Capitulo 6
Erick
— Quando eles chegarem, eu quero que vocês dois se comportem — minha mãe ajeita meu cabelo pela trigésima oitava vez.
Não conseguia entender porque ela queria tanto que eu causasse uma boa impressão, era só cumprimentar uns hóspedes e depois passar o dia inteiro jogando Demontech com Finn.
— Tia Lani, a gente já ouviu isso um monte de vezes — o primo reclama.
— E eu vou dizer quantas vezes foram necessárias — o responde e olha de volta pra mim. — Seu pai quer muito que esse acordo dê certo, se os lobos forem nossos aliados, não teremos que nos preocupar com aqueles sanguessugas.
— Mas essa guerra é deles, os vampiros nunca nos atacaram! — rebato. Sabia que ela não me escutaria, ela me achava muito novo para entender.
— A Luna dos lobos foi sequestrada, isso é muito grave. Se coloque no lugar deles, não ia querer que ajudassem se nós estivéssemos precisando de ajuda?
Que seja. Apenas concordo com a cabeça.
— Ótimo! — ela parece satisfeita.
— Leilani! — a voz do meu pai ecoa pelos corredores. — Eles chegaram.
Eu e meu primo trocamos um olhar tedioso antes de ir até a entrada principal, e lá estavam eles.
Eles são uma família estranha. O Supremo dos lobos era um cara grande, branquelo e tinha uma barba escura que o fazia parecer mau. Atrás dele, estava uma garotinha que segurava um livro colorido.
— Adam, seja bem-vindo. Lamentamos muito sua perda e vamos fazer o possível para encontrar sua companheira.
O homem lobo apenas concorda com a cabeça e não parecia ter ouvido uma única palavra apesar de o olhar atentamente.
— Podemos conversar a sós?
— Claro, por aqui — meu pai sai com o estranho barbudo pelos corredores.
A menina é deixada para trás com a mulher que parecia ser a avó dela.
— Olá, pequenina! — minha mãe se abaixa para falar com ela. — E você deve ser Marjorie, a avó de Lyanna.
— Vem criança, vamos dizer "oi" — a avó enrugada e de aparência doce segura a mão da garotinha.
— Oi — ela murmura, tímida. Tinha a pele mais clara do que a minha e cabelos ruivos cacheados e não era branca igual ao pai. Seu rosto estava um pouco vermelho por causa do sol de quase quarenta graus lá fora, e, a julgar pelas roupas, eles não estavam preparados para o nosso clima.
Ela olha para todos os cantos da casa, observando tudo, de repente ela me pega olhando e sorri. Até que ela era fofinha.
— Vocês devem estar morrendo de calor, vamos almoçar! — minha mãe convida, era a pessoa mais receptiva e simpática do mundo. — E depois podemos comer um sorvete na praia.
— Mas não tem tubarões lá? — a menina parece interessada e a segue pela casa junto com a avó.
— Ah não, nós expulsamos todos eles da nossa praia — elas somem pelo corredor e as vozes ficam baixas demais.
— ... Ei, você está aí? — o primo surge no meu campo de visão, balançando a mão na frente do meu rosto. — Cara, você não disse nada por uns dois minutos.
— Ah, é? — pisco algumas vezes, tentando lembrar o que eu ia fazer. Na verdade, não sei, eu ia fazer alguma coisa?
— É! — Finn revira os olhos, impaciente. — E aí, posso ligar o jogo?
Apenas concordo com a cabeça. Já havíamos almoçado, então minha mãe deixou a gente em paz jogando por um tempo. Mas, quando esse tempo de paz acabou, não foi ela quem apareceu para nos incomodar.
— Posso brincar também? — a garotinha ruiva pergunta.
— Agora não e isso não é brincadeira, sai daqui — Finn empurra ela pro lado e aquilo me deixa com raiva.
Jogo o controle no sofá e dou um soco de aviso em seu ombro.
— Ai, por que você fez isso? — ele se finge de idiota.
— Não fala assim com ela.
— Pega logo o controle, a gente vai perder.
Olho pra garotinha que caiu sentada no chão, parecia prestes a chorar mas não queria que ninguém visse, por isso mantinha a cabeça baixa enquanto se levantava.
— Eu não tô nem aí, se vira — levanto e ajudo a garotinha levantar também. — Vem, eu vou brincar com você.
— Qual é? Vai mesmo fazer isso? Ela é só uma garotinha! — ele continua irritado, mas, eu realmente não ligava. Levo ela para o quintal onde tínhamos um balanço de madeira e ferro enferrujado, a horta da minha mãe e a casa na árvore que nunca terminamos de construir.
— Uau, aqui é tão grande! — ela sorri, impressionada e aponta pro mar. — Tem golfinhos e baleias lá?
— Tem, mas as baleias aparecem no inverno quando é época de migração.
— O que é isso? — pergunta confusa e vira a cabeça pro lado igual um cachorrinho.
— É uma coisa que elas fazem, não sei porquê.
— Ah.
— Quer ir até lá?
— Minha avó chata disse que eu não posso ir porque estou doente, mas é mentira, eu não tô não e ninguém acredita em mim, nem o meu pai — ela cruza os braços indignada.
É quando percebo o quanto ela é pequena e inocente. Sua alcatéia foi atacada, os lobos estavam em guerra contra os vampiros que sequestraram sua mãe. Ela provavelmente não fazia ideia do que estava acontecendo, talvez achasse que vieram aqui pra tirar férias, mas, na verdade, vieram pedir nossa ajuda e agora sua avó dizia que ela estava doente para que ela não entrasse na água, e era mesmo mentira. Lyanna estava ótima, era visível.
Eles já haviam perdido sua Luna, não poderiam arriscar perder ela também.
— Onde você mora não tem praia, né?
Ela faz que não com a cabeça.
— Olha isso aqui — sento no chão e pego um punhado de areia e tento moldá-la para formar uma base.
— O que tá fazendo? — A garotinha senta do meu lado, interessada.
— Uma tartaruga — junto mais areia para formar a cabeça e as patas e faço desenhos sobre o casco.
— Eu nunca vi uma tartaruga.
— Agora viu.
Lyanna ri animada e começa a desenhar sobre o casco dela também.
Fico satisfeito por fazê-la sorrir. Vê-la infeliz estava me fazendo sentir péssimo.
Aquele foi um dia feliz. No final da tarde, assistimos ao pôr do sol na varanda enquanto comíamos sorvete. E depois de entretê-la durante toda a tarde com desenhos e historinhas, ela adormece por cima de mim. Eu queria tanto ter mantido ela comigo, queria tanto poder voltar no tempo e não deixado que a levassem para longe, mas eram só alguns cômodos de distância, ela estaria logo ali no quarto ao lado e amanhã brincaríamos mais, teríamos rido da cara enjoada de Finn e quem sabe convencer nossos pais a ir até o mar.
Não consigo mais imaginar o que teria acontecido ou o que poderíamos ter sido.
Aquela garotinha morreu. Foi morta em sua cama, os lobos vieram até nós e os parasitas sanguessugas a encontraram. Aquele foi o fim para ela, fim para o Supremo, fim para o meu lar.
E agora uma outra apareceu e se parece tanto com ela. Não pode ser ela. A garota adormecida ao meu lado me lembrava dela, mas é claro que não podia ser, os olhos não tinham a mesma cor, o cheiro dela era diferente e ela não tinha uma loba dentro dela como a garotinha. Sequer tinham o mesmo nome e por mais que eu desejasse que fosse, não era.
Não podia ser.
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