• Capítulo 20 •
"Que tal... Invocação do Mal?"
"Ficou maluco? A última vez que assisti um filme de terror acabei dormindo no quarto do meu pai por seis meses!"
"É só ficção. Não tem que ter medo."
"E você acha que meu cérebro processa essa informação?"
Adrien suspirou, abrindo um pequeno sorriso e olhando para Beatrice, sentada no sofá.
"Tudo bem, que seja", disse, cedendo. "Mas não vou assistir nenhuma comédia romântica."
Beatrice abriu a boca em um grande "O", olhando para ele como se fosse um bicho de sete cabeças.
"Por que não?"
"Porque não são nem um pouco realistas", disse simplesmente, se jogando no sofá também e apertando o controle remoto para ver outra parte do catálogo da Netflix.
"Falou o cara que assiste a filmes de terror...", ele ouviu Beatrice resmungar ao seu lado. Adrien riu.
"Muito bem, que tal ação? Todo mundo gosta de ação."
Beatrice pareceu ponderar sobre a questão.
"Tudo bem. Que seja ação então."
Adrien assentiu, navegando pela aba de filmes de ação um segundo depois.
"Agora como decidimos qual assistir?"
Beatrice soltou uma gargalhada e lançou uma almofada na direção dele, acertando-o em cheio.
"Somos as pessoas mais indecisas do mundo", ela decretou, balançando a cabeça.
"Se estamos indecisos em escolher um simples filme, como vamos decidir para qual lugar viajar na primavera?", perguntou Adrien com um sorriso, jogando o controle remoto para um lado.
"Não faço nem ideia", confessou Bea.
Era uma noite clara aquela. Apesar do frio intenso, o céu noturno estava completamente limpo e repleto de estrelas, sinalizando o bom tempo que viria.
Adrien e Beatrice decidiram que queriam fazer algo naquela noite depois do jantar, quando perceberam mutuamente que não queriam se despedir um do outro tão cedo. Trabalhando em conjunto, eles levaram cobertores e travesseiros para a sala de TV que ficava no segundo andar, tornando o lugar ainda mais confortável.
Porém, desde que haviam se acomodado e ajeitado tudo, discutiam sobre o que iriam assistir, sem nunca entrar em um consenso.
Na verdade, Adrien Fletcher pensava que ficar ali com Beatrice, apenas conversando, era bem melhor do que ficar perdendo tempo vendo um filme qualquer, quando poderia estar olhando para ela e escutando sua voz.
"Então você tem medo de filmes de terror?", ele indagou, quando Beatrice puxou um pouco mais o cobertor e aproximou-se dele.
"Não", respondeu. "Eu tenho medo de coisas que não consigo entender. Como fantasmas, mortos-vivos e..."
"Nada disso existe", Adrien falou, com uma certeza tão grande e cômica que Beatrice teve de rir. "É sério."
"E como você sabe que não existe?", ela perguntou, erguendo uma sobrancelha para ele desafiadoramente.
"A ciência não consegue provar."
"Então só acredita nas coisas que a ciência pode provar?"
"Bem... Sim."
"Por quê?"
"Isso por acaso virou um interrogatório?"
Beatrice riu, jogando outra almofada nele.
"Quando era criança, costumava morrer de medo do escuro", contou ela, os olhos castanhos fitando os de Adrien. "Meu pai sempre deixava a luz do corredor acessa à noite, para que eu não tivesse medo. Com o tempo foi melhorando, naturalmente. Uma noite a luz acabou e ficamos completamente no escuro, morri de medo, é claro, mas resisti e desde então isso não me assusta como antes."
Enquanto ela falava, Adrien nem conseguia piscar, atento a cada palavra. Beatrice Morgan tinha aquele efeito nele, de pegar toda a sua atenção para si e desligá-lo do resto do mundo.
"E você? Do que tem medo?", ele a ouviu perguntar. Adrien piscou e deu de ombros, tentando se recompor.
"Quando era criança? Acho que de nada", confessou. "Nunca tive medo de altura, ou do perigo, nem nada disso. Na verdade, eu gostava do perigo, procurava por isso. Uma vez, encontrei uma escada que levava aos telhados da casa no campo que tínhamos, subi até lá e fiquei escondido por quase uma hora. Quando me encontrou lá em cima, Samantha faltou sofrer um infarto. Eu devia ter dez anos."
Enquanto contava, Adrien viu os olhos de Beatrice se arregalarem, e quando terminou ela ria incontrolavelmente.
"Você devia ser uma peste", disse ela, o rosto vermelho pelo acesso de riso.
"Teve uma época em que eu tinha três babás para ficarem de olho em mim. Foi horrível."
"Bom, elas podem ter impedido que você acabasse quebrando um pescoço."
"Talvez, mas também impediram que eu me divertisse."
Beatrice sorriu e lhe deu um leve empurrão.
"Em compensação, você deve ter se divertido bastante depois de crescido", ela comentou, com um meio-sorriso de lado e olhos maliciosos.
"Agora, se pensar bem, acho que não me diverti tanto quanto eu pensava", confessou ele, pensando no passado que tivera antes do acidente. "Quer dizer, claro que havia os momentos bons, mas nem sei se eles foram realmente reais."
"O que quer dizer com isso?", perguntou Beatrice, curiosa.
Adrien suspirou, sentindo como se houvesse um gosto amargo na boca.
"As festas, as garotas, as bebidas... Tudo isso, meio que não faz mais sentindo agora, quando olho para trás. Sempre estava cercado por pessoas que achava serem meus amigos, mas depois do acidente... Bem, foram poucos e ainda menos que me procuraram."
Assim que acabou de dizer as palavras, Adrien percebeu a verdade nelas. Por algum motivo, desde que Beatrice entrara em sua vida, havia se dado conta de muitas coisas no seu passado que pareciam claras como água agora. Talvez, por todo aquele tempo, Adrien Fletcher tinha apenas fechado os olhos para tudo aquilo que não queria ver.
"Bom, se isso te tranquiliza, devo dizer que seus amigos não eram amigos de verdade", Beatrice disse aquilo que já deveria ter se dado conta há séculos. "São apenas alguns riquinhos metidos a besta."
Adrien não resistiu, sorriu.
"Sabe, eu também já fui um riquinho metido a besta", falou, olhando para ela. "Um dos piores da espécie."
"Mas agora não é mais", ela respondeu, com tanta certeza que fez o coração dele sacolejar.
"E como sabe?"
"Se fosse, eu já teria dado um jeito de fugir para Roseville no meio da neve há muito tempo."
Quando ouviu aquilo, Adrien quis beijá-la. Pela centésima vez.
Deus, nunca tinha desejado tanto uma mulher como desejava Beatrice. Em todos os sentidos.
"Acho que devo ficar feliz por ouvir isso então", ele sussurrou, estendendo um braço pelo encosto do sofá, sendo surpreendido quando Beatrice se aproximou mais e se acomodou ao seu lado. A intimidade entre eles era agora palpável, algo tão bom que Adrien até mesmo se esquecia de perguntar-se como ela conseguia ficar tão próxima e não sentir medo.
"Deve mesmo."
Eles ficaram em silêncio por um tempo, Adrien sentindo o corpo de Bea junto ao seu, observando seus pés pequenos calçados com meias cor-de-rosa pousados no sofá.
"Me conte mais", ele a ouviu dizer. "Sobre sua infância, as viagens que já fez... Quero saber."
Adrien sorriu levemente, perguntando-se quando alguém parecera assim tão interessado em sua vida.
"Tem certeza?", ele pegou-se perguntando.
"Ora, é claro que sim. Por que não teria?"
Adrien suspirou, encarando a tela brilhante da televisão, sem suportar o olhar penetrante de Beatrice.
"Eu não era uma boa pessoa, Beatrice. Nunca fui. Em todas as histórias que posso contar... Bem, você vai acabar se deparando com alguém que não vai gostar nem um pouco, entende? Todas as decisões que tomei... tudo o que fiz... trouxeram-me até aqui."
"Então se arrepende?", perguntou ela, a voz cautelosa. Seu olhar era tão intenso e profundo que Adrien poderia facilmente se afogar nele. "Se arrepende de estar aqui agora?"
"Não", respondeu depois de pensar um pouco, mas queria completar: Por causa de você. "Só queria que as coisas tivessem acontecido de um jeito diferente."
Que eu não estivesse marcado...
Adrien sentiu quando Beatrice segurou sua mão, gentil e firme, fazendo com que ele olhasse para ela.
"Não me importo com a pessoa que foi antes, Frederick, contanto que não volte a sê-la."
E como poderia? Ele quase disse. Quem eu era se partiu depois do acidente, voltando de um modo novo quando você apareceu.
"Uma vez, estava bêbado em uma boate da capital", ele começou, não sabendo muito bem o motivo pelo qual começou por aquela história em específico. Talvez quisesse mostrar para Beatrice quem ele verdadeiramente era, dá-la as cartas e observar se ela então se intimidaria e afastaria. Ele torcia para que não. "Tinha um cara, tão ou mais bêbado que eu. Não sei muito bem o que aconteceu, acho que teve a ver com uma bebida derramada e uma garota em comum, só sei que quando percebi estava em cima dele. Acho que quebrei mais dentes do pobre coitado do que deveria."
Adrien não mencionou que no dia seguinte apareceu em todos os jornais locais, e que seu pai ficou tão furioso pela atenção que tinha chamado para si - ou para a sua doença, como ele preferia pensar - que permaneceu meses sem lhe dirigir a palavra. Tudo isso poderia revelar mais do que deveria sobre quem ele era de verdade.
"Que linda história", ouviu Beatrice dizer sarcasticamente ao seu lado. "Quando disse que sua ficha por brigas de bares era longa não estava brincando, não é?"
"Nem um pouco."
"Sorte a sua que sou tão perigosa quanto você. Já contei da vez em que fiquei tão brava com Gavin que quase lhe dei um belo chute entre as pernas?"
Adrien sorriu, sem conseguir acreditar. O dom dela de tornar tudo mais fácil era ao mesmo tempo cômico e bem-vindo. Ainda mais para alguém como ele.
"Mas você se controlou", ele não deixou de acrescentar.
"Bem, sim", confirmou, assentindo. "Mas só porque eu tive muita pena dele se visse meu pior lado. Sabe como é, devo prezar pela minha boa imagem e só usar meus truques de judô quando foram estritamente necessários."
"Como ainda não os usou comigo?"
"Não sei, Harris, talvez você tenha se mostrado melhor do que eu pensava."
Quando a viu sorrindo, Adrien soube que estava falando a verdade, que realmente acreditava naquilo.
"Obrigado", ele murmurou para ela, a palavra soando ao mesmo tempo estranha e absolutamente correta saindo de sua boca.
"Pelo quê? Por não atingi-lo com um poderoso chute?"
Ele riu, puxando-a mais para perto e mantendo-a ali, junto ao seu peito.
"Também."
Beatrice, sentindo o calor que Frederick exalava, não pôde deixar de notar o quanto aquele momento parecia perfeito em sua simplicidade. No frio congelante que uivava lá fora, estar ali com Frederick era mais do que ela poderia sonhar.
Ouvindo-o contar sobre seu passado, sobre quem era e o que havia acontecido antes de se conhecerem, Bea se surpreendeu ao constatar que não se importava com nada daquilo. Não importava os erros que ele tinha cometido, ou as ações impensadas, o Frederick que importava, de verdade, era o que estava com ela naquele momento. Aquele que a fazia rir, que a mantinha sempre por perto, que a fazia se sentir especial em todos os sentidos e que, principalmente, era capaz de até mesmo controlar seu mau gênio para que não a atingisse com ele.
Beatrice sabia que as pessoas nunca mudam totalmente, que sempre há nelas o resquício de quem foram, mas o importante era fazê-lo entender que podia sim ser a melhor versão de si mesmo.
Adrien, por sua vez, por mais que as dúvidas não lhe deixassem em paz e o fizessem duvidar que merecia tudo aquilo, se concentrou somente naquele momento, aquele único momento em que Beatrice estava em seus braços, confortável e confiando totalmente nele. Dentro de si sabia que não queria Beatrice como sempre quis outras garotas, por uma única noite ou um curto espaço de tempo, lhe queria todos os momentos, de todos os dias de sua vida.
Dentro da sua cabeça, uma voz gritava para que ele dissesse o que sentia por ela, olhando em seus olhos e deixando com que o sentimento fosse descrito com palavras. Tinha que dizer.
Quando olhou para ela, que de repente fechara os olhos e respirava suavemente junto ao seu peito, Adrien travou completamente.
Deus, todas as pessoas fugiam dele, mesmo quando tinha um rosto bonito, como poderia confessar o que sentia por ela e esperar ser retribuído?
Beatrice fora uma garota solitária em sua pequena cidade, ela mesmo dissera, talvez apenas considerasse Adrien, ou melhor, Frederick, alguém ao mesmo tempo diferente e igual à ela em alguns sentidos. Alguém que tinha os mesmos sonhos, gostos parecidos e a vontade de viver cada aspecto daquela única vida que tinham.
Ele não podia estragar o que eles já tinham, não podia arriscar.
Aquele era o mesmo pensamento que lhe invadia todas as vezes em que estava prestes a olhar para ela e dizer tudo, ou quando estava completo e totalmente tentado à beijá-la.
Mas, no fim das contas, ele só devia ser um grande covarde.
Adrien não soube quanto tempo se passou, mas quando olhou novamente para Beatrice soube que ela tinha adormecido.
Ele poderia segurá-la e levá-la de volta para o quarto, mas o caminho até lá era longo e ele não queria acordá-la, não quando parecia dormir tão profundamente.
Mexendo-se com cuidado, Adrien colocou um travesseiro sob sua cabeça e saiu do sofá, puxando os dois pesados cobertores até o queixo dela.
Ajoelhando-se junto ao sofá, observando seu rosto tão lindo completamente sereno e calmo, Adrien soube que o curso da sua vida tinha sido completamente alterado por causa daquela garota.
Ela não ficaria ali para sempre, e Adrien jamais se perdoaria se a deixasse ir sem falar o que realmente sentia. Não, realmente não se perdoaria. Tinha que pelo menos tentar, mesmo se fosse rejeitado e a dor o assolasse para sempre.
Com delicadeza - bem mais do que ele julgava possuir - Adrien afastou o cabelo de Beatrice de sua testa, depositando um leve beijo no local.
"Boa noite", sussurrou, antes de desligar a televisão e sair.
Mas Beatrice não ouviu suas palavras, nem sentiu o beijo, estava mergulhada em um sono profundo, sem nem ao menos cogitar que, no dia seguinte, tudo viraria de cabeça para baixo.
Quando abriu os olhos, com a luz do sol entrando pelas janelas, Beatrice precisou de alguns segundos para lembrar-se de onde estava.
Havia pesados cobertores lhe cobrindo, além de um travesseiro macio sob sua cabeça. Apesar de ter dormido no sofá, ela não se lembrava de ter tido um sono tão profundo e delicioso.
Conforme os acontecimentos da noite anterior voltavam à sua mente, Beatrice sentiu seus lábios se abrirem em um pequeno sorriso.
Provavelmente Frederick não quis acordá-la, por isso a deixou ali para dormir.
Sentindo o rosto corar de vergonha, Bea soube que tinha acabado adormecendo nos braços dele, reconfortada pelo seu calor e pelo momento.
Esfregando os olhos, Beatrice procurou pelo seu celular para checar o horário. Encontrou-o na mesinha de vidro que ficava ao lado do sofá.
Quando Beatrice olhou o visor, quase teve um ataque cardíaco.
Onze chamadas. Onze!
Uma era de seu pai - normal, já que na noite anterior eles acabaram não se falando e ele com certeza ligou para saber notícias - duas de Eliza e, oh Deus, oito de Gavin.
Bom, ela com certeza não iria retorná-lo.
Beatrice estava digitando o número do pai quando Frederick apareceu, sorridente e com uma bandeja prateada nas mãos.
"Bom dia", falou, caminhando até ela.
"Meus olhos estão vendo o que acho que estou vendo? Frederick Harris está trazendo café na cama para mim?", ela brincou sorrindo, no mesmo instante largando o celular.
"Tecnicamente, é sofá, mas sim, acordei cedo e decidi ser... hospitaleiro. Mas não vá se acostumando."
Beatrice riu, balançando a cabeça.
Frederick pousou a bandeja na mesinha, logo em seguida estendendo uma xícara de chocolate quente para ela.
"Dormiu bem?", ele perguntou, sentando-se ao seu lado. "Não queria acordar você ontem à noite, por isso a deixei aqui. Não sei se esse sofá é dos mais confortáveis, mas..."
"Dormi muitíssimo bem, obrigada", ela disse, interrompendo-o com um sorriso.
Enquanto tomava um gole de seu chocolate quente, Beatrice observou Frederick discretamente. O sol dourado daquela manhã fazia com que seus cabelos compridos brilhassem ainda mais vermelhos, iluminando também seus claros e límpidos olhos azuis.
Era bom vê-lo na luz da manhã, enxergando-o com perfeição. Apesar de não se esconder mais dela na maior parte das vezes, encarando-a sem medo, Bea sabia que Frederick se sentia mais confortável à meia-luz, e aquele conhecimento parecia ter o poder de partir seu coração.
"O céu está bastante aberto hoje", ela o ouviu dizer depois de um tempo, olhando pela janela que mostrava uma parte dos jardins cobertos de neve. "Poderíamos fazer algo ao ar livre."
"Algo me diz que, com o belo sol que está fazendo, nossas bolas de neve vão virar água antes que eu consiga acertá-las em você."
"Como se você fosse uma guerreira tão boa com bolas de neve quanto eu", ele comentou jocosamente, revirando os olhos.
"Eu tenho a vantagem de ser mais rápida."
"Para fugir."
"Você é insuportável, sabia?"
"É uma das minhas mais marcantes qualidades."
Beatrice sorriu e revirou os olhos, tentando esconder o que realmente sentia.
A verdade é que seu coração batia tão forte quando olhava para ele que ela temeu ser descoberta. Era quase impossível esconder o que sentia por ele, ainda mais naquele instante, com o sol completamente à mostra para revelar suas expressões e Frederick tão perto.
Naquele instante, quando já ia se servir de uma torrada que estava na bandeja, Beatrice percebeu que o telefone tocava.
No visor, o nome de Gavin apareceu.
Assim como ela, Frederick percebeu.
"Não vai atender?", ele perguntou, e Bea notou que sua voz parecia um pouco dura e ácida. Ele desviou o olhar do dela.
Ele me ligou oito vezes, pensou Beatrice, tentada a jogar o telefone no meio da neve do jardim, provavelmente é só ele tentando ser insuportável mais uma vez, mas mesmo assim...
Beatrice suspirou, pegando o celular.
"Me de só um minuto", disse para Frederick, se levantando do sofá e saindo da sala.
No corredor, ela atendeu.
"Não viu minhas chamadas?", foi a primeira coisa que o imbecil disse quando ela atendeu, tão duramente quanto era possível.
"Estava no silencioso", ela respondeu simplesmente. "Você me ligou oito vezes! Aconteceu alguma coisa?"
É claro que não havia acontecido, mas mesmo assim ela se forçou a perguntar, Gavin era sempre insistente, mas não tanto.
"A estrada que liga Roseville e a mansão abriu", ele disse na lata, sua voz reverberando do outro lado da linha. "Já estava melhor nos últimos três dias, mas agora está segura o suficiente para que você possa voltar."
Bea não soube muito bem como se sentir em relação àquilo, mas não pôde ignorar a pontada que lhe atingiu no peito.
"Bom, isso é ótimo, mas tenho certeza que eu mesma perceberia isso assistindo a um noticiário local qualquer, voltando por minha própria conta." Gavin não respondeu, mas Bea o ouviu bufar do outro lado. "Mesmo assim", obrigou-se a dizer, "obrigada por avisar."
Ela já ia desligar quando ele a interrompeu.
"Você não está entendendo, Beatrice", Gavin falou em tom grave. "Você tem que voltar agora."
Bea parou no lugar, franzindo as sobrancelhas.
"Gavin, olhe aqui..."
"Seu pai, ele já ficou muito tempo sozinho, Bea", ela o ouviu dizer, dessa vez tomando sua atenção completamente. "Acho que ele não está muito bem, por mais que não tente demonstrar. Estive na loja ontem e..."
"Gavin, o meu pai está muito bem", ela interrompeu, dizendo aquilo mais para si mesma do que para ele. "Converso com ele todos os dias, ainda mais quan..."
"Conversar por telefone é uma coisa, Bea, ver pessoalmente é outra. Acredite em mim quando digo que você deve voltar. Sabe que só quero o seu próprio bem e o de sua família."
Beatrice suspirou, fechando os olhos com força.
Seu pai, todos os dias, lhe assegurava que estava bem, que não precisava se preocupar. Mas e se dissesse essas coisas simplesmente para não deixá-la angustiada?
Olhando por uma das janelas do corredor, Beatrice soube que realmente precisava voltar. Precisava aproveitar o bom tempo e retornar para onde era o seu lugar. Seu pai precisava dela e ela tinha uma... vida lá.
"Muito bem, Gavin, vou ver o que posso fazer", disse por fim, simplesmente querendo desligar e entender o que se passava dentro dela.
"Posso ir buscá-la. Agora mesmo se quiser."
"Não. Eu... Não precisa. Obrigada por avisar."
Antes que ele dissesse mais alguma coisa, Beatrice desligou.
Quando voltou para a sala de estar, parou dois segundos na porta, observando Frederick sentado no sofá com uma xícara fervente nas mãos, olhando pela janela. Ele era tão grande, todo ele, que a pequena peça de porcelana quase sumia em suas mãos enormes. Sem querer, um sorriso triste surgiu nos lábios dela.
Adentrando a sala, Frederick no mesmo instante olhou para ela, os olhos azuis apreensíveis.
"Tudo bem?", ele perguntou, com certeza percebendo sua mudança de espírito.
"Tudo sim", respondeu, assentindo. "Eu só...", ela soltou o ar que estava prendendo, desejando profundamente agir naturalmente. "Frederick, tenho que voltar."
Ele pareceu congelar no lugar por um momento, como se assimilasse suas palavras. Um segundo depois, piscou, e Beatrice soube que ele não sabia como agir.
Mas... por quê? Aquilo aconteceria uma hora ou outra, certo? Ela não ficaria ali para sempre. E também não era como se eles nunca mais fossem se ver.
"Aconteceu alguma coisa?", foi a primeira coisa que ele perguntou, em seguida deixando a xícara de lado para se levantar e aproximar-se dela.
"Não", respondeu, balançando a cabeça. "Quer dizer, a estrada está aberta, segura. Preciso voltar para os meus empregos, e, principalmente, para o meu pai... Eu devia..."
"Você quer ir... hoje?", ele perguntou cautelosamente, olhando para ela.
Beatrice não respondeu, apenas assentiu.
"Não posso perder o bom tempo."
Os dois ficaram em silêncio por um tempo, apenas olhando um para o outro.
Frederick foi o primeiro a reagir.
"Vou mandar preparar o carro", falou, já se movendo. "Chamarei algumas criadas para que ajudem você a arrumar suas coisas."
"Não, não precisa", ela disse, entrando em sua frente antes que atravessasse a porta. "É pouca coisa, posso fazer isso sozinha." Ele não respondeu, na verdade, nem olhou para ela. "Gostaria só de me despedir de Samantha, se puder, e de Luke e Howard também. Não vai dar para dar tchau para todo mundo, mas..."
"Vou pedir para que apareçam no seu quarto em alguns minutos", Frederick falou. "Se precisar de mais alguma coisa..."
Ele então passou por ela, caminhando a passos largos pelo corredor até desaparecer de vista.
Beatrice se recostou no batente da porta, sentindo-se tão completamente confusa que não sabia o que pensar.
Fechando os olhos por um segundo, desejou saber o que passava pela cabeça de Frederick naquele instante.
Uma hora depois, ela estava parada no portão da propriedade. Tinha se despedido de todos os seus amigos minutos antes, e agora apenas Frederick a acompanhara até ali.
O carro preto já lhe aguardava do lado de fora dos portões.
"Frederick, eu nem sei como agradecer por ter me acolhido aqui durante todo esse tempo...", ela falou, enquanto o vento batia em seus rostos. Ambos estavam agasalhados, muito próximos um do outro. Bea sentia seu coração bater descompassado.
"Não precisa agradecer", ele disse, a voz sendo levada pelo vento. "Foi... um prazer."
Beatrice engoliu em seco. Eles não se falavam desde que Frederick saíra da sala de estar. O clima entre eles não parecia dos melhores.
"Assim que as coisas voltarem ao normal para mim em Roseville, venho visitá-los", ela falou, sabendo que aquilo seria a coisa certa a dizer. "E eu gostaria muito que você aparecesse por lá também."
Ela realmente gostaria daquilo, gostaria mais do que poderia descrever, mas sabia que Frederick não faria aquilo. Dentro de si, depois de todo aquele tempo convivendo com ele, conhecendo-o, ela sabia que ele ainda não estava preparado para encarar o mundo de novo.
Mas já tinha desistido da cirurgia - ela esperava - e aquilo era um progresso maior do que qualquer outro.
"Eu adoraria", foi tudo o que ele respondeu.
Beatrice então não soube mais o que dizer. Ela deu as costas para ele, caminhando em direção ao portão, mas assim que se aproximou voltou para o lugar onde estava.
Sem saber muito bem o que estava fazendo, jogou seus braços ao redor dos ombros dele, sentindo seu calor aquecê-la.
Frederick também a abraçou, envolvendo-a e mantendo-a ali por segundos maravilhosos.
Quando se afastaram, Bea sorriu e afastou os cabelos ruivos de Frederick dos seus olhos, para que pudesse enxergar seu rosto apesar do vento forte.
"Você fez muito mais que me hospedar aqui, Frederick, sabe disso", ela sussurrou, olhando-o atentamente, um sinal claro para que não desviasse os olhos dos dela. "Você... Bem, acho que acabou me salvando de mim mesma."
As imagens do dia em que desmaiara no banheiro voltaram, e tudo o que se seguiu depois. Se não fosse por ele, e pelos amigos que tinha feito ali, talvez ainda estivesse fechada para a ideia de mudança, a ideia de procurar melhorar.
"Você fez a mesma coisa", ele disse para ela, e as palavras saíram com tanta verdade e fervor que o corpo inteiro dela se arrepiou. "E sabe disso."
Ela abriu um pequeno sorriso, balançando a cabeça.
"Eu não fiz nada."
Então, ficando na ponta dos pés, ela lhe deu um beijo no rosto. O mesmo rosto marcado que o fez ficar longe dela por muito tempo quando chegara ali.
Segundos depois, quando já estava dentro do carro, Beatrice perguntou-se por qual motivo não tinha dito. Dito que estava apaixonada por ele.
Fechando os olhos com pesar, ela soube que as pessoas às vezes fazem coisas impensadas, e, outras vezes, por pensarem demais, acabam não fazendo nada, deixando com que as oportunidades escorregassem por entre seus dedos.
Tentando se tranquilizar, ela disse a si mesma que poderia voltar quando quisesse desde que as estradas estivessem boas, e que também tinha o número de Frederick gravado no celular.
Ela o veria de novo. Muito em breve se Deus permitisse.
O carro então deu partida e desceu a colina, levando-a de volta para a casa.
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Oii meus amores! Tudo bem com vocês??
Sei que demorei a postar esse capítulo, mas é que aconteceu uma série de imprevistos nessa semana.
Mas então, o que acharam??? Lembrando que faltam TRÊS capítulos para o fim de A Rosa Mais Bela! Quais são suas teorias para o final?
Espero que estejam gostando do livro!
Até mais,
Ceci.
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