Capítulo 10

Naquela semana, o Jornal Oficial da sexta-feira, que seria o primeiro dessa Seleção, foi cancelado porque Gavril Fadaye estava doente.

Mas isso não foi nenhum empecilho para Osten, já que ele teve alguns encontros. Ou melhor, vários encontros. Na verdade, ele se encontrou com quase todas as garotas, exceto quatro.

E eu infelizmente estava entre essas quatro.

Isso só fez com que eu acreditasse cada vez mais nas palavras de Leanna. Certo, ela só quisera me abater quando falou aquilo tudo, mas se o que ela tinha dito não era verdade, porque Osten parecia estar me evitando? Oito dias haviam se passado e eu só o via nas refeições ou andando pelo palácio com alguma selecionada.

Hoje, como em todas as tardes, as selecionadas estavam matando o tempo no Salão das Mulheres. Leah e Madison estavam conversando, e eu estava enfiada em um livro, sentada um pouco longe de todas as outras meninas. Mas não longe o suficiente para deixar de ouvir algumas coisas.

— Leanna estava certa. Ela não teve um encontro sequer com o príncipe. — Sussurou Zoe Scott, de Whites. Se o intuito dela era ser discreta, ela falhou miseravelmente.

— Ele deve ter enjoado mesmo dela. Aposto todas as minhas fichas que ela volta para casa já na próxima eliminação. — Retrucou Avery Parker no mesmo tom.

— Nem aquela tentativa indecorosa dela no primeiro dia vai salvá-la, garotas. — Olivia Jones, de Belcourt, continuou, com ironia — Sair do quarto depois ser expressamente proibida só para se jogar no príncipe foi lamentável.

— Em Hudson nós temos uma palavra que define garotas como ela. — Avery falou, num tom amargo.

— Não só em Hudson, Avery, mas em todo lugar. Alice Wightman é uma oferecida.

— Se você repetir isso, Zoe, eu vou me certificar de que você faça o caminho mais rápido para a ala hospitalar. — Declarou Leah, subitamente tomando ciência da conversa enquanto se aproximava de mim.

Suspirei. A semana inteira tinha se passado dessa forma, com várias selecionadas aos cochichos falando mal de mim só por causa do tempo que passei com o príncipe no abrigo. Exatamente como eu havia imaginado que aconteceria. No começo eu tentei conversar com elas, para fazer com que parassem, educadamente. Não deu certo. Então Leah gritou com algumas delas, o que surtiu um efeito imediato, mas infelizmente temporário.

Ou seja, nada fez com que elas parassem. E às vezes até parecia que elas falavam justamente para que eu ouvisse.

Um fato. Eu lembrava claramente que Osten havia dito para eu contar a ele qualquer insinuação que alguém fizesse. Mas como eu poderia ter feito isso se não tive nem um momento a sós com ele? Ou ainda pior, se eu nem mesmo sabia mais se ele queria que eu continuasse na Seleção?

Sendo assim, não tive alternativa a não ser esperar que o tempo deixasse o assunto morrer. O que, definitivamente, não estava funcionando.

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— Já chega. — Leah disse, me encarando acompanhada de Madison. Nós três havíamos nos tornado muito amigas. E dentre elas só eu não havia tido um encontro particular, oficial, com o príncipe. — Madison, Phoebe já nos dispensou, então vamos levar a Alice para o quarto dela e espantar essa tristeza agora.

As duas me puxaram pelo braço antes que eu pudesse protestar.

Quando chegamos ao meu quarto minhas criadas estavam terminando os afazeres do dia.

— Senhorita Alice, aconteceu alguma coisa? — Evie perguntou.

— Aconteceu. — Leah respondeu no meu lugar. — Vocês já devem ter percebido que a Senhorita Alice está muito para baixo, estou certa?

Minhas três criadas assentiram.

— Ótimo, então nos ajudem a levantar o astral dela. Sabem de alguma coisa que senhorita Alice aqui adorava fazer mas parou desde que chegou ao palácio?

Evie, Mary e Summer negaram derrotadas.

— Vamos lá meninas, se esforcem. — Madison as incentivou.

Minhas criadas puseram-se a pensar com afinco. Eu devo ter sido uma péssima companhia mesmo esses dias para elas quererem tanto assim me alegrar.

— Oh, — disse Mary, parecendo se lembrar de alguma coisa. — Eu achei algo na mala dela no primeiro dia. A senhorita pediu para que eu guardasse e não as procurou mais.

Eu não fazia ideia do que ela estava falando, mas quando Mary voltou com as minhas sapatilhas de balé do closet eu subitamente me recordei. Assim que cheguei ao palácio, decidi que aqui não era um lugar para dançar, e como eu tinha tanta certeza que ia ficar pouco tempo, não vi problemas em parar com os meus ensaios durante a minha estadia.

— Eu não vou dançar. — Disse enfaticamente.

— Ah, vai sim. — Madison falou.

— Não posso, nem música nós temos aqui. — Tentei me justificar.

— Sem problemas. — Evie disse saindo do quarto.

Minutos depois ela voltou com um rádio nas mãos.

— A princesa Kerttu concordou em emprestar para você por um tempo Senhorita Alice. — Evie disse calmamente.

— Você pediu para a princesa? — Arregalei os olhos. — Porque você fez isso?

— Porque ela era a única que poderia ajudar, e porque quando eu falei que era para a senhorita ela não hesitou nem por um segundo.

— Só que... — Tentei argumentar, mas Leah me interrompeu.

— Pare com isso Alice. Você quer dançar e todas nós queremos ver. Então, por favor, pegue agora essas sapatilhas e vá se trocar.

— Tá legal, vocês venceram. — Suspirei, com as sapatilhas já nas mãos.

No closet, eu me dei conta do quanto eu havia tido saudades de dançar. Sorri abertamente enquanto calçava as sapatilhas e vestia a malha e depois de fazer um pequeno alongamento, voltei ao quarto.

— Sintonizem na estação de música clássica por favor. — Pedi, e Summer ligou o rádio.

Uma nova música havia acabado de começar, e por mais impressionante que fosse, era justamente a minha favorita. Ela era bem antiga, o Lago dos Cisnes, de um músico cujo nome se perdeu no tempo.

Sentindo a melodia, fiquei na posição inicial.

Transmiti a suavidade inicial das notas em passos curtos relaxados. A sensação de voltar a dançar era maravilhosa. Não demorou muito para que eu me desligasse do mundo e esquecesse de quem estava ao meu redor. Simplesmente fechei os olhos e bailei sem pensar em nada.

Quando dei por mim, a música já estava quase no fim. Um coro de notas corridas e altas que transmitiam desespero chegou aos meus ouvidos e eu finalmente pude expressar tudo o que estava sentindo, fazendo movimentos precisos, rápidos e certeiros.

Os passos finais eram os giros. Não hesitei em realizá-los. Girei, girei e girei, pegando mais velocidade a cada toque do meu pé no chão para tentar lavar minha alma da angústia e das inseguranças que me consumiam. Parei em posição frontal, num movimento decisivo.

Palmas rápidas me fizeram abrir os olhos e dar de cara com a princesa Kerttu, que me encarava sorrindo encantada.

— Eu fiquei curiosa sobre o que vocês estavam fazendo. — Disse ela.

— Alteza. — Nós todas nos curvamos em uma reverência.

— Você dança balé, meu deus. — Ela correu até mim e pegou minhas mãos, pulando. — Você pode me ensinar, por favor, por favor, por favor. Eu sempre quis aprender.

— Eu não sei se a rainha Eadlyn concordará com isso Alteza.

— Minha mãe vai deixar, aceite. — Ela me encarou com olhos pedintes e eu nada pude fazer se não concordar.

— Tudo bem. — Eu disse, pensando em como Phoebe ficaria ao saber disso.

A princesa se jogou na minha cama comemorando enquanto todas nós riamos.

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— Senhorita Alice? — A rainha Eadlyn me chamou no meio do jantar, fazendo todos me encararem, inclusive Osten.

— Sim, Majestade? — Respondi num tom receoso.

— A minha filha me contou que lhe pediu aulas de balé e a senhorita aceitou em ministrá-las, isso procede?

Eu assenti.

— Eu também soube em primeira mão por Phoebe que a senhorita não foi só a primeira a terminar a prova de História e Política Mundial, mas também a única a gabaritar. Diante disso, eu falei com o meu irmão e com Phoebe e nós três decidimos cancelar suas aulas por enquanto. No lugar delas, a senhorita poderá dar as aulas de balé a minha filha e, se aceitar, se tornar sua tutora temporária até que eu encontre alguém para assumir definitivamente o cargo.

Não sei quem ficou mais chocada com a atitude da rainha, eu ou as outras selecionadas. A parte do balé eu já esperava, mas a de tutora? Nem em um milhão de anos. No entanto, eu não queria mais passar o tempo só pensando na distância que Osten impusera entre nós, entao eu aceitei a proposta sem pestanejar.

— Eu estou de acordo, Majestade.

— Ótimo. — A rainha sorriu. — Vocês poderão começar amanhã.

É óbvio que quase todas as outras garotas não estavam nada felizes com essa aproximação entre mim e a princesa Kerttu. Elas engoliram a raiva porque não podiam contestar a rainha, mas ainda vi Leanna trincando os dentes.

Porque elas se importavam tanto com isso? O príncipe Osten estava me ignorando totalmente e dando toda sua atenção a elas, não a mim. Isso por si só já era tudo o que elas deveriam querer.

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