado como esse é meio estranho mesmo. Marco deve estar apreensivo, só isso."
"Meio estranho e podre de rico", observou Gavin. "Sabemos que o lugar recebia visitas frequentes de seus donos em alguns verões, mas ninguém mora lá de verdade há um tempão."
"Vai ver a família decidiu desfrutar de vez a paz do interior."
"Não sei...", falou Gavin, a cabeça dando nós. "Sabe como as pessoas daqui são, descobrem tudo e transformam em fofoca em menos de dois segundos. Porém, até agora, ninguém soube nada a respeito da pessoa que está morando na casa, e nem vimos o rosto de ninguém por aqui. Quer dizer, a cidade mais próxima da mansão, além de Roseville, fica há cinquenta quilômetros. Não é possível que eles não tenham vindo até aqui ainda." Gavin inclinou-se mais o amigo, sussurrando: "Soube que a casa está ocupada há mais ou menos dois anos."
"Com o dinheiro que eles provavelmente têm, o mais certo é que mandem empregados até aqui para cuidarem de suas necessidades", opinou Leif.
"Marco disse que é amigo de uma mulher que trabalha na casa", Gavin contou. "Mas falou que ela sempre foi muito reservada na questão de seu emprego, e sempre disse apenas que era ajudante do cozinheiro da mansão."
"Você pelo menos descobriu o nome do dono?", perguntou Leif.
"Frederick Harris, foi o que Marco disse. Mas ele falou outra coisa...", nesse momento um sorrisinho surgiu nos lábios de Gavin. Leif demonstrou sua curiosidade abrindo bastante os olhos, que mais pareceram bolas de golfe.
"Diga logo!"
"Demorou um pouco para puxar a língua de Marco, mas ele acabou contando coisas interessantes a respeito desse tal Frederick." Gavin bebeu um gole de sua cerveja, divertindo-se com a expressão desesperada de Leif para saber mais detalhes. "Ele disse que o dono da mansão parece ser jovem, não muito mais que vinte anos, e, pelo pouco que falou, deu a entender que Frederick era o único regendo a casa."
"Nossa, que interessante...", ironizou Leif, revirando os olhos e recostando-se de novo na cadeira.
"Cale a boca, eu ainda não terminei", Gavin disse rispidamente, fechando a cara. "Não passa por essa sua cabeça oca que é no mínimo estranho alguém dessa idade morar sozinho na casa, além de regê-la?" Leif pareceu pensar a respeito. "Claro que ele pode ter herdado a casa, ou sei-lá-o-que, mas é óbvio que há um motivo pelo qual um rapaz de vinte e poucos anos se isolou em um lugar como esse, mesmo em uma casa luxuosa como aquela."
"Bem, talvez", comentou Leif, dando de ombros. "Mas nós não sabemos o motivo."
"Você é quem pensa", disse Gavin, abrindo ainda mais o sorriso. "Não vai acreditar, mas Marco contou que o cara é completamente desfigurado, tem cicatrizes horrendas e mais parece um monstro."
Leif ergueu as sobrancelhas. Duvidava muito que alguém amável como Marco tivesse usado exatamente aquelas palavras sobre quem quer que seja, mas decidiu não comentar.
"Bem, temos aí o motivo por ele ter se escondido aqui então, sem nem ao menos sair da casa", falou Leif, não muito interessado. "O que eu não entendo é o que exatamente você tem a ver com isso."
"Você não entende?", perguntou Gavin, olhando para o amigo como se ele fosse uma anta. "Beatrice vai ficar presa naquela casa luxuosa, com um cara quase da sua idade e podre de rico por não sei quanto tempo! Isso é obviamente um risco as chances que eu ainda tenho com ela."
"Você também é rico Gavin, mora em uma casa luxuosa, tem quase a mesma idade de Beatrice e é bonito. Para ser sincero, se ela realmente se apegasse a alguma dessas coisas, já estaria com você." Gavin o fitou com raiva. "Veja bem", recomeçou, tentando apaziguar a situação. "Você mesmo acabou de dizer que o tal Frederick é desfigurado e mais parece um monstro. Em minha opinião, ela nem vai olhar para ele uma segunda vez."
"E você acha que eu vou apostar para ver?", perguntou Gavin. "Beatrice vai ficar comigo uma hora ou outra, mas não quero arriscar que acabe... se apaixonando por aí."
Enquanto Beatrice estava em Roseville, sempre trabalhando ou ficando em casa, outros garotos não tinham tanta oportunidade de tentar algo com ela, principalmente por saberem do interesse de Gavin nela. Motivo suficiente para mantê-los longe.
Mas agora Beatrice não estava ao alcance de sua vista, e qualquer coisa poderia acontecer.
"Bem, Gavin, sinto muito ser eu a lhe dizer isso", falou Leif, despertando-o dos devaneios, "mas a não ser que você contrate um helicóptero e vá tirar Beatrice de lá, ela continuará na mansão até a neve derreter."
"Eu sei disso", admitiu com um suspiro cansado. "Mas isso não me impede de descobrir um pouco mais sobre Frederick Harris. Talvez uma informação ou outra seja útil no fim das contas." Gavin se inclinou para o amigo, estreitando os olhos. "Esse cara cheira problema, e algo nessa história parece errado. Minha intuição me diz para investigar."
"Então faça isso", disse Leif com um suspiro derrotado, mais para agradá-lo do que qualquer outra coisa.
"Beatrice será minha, vai ver", declarou Gavin com um sorriso satisfeito, colocando os braços por trás da cabeça e relaxando na cadeira. "Não será uma fera qualquer que acabará com as minhas chances."
"Talvez você esteja sendo um pouco paranoico", opinou Leif. "Sabe que Beatrice não vai resistir a você por muito tempo. É só aguardar e ter paciência, além de tentar ser, quem sabe, um pouco mais gentil quando ela voltar."
"Desculpe querido amigo", falou Gavin, soltando uma risada. "Paciência não é uma das minhas muitas qualidades, e gentileza... Bem, essa com certeza não está no topo da lista."
___________________♡__________________
Oiii galera! Tudo bem com vocês? Mais um capítulo fresquinho❤ (quem diria que eu estou cumprindo o cronograma né kkkkk)
Me falem o que acharam desse capítulo! Eu amei TANTO escrever kkkkk, me diverti super. O que acham dessa versão moderna do Gaston? E do LeFou ?
Essa semana pretendo postar um capítulo extra na sexta, mas vai depender dos votos que tivermos aqui até lá, que tal?❤
Muitos beijinhos,
Ceci.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top