• Capítulo 21 •
Do seu quarto na ala oeste, Adrien observava as nuvens transformarem o céu azul em um cinza chumbo, frio e sombrio. O tempo, que amanhecera tão caloroso algumas horas mais cedo, tinha se transformado tão rapidamente quanto o seu humor.
Adrien não queria sair do quarto, não queria dar as caras. Pelo menos não por enquanto.
Era estúpido o modo como ele estava se sentindo, mas sabia que, se andasse pelos corredores da casa, sentiria ainda mais a falta de Beatrice. A presença dela tinha se tornado peça fundamental na mansão e em sua vida, e saber que ela não estava mais ali era devastador.
Adrien Fletcher se perguntava se algum dia viveria um mês tão maravilhoso como aquele que havia passado.
Atrás de si, com um rangido quase nulo, ele ouviu a porta se abrir. Passos hesitantes se aproximaram.
"Não batem mais antes de entrar?", ele perguntou para os criados, mas sua voz não tinha o tom ríspido que era costumeiro quando ficava irritado, ao invés disso, as palavras foram ditas como se ele realmente não se importasse o que os criados faziam ou deixavam de fazer. Poderia soar dramático, mas pouca coisa importava para Adrien naquele momento.
"Nós batemos", a voz de Luke disse. "Mas você não pareceu ouvir."
Adrien suspirou. Tinha que manter sua cabeça no lugar.
"O que querem?", perguntou, dessa vez se virando para os três, que estavam parados perto da sua cama com os rostos abatidos.
"Queríamos... conversar", foi Samantha quem falou, torcendo as mãos em visível apreensão. "Adrien..."
"Eu só quero ficar sozinho agora", ele disse a interrompendo, voltando o olhar para os jardins brancos lá fora. E sussurrando completou: "Por favor."
Mas Adrien não ouviu os passos deles se afastarem, ao invés disso sentiu uma mão quente e reconfortante apertar seu braço.
"Samantha...", tentou objetar, mas ela não se afastou e fez com que ele olhasse para ela.
"Beatrice gosta de você, Adrien", ela disse, com tanta certeza na voz que ele não teve outra alternativa senão acreditar. "É claro que precisava voltar para a casa, mas sei que ela não vai deixar o que vocês têm se perder."
"Eu só...", as palavras se perderam, Adrien não sabia o que dizer. O aperto em seu peito era esmagador, e a garganta parecia estar completamente fechada. "Sabia que ela teria que voltar em algum momento, nós até fizemos planos para a primavera e... Não sei. Acho que me apeguei a ela mais do que deveria."
Admitir aquilo em voz alta só fez com que as emoções ficassem ainda mais fortes. Adrien ainda não era capaz de desvendar o que exatamente Beatrice causara nele.
"Mas isso não é algo ruim", outra voz disse. Howard se aproximou. "Tudo o que aconteceu... Sei que não se arrepende."
E Adrien realmente não se arrependia. Talvez, exceto ter demorado tanto para se apresentar para ela no início. Deveria ter se agarrado a cada momento com Beatrice Morgan, desfrutado cada um deles, mas antes não fazia ideia do quanto ela viria a ser importante em sua vida.
"Por que não disse para ela?", Luke indagou, fazendo a pergunta que todos queriam ter feito desde o aniversário de Beatrice. "Por que não olhou nos olhos dela e disse como ela o faz sentir?"
O silêncio pairou no quarto frio por um instante, até Adrien ter coragem de erguer os olhos para o amigo e responder:
"Tive medo", falou, as palavras reverberando em seu peito. "Tive medo de falar naquela noite e em todas as outras oportunidades que se seguiram. Tive medo de estar confundindo tudo, Luke. Tive medo de ela não me querer do modo como eu a quero. É irônico, suponho, que na minha outra vida nunca tenha temido tanto um mulher, mas temo Beatrice. Mas, mais do que qualquer outra coisa, temi perdê-la."
Adrien sentiu Samantha apertar seu braço, e aquilo foi o encorajamento que precisava para continuar. Ele sabia que, se não dissesse tudo aquilo que passava por sua cabeça desde que Beatrice fora embora, nunca mais dormiria à noite, refém dos próprios pensamentos.
"Fui um tolo e tive medo que Beatrice não gostasse de mim pela minha aparência, por todo esse maldito tempo. Mas agora isso parece ridículo. Na maior parte das vezes, quando estamos juntos e ela me olha, é como se eu nem me lembrasse dessas cicatrizes, é como se elas não fossem importantes." Ele olhou para seus criados, aqueles que sempre estiveram ao seu lado, mesmo quando era um monstro com eles. "Beatrice não é desse jeito, nunca foi e eu só percebi isso agora. Algo tão claro como água. O que aconteceu comigo depois do acidente... não é importante. Nada vai mudar se eu não mudar. Ela me fez ver isso, ela me fez enxergar tudo por uma nova perspectiva. Por isso não vou fazer outra cirurgia, não vou arriscar a vida que posso ter só para conseguir de novo o que era mais precioso para mim antes. Porque não é importante." Os olhos de Samantha brilhavam como duas chamas vivas, e ela parecia tão aliviada por ouvir aquelas palavras que Adrien a viu vacilar ligeiramente. "Se vou ser assim para sempre, que seja. Há coisas que valem mais à pena. Não quero que fiquem presos aqui por minha causa, e eu também não vou ficar, não por muito tempo. Mesmo antes de ela entrar naquele carro hoje de manhã e voltar para Roseville, eu já tinha decidido. Não vou mais me esconder, Samantha, não vou ficar preso nessa mansão escura vendo a vida passar pela janela. Eu nunca fui assim e cansei de deixar com que essas cicatrizes ditem como vou passar o resto dos meus dias."
Quando sentiu Samantha lhe abraçar, não teve outra alternativa que não fosse retribuir. Por mais que não gostasse de contato físico, tinha que admitir que ela merecia aquilo. Samantha Sandoval havia sido sua segunda mãe por vinte e um anos.
"Tudo vai dar certo para você", ela disse alguns segundos depois, enquanto enxugava as lágrimas e segurava o rosto de Adrien entre as mãos. "Eu sei disso."
"Senhor, se me permite dizer", começou Howard, que embora tentasse disfarçar, também estava claramente emocionado, "não deveria perder mais nenhum segundo."
"Uma garota como Beatrice não se acha duas vezes, eu já disse isso", reforçou Luke, sorrindo. "Adrien, não a deixe escapar."
"Não vou deixar", ele sussurrou. "Nunca. Eu a amo."
Assim que as palavras saíram, foi como se uma torrente de emoções invadisse seu corpo, fazendo com que Adrien Fletcher se sentisse nas nuvens.
Como tinha conseguido esconder aquilo de si próprio por tanto tempo?
Ele amava Beatrice Morgan. Amava como nunca havia amado ninguém antes. Amava com todo o amor que julgava possuir, com todo o seu quebrado e por muito tempo gelado coração.
"Adrien?", Samantha chamou com um meio sorriso encorajador. "Vá atrás dela."
E quando o rosto de Beatrice surgiu em sua mente, clareando até a mais sombria das dúvidas, Adrien sorriu para os três criados e correu até a porta do quarto.
"Então está total, perfeito e inquestionavelmente bem?"
"Mas é claro que estou!", Marco Morgan exclamou. "Por qual motivo não estaria?"
Em sua mente, Beatrice fez uma anotação mental de nunca ter uma arma por perto quando visse Gavin, caso contrário seria capaz de matá-lo.
Andando de um lado para o outro na pequena cozinha da casa que crescera, ela tentava manter sua cabeça no lugar ao mesmo tempo em que tranquilizava um pai aflito e contente por vê-la retornar de surpresa para a casa.
"Gavin me ligou mais cedo, disse que não tinha certeza se o senhor estava bem, que parecia abatido ou algo assim", contou. "Aproveitei as estradas seguras e voltei. Desculpe por parecer tão desesperada."
Uma hora mais cedo, Beatrice tinha retornado da mansão de Frederick e parado na loja do pai, praticamente o arrastando para a casa, obrigando-o a fechar o estabelecimento naquela manhã. Bea só começou a falar quando os dois entraram em casa, servidos de duas grandes e fumegantes xícaras de chá que ela mesma preparou. Porém, agora, tudo o que queria era quebrar aquela linda porcelana na cabeça de Gavin.
Atormentá-la para que voltasse o mais rapidamente para casa era uma coisa, mas colocar seu pai naquilo era ridículo e desesperador.
Beatrice Morgan se considerava uma pessoa pacífica, mas tudo o que desejava naquele momento era esbofetear a perfeita cara mentirosa de Gavin.
"Ele fez isso?", ouviu o pai perguntar atônito. "Só pode estar brincando..."
"Quem dera se estivesse", Bea falou, ainda andando de um lado para o outro. Ali dentro, o ar era quente e o aroma adocicado que sempre tomara conta da casa lhe invadia, fazendo com que se sentisse ao mesmo tempo segura e melancólica. Nunca tinha passado tanto tempo fora daquela casinha. "Gavin está passando completamente dos limites", completou, tentando alimentar sua raiva para quando o visse. Se Deus fosse bom, interviria e não deixaria com que Gavin ligasse para ela, caso contrário era capaz de gritar com ele por uma hora a fio.
"Bea, você pode fazer o favor de se sentar? Desse jeito vai acabar cavando um buraco no chão."
Beatrice suspirou e parou no lugar. Seu pai tinha razão, tinha que se acalmar.
Quando desabou na cadeira de madeira, foi como se todas as exaustões de Bea a invadissem. De repente, não conseguia parar de pensar em Frederick, na despedida e em como estava arrependida por não ter tido um pouco mais de coragem e lhe beijado ali mesmo, no meio da neve e com o motorista que a levaria de volta para Roseville os olhando. Agora, não saberia quando o veria de novo, e sendo praticamente obrigada a sair da casa dele daquele jeito pelas mentiras de Gavin, tudo havia se tornado pior.
"Filha, tem algo errado e você não quer me contar o que é", ela ouviu a voz do pai dizer naquele instante, e quando ergueu os olhos para encarar o homem já velho e cansado que se encontrava a sua frente, seu coração apertou.
Já vinha escondendo tantas coisas dele... Não parecia justo privar-lhe de mais uma.
"As coisas tomaram proporções maiores do que eu imaginava", ela sussurrou, sem conseguir encarar os olhos castanhos do pai.
"O que quer dizer com isso?"
"Bem... Eu..." Ela sentiu suas bochechas corarem. Droga, não conseguia falar sobre aquilo com ele, mas sentia que se não contasse o que lhe sufocava naquele momento, acabaria explodindo.
"Beatrice?", ele incitou, naquele tom de voz que era impossível de ignorar.
"Acho que Frederick Harris se tornou mais do que apenas um amigo para mim, papai", soltou de uma vez, ao mesmo tempo envergonhada e aliviada por ter dito as palavras. "Despedi-me dele de um jeito tão rápido e repentino que... Eu nem consegui..."
"Espere um pouco", Marco pediu, balançando a cabeça. "Está me dizendo que você e Frederick..."
"Não!", ela respondeu de imediato, sentindo as pontas das orelhas pegarem fogo. "Eu não..."
Ele ergueu uma sobrancelha para ela, com nada menos do que um pequeno sorriso no canto dos lábios. Beatrice entendeu aquilo como uma permissão para continuar.
"No início eu não tinha uma opinião muito boa sobre ele, confesso. Quer dizer, que pessoa no mundo seria tão insensível e grosseira ao ponto de ficar uma semana sem se apresentar para um convidado dentro da sua própria casa? Além disso, não foi como se ele fosse a pessoa mais simpática do mundo depois daquele jantar horrível...", as lembranças da noite em que conheceu Frederick lhe voltaram a mente, agora, parecendo quase cômicas. Eles mal se suportavam. "Mas depois... Puxa, ele me deu uma biblioteca! Não é como se eu pudesse resistir a isso..."
"Espere um pouco, ele..."
Mas Beatrice não conseguia parar de falar, de repente como se estivesse ligada no modo automático.
"E, puxa papai, ele é o homem mais inteligente que eu já conheci! Tudo bem que isso não é lá muito difícil, já que vivi a vida inteira em Roseville, mas ele sabe falar de Shakespeare comigo como as pessoas falam de um dia ensolarado ou nublado. Sei que não deveria ter mantido todos os detalhes ocultos do senhor, mas é que, a cada dia, foi como se Frederick me surpreendesse mais e mais, deixando-me completamente sem fôlego." Beatrice riu ao se lembrar do dia em que ele lhe mostrara o jardim de inverno, tão lindo e encantador. Caramba, que homem no mundo fazia as coisas que ele fazia para ela? A sensação era tão boa que Beatrice queria gargalhar e sair dançando com o pai pela casa. "Eu não sei como aconteceu, aos poucos sem dúvida, mas, silenciosamente e sem que eu percebesse, me apaixonei por ele. Completamente."
A sensação que tomou conta dela quando disse em voz alta foi tão boa quanto na vez em que revelou seus sentimentos para Eliza, na noite do seu aniversário.
"É claro que já tive interesse em alguns rapazes daqui, o senhor mesmo sabe, mas com ele...", Beatrice balançou a cabeça, sorrindo. "Nunca senti isso por ninguém. Acho que é por isso que estou tão brava por Gavin ter feito o que fez. É claro que eu poderia ter voltado hoje mesmo se tivesse descoberto sobre as estradas, mas, talvez, poderia ter contado o que sinto para Frederick. Com calma."
Seu pai ficou em silêncio por longos instantes, tão longos que Beatrice se sentiu desconcertada. Talvez tenha falado demais, como sempre costumava fazer.
"Bem, você realmente gosta dele. Dá para ver em seus olhos", foi a primeira coisa que seu pai disse, fazendo com que Beatrice soltasse um grande e sonoro suspiro de alívio. "E se você se sente como diz se sentir, não deveria ter saído daquela casa antes de contar para ele, Beatrice. Apesar de estar perto, você não sabe quando o verá pessoalmente de novo."
Beatrice sabia daquilo, sabia mesmo, mas ouvir da boca de outra pessoa só tornou tudo ainda pior.
"Acho que tive medo de ele não sentir o mesmo", admitiu, dando de ombros. "Mas isso parece improvável de algum modo. Seus gestos, o que ele fez por mim... Papai, ou estou loucamente apaixonada e cega, ou Frederick pode gostar de mim tanto quanto eu gosto dele."
Marco sorriu, segurando a mão da filha.
"Bea, você é realmente filha da sua mãe." Seus olhos continham uma emoção tão profunda e verdadeira que Beatrice quis abraçar o pai e reconfortá-lo. Ela bem sabia como ele amara sua mãe; estava no som de suas palavras quando falava dela, no brilho dos seus olhos quando encarava suas fotos, e, principalmente, no amor que ele tinha com Bea, sua lembrança viva da mulher que amara. "Que homem em sã consciência não se apaixonaria por você, filha?"
Bea sorriu, tentando evitar derramar lágrimas.
"O senhor diz isso porque é meu pai."
"Justamente", ele concordou. "Por isso tenho certeza disso, porque te conheço melhor do que qualquer outra pessoa."
Beatrice se debruçou sobre a pequena mesa da cozinha, agarrando o pescoço do pai e lhe dando um abraço forte e apertado, como sempre fazia quando precisava de consolo.
"Beatrice", ele chamou quando ela se afastou, prendendo uma mecha do seu cabelo atrás da orelha. "Eu espero que ele seja um bom homem."
O olhar atento do pai fez Bea rir. É claro que ele teria aquela preocupação, não tinha passado tanto tempo com Frederick quanto ela.
"Oh, ele é sim", falou, com um aceno. "Tem seus problemas e defeitos, como todos nós, mas isso não me intimida." Bea sorriu consigo mesma, desejando profundamente estar com Frederick naquele momento. "Papai, eu amo ele. O senhor sabe que não distribuo amor para qualquer pessoa."
Beatrice sentiu os olhos marejar. Céus, ela amava Frederick! Amava sim, completamente e com cada pedacinho do seu coração. O amava e queria ficar com ele, sem perder nem mais um segundo.
Então seu pai sorriu, apertando a mão da filha em um gesto que dizia claramente que confiava em seu julgamento. E aquilo significou para ela mais do que poderia explicar.
Naquele momento, quando já abria a boca para contar mais de Frederick para o pai, Beatrice ouviu batidas frenéticas vindas da porta de entrada.
"Está esperando alguém?", ela perguntou para o pai, já se levantando.
"Não. Esqueceu que você me arrastou da loja há uma hora?"
Beatrice abriu um sorrisinho, revirando os olhos.
"Tem razão. Aliás, desculpe por isso."
As batidas continuavam, de modo que Beatrice franziu as sobrancelhas e correu pela pequena sala de estar para chegar à porta da frente.
Quando ela a abriu, com um pequeno sorriso no rosto, sentiu todo o bom humor que tomava conta dela naquele momento se evaporar.
"Beatrice. É bom ver você."
Gavin estava parado em sua porta, os olhos verdes lhe analisando como um abutre ao redor de uma carcaça. Ele parecia um pouco diferente desde a última vez que o vira, ainda inquestionavelmente bonito, porém com um ar meio estranho que a assustou ligeiramente, antes de recordar do que havia acontecido e a raiva inflar seu peito. A barba dele estava por fazer, e os cabelos negros, sempre impecáveis, estavam desalinhados. De um modo geral, continuava tão detestável como um mês antes.
Com um profundo suspiro, Beatrice atravessou o batente da porta e a fechou atrás de si, fazendo com que os dois ficassem parados nos degraus de entrada. Por sorte, a neve tinha cedido naquela manhã, por mais que o céu estivesse escuro e tempestuoso.
"Você ficou maluco?", ela perguntou em tom baixo, para que o pai não precisasse ouvir, nem a pacata vizinhança. "Como tem coragem de aparecer na porta da minha casa depois de mentir para mim?"
"Mentir?", ele perguntou, fingindo inocência. Beatrice fechou as mãos em punhos. "Do que está falando?"
"Do que estou falando?", repetiu ela, completamente indignada. "Por que me ligou hoje mais cedo dizendo que o meu pai parecia mal sendo que ele está absolutamente bem? Tem ideia do quanto eu fiquei desesperada?"
"Bem, ele realmente parecia um pouco mal. Pelo menos para mim", Gavin disse, erguendo as mãos para o alto como se quisesse mostrar que era inocente. Um sorriso surgiu em seus lábios. "Mas o importante é que você está em casa agora."
Ele se inclinou para ela, fazendo com que Bea recuasse e batesse na porta. Gavin, porém, pareceu não perceber seu gesto. Quando se aproximou mais, Beatrice colocou as mãos abertas em seu peito - que mais parecia uma parede de tijolos - e o empurrou para trás.
O seu esforço não provocou muita coisa, mas fez com que ele descesse outro degrau e olhasse para ela com os olhos faiscantes.
"Já chega, Gavin", ela disse, agora em tom mais alto. "Eu tentei de todas as maneiras possíveis ser delicada com você, mas agora chega." Ela olhou fundo nos olhos dele, grata por poder olhá-lo do alto. "Eu nunca, nem em mil anos, vou ficar com você. Não precisa me procurar, nem mandar mensagens, nem ligar ou qualquer outra coisa, porque não vai funcionar, ok? Chega."
Ela não devia, mas ficou profundamente satisfeita quando viu a fúria e a indignação ascender naqueles olhos verdes. Beatrice sabia que, agora, tinha sido profundamente clara. Se ele não quisesse entender, tudo o que receberia era o silêncio constante da parte dela.
Leve por ter dado um fim naquilo, Beatrice se virou para entrar novamente em casa. Quando ergueu o braço para girar a maçaneta, sentiu uma mão forte e dura puxá-la de volta, fazendo com que se desequilibrasse e voltasse para sua posição inicial.
"O que está fazendo?", sibilou, vendo a mão de Gavin agarrada ao seu pulso, já deixando uma baita mancha vermelha na pele clara dela.
"Isso tem a ver com ele, não tem?", ela ouviu a voz de Gavin dizer, e quando olhou para ele sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Não havia nada em seus olhos, sua expressão era dura como pedra. De repente Beatrice se viu tremendo, mas não por causa do frio.
"Do que você está falando?", ela perguntou, tentando se soltar, mas seu aperto era de aço.
"Dele. O monstro desfigurado com quem você passou o último mês." As palavras feriram Beatrice como facas quentes. Como ele... "Vamos Beatrice, diga logo!"
"Como..." Ela queria perguntar como ele sabia sobre Frederick e sua condição, mas de repente percebeu que aquilo não era nem um pouco importante. Não agora. "Gavin, você está tão profundamente errado que eu tenho vontade de rir", ela sibilou, com toda a raiva que era capaz de sentir. "Nem se você fosse o último homem desse mundo eu ficaria com você. Você nunca nem foi uma opção."
Então ela sentiu seu outro braço ser agarrado, mas estava com tanta raiva e nojo de Gavin que pareceu nem sentir a dor.
"Mas, se quer mesmo saber, eu realmente gosto de Frederick, e antes que diga que ele é um monstro, deveria se olhar no espelho antes. Talvez assim enxergue o que eu vejo."
Antes que pudesse piscar, Gavin pressionava seu corpo contra a porta. Desesperada, Beatrice olhou para a ruazinha coberta de neve, mas não havia ninguém, e todas as janelas das casas estavam fechadas por causa do frio.
Bastava ela gritar. Bastava ela gritar e todos viriam.
"Você está louca", a voz de Gavin disse, seu rosto estava tão próximo do dela que conseguia sentir sua respiração. Beatrice não sabia quem era aquele homem, mas sabia que o medo começava a tomar conta dela. "Frederick Harris mentiu para você. Ele não é quem diz ser, sua idiota. Diga-me, ele está assim tão horrível ao ponto de não conseguir reconhecer seu rosto?"
"Do que você..."
Mas antes que ela concluísse, Gavin soltou um de seus braços e enfiou a mão no bolso do casaco, tirando de lá uma pequena fotografia.
"Vamos, Beatrice, olhe e diga quem você vê."
Ele colocou o retrato diante dos seus olhos, mas ela estava tão desnorteada que demorou algum tempo para assimilar quem era aquele que estava ali.
O rapaz tinha um sorriso radiante, cabelos ruivos cortados curtos e olhos azuis que reluziam mesmo através da fotografia. Seu rosto era impecável, liso e perfeito. Ele era lindo.
Um segundo.
Foi esse o tempo que levou para o mundo de Bea desabar ao seu redor.
"Não...", sussurrou, mas aquela era uma negação falha.
Beatrice reconheceria aquele homem mesmo se milhões de anos se passassem. Reconheceria aquele sorriso e aquele cabelo, reconheceria seu rosto – apesar de tudo – e, principalmente, reconheceria aqueles olhos azuis. Nada no mundo a faria se esquecer deles.
"O que foi, Beatrice?", a voz de Gavin sussurrou, maliciosa. "Não consegue dizer o nome?", ela não conseguiu responder. "Então deixe que eu diga para você: Adrien Fletcher."
Então a fotografia se foi, sumindo no bolso do casaco de Gavin.
Beatrice estava paralisada, completamente sem palavras.
Sua cabeça girava tanto que se sentiu tonta, completamente sem chão.
Frederick, o homem por quem ela se apaixonou, era Adrien Fletcher? Aquilo parecia impossível.
"Ele mentiu para você, Beatrice", Gavin voltou a dizer, mas Bea mal ouviu suas palavras. "Mentiu sobre quem era e você acreditou. Viveu com o famoso Adrien Fletcher por um mês inteiro, ou, pelo menos, quem ele se tornou depois do tal acidente, e durante todo esse tempo ele mentiu para você."
"Não", ela sussurrou novamente, tentando dar sentido àquilo. Se Frederick realmente era quem Gavin dizia ser, ele devia ter um bom motivo por ter escondido sua identidade dela. É claro que devia. Bea o conhecia. Não é?
"Imagine só", Gavin recomeçou, um sorriso cruel surgindo em seus lábios. A força que ele aplicava nos braços dela aumentou. "Imagine como Adrien se sentiria se a mídia, que o procura desesperadamente há anos, o encontrasse agora? Não seria incrível?"
"Não pode fazer isso", Beatrice disse no mesmo instante, de repente sendo despertada do topor no qual se encontrava.
"Não posso?", uma gargalhada saiu dos lábios dele. "Doce Beatrice, você não faz ideia do que eu posso ou não fazer."
Ela sentiu seu estômago revirar, ao mesmo tempo em que o frio parecia invadir cada pedacinho dela.
Frederick... Ele havia se escondido naquela mansão por todo aquele tempo por um motivo. Não estava preparado para ser visto pelas pessoas, não até ela chegar, pelo menos. Se Gavin fizesse aquilo, o expusesse tão completamente daquele jeito, tudo desmoronaria. Ele se recolheria dentro de si mesmo novamente.
"Vá embora, Gavin", foi tudo o que ela conseguiu dizer, segurando-se para não desmoronar ali mesmo. "Eu quero ficar sozinha."
"Se acha que..."
"Eu quero que vá embora!", dessa vez ela gritou, sentindo as lágrimas rolarem pelo seu rosto quando Gavin a pressionou ainda mais contra a porta.
Então, tão rápido que seu cérebro nem ao menos conseguiu registrar, ele não estava mais em cima dela.
Seus olhos caíram sobre a calçada, desesperados registrando Gavin caído no chão, com o rosto ensanguentado. No mesmo instante, outro homem se lançou sobre ele, um maior e furioso, com os cabelos vermelhos sendo soprados pelo vento e revelando seu rosto.
As janelas das casas se abriram, com pessoas curiosas se esgueirando para ver o que acontecia do lado de fora. Seu pai surgiu, desesperado ao seu lado, ao mesmo tempo em que Gavin se recuperava e partia para cima de Frederick.
O corpo de Beatrice se transformou em gelo. Duro e paralisado.
Ela só reagiu novamente quando viu o sangue na calçada.
Dessa vez, o sangue de Frederick.
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Hello galera! Peguei vocês de surpresa, né não? Hahaha
Para compensar o atraso na postagem do capítulo de quarta, estou postando esse aqui para compensar ❤
Manas, o que acharam do final desse capítulo? Acham que deu merda total ou é capaz de piorar? (Não digo nada hehehe)
Muitos e muitos beijos, nos vemos no penúltimo capítulo de ARMB❤❤
Ceci.
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