Capítulo 12
Desde os meus cinco anos de idade, nunca cheguei a pensar que dormir pudesse ser algo muito bom. Fora a parte em que o meu corpo precisava disso, o ato em si sempre me pareceu um pouco aterrorizante. Fechar os olhos para mim sempre significou mergulhar continuadamente em lembranças que eu queria esquecer... Até o momento em que fiquei trancada no abrigo com Osten, e dormi em seus braços pela primeira vez.
Não sei como ele conseguiu fazer isso, mas Osten devolveu a tranquilidade ao meu sono. Se escudos impenetráveis contra pesadelos existissem de verdade, ele claramente seria o meu. Foi assim no abrigo, foi assim também essa noite e eu tinha a ligeira impressão de que seria assim todas as noites enquanto ele estivesse ao meu lado.
E pensar que eu saí de casa e cheguei ao palácio querendo ir embora na primeira semana. Certamente, se a minha vida fosse um livro as pessoas poderiam ficar assustadas comigo, pois a velocidade com que eu mudei a minha posição a respeito do príncipe foi algo sobrenatural. Muitos até me tachariam de personagem volátil, mas o que eu posso fazer? Nem eu mesma entendi essa mudança. Eu só senti. Senti que foi o certo.
Eu percebi que quando o assunto é Osten eu sempre me vejo na beirada de um abismo, com duas opções possíveis. Recuar e permanecer segura, mas decepcionada, ou me lançar em queda livre, no desconhecido, um caminho sem volta e cheio de incertezas mas com sensações inesperadamente boas.
O meu cérebro é adepto ferrenho da primeira opção. O meu coração, da segunda.
Já li muitos romances na vida para reconhecer o que está acontecendo comigo. Ou até mesmo o que já pode ter acontecido.
Não era para ter sido assim. Eu não deveria ter deixado. Mas, a questão é, como eu poderia ter evitado? Me parece algo impossível de se fazer.
Os beijos, o ciúme, o sorriso involuntário, o conforto, a dor de ser ignorada, os pensamentos no futuro. Tudo aponta para uma só direção. A mesma direção da qual eu prometi para mim mesma fugir mas Vossa Alteza não me permitiu.
Um leve arrepio se passou pelo meu corpo quando Osten mexeu a mão que estava na minha cintura. Essa foi uma confirmação da qual eu nem precisava. A verdade estava mais do que clara.
Suspirei.
Eu estava me apaixonando pelo príncipe Osten. Confiar a ele o meu coração, porém, era outra coisa.
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Abri os olhos ao sentir algo pressionando a minha bochecha. Eram lábios.
— Me perdoe, eu não queria te acordar. — A voz de Osten invadiu os meus ouvidos. — Eu tenho que ir.
Olhei na direção da janela e percebi que a aurora já dava sinais de vida.
— Tudo bem.
— Obrigado, Alice.
Voltei-me para ele confusa com o seu agradecimento. Grave erro. Sua presença me atingiu em cheio. Literalmente, já que eu bati a minha cabeça na dele.
— Ai!
Ele riu.
— Não foi a melhor maneira de me dizer tchau.
Revirei os olhos.
— Como se eu tivesse planejado isso.
— Quem sabe você não planejou mesmo? — Ele disse com divertimento.
— Osten!
— Só uma hipótese. De qualquer modo Alice, saiba que assassinato é crime.
— Nem foi tão forte assim, seu exagerado.
— Exagerado, em? A maioria das pessoas não diria isso a um príncipe.
Eu corei.
— Não precisa ficar envergonhada. Eu só estava brincando. Gosto de ver como você reage.
Revirei os olhos de novo, mas também sorri. — Não consigo imaginar o que você fazia quando era criança.
— Eu consigo. — Seus olhos adquiriram um brilho travesso. — Já derrubei suco de manga na rainha da Itália por exemplo.
— A rainha Nicoletta?
— A própria.
— Meu Deus! — Exclamei perplexa. — Você poderia ter causado a 5ª Guerra Mundial.
— Longe disso. Eu só tinha 4 anos e a rainha simplesmente riu e me pegou no colo. Mas minha mãe ficou mortificada. Algo sobre a rainha Nicoletta estar usando uma peça de seda ou coisa assim, não me lembro muito bem.
Eu fiquei boquiaberta.
— E o que você fazia aos 8 anos? Fabricava ciclones?
Ele riu novamente. — Quase isso. — Osten olhou para a janela e suspirou. — Eu tenho mesmo que ir agora.
Eu assenti.
— Eu vou te mandar um bilhete acertando tudo do nosso encontro hoje, certo?
— Certo.
— Você pode me dizer quais da selecionadas estavam falando mal de você?
Aquela mudança brusca de assunto me pegou desprevenida. Fiquei tentada a dizer "Quase todas" e citar os nomes delas um a um, mas nunca fui do tipo que delata ninguém. Além disso, tudo o que eu queria era me esquecer daquilo.
— Não posso fazer isso.
— Tudo bem. Eu já sabia que você ia recusar. — Ele tirou uma mecha de cabelo da minha testa. — De qualquer forma, eu já sei quem foram.
Arregalei os olhos.
— Você sabe? Como isso é possível? — Perguntei. — Espere aí, como é que você descobriu tudo na verdade? Eu não contei a ninguém, e é óbvio que dificilmente alguma selecionada viria me favorecer diante de você.
Osten sorriu. — Tenho as minhas fontes.
— Ah não, você não vai fazer isso comigo. Você não vai dizer essa frase clichê e ir embora sem contar nada.
— Isso é exatamente o que eu vou fazer. Bom dia, Alice.
Ele deu um beijo na minha testa rindo e se levantou. Eu me sentei na cama, vendo-o calçar os sapatos e pegar o paletó dobrado na cômoda. Depois que ele abriu a porta, olhou para mim mais uma vez, e saiu contendo gargalhadas diante da minha cara de indignação.
Me deitei de novo com um baque. Mas ao invés de estar chateada, eu estava sorrindo.
E já tinha uma forte desconfiança sobre quem havia contado tudo ao príncipe.
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— Tudo bem, fui eu. — Leah disse sem hesitação.
— Jesus, Leah. Você não podia ter falado nada.
Ela revirou os olhos. — E eu devia continuar vendo você definhar a cada dia? Não contei só porque você é minha amiga, contei também porque o que elas estavam fazendo era errado de qualquer forma. Eu deveria ter feito isso há muito tempo na verdade.
— Mas...
— Nada de "mas". — Ela me interrompeu. — Eu já contei, não há como voltar atrás. E eu não voltaria nem mesmo se pudesse. Veja só você, mal consegue disfarçar a sua alegria. Suponho que o príncipe já tenha ido falar com você.
Ela tinha razão. Eu estava num êxtase ímpar àquela manhã. E saber que não teria mais que aguentar provocações era um bônus à parte.
— Sim. Ele foi ao meu quarto ontem à noite. — Corei com a lembrança de nós dormindo juntos de novo.
— Percebi. Você está parecendo comigo depois de passar um tempo com o Ste... — Leah se calou de súbito.
— O Ste...?
Ela balançou a mão no ar. — Esqueça. Phoebe deve estar louca atrás de nós duas para o café da manhã.
Era impressão minha ou Leah tinha tremido com a lembrança daquele meio nome? Como ela já tinha desconversado resolvi não persistir no assunto. Cada um tinha o direito de ter o seu tempo.
— Tudo bem. Já devemos estar atrasadas mesmo. E Leah, você está certa. — Dei um abraço nela. — Obrigada.
— Estou à sua disposição futura Alteza.
Ela insistia em me chamar assim, fato que eu achava bastante desconcertante. Pois se nem eu tinha a certeza de que podia me entregar a um relacionamento apesar sentir tudo aquilo por Osten, como alguém poderia tê-la?
Rindo sem jeito, eu a segui para a sala de jantar.
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