12.Um novo ano

Kareen,

Desde que as férias se passaram, seis meses se passaram. Nesse meio tempo, eu e Rayne não tivemos mais contato físico e muito mal estamos conseguindo manter as cartas. Ele está em uma missão como visionário e eu sei bem como isso funciona. Outra coisa que mudou bastante no nosso cotidiano foi a minha posição na escola. Agora que estamos no terceiro ano, o diretor me colocou como braço direito dele e estava tudo ótimo, porém o Ryoh não larga do meu pé e com isso estou trabalhando no gabinete. O bom é que ficou mais fácil para falar com Ames e ruim porque eu detesto todos os visionários divinos com todo o meu ser, exceto o meu namorado.

São arrogantes e cheios de prepotência, dá tanta vontade de explodir todos eles, mas aí eu vou e me acalmo, principalmente quando o Grantz insiste em testar as minhas habilidades. Ele meio que afirmou que estou escondendo algo e está coberto de razão, então eu o deixo brincar com meu poder, ou seja, ele sempre me força a lutar contra ele e isso é bom porque eu acabo treinando no processo e aprendendo cada vez mais sobre mim.

Fora tudo isso, não tenho conseguido aperfeiçoar minha magia das trevas, como Margo costuma chamar, e por falar nela, é uma pena o quanto nos afastamos. Quase não consigo vê-la na escola e, quando estamos juntas, sempre tem algum capacho. Eu nunca imaginei que alcançar a maioridade fosse assim: sem tempo para os amigos, entupida de trabalho e estudo e com um namoro distante por conta desse mesmo motivo. Porém, não posso reclamar, pois as pessoas que estão na minha vida permanecem nela.

Finn conseguiu passar na escola e chegou aos meus ouvidos que estava sendo atormentado por alguém filhinho de papai ridículo e, antes que eu pudesse intervir, ele arrumou um colega que fez isso por ele, mas obvio que não deixei barato.

Eu estava revoltada, o desgraçado além de roubar o amuleto que eu dei para ele, simplesmente o ameaçou por que o papaizinho dele trabalha no gabinete e isso me faz rir, um grande covarde. Os visionários divinos são a ordem desse país e o irmão de Finn é um deles, isso mostra o quão grande é o caráter do meu cunhado por não querer utilizar o nome e a posição do irmão para sobressair, mas eu não sou Finn e muito menos o Ames. Prometi para o diretor que não tacaria uma azaração no idiota, mas não falei nada sobre o pai dele...

E foi exatamente isso que eu fiz, fui até o papaizinho dele e o apresentei a minha lei. Deixando claro que a Easton não aceitaria mais inúteis feito o filho dele e que se ele quisesse que o filho continuasse lá teria que fazer por merecer e retirar todas as regalias do moleque inútil e se não cumprisse as minhas ordens eu lhe daria a pior tortura do mundo. O velho não acreditou então lhe dei uma prova e depois de me xingar de tudo o quanto é nome além de ser um xenofóbico estúpido ele fez o que ordenei e então eu sumi. 

OFF


— Você está fraca, desvie de novo. — Ryoh ordenou e respirei fundo me negando.

— Eu não vim aqui para ser a sua diversão pessoal, eu nem sei por que insiste tanto em me treinar. 

Ele estalou os dedos trocando de roupa e vindo pra cima de mim com tudo, precisei desviar e dar um cambalhota para trás ou ele me atingiria em cheio.

Levantei-me depressa depois da cambalhota, soltando um suspiro irritado. Eu podia sentir o olhar do Ryoh em cima de mim, avaliando cada mínimo movimento meu, o que só tornava tudo ainda mais insuportável.

— Você acha que isso é brincadeira? — ele questionou com aquela voz de quem se julga autoridade suprema, me olhando como se eu fosse só mais uma aluna medíocre. Mas eu percebi algo nos olhos dele... um brilho de interesse escondido. Ele queria ver até onde eu ia?

Eu cerrei os dentes, recuperando o fôlego e mantendo o olhar firme.

— Não acho nada disso, mas o que você quer de mim, Ryoh? — retruquei, tentando não deixar transparecer minha irritação. — Já prova todos os dias o quanto odeia os visionários divinos, então por que está tão empenhado em me treinar?

Ele se aproximou devagar, aquele olhar frio e meticuloso não desviando um segundo do meu rosto.

— Porque é isso que você vai enfrentar, Kareen. Visionários, políticos, gente que não vai pensar duas vezes antes de te atacar, e você sabe disso — ele rebateu com uma intensidade que me fez querer rir. — Eu só estou te dando uma prévia.

Revirei os olhos, exausta das provocações constantes. Mas havia algo naquelas palavras que me fez hesitar, e ele percebeu, claro que percebeu. Um sorriso desafiador, sutil, surgiu no canto dos lábios dele.

— Se você está com tanto medo que eu não saiba me defender, talvez não tenha prestado atenção nos últimos treinos — rebati, invocando uma faísca de energia nas mãos só para ver se ele parava de me subestimar. — Acha mesmo que eu sou uma maga qualquer?

Ryoh parou, e o silêncio que seguiu só intensificou o peso do olhar dele.

— Não. Acho que você é uma das mais promissoras. E, por isso, é a que mais precisa se preparar. Goste ou não, você atrai a atenção dos visionários. E é essa atenção que pode te colocar em perigo então continuará sob a minha supervisão querendo ou não.

Antes que eu pudesse responder, ele avançou de novo. Rápido demais, imprevisível. Não tive tempo de reagir, e o impacto da magia dele me fez cambalear para trás, os pés escorregando no chão.

— Acalme-se, Kareen. Você ainda não sabe controlar isso direito — ele disse, mas sem aquele tom de repreensão que eu esperava. A dureza estava lá, mas parecia mais... cuidadosa. — Vamos de novo.

Respirei fundo, me preparando para o próximo ataque. Dessa vez, eu não ia mostrar fraqueza. Eu sabia que ele não ia pegar leve — mas ele estava prestes a descobrir que eu também não.

A explosão devastou a sala com uma força brutal, o impacto reverberando pelo espaço e ameaçando engolir tudo ao redor. Meu corpo agiu no reflexo, conjurando uma barreira de proteção que se ergueu à nossa frente. Mas eu estava exausta, cada fibra do meu ser gritava com o esforço, e a barreira falhou na parte de cima.

Os escombros subiram em um arco vazando por cima da proteção, e por um segundo, pensei que fosse o fim. Mas o erro acabou se tornando uma vantagem inesperada — enquanto o caos se erguia ao redor, a abertura na barreira deu tempo suficiente para que ele entrasse em ação. Com um movimento rápido, Ryoh dissipou os destroços que ameaçavam desabar sobre nós ou a cidade.

Ele me olhou, os olhos estreitos e calculistas, como se estivesse avaliando minha condição.

— Parece que ainda precisamos trabalhar mais na sua resistência — comentou, impassível. Ahse ele soubesse a verdade, isso sim seria surpreendente, porém prefiro manter assim.

Engoli em seco, sentindo a frustração misturada ao alívio. Mas não ia deixar ele perceber isso.

— A explosão estava sob controle... até você resolver aumentar a intensidade — retruquei, com um meio sorriso desafiador, tentando manter a compostura.

Ele arqueou uma sobrancelha, quase como se estivesse achando graça da minha resposta.

— Sob controle? Kareen, se a explosão estivesse sob controle, a sua barreira não teria falhado.

Engoli em seco de novo, o cansaço começando a pesar, mas mantive o que restava da minha postura firme.

— Foi um cálculo preciso, Ryoh. Eu já estava pronta para corrigir qualquer falha... você só resolveu acelerar o processo.

Ele deu um passo à frente, os braços cruzados, me observando com uma intensidade irritante.

— Sabe qual é o problema? — perguntou ele, os olhos semicerrados. — Você se contenta com a superfície das coisas. Sabe que tem potencial, mas se limita ao básico, porque é mais confortável.

Eu senti o calor da irritação crescendo.

— Limite? — rebati, erguendo o queixo. — Talvez você esteja confundindo minha prudência com algo que você nunca teve: controle.

Ele deu um sorriso enviesado, um brilho de desafio nos olhos.

— Controle, é? Então prove, Kareen. Mostre que sabe o que está fazendo. Porque se não sabe, alguém vai acabar te superando — disse ele, com uma calma cortante. — E eu te garanto, não vai ser nada gentil.

Aquilo me atingiu mais do que eu gostaria de admitir. Eu sabia que ele estava testando meus limites, mas também sabia que estava cansada de jogar esse jogo em que sempre pareço um passo atrás dele. Respirei fundo, sentindo cada músculo tenso, como se o próprio ar fosse uma batalha.

Decidi que não responderia. Em vez disso, invoquei uma energia densa, envolta em sombras, e fiz com que uma camada dela se expandisse em volta de mim como uma nova armadura, aumentando minha própria defesa e assumindo um controle total sobre aquela nova força.

O rosto dele ficou sério, e pela primeira vez em muito tempo, vi algo como ansiedade nos olhos dele.

— Finalmente — murmurou ele, num tom de aprovação inesperada. — É isso que eu quero de você Bernauer! Mostra pra mim do que é capaz. — O sorriso dele se alargou, e naquele instante eu percebi a besteira que fiz. Se a minha magia das trevas se manifestasse por completo, a linha oculta que eu tanto preservo poderia aparecer, e isso traria problemas. Inspirei fundo, puxando toda a energia de volta para o centro do meu corpo, controlando o fluxo até que a aura escura fosse apenas um eco ao meu redor.

Com calma, ajeitei meus cachos rebeldes, ergui o queixo e o encarei com uma expressão de desdém calculado.

— Já tivemos destruições demais por hoje. Vai ficar só na vontade, visionário divino Ryoh Grantz — pronunciei o nome dele de forma provocadora, sabendo o quanto isso o incomoda quando sai da minha boca.

Dei-lhe as costas com uma tranquilidade que disfarçava meu cansaço, tentando ao máximo manter a compostura enquanto me afastava. No entanto, o som de sua respiração arfante e passos pesados atrás de mim fez com que eu me virasse por um instante.

Ele havia me seguido, o olhar intenso, um brilho feroz de curiosidade e desafio ainda mais evidente.

— Você acha que pode simplesmente me provocar assim e sair andando, Bernauer? — Ele parou a poucos passos de mim, a expressão dividida entre o fascínio e a irritação.

Eu dei um meio sorriso, com um toque de ironia.

— Te provocar? Só estou lembrando você de que o controle é algo que se aprende, Ryoh. Talvez um dia você descubra.

Vi um lampejo de irritação atravessar seu rosto, e então ele deu um passo para frente, encurtando ainda mais a distância entre nós.

— Controle? Sabe que essa é a primeira lição que aprendi. Mas você ainda acha que me entende, não é?

Mantive minha postura, sem recuar. A voz dele era quase um sussurro, mas havia algo de desafiador, como se ele estivesse determinado a extrair de mim o máximo possível.

— E quanto a você, Kareen? Acha que fugir agora vai resolver seus problemas?

— E quem está fugindo aqui, Ryoh? — sorri, carregando a provocação no tom, um sorriso cínico, só para que ele soubesse que não recuaria.

Ele me olhou com aquela expressão de malícia que, para meu desgosto, parecia imortalizar-se em seu rosto. Aquele brilho perigoso nos olhos, o meio sorriso que desafiava, como se soubesse de um segredo sobre mim que nem eu mesma sabia.

— Então prove, Bernauer. Me mostre que não tem medo — ele retrucou, dando um passo à frente, deixando claro que não pretendia encerrar nosso treino sem antes me ver à beira do limite.

Cruzei os braços, mantendo a postura firme, mas sentindo a tensão crescente entre nós. Essa era a arte dele: me testar até eu me desdobrar em pedaços, insistindo que eu mostrasse tudo, até o que deveria permanecer oculto.

— Já cansei de brincar com seus joguinhos — rebati, firme, ainda mantendo o sorriso irônico. — Se acha que pode me empurrar sempre, está enganado. Tenho coisas mais importantes para fazer do que ser seu passatempo.

O sorriso dele alargou ainda mais, o olhar afiado e perscrutador.

— Ah, sim, seu tão precioso controle. — Ele se aproximou mais um pouco, até eu sentir sua presença ao ponto de ser impossível ignorá-lo. — Mas sabe, Kareen, o que mais me intriga não é o que você mostra. É o que esconde.

Fiquei quieta por um momento, mas não deixaria que ele percebesse o que essas palavras realmente significavam. Ele não entenderia, ou pelo menos, eu não queria que ele soubesse o quanto acertara. Ajustei o sorriso e mantive o olhar firme.

— Talvez você nunca descubra — respondi, mantendo o tom desafiador antes de deixar o local arruinado.

Enquanto os dias se arrastavam, a ausência de Ames se tornava um peso em minha rotina. Havia algo quase insuportável em não tê-lo por perto, em não poder contar com suas palavras, seu toque. As cartas, por mais sinceras e afetuosas, eram um consolo raso, especialmente quando me via presa naquela escola, com compromissos inacabáveis e uma pressão constante. Estávamos no terceiro ano e minha função como braço direito do diretor tornava as poucas oportunidades de comunicação ainda mais complicadas.

Cada carta de Ames era um alívio, mas também um lembrete do quão distante estávamos. Ele sempre dizia que estava bem, que sua missão estava sob controle e que logo voltaria, mas eu sabia o que significava ser um visionário, e ele parecia cada vez mais distante a cada correspondência. Nossas palavras se limitavam a pequenos relatos do cotidiano, quase formais, o que me deixava inquieta. Não era o suficiente. Eu sentia falta da intimidade, das conversas longas sobre qualquer assunto, dos momentos em que o mundo parecia pequeno ao nosso redor.

Lembro-me de uma noite, depois de um longo dia de treinamento com Ryoh, em que me sentei no canto mais alto da torre do gabinete, com a última carta de Ames nas mãos. A lua estava cheia, iluminando as palavras que eu já havia lido mais vezes do que poderia contar. Nela, ele mencionava como pensava em mim a cada noite, e como esperava poder voltar logo para que nossos caminhos se cruzassem outra vez.

"Estou seguro, Kareen. Mas o trabalho aqui exige mais do que imaginei. Espero que você esteja bem e que continue treinando, mesmo que seja apenas para me surpreender quando eu voltar."

Fechei os olhos, tentando imaginá-lo perto de mim, ao meu lado. E com isso, a saudade crescia, uma saudade que não parecia ter fim. Ames era o único a quem eu confiava completamente, o único que me fazia acreditar que eu não precisava enfrentar o mundo sozinha. Sua ausência deixava um vazio, e com ela, uma espécie de incerteza se eu ainda o conhecia como antes.

Nesses momentos, acabei me jogando no trabalho, nos treinos exaustivos com Ryoh, tentando sufocar a saudade com atividades. Mas, inevitavelmente, ao fim do dia, lá estava o vazio outra vez, e a dúvida.

Uma noite, peguei uma pena e, sem pensar muito, comecei a escrever para ele:

"Ames, a verdade é que sinto sua falta como nunca imaginei. Sei que você tem responsabilidades que vão além do nosso entendimento, mas às vezes sinto como se estivesse perdendo algo. Queria que as cartas bastassem, mas a distância parece maior do que nunca. Quando voltaremos a ser nós? É estranho dizer isso, mas tenho receio de que a saudade se torne uma presença constante, algo que simplesmente se acomode entre nós. Volte bem."

As palavras saíram cruas, sem muita organização, mas eram verdadeiras. Enviei a carta sem hesitar, ainda queria por coisas como "Volte logo. Eu preciso de você mais do que posso admitir." Porém não quero parecer grudenta ou dar mais imaginação a minha mente distorcida que grita que algo entre nós vai dar errado e mesmo que a resposta pudesse demorar eu esperaria ansiosamente por ela.

Dias depois, enquanto lidava com outro treinamento exaustivo com Ryoh, algo inesperado aconteceu. Ao chegar ao meu dormitório, encontrei uma nova carta de Ames. O envelope estava desgastado, e as primeiras palavras já mostravam um tom de afeto que não estava presente nas correspondências anteriores.

"Kareen, recebi sua carta e entendo o que está passando. Acho que também estou perdendo um pedaço de mim a cada dia longe de você. Sinto sua falta, e só posso prometer que, ao final de tudo isso, encontraremos uma forma de recuperar o tempo perdido. Acredite, estou contando os dias."

As palavras dele me aqueceram como um abraço distante, e, mesmo que não diminuíssem a saudade, ao menos me deram uma esperança. Talvez esse tempo longe fosse apenas uma fase, um teste para ambos e creio que nunca fiz Ames ser tão carinhoso abertamente.

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