Capítulo 20

A minha primeira reação foi trancar a porta do closet e pedir a Mary que mandasse alguém chamar a rainha imediatamente.

Eu podia estar apavorada, mas isso não significava que havia ficado burra. Se eu não contasse à monarca a minha recém-confirmada ligação com o "presidente", quando ela descobrisse por si mesma as chances de achar que eu estava infiltrada no palácio seriam infinitamente maiores.

— Aconteceu alguma coisa senhorita Alice? — A rainha Eadlyn falou entrando no quarto acompanhada de Neena.

— Sim.

Lembrando do sinal que ela usou no dia do Jornal, eu pisquei os olhos rapidamente várias vezes na esperança de que ela compreendesse a natureza do assunto.

A rainha deu uma assentida quase imperceptível.

— Neena, você poderia verificar Kerttu para mim, por favor?

— Vou fazer isso agora, Majestade.

— E você... Mary, certo? — Minha criada assentiu. — Poderia descer e avisar que talvez eu e a senhorita Alice nos atrasemos para o jantar?

— Sim, Majestade.

As duas mulheres saíram do quarto e eu fiquei a sós com a monarca.

— O que houve? — Ela perguntou assim que a porta foi fechada.

— É melhor a senhora se sentar, Majestade.

A rainha o fez. Eu me aproximei dela, e com um suspiro comecei a falar.

Contei quase toda a história. Omiti apenas a parte do que o abandono de Landom causou em mim. Só Osten precisava e podia saber daquilo.

Foi óbvia a hesitação da rainha para comigo depois de eu ter lhe revelado tudo.

— Então... você acha que é filha dele? E que ele a reconheceu?

— Sim. Eu desconfiei do fato assim que ouvi sua voz na televisão naquele dia, mas para poder contar a alguém eu precisava ter certeza. — Suspirei. — Então eu mandei uma carta para casa e pedi a confirmação do fato à minha família. No entanto, ainda não obtive resposta.

— Mas... se sua mãe e seus tios ainda não lhe confirmaram nada, como você chegou a uma conclusão sozinha?

— Com isso.

Eu me levantei da cadeira e fui até o closet. Abri a porta dele e fiz um sinal com a mão para que a rainha se aproximasse. Ela veio na minha direção e passou por mim, entrando no pequeno espaço.

Depois de dar uma boa olhada ao redor, ela exalou confusa.

— Não estou entendendo.

— Eu tive que esconder para ninguém visse, — Dei dois toques na madeira da mesa alta que eu pusera na frente da mensagem. — mas... aqui está.

Comecei a empurrar a mesa para o lado.

Demorou até que eu descobrisse todo o recado, pois o móvel era bem pesado e a rainha parecia estar ocupada de mais decidindo se confiava em mim ou não para poder me ajudar. Quando conseguir terminar o trabalho, a monarca foi arregalando os olhos à medida que lia o texto.

— Mas isso é... isso é... um absurdo!

Eu arquejei.

Ela vai desconfiar de mim. E o pior, Osten vai desconfiar de mim também, e vai me expulsar não só do palácio, mas da sua vida para sempre.

Esse pensamento quase me matou por dentro.

— Que espécie de ser humano faz uma coisa dessas com a própria filha?

Eu levantei a cabeça surpresa.

— Então, Sua Majestade acredita em mim?

— Mas é claro que eu acredito. Não há como fingir o modo que a senhorita estava tremendo quando eu cheguei ao seu quarto. Ou a dor que emanava de você enquanto era obrigada a me contar tudo.

— Eu estava...

— Com medo de que eu achasse que a senhorita era uma infiltrada? — A rainha sorriu para mim. — Acredite em mim, senhorita Alice, eu não teria me juntado a você em um plano que quebraria o meu acordo com a minha primeira-ministra se não confiasse na sua pessoa.

— Mas isso aconteceu antes da senhora saber que eu era filha... dele.

— O que não muda nada. — Ela afirmou irredutível e se aproximou de mim. — Tenho certeza de que foi um verdadeiro desastre para uma criança ver o pai abandonar a casa e a família daquela forma.

— Mais do que a senhora imagina... — Afirmei encarando o vazio.

— E ainda por cima, agora esse monstro está atrás da senhorita. — A rainha suspirou preocupada. — E a culpa é toda minha.

Eu neguei com a cabeça.

— Eu que lhe ofereci ajuda, a senhora só tomou a decisão certa em aceitar.

— Mas veja só o que aconteceu. — Ela gesticulou para a parede. — A senhorita corre risco iminente de ser sequestrada.

Passamos um tempo em silêncio depois de sua última fala.

Foi quando uma ideia surgiu na minha cabeça. Endireitei a postura e encarei a rainha, minha expressão séria.

— Eu estou protegida aqui no palácio. E quanto mais rápido acabarmos com a ADL, mais rápido não só eu, mas todos estarão seguros. E eu já sei como posso fazer isso.

A rainha me encarou temerosa.

— Eu vou destruir definitivamente a imagem do "presidente" da ADL em rede nacional. Quero ver só se alguém conseguirá sequer pensar em ser governado por um homem que é capaz de abandonar a própria filha aos 5 anos.

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Osten surtou quando entrou no meu closet e encarou a parede.

— Eu quero dez! Não! Vinte! Isso mesmo, vinte guardas na porta dela todas as noites! Você está me ouvindo Eadlyn? Vinte guardas! — Ele quase gritou ao dizer isso.

Quando eu contei o que pretendia fazer, é óbvio que ele foi expressamente contra. A própria rainha não me perecera muito certa do que estava fazendo quando me apoiara.

— Você não pode fazer isso! — Osten tomou meu rosto em suas mãos.

— Eu preciso.

— Não, você não precisa. O que você precisa é continuar viva, e aqui do meu lado. — Seus olhos eram um mundo inteiro de preocupação. — Deixe que eles tomem o país.

— Não é só pelo país, Osten. É por mim. Por nós dois. Eu tenho que falar.

— Não.

Eu suspirei diante de sua negação.

— Várias vezes você me disse que iria me ouvir quando eu estivesse pronta para lhe contar tudo, Osten. Tudo sobre o Landom, tudo sobre o meu medo de confiar. E essa hora chegou. Preciso que você cumpra com o que disse.

Ele encostou sua testa na minha.

— Você não está jogando limpo.

Eu sorri, lembrando de uma conversa nossa parecida com aquela.

— Só estou usando as minhas armas.

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Descobri a carta da minha mãe em cima da mesa de cabeceira pouco antes de dormir. Evie me pediu desculpas e disse que a correspondência havia chegado logo após o ataque, mas como Osten e eu estávamos sumidos naquela hora, a preocupação a fizera guardar a carta e esquecer de me entregá-la depois.

Eu lhe respondi que não havia problema.

Acendi uma vela, e comecei a ler.

Querida filha,

Sei que eu demorei a lhe responder, mas não encare isso como uma vingança. Pelo contrário, eu perdoei você pelo fato de ter me escrito tão tardiamente pelo simples fato de você ter me escrito.

A verdade é que diante de tudo o que me disse, eu cheguei à conclusão de que só poderia lhe responder alguma coisa após ter a chance de ver você e o príncipe juntos, o que por sua vez eu só poderia fazer assistindo a algum Jornal Oficial.

Confesso que eu estava esperando perceber alguma troca de olhares discreta ou algum sinal secreto entre vocês, contudo, não posso dizer que fiquei surpresa com o aconteceu no palco. E não, eu não desmaiei como você deve ter pensado na hora. Pelo contrário, eu tive a reação que praticamente todo o país teve ao ver o ciúme mais que evidente do príncipe em relação a você.

Eu caí numa gargalhada tão grande quanto a da menina Leah.

E por falar naquela garota, ela é hilária, além de estar óbvio que tem interesse zero em ganhar a Seleção. Gostei dela. Espero que tenham se tornado amigas.

Tudo por aqui tem estado como sempre, a não ser pelo fato de eu e seus tios termos virado celebridades locais. Algo como "Os parentes da favorita", sendo que essa "favorita" obviamente é você.

Eu não descordo desse título que lhe deram.

Mesmo comigo não podendo contar a ninguém o que aconteceu entre você e o príncipe desde que você chegou ao palácio (porque você infelizmente me proibiu de comentar sua carta com alguém), está mais do que claro para o mundo inteiro que você dois estão apaixonados um pelo outro.

Sim filha, você não está sozinha nessa empreitada. O príncipe Osten nitidamente beija o chão que você pisa. Metaforicamente, é claro.

Eu realmente não sei de onde ele tirou esse negócio de "medo de desbotar", ou de "confusão nos sentimentos".

Para mim, essa diretora do Centro, Antonella, é quem está certa.

O que o príncipe têm na verdade é medo de te machucar.

E digo uma coisa. É bom ele ter medo mesmo. Porque se ele te machucar eu vou esquecer desse negócio de realeza e vou passar que nem um furacão por esse palácio.

Bem, é isso filha.

Um último conselho:

Eu sei o quanto te custa confiar em alguém, Alice, e sei também que você deve estar mesmo perdida como me falou.

Mas diante da descrição que me deu dos teus sentimentos pelo príncipe, lhe asseguro filha, não há com o que temer.

Guarde o que vou lhe falar a seguir.

O amor verdadeiro é nossa melhor perdição.

Amamos você,

Sarah

PS: Não sei de onde você tirou a ideia de que eu tenho alguma objeção contra netinhos. Afinal, eu já estou ficando velha

PS 2: Seus tios e eu estamos morrendo de saudades.

PS 3: Não sou vidente. Foi intuição de mãe, já disse. Se você e o príncipe já tivessem começado a planejar os meus netinhos você já teria tido um relance do que é isso.

PS 4: Não é para você ficar preocupada, mas nós achamos que você pode estar certa. Aquela voz na gravação tem grandes chances de ser a dele.

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