|CAPÍTULO 02 • "HIPOMANIACAMENTE" INTERESSADA I|
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Em meio às gôndolas de doces do mercado, Luna estava com o poder de decisão comprometido, assim, não conseguiu escolher apenas uma opção, entre às variadas marcas de chocolate. Subitamente, sentiu uma imensa e impulsiva vontade de levar três barras de cada.
Rapidamente, colocou no carrinho diversas barras de chocolate. Pensou num festival privado de degustação "choco mania", e ainda adicionou outros produtos supérfluos sem motivo específico para a compra. A reflexão sobre o consumismo desenfreado ficaria para quando estivesse com seu humor estabilizado.
Uma crise depressiva sem dúvida era onde mais sofria. No entanto, se comportar sem o filtro do constrangimento em um supermercado cheio de pessoas olhando, resultava sempre em ressaca moral. Sem contar nas amizades que fazia, e nos desentendimentos que causava. Já chegou a levar uma tapa de uma senhora por sair dançando com o marido dela pela sessão de carnes, ou seja, esses ápices podiam causar problemas.
As horas passaram rápido pelo período que passou conversando com uma cabeleireira que conheceu enquanto escolhia uma tinta capilar. Ocupou a mulher dizendo o quanto queria mudar a cor dos cabelos para vermelho paixão igual eram os cabelos dela, e terminou o bate-papo em assuntos aleatórios da vida. Quando deu por si estava no final da tarde, passou no caixa e pagou. Poderia ficar mais algum tempo, se a fome que sentia queimar a barriga permitisse. Agarrou as duas sacolas de papel de pão, uma repleta de chocolate de todos os tipos e saiu.
Atravessando o estacionamento, continuou em frente. Seu passo acelerado acompanhava a batida das músicas que tocavam no smartphone. As sacolas de compras estavam abarrotadas dentro de um abraço desengonçado junto ao seu peito, enquanto Luna tentava firmar ao máximo e evitar que tudo desmoronasse no chão. Embora, pouco importasse caso acontecesse o incidente. Em seu estado atual, o máximo que faria seria achar engraçado.
Mal conseguia enxergar quem cruzava seu caminho por cima dos sacos que levava, fazendo as pessoas desviarem para não serem atropeladas por duas sacolas dançantes em alta velocidade. Chegou ao prédio sem imaginar como faria para pegar as chaves na bolsa e abrir o portão. Essa dificuldade era recorrente quando entrava no estado euforia, pois comprava motivada pela compulsão, o que resultava em mais compras do que podia carregar confortavelmente.
Remexia a cintura no balanço do xote que ouvia nos fones como se as sacolas fossem um parceiro de dança. Prestes a colocar as compras no chão, alguém tirou o pequeno aparelho sonoro da orelha dela. Uma voz calorosa e aveludada ofereceu ajuda num inglês com sotaque estrangeiro, a pronúncia diferente lhe chamou a atenção.
O tom calmo da voz grave lhe invadiu seduzindo seus ouvidos e estava acompanhado de um perfume quente com notas de madeira, o que a fez se concentrar ao máximo em descobrir quem a abordou. Tentou de alguma forma enxergar o homem que tão gentilmente ofereceu ajuda, mas o estranho brincou de esconde-esconde esquivando-se em suas costas.
A curiosidade da brasileira ficou ainda maior, até que um homem ocupou a sua frente, e com facilidade encontrou caminho em meio às sacolas. Quando teve os seus pacotes segurados pelo estranho, Luna pôde, enfim, ver seu samaritano sorridente, que se divertia com a brincadeira que fizera.
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Os trinta centímetros de diferença fizeram com que ela erguesse a cabeça em direção ao céu para avaliar quem lhe abordou. Por um momento ficou perdida nos olhos que pareciam uma imensidão escura e magnética, adornados por sobrancelhas grossas e acentuadas.
Ali, por sua vez, atravessou a íris acobreada da jovem mulher de trinta e dois anos, mergulhando no enlace criado pela vida sem pensar. Seu jeito conquistador foi brevemente neutralizado pelo momento. Em outras circunstâncias, já teria investido e saberia pelo menos o nome dela. Agora, até para responder o próprio nome demoraria a raciocinar, pois estava preso na armadilha que era o olhar de Luna.
O tempo parou para ambos, e durou mais do que realmente foi. Naquela troca de olhar houve um encontro de almas. Um ponto de convergência surgiu tirando deles qualquer mísero pensamento. Ficaram por completo presentes um para o outro, ainda sem poder identificar um sentimento que no futuro saberiam, começou ali.
Percebeu que ele a encarou da mesma forma e ficou desconcertada. Sentiu as maçãs do rosto arder, com o peito cheio de algo que ia até a garganta. Levada pela euforia, pigarreou sorrindo alegremente, quebrando a tensão que se formou entre os dois. Ficou ainda mais elétrica do que já estava, o que fez o coração bater a mil por hora.
Um simbólico alerta de perigo, ressoava perdido em algum lugar inatingível da mente, tentando acionar o modo: fugir de compromissos. Nervosa, girou o rosto para o lado subitamente, na busca de disfarçar um pouco a atração que sentiu. Ele achou engraçado ver o empenho dela em esconder o que ficou tão óbvio.
O bom-humor a impedia de contrair os músculos do rosto para vestir sua expressão habitual de seriedade, e a manteve simpática e alegre. As mãos ficaram geladas, porém, não era de frio. Inconscientemente, pressionou os dedos um nos outros juntando as palmas das mãos, na tentativa de pacificar um pouco a euforia. Sem o menor autocontrole, a empolgação só crescia diante da presença dele, que de maneira discreta se divertia com o jeito dela.
Isso não está certo, Luna pensou vagamente.
O turco deu uma piscadinha, e provocou na brasileira uma pequena gargalhada seguido de um rebuliço viciante no próprio estômago. Deu um leve tapa no braço forte do homem, deixando a mão explorar um pouco o bíceps, aproveitando o contato.
— Agradeço ao gentil cavalheiro seu nobre gesto — disse floreando a voz e fez uma reverência antiquada da era vitoriana. Inclinando o corpo de maneira delicada dobrou os joelhos, curvando levemente as costas e levantou um pedaço da camiseta branca ensacada na calça jeans justa num leve arco.
Ali se curvou para retribuir o comprimento espirituoso, tal qual um verdadeiro cavalheiro faria para corresponder a uma dama. Ambos sorriam fácil numa felicidade ingênua. Ele se sentia estranhamente alegre com a maneira leve dela e, analisava atento se a dona das sacolas estaria sob efeito de álcool ou simplesmente era alguém de bem com a vida.
Alheia sobre qual era a impressão que estava causando, vozes flutuavam pela mente de Luna. Enquanto checava o homem dos pés à cabeça, em um look básico e justo, totalmente preto, realçando completamente com os cabelos e a barba escura, ela também pensava numa sequência rápida de vozes.
Como se tivesse multiplicado a própria consciência, conversava consigo com a boca em silêncio, embora a mente estivesse repleta de falas que se atropelavam.
Ele tem quase o dobro do seu tamanho.
Parece que está interessado também...
Você até que é bonitinha.
Chama ele para sair.
Não dá para chamar uma pessoa assim do nada.
Quem não arrisca não petisca.
Joga o cabelo para o lado.
Controle! Já está bem esquisitona parada aí.
Abre o portão, criatura!
A presença dele a deixou distraída e ficou atrapalhada em sua sequência de atos necessários para entrar no prédio. Em um desastre atrás do outro, deixou cair a bolsa com seus pertences que se espalharam pelo chão. Riu de si mesma diante do olhar dele atento a sua falta de jeito.
Reuniu os objetos dentro da sua bolsa amarela e os guardou apressada, segurando a chave separadamente.
Calma, nunca viu um homem?! Questionou a si mesma.
Não um que seja igual a esse, respondeu uma das vozes, assumido por sua Creamy, ela tinha um jeito especifico de falar, como alguém que está sempre disposta a qualquer coisa depois de algumas doses de uma bebida alcoólica.
Respirou fundo para se concentrar, até que finalmente conseguiu abrir o portão. Arrancou as sacolas dos braços dele, agradeceu a ajuda e entrou apressada pelo portão de vidro. Depois, trancou a fechadura, enquanto o gentil cavalheiro a observava com um sorriso discreto na calçada.
Agitou a mão num aceno empolgado, esperando ele seguir seu caminho, sob protestos internos que a incentivaram a pegar ao menos o contato. Quando, para sua surpresa, ele tirou do bolso uma chave que abria agora, o mesmo portão por onde acabara de passar, e mais uma vez perguntou com sua voz atraente que parecia acariciar o seu ouvido.
— Posso te ajudar?
Naquele instante, ficou perdida em cada movimento do turco. Hipnotizada, admirou o braço do homem ir no curso dos seus cabelos abundantes. Com a mão, Ali afastou os fios do rosto, encaixando por trás da orelha. O momento parecia acontecer em câmera lenta, podia ouvir em sua mente aplausos acompanhados de gritos histéricos:
Pense num homem!
Com esse daí você casava, tenho certeza.
A fina pele da face ardia de dentro para fora e a barriga sentia pequenos golpes. Ficou imóvel sem ser capaz de responder à pergunta que lhe foi feita, permanecia completamente distraída.
Será que ele mora aqui?! Divagou sobre a possibilidade e sorriu fugaz, incapaz de outra reação.
— Talvez não esteja compreendendo meu inglês. Perguntei se posso te ajudar? — Ali falou, tentando pronunciar o exato inglês nativo por temer não ser compreendido.
— Não seria mais fácil ter aberto o portão já que tinha a chave? — indagou ao enxergar o que seria mais lógico na situação, e ficou risonha por apontar a resolução mais evidente, sem se incomodar por ter soado mal-agradecida.
— Achei melhor aliviar o peso nos seus braços. Não sabia que seria tão difícil para você abrir a fechadura — provocou —, quer ajuda com as sacolas?
— Claro! — Sua voz saiu com um grito fino, pigarreou e entregou uma das sacolas, enquanto a euforia consumia os seus pensamentos com a presença de Ali.
Que perfume é esse?
Ele é tão charmoso!
Nossa... e o olhar?
Ele está olhando!
Uau! Ele é muito sexy.
— Eu posso levar as duas, assim você consegue dançar melhor — ofereceu de maneira educada, revelando que a viu dançar na rua. Ela sorriu amarelo.
Ali pegou a outra sacola e a esperou indicar o caminho.
Então ele me viu dançar? Pelo menos sei rebolar, pendeu a cabeça e o olhou curiosa. Os pensamentos, naquele instante, fugiram para outros assuntos, sem se dar conta que precisava indicar o caminho, até que Ali despertou sua atenção ao se aproximar.
— Éno segundo andar — murmurou alegre, enquanto apontava a escada à frente.
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