19.Meus motivos

Finn,

Eu estou um pouco tenso, os burburinhos pelos corredores só parecem aumentar, todos os olhos e ouvidos voltados para o Mash, respirei pesado, passando por ali sem dar a devida atenção, meu medo é que expulsem meu amigo.

Estava para virar à direita no corredor que dava para a casa Adler quando senti uma mão no meu ombro, olhei para trás e vi que se tratava do meu irmão.

— Vamos conversar. — Eu fiquei um pouco nervoso, Rayne nunca faz isso. Apenas assenti, andando ao lado dele.

— Como você está? — Ele perguntou sem desviar o olhar do caminho.

— Bem, e você? — Ele emitiu um som tipo um hum... Antes de fazer um carinho no topo da minha cabeça.

— Você é realmente inacreditável, Finn. Eu não esperava vê-lo lutar no exame, na verdade, fiquei surpreso em saber que iria participar.

— E isso te incomoda? — Eu temia que meu irmão me achasse um fraco, afinal de contas, eu não tenho a metade da força ou sequer o poder dele.

— Profundamente. — Desviei meu olhar e vi que ele me analisava de cima. — Sabe, eu te devo desculpas. Nunca imaginei que meu irmãozinho tivesse essa ambição e devo dizer que estou orgulhoso do que você fez. — Rayne voltou a andar e eu fiquei ali parado por alguns segundos.

— Espera. Eu não fiz nada.

Dessa vez, meu irmão parou, ele riu seco e uma única vez, eu nunca o vi agir desse jeito antes.

— Há mais de uma forma de lutar, Finn, quando você encontrar a sua, entenderá que se subestima demais.

Rayne voltou a andar e eu fiquei extremamente envergonhado. Até que me liguei em algo e o chamei.

— Você está indo ver o diretor, não é? É sobre os dragões da Kareen?

Ele respirou pesado, como se estivesse irritado com isso, e devia estar mesmo, parece que ele e Kareen não estão bem.

— Apenas uma reunião com alguns visitantes.

— Acha que o diretor vai expulsá-la?

— Não. E se fosse o caso, eu não permitiria. — A convicção dele é realmente inabalável.

— Então mande um olá a ela por mim. — Meu irmão assentiu antes de retornar ao seu caminho e eu fui ao encontro dos meus amigos.

— Parece que o Mash ficou popular. — Afirmei.

— Meu futuro maridinho, estou tão orgulhosa de você! — Lemon sorriu.
Começamos a conversar a respeito do que fariam com o exame e chegamos à conclusão de que seria anulado.

— Mas não faz sentido, o Mash deveria ser reconhecido. — Afirmei.

— Você esqueceu que o Macaron não foi derrotado. — Lance afirmou e, antes que pudéssemos dizer algo, mais burburinhosnos alcançaram. Já que estamos no corredor, a ideia era ir ao refeitório.

Olhei para frente e vi a cabeleira vermelha. Ela ria ao lado do Macaron até que me viu e veio em minha direção.

— Finn. — Ela me abraçou, eu já estou acostumado com as demonstrações de carinho dela, mas acho que meus amigos não, pois Dot ficou pasmo. — Como você está? — Ela analisou meu rosto enquanto segurava em meus braços.

— Alguém te machucou?

— Kareen se acalma. Eu estou bem. — A encarei e ela se afastou.

— Queridinha, eu tenho que ir, te vejo depois. — O Margarete sorriu e ela assentiu, dando um beijinho na bochecha dele.

— Não esquece que você vai me levar para fazer compras no fim de semana, Marg. — Ela piscou enquanto o Macaron abanava as mãos, ela riu e se voltou para mim.

— Seu rosto...

— Eu estou bem.

Ela então desviou o olhar para os meus amigos.

— Bom revê-los...

— Quem é você mesmo? — Mash perguntou.

— Seu idiota! — Dot reclamou. — Gatinha, perdoe os maus modos dele.

Kareen riu da situação. Minha cunhada não vê problema nisso.

— Tudo bem, eu ouvi muito o seu nome nos corredores. Finn não é muito de falar dos amigos.

— Então, você e ele têm algum tipo de... lance?

— O quê? Mash, nunca mais diga isso! — Afirmei. — Ela é a minha cunhada, entendeu?!

— Ah...Tá legal — Ele inclinou a cabeça para o lado como quem estava tentando entender e Kareen riu.

— Seus amigos são divertidos, Finn, fico feliz que esteja rodeado de pessoas boas. — Ela ajeitou os cabelos e encarou a Lemon, que estava um pouco envergonhada e eu senti vontade de apertar o colar que ela me deu. Realmente foi um bom presente.

— Você é muito fofa.

— Obrigada. — Notei que o olhar de Lemon foi para a aliança no dedo dela. — Espera, depois podemos conversar? E quem sabe me passar umas dicas. — Lemon sussurrou e Kareen sorriu.

— Ah, claro. Eu vou adorar ter uma amiga que gosta de comprar vestidos. — Piscou e depois me encarou mais uma vez: — Finn, eu lembrei agora, vou levar Igniss para a reunião, não quer conhecê-lo?

Eu pisquei diversas vezes e isso realmente me animou.

— É sério que eu posso? — Ela assentiu.— E os meus amigos?

— Também. — Palavras de Kareen me deixaram empolgado. Muito empolgado. Ela sorriu e nos encarou. — Muito bem, sigam-me.

Meus amigos não disseram nada, apenas a seguiram . Notando o quanto os olhares vinham até nós, Kareen nos guiou para fora da escola e pela floresta, descemos até aquele mesmo coliseu.

— Tem certeza que aqui é seguro? — Lemon perguntou e minha cunhada sorriu.

— Nada dará errado e se ficar em perigo temos muitos candidatos a visionários aqui. — Ela piscou se afastando um pouco e não vimos muito bem quando ela abriu um portal de tamanho mediano e por ele vi quando as escamas rubras e um olhar igualmente vermelho se acendeu, Kareen deu mais um passo para trás e abriu os braços me deixando extremamente curioso.

— Vem coisinha fofa. — Ela sussurrou enquanto um dragão praticamente do tamanho dela foi em sua direção ele a rodeava com suas asas e ela acariciava sua cabeça.  — Finn. — A voz dela chamou atenção dos meus amigos além da minha.

— Esse é Igniss, a minha família. — Ela sorriu de maneira amorosa. Todos ficamos quietos vendo como o dragão se comportava como se fosse um cachorro, mas de repente uma pata enorme e negra pisou pelo portal abrindo-o mais, eu não conhecia aquele tipo de dragão, mas estava claro que isso a irritou pois ela mandou que o dragão que ela chama de família ficasse para trás e foi até o portal.

 — Azrathos, volte agora para casa. — Ele não parecia querer obedecer, quando se abaixou pude ver seu enorme olhar azul e parte de seus dentes, aquele dragão dava medo. Muito medo, no entanto Kareen o encarava ao ponto de que não conseguimos vê-la de frente e depois de alguns minutos o dragão se curvou em respeito e voltou para dentro do portal. — Quando Tristan acabar aqui ele irá até você, até lá, nunca mais faça isso.

Em um consentimento mudo, o dragão voltou e ela fechou o portal.

— Prontinho! Podem se aproximar, Igniss gosta de atenção. — Meus amigos estavam um pouco receosos e é completamente entendível afinal é um dragão!

Porém ao me aproximar ele se esgueirou e me analisou, eu fiquei imóvel e prendi a minha respiração e então senti a mão de Kareen nas minhas costas em um afago.

— Ele não vai te machucar, na verdade espera a bastante tempo para te conhecer. — Ela afirmou e eu relaxei na medida do possível até sentir o animal se aproximar mais e roçar a cabeça na minha perna, estava quente mas nada que não fosse insuportável.

— Ele é muito manso para um dragão. — Lance afirmou.

— Dragões como qualquer outro animal da classe dele só atacam para comer e, se, sentem ameaçados, ele não irá machucar uma pessoa por nada e Igniss é diferente, fora que ele não devora humanos. — Ela se afastou um pouco e nos deixou conhecê-lo melhor Karen ficou ali mexendo com a varinha enquanto eu, Dot, Lemon e Mash brincávamos com ele, Lance, no entanto se manteve distante.

Kareen viu de longe os fios loiros daquele amigo dela e se aproximou novamente.

— Igniss, vamos. Está na hora. — O dragão se afastou, andando calmamente até estar ao lado dela.

Tristan se aproximou e sorriu.

— Oi, Finn.

Eu retribuí o cumprimento, e ele se abaixou para fazer uma leve carícia na cabeça de Igniss.

— Vai levá-lo para a reunião?

Ela assentiu.

O loiro então se afastou e pegou a varinha. Era preta e parecia ter escamas de dragão por todo o comprimento. Quando a brandiu em direção ao dragão, ele encolheu até ficar do tamanho de um copo e não tardou a voar, pousando no ombro de Kareen, onde descansou e esfregou o rosto no dela.

— Princesa, você precisa ser mais calma com Azrathos. — Tristan falou, e, por um momento, imaginei meu irmão atravessando uma espada nele.

— Mande-o me obedecer, ou da próxima vez não serão só palavras. — Ela se virou para nós e sorriu. — Bom, eu tenho que ir. Na verdade, já estou atrasada. Quem sabe um dia possamos dar uma voltinha pelos céus? Até breve. E, Finn, se cuida.

Kareen sorriu antes de se afastar, e eu encarei mais uma vez a forma como ela e Tristan andavam lado a lado.

É... Meu irmão terá uma crise de raiva.

— Essa garota é muito perigosa. — Lance disse, e eu respirei pesado. Ele não estava errado. Eu podia sentir isso no fundo, como se Kareen tivesse mais segredos do que qualquer um de nós fosse capaz de entender, mas jamais a questionaria dessa forma, uma vez que ela sempre esteve do nosso lado.

— Bom, se ela for mesmo perigosa, que bom que está do nosso lado. — Mash afirmou.

Respirei fundo e olhei para eles. Mash, Dot e Lemon ainda estavam tentando processar tudo, mas estavam visivelmente mais relaxados após verem que Igniss era amigável. Só Lance estava distante, claramente incomodado com tudo. Eu sabia que ele estava mais cauteloso... talvez até com razão.

— Eu sei... — murmurei, pensando em tudo o que havia acontecido naquele dia e nas possibilidades que poderiam surgir com a presença dos dragões. Ela era envolta em mistério, poder e talvez até perigo. Mas, ao mesmo tempo, era a namorada do meu irmão, uma pessoa extremamente boa.

Lance me olhou, mas não disse mais nada, apenas continuou observando o caminho por onde Kareen havia ido, com uma expressão que misturava preocupação e desconfiança. Eu sabia que, de alguma forma, as coisas com ela e com o que trouxe para nossas vidas não seriam simples. E eu não sabia se estava preparado para o que viria a seguir.

— Vamos voltar? — Dot perguntou, tentando suavizar a tensão que pairava no ar. — Ainda estou curioso sobre ela.

Eu dei um pequeno sorriso, mas estava longe de estar tranquilo.

— Não fique. A família Bernauer é tão antiga quanto a linhagem dos dragões. — Lance afirmou.

— E quem são esses? — Mash perguntou.

— Mozão, acho que estão falando da Kareen. — Lemon sorriu.

— Kareen Bernauer é a filha de um homem muito cruel, com um passado que foi limado do nosso mundo: Silver Fayne. — Lance afirmou.

— E como você sabe disso? — Dot fez a pergunta de milhões. Todos queríamos saber de onde ele tirou essa informação.

— Na época em que eu morava com meus pais, eles contaram algumas vezes a respeito dos Bernauer. Uma antiga linhagem de bruxos fortíssima, tão poderosa que só tinham magos de três listras. Até que a líder do clã se apaixonou por um estrangeiro e, então, tudo ruiu. Aos poucos, cada membro da família foi morrendo, até que restassem apenas a própria líder, grávida, e o marido, que ocupou o lugar da esposa quando ela adoeceu. Eu não sabia que Kareen era uma aluna da Easton, mas, assim que ouvi o sobrenome, assimilei a história. Até onde sei, ela é fruto desse relacionamento, e é estranho que tenha apenas uma listra.

— Que história bizarra. — Mash comentou.

— É mesmo sinistra. — Dot endossou.

— Tá, mas e os dragões? — Lemon parecia curiosa de uma forma genuína.

— São obra da mãe dela antes de morrer. Porém, eu não sei como aquela família foi capaz de domá-los. Eles sempre foram um perigo para o nosso país por um motivo.

O ceticismo de Lance não me incomodava, apenas aumentava minha curiosidade. Algo me dizia que, com Kareen e Tristan fora da escola, coisas ainda mais inesperadas poderiam acontecer. E com Rayne, tudo seria mais complicado... Afinal, meu irmão odeia aquele cara.

— Vamos. — Respondi, mas a sensação de que algo maior estava prestes a acontecer não saiu da minha mente.


Kareen,

Tristan andava ao meu lado e, de tempos em tempos, desviava o olhar para mim. Seus pensamentos pareciam incertos, o que me deixava um pouco desconfortável — algo que nunca havia acontecido ao lado dele.

— Tristan. — Ele me encarou. — O quanto você deu a Azrathos?

Ele respirou fundo, me observando, e parou no meio do caminho. Estávamos próximos à escola, mas não o suficiente.

Tristan fez um carinho no meu dragão e sorriu.

— Eu já te falei, princesa. Eu dei tudo.

Segurei seu pulso, encarando-o com seriedade.

— Me mostra. — Exigi.

Ele respirou pesado. Tristan também usava o uniforme, mas sem capa e sem gravata.

Se afastando um pouco, ele começou a abrir lentamente os botões da camisa branca, revelando o corpo definido e a marca ainda enegrecida, exatamente sobre o coração. Aquilo me assustou. Ter conhecimento sobre isso era diferente de ver com meus próprios olhos. Toquei a marca e ele fez uma careta de dor, o que me fez recuar imediatamente.

— Se meu pai matar Azrathos...

— Ele não vai. — Tristan fechou a camisa e alisou meu cabelo. — Você realmente não se lembra dele, não é?

Por um instante, fiquei confusa, mas então ele respirou fundo, e Igniss soprou fogo na ponta dos dedos dele.

— Igniss!

— Tudo bem... Aparentemente, eu falei demais. Vamos?

Eu queria respostas, queria interrogá-lo, mas sabia que precisávamos comparecer a essa reunião.


🔮🔮🔮


Havia mais Visionários Divinos do que o esperado. Rayne estava ao lado deles, enquanto eu permanecia no centro, sendo julgada ao lado de Tristan.

— Agora que estamos aqui, pode começar a explicação, queridinha. — Ryoh estava irritado, e eu respirei fundo.

— Serei breve. Vocês imaginam o que aconteceria se a magia dos dragões caísse em mãos erradas? Esse é o motivo pelo qual meu país foi exilado. — Fui direta, e tanto o diretor quanto o líder dos Visionários me encararam.

— Uma barreira viva não é impossível de quebrar. Vocês já viram a situação de perto. — Encarei o diretor, que alisava a barba com seu único braço.

— Muito bom. Mas você saiu de lá e está aqui agora. — A voz de Ryoh ecoou. — E tem passado por ela várias vezes.

— Isso porque eu trouxe comigo a certeza de que nada mais iria acontecer. Para a barreira ser destruída, eu deveria estar lá, mas não pretendo voltar.

As coisas eram tão simples que eu não entendia o motivo dessa reunião. Os olhares se desviaram para Tristan enquanto eu acariciava meu pequeno dragão.

— Innocent Zero é o ser mais poderoso atualmente. Conseguem imaginar o que ele faria se tivesse magia pura de dragão? A magia de dragão que vocês conhecem não é nem um terço do que eles realmente podem oferecer. Agora, imaginem um ser extremamente poderoso com nossa magia... Seria impossível derrotá-lo, se é que já não se tornou. Fora que ele poderia utilizar os dragões para benefício próprio.

— Tristan! — Chamei sua atenção. Eu não confiava em todos ali. — Eles já entenderam. — Tentei demonstrar o máximo de tranquilidade, apesar dos olhares fixos em mim.

— Se essa for a questão, temos como lidar com isso. Não será um grande trabalho. — Orter desviou o olhar para mim. — Além disso, ela aparenta ser a mais fraca do reino.

Esse Visionário me irritava profundamente.

— Não seja tão precipitado, Orter. Ela apenas age como uma fraca. Afinal, ainda é uma Bernauer, e, até onde me informaram, esses dois foram capazes de destruir completamente o mercado negro que existia em seu país. — A voz veio de Kaldo. Eu o conhecia porque, às vezes, ele conseguia conter a implicância de Ryoh.

— Que seja. — Orter murmurou.

Olhei para Ames. Ele estava irritado e visivelmente frustrado.

— Bom, nesse caso, senhorita Bernauer, você não tem motivos para fugir ou sequer ser expulsa da escola. Alguma objeção? — O diretor afirmou, e senti um peso ser retirado dos meus ombros.

— Eu tenho uma. — Kaldo se levantou. — Ela aprontou bastante nos últimos meses. Destruiu dois mercados, deu uma surra em algumas pessoas importantes e trouxe dragões para nosso país. Algo que é extremamente proibido.

Minha respiração pesou. Punições não seriam uma boa ideia agora.

— Vai com calma, Gehenna. Vamos ouvir o que ela tem a dizer. — Ryoh ironizou.

Notei que, esse tempo todo, Igniss dormia em meu ombro. Senti vontade de acariciá-lo, mas me segurei. Então, ergui os olhos em direção aos Visionários, encarando Rayne diretamente.

— Eu não tenho nada a dizer. Esta cidade vive cheia de problemas, e vocês parecem verdadeiros cegos. Só agem quando lhes convém, visto que são a ordem máxima daqui. Regras são quebradas diariamente, inclusive no mercado clandestino, que trafica gente enquanto nenhum de vocês move um dedo para impedir. Mas, quando um dragãozinho aparece, querem dar chilique? Francamente!

Perdi parte da minha compostura e, logo em seguida, ouvi palmas e uma bela risada vinda de Grantz. Meu namorado, por outro lado, parecia relaxado e até orgulhoso do meu posicionamento.

Eu jamais me acovardaria por causa de um cargo elevado.

— Ela é sempre tão espirituosa. — Ryoh se levantou e veio até mim.

Tristan estava tenso. Dava para sentir que, a qualquer momento, as coisas poderiam sair dos eixos. O Visionário, no entanto, parou à minha frente, puxou a varinha e tocou a cauda do meu dragão antes de me encarar.

— Vamos testar uma coisinha.

Eu sabia que teria problemas com o meu controle, pois Igniss, aparentemente, seria colocado em perigo.


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