03 - Intrigas Veladas
Minhas mãos se enroscam instintivamente nos cachos loiros enquanto aguardo nervosa por uma resposta.
O escritório de Raposo é uma extensão de sua personalidade implacável. As paredes revestidas de madeira escura conferem um ar de mistério ao ambiente, enquanto a iluminação tênue destaca sua preferência pelo discreto. Uma poltrona de couro gasto fica à sua mesa, testemunha silenciosa de inúmeras decisões duvidosas. O aroma amadeirado do espaço mescla-se com o leve cheiro de tabaco, revelando os vestígios de seus vícios.
Seus olhos âmbares deslizam pela folha com uma frieza calculista que arrepia a pele, seus lábios marcados por um sorriso satisfeito. Ao concluir a análise dos documentos, ele os entrega a Nathan, instruindo-o a levar as provas.
— Melhor do que eu imaginava, sem dúvida! — exclama finalmente.
Melhor? Tudo aquilo é simplesmente horrível; apenas alguém como ele ficaria satisfeito com algo assim.
— E o que você fará? — questiono, hesitante.
— Chantagem, é claro.
Isso é ridículo... não preciso de mais detalhes para entender o plano de Raposo. Ele pretende retirar o Lorde de cena e, provavelmente, embolsar uma bela quantia. Alden fugirá com todo o ouro que extorquiu do povo, construindo uma nova vida em outro lugar. Bem, eu não quero isso. Esse cretino merece muito mais que perder seu cargo.
— Não vai matá-lo? — pergunto, sem pensar.
— Está se oferecendo para o trabalho? — ele retruca, sua risada rouca ecoando pelo escritório.
— Não. — essa é uma linha que ainda não cruzei, e nem pretendo. Não até colocar minhas mãos em minha madrasta.
Os cabelos acobreados de Raposo caem sobre seus olhos quando ele se inclina sobre a mesa, tirando algo da gaveta. Estende uma sacola de moedas generosa, mas recolhe as mãos quando meus dedos tocam nela, fazendo as moedas tilintarem.
— Tem planos para hoje, Ellara? — ele questiona provocador, uma sobrancelha agora perfeitamente arqueada.
Essa não seria a primeira vez que ele faz uma proposta do tipo. Meus olhos percorrem sua figura, os cabelos acobreados bem alinhados, tocando sutilmente as orelhas, seus chamativos olhos dourados, a barba feita, traços bem marcados e corpo musculoso. Tenho que admitir, o homem não é de se jogar fora.
Raposo poderia ser um belo passatempo, mas uma dor de cabeça que eu não gostaria de almejar. E isso não tem nada a ver com ele ter dezoito anos a mais que eu; simplesmente não acho que me envolver com meu chefe seja uma ideia sábia.
Ou talvez, no fundo, eu saiba que tem a ver com uma certa promessa que fiz à minha mãe. O que é uma grande idiotice de se manter, já que não é como se tivesse um príncipe esperando para casar comigo por aí.
— Tenho. — Respondo finalmente, esticando as mãos em direção ao saco de moedas. — Passe isso logo.
— Sua educação é... admirável. — Seu sorriso ladino me irrita, como se eu fosse um ratinho pronto para ele brincar. — Seus planos envolvem Thorne ou Nathan?
Foi impossível evitar que minhas bochechas corassem. Ele está, como sempre, muito errado sobre Thorne... já Nathan, bem, talvez eu tenha mantido minha promessa, mas também posso ter brincado um pouco com certas pessoas, incluindo o funcionário preferido dele.
— Não é da sua conta!
Respiro fundo, tentando conter a vergonha que me tomou. Tenho vinte anos, moro sozinha e trabalho; não preciso ser uma dama imaculada, não mais. Ninguém liga para o que a ralé faz em seu tempo livre. Não existem mais cobranças para mim.
Estou perdendo o foco, e tenho vontade de me estapear quando percebo o que aquele desgraçado está fazendo. Ele está me distraindo para que eu esqueça a história do Lorde. Maldição!
Está claro que ele lidará com a situação de forma política, mas isso está longe de ser justo; o desgraçado precisa ser punido. Preciso pensar em algo, argumentar sobre isso não resultará em nada, Raposo faz as coisas como quer.
As provas devem estar no armazém, sem dúvida. Minha mente gira com todas as informações que tenho.
Pense, Ellara, pense.
Sorrio quando um plano se desenha, um intricado quebra-cabeça de estratégias. Para dar certo, preciso estar alerta e ser rápida.
— Você ficará encantado ao saber que pretendo investir essas moedas no seu cassino. — minha voz transborda irritação e faço questão de soltar um bufar, como se tivesse cedido. Finalmente, meus dedos se fecham firmemente na sacola.
— Permita que eu a leve. — O brilho faceiro em seus olhos me cutuca, uma faísca que ameaça incendiar tudo. Contenho a vontade de socar seu rosto.
━━━━━━━━❪❂❫━━━━━━━━
O cassino de Raposo é um abismo de devassidão, uma dança embriagante entre o proibido e a sedução. Desço os degraus que se afundam na escuridão, a entrada disfarçada como a porta para um reino secreto.
O salão se desdobra diante de mim, uma miríade de tentações em uma sinfonia caótica.
A iluminação, suave e indulgente, transforma as sombras em cúmplices silenciosos. Mesas de jogos exalam o aroma aguçado da madeira polida, enquanto cadeiras acolchoadas sussurram histórias de jogadores audaciosos. Cortinas de veludo abraçam a intriga, absorvendo murmúrios e segredos como um guardião silencioso.
O som das fichas, das cartas e das roletas girando cria uma melodia viciante. O salão pulsa com risadas, gritos e conversas animadas, como uma respiração coletiva. A atmosfera é um êxtase sensorial, uma colisão de sensações que atordoam os sentidos.
No palco, uma linda mulher vestida de vermelho sussurra melodias proibidas, sua voz como veludo em chamas, enquanto um pianista e um violinista pintam a trilha sonora do desejo. No canto, um balcão serve bebidas de todos os tipos, desde vinho e cerveja até conhaque e absinto. Paredes adornadas com quadros de mulheres sensuais criam um cenário provocante. Cada pincelada é uma promessa de pecado, cada olhar imortalizando uma tentação pendurada. As cores, verdes e douradas, dominam o cenário, criando uma paleta que reflete o luxo e a corrupção.
Passo um tempo imersa nesse espetáculo, saboreando cada detalhe com a prudência de quem dança à beira do abismo. O tempo é meu aliado, mas também meu inimigo. Por sorte, Raposo logo precisou ir resolver seus assuntos.
Algum tempo depois, Thorne finalmente surge, como esperado. Ele deixa algo no escritório de Raposo antes de voltar para me fazer companhia. Meu amigo trabalha para o criminoso muito antes de mim, sua ocupação um mistério que nunca quis compartilhar.
Tudo está se desenrolando conforme o plano, mas preciso manter a lucidez e a prudência como aliadas. Puxo Thorne para um recanto mais reservado, afastando-nos dos ouvidos curiosos que espreitam no lugar.
— Preciso da sua ajuda. — Sussurro perto do seu ouvido, algo que pareceria apenas flerte aos observadores.
Conto-lhe tudo sobre o Lorde, as provas e meu plano meticulosamente traçado. Demoro algum tempo para persuadi-lo, pois o medo de sermos descobertos tece uma teia delicada entre nós. O ódio que toma suas feições quando conto que a usurpadora de Prian está envolvida é o elemento que o convence a seguir em frente.
Passamos uma eternidade mergulhados em risos falsos e movimentos coreografados, dançando enquanto cochichos astutos insinuavam um romance clandestino. Rumores sobre nós se tornavam a tinta com que pintávamos nossa farsa, explorando a curiosidade alheia a nosso favor.
Observo atentamente as portas laterais, onde placas apontam para as áreas reservadas para casais que procuram privacidade, aguardando até que a mais afastada delas fique vaga.
Nathan se aproxima de nós segurando uma bebida na mão, seus olhos castanhos brilhando com malícia enquanto me observa. Seus cabelos escuros, cortados de maneira impecável, destacam a determinação em seu rosto.
— Escutaram o murmúrio? — ele indaga enquanto se acomoda ao meu lado de forma relaxada, cada movimento é executado com uma graça intrigante.
Thorne discretamente se afasta em direção ao bar, evitando a presença dele. A aversão entre os dois é palpável desde o primeiro encontro, e não fazem questão de esconder. Levanto os ombros, jogando a isca sem conhecer o anzol.
— Dizem que toda a realeza de Etéria está se reunindo com Elementais — Nathan revela — Negociações, ao que parece.
— Só boatos. Desde quando negociamos com o outro lado? O sentimento é mútuo: nós os odiamos, e eles nos desprezam. — Respondo, revirando os olhos.
— Estou apenas repassando o que ouvi — ele se defende, dando de ombros — Que tal trocar essa companhia tediosa por algo mais emocionante e deixar Thorne de lado?
— Talvez em outra ocasião. — Dispensando sua proposta, percebo que a área reservada finalmente está livre.
Não é a primeira vez que Nathan tenta usar-me como peça para provocar meu amigo, sem suspeitar que, na verdade, não temos vínculo romântico.
Desmentir o boato após essa noite será uma tarefa impossível.
Thorne e eu nos dirigimos aos pequenos recantos reservados, e o aconchegante cubículo nos envolve. Almofadas de veludo em tons profundos de vermelho revestem o espaço, enquanto uma cortina do mesmo estilo proporciona a privacidade necessária. A área é compacta, e mal conseguimos permanecer de pé sem que nossos corpos se toquem sutilmente.
Eu me aninho nas almofadas, precisando aguardar antes de começar a colocar meus planos em prática.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top