• Capítulo 3 •
De uma das sacadas da ala oeste, Adrien Fletcher sentia o vento frio da noite batendo no rosto, enquanto observava o carro preto se afastar da mansão.
Lá no fundo, ele esperava que o médico da cidade tivesse liberando a garota para voltar para casa naquela mesma noite, mas Adrien viu quando Beatrice Morgan entrou pelos portões de ferro da sua propriedade e bateu a cabeça no chão, desmaiando logo em seguida. Havia sido uma queda feia e ela estava desacordada desde então.
Ao que parecia, na última hora, a garota finalmente havia acordado. Isso explicava o motivo do motorista estar dirigindo àquela hora até Roseville.
Adrien voltou para o quarto - se é que ainda podia chamar aquele lugar de quarto e não de covil - quando o carro desapareceu de sua vista, escondido pela infinidade de colinas que havia naquele lugar. Pelo jeito, estaria acordado quando os primeiros raios de sol surgissem no horizonte. Depois do dia que tivera seria impossível pregar os olhos um minuto sequer.
Ele ainda não tinha fechado as portas que levavam à sacada, quando ouviu uma batida suave na porta do quarto, quase que hesitante.
"Entre", Adrien disse em tom baixo, mas perfeitamente audível no silêncio que tomava conta da mansão.
As antigas portas do quarto rangeram ao abrir. Estreitando os olhos, Adrien enxergou o rosto magro de Luke Lemaire surgir.
Devagar, o mordomo entrou no quarto.
"Senhor, Sra. Sandoval mandou avisar que Dr. Davey e o pai da garota já foram embora", ele disse olhando para o chão, para as paredes, ou qualquer outra coisa que não fosse o rosto de Adrien.
"E ela?", perguntou simplesmente. Era aquela a parte que o preocupava.
"Dr. Davey confirmou as suspeitas. Beatrice deve ficar em repouso absoluto pelos próximos cinco dias. O pai dela queria falar com o senhor uma última vez, para se certificar que não haveria problema em ela ficar hospedada aqui. Informei que o senhor já havia se deitado."
Adrien assentiu, satisfeito.
"Ótimo." Ele caminhou até sua cama, tentando pensar no que deveria fazer a seguir.
Não poderia mandar a garota de volta para casa, a única chance que ela tinha de se recuperar totalmente da concussão era ficar ali por mais alguns dias. Adrien, por mais que odiasse terrivelmente aquele fato, não podia fazer nada em relação a isso.
"Quero que informe toda a criadagem bem cedo sobre a garota", Adrien falou por fim. "Ela deve ser tratada muito bem enquanto estiver aqui." Talvez assim se recupere mais rápido, pensou ele, consequentemente indo embora mais rápido também.
"Sim, senhor", disse Luke, com seu costumeiro sotaque francês carregado. "Ela deve continuar hospedada na mesma suíte no primeiro andar?"
"Sim", Adrien respondeu de imediato. Quanto mais longe ela ficasse dele melhor. "A não ser que ela prefira outro quarto, deixe-a onde está."
Luke continuou parado no meio do quarto, olhando para os pés de Adrien.
"O que está esperando?", perguntou impaciente, sua voz saindo mais como um rugido nervoso. "Saia."
"S-sim, senhor", o homem gaguejou, virando-se imediatamente e deixando o quarto como o diabo que foge da cruz.
Quando ficou sozinho Adrien suspirou, sentando-se na cama e escondendo o rosto nas mãos.
Por três anos não havia sido visto por ninguém além de seus pais, médicos e criados. Porém, em um único dia, uma garota aparentemente sem muitos miolos na cabeça, foi perseguida por lobos e atirou-se ao seu portão, seguindo-se pela visita de um médico chamado às pressas e um pai desesperado.
Quando pegou a garota - até então desconhecida - nos braços e a levou para dentro, com os lobos furiosos ainda rugindo ao seu portão, seu maior medo não foi que ela estivesse com um problema mais sério do que um simples desmaio, ou que os lobos encontrassem um modo de atravessar os portões. O maior medo de Adrien foi que ela acordasse naquele instante, o visse e acabasse desmaiando de novo, ou saindo correndo e gritando.
Ele bem sabia que aquilo era capaz de acontecer.
Quando mandou chamar o médico em Roseville e Samantha Sandoval - a principal responsável pelas cozinhas da casa - afirmou conhecer o pai da garota, Adrien achou que pudesse se refugiar na ala oeste e deixar com que os criados cuidassem de toda a situação. Mas claro que não foi aquilo que aconteceu.
Marco Morgan insistiu para falar com ele, para agradecer pessoalmente por ter... Como era mesmo? Salvado a vida de sua filha? Seja como for, Adrien - por mais que não quisesse e tivesse quebrado um ou dois jarros de porcelana pela frustração que aquilo lhe causou - teve que se apresentar na própria sala de visita no primeiro andar.
É claro que os dois homens tentaram disfarçar o horror quando o viram, sorriram e apertaram sua mão, sempre tendo o cuidado de não encará-lo diretamente.
Adrien conhecia aquela reação e não queria que ela tivesse lhe irritado tanto quanto irritou. Desde o acidente que o desfigurara, as coisas eram daquele jeito. Por mais que tentasse dizer para si mesmo que não se importava, a mentira era tão falsa que ninguém - nem mesmo ele- acreditaria nela.
Deitando-se na cama, Adrien observou o céu pelas portas de vidro da sacada. Aos poucos ele assumia cores mais claras, tingindo o horizonte com um brilho dourado.
Relembrando a tarde que tivera, Adrien lembrou-se do momento em que Marco Morgan perguntou qual era seu nome.
"Frederick", respondeu de imediato, a mentira saindo tão facilmente que até mesmo ele se surpreendeu. "Frederick Harris."
Um ano depois do acidente, quando sua primeira tentativa de uma cirurgia plástica deu terrivelmente errado, Adrien decidiu sumir do mapa.
A mídia ainda estava enlouquecida. Nem uma foto havia sido divulgada dele desde o dia do acidente, e apesar das afirmativas do seu pai para os veículos de comunicação que ele estava vivo e bem, todos começaram a fazer teorias bizarras sobre o motivo pelo qual Adrien Fletcher tinha desaparecido.
Era uma loucura sem fim.
Ele não queria ser visto por mais ninguém - muito menos pela mídia internacional - daquele jeito. Sua vida tinha acabado no momento em que o carro saíra da pista e ele acordara no hospital dias depois, com o rosto enfaixado e aparelhos lhe mantendo vivo.
A mansão que havia ganhado do seu pai no seu aniversário de 18 anos acabara mostrando alguma utilidade.
Assim que conseguiu organizar tudo, Adrien se mudou para aquele lugar isolado, levando consigo metade da criadagem que trabalhava para os Fletcher desde que ele nascera. Os criados assinaram contratos para que nunca contassem a ninguém para quem realmente trabalhavam, além de morarem na mansão desde então.
Frederick Harris era o nome que Adrien adotara, na esperança de despistar as pessoas e a mídia, continuando às escondidas.
Era assim que tinha de ser. Não havia outro jeito.
Para Marco Morgan e Dr. Davey, Adrien seria Frederick, e se caso acabassem abrindo a boca e contando para alguém em Roseville sobre o homem desfigurado que vivia na antiga mansão nas colinas, ninguém relacionaria uma coisa à outra.
Enquanto observava o sol nascer, o único problema que Adrien ainda tinha era Beatrice.
Talvez, conseguisse fugir do seu olhar pelo tempo em que ela ficaria ali. Cinco dias era pouco tempo, passariam sem que ele pudesse ver, embora a ideia de que teria que se esconder na sua própria casa - o lugar que na verdade deveria ser seu refúgio para se esconder das pessoas lá fora - não agradasse Adrien nem um pouco.
Depois da monotonia constante que havia sido os dois anos que passara naquela casa que se tornara sua prisão, Adrien via uma agitação indesejada tomar conta de tudo. Ele só esperava sair ileso daquilo, deixando as coisas como elas sempre foram desde o acidente.
Na verdade, Adrien nem mesmo conseguia imaginar um novo jeito de viver senão aquele que, amargamente, havia se habituado.
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Oii gente! Capítulo novinho para vocês <3
Então, como ficou combinado, montei o cronograma de postagens para esse livro. Todas as quartas e domingos haverá postagem, além de - quem sabe - uma semana com um capítulo extra em algum dia aleatório.
Espero que tenham gostado, pois tentei atender um pouquinho todos os pedidos. E também, por aviso dos meus leitores de Portugal, os capítulos vão sair mais cedo por causa do fuso horário. <3
Quero muito saber o que vocês estão achando do livro e desse capítulo em si! O que acharam desse ~ novo ~ Adrien? Estão encontrando as semelhanças e diferenças com a história clássica? E, o mais importante, estão gostando? Críticas construtivas são sempre bem vindas, e eu procuro sempre dedicar um capítulo para aqueles leitores que sempre estão por aqui. Sem vocês nada disso seria possível!
Mil beijos e até domingo!
Ceci.
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