✿*:・Capítulo VI
— O que ela está fazendo aqui? — o conde questionou, o olhar de repulsa que sequer tentava disfarçar fez Lilith estremecer, mas ainda assim, não hesitou.
— Olá, titio. Vim lhe fazer uma visita, porém o senhor não se encontrava, espero que goste da surpresa que preparei — o sorriso cínico da garota se estendeu como uma vibora, sua vontade naquele momento era de destruir a cabeça daquele homem com o seu bastão.
— Marido! Essa... essa atrevida, desavergonhada entrou aqui feito uma histérica e quebrou toda a decoração do saguão e dos cômodos posteriores, veja, até mesmo fez o nosso Davi passar mal — Matilde tomou a frente do filho um pouco alterada, ainda se mantendo em uma distância segura por medo de sofrer qualquer retaliação pela sua fala.
Os olhos de Rodolfo varreram o ambiente com certa rapidez até repousar em Lilith, que segurou o bastão com um pouco mais de força sem saber o que esperar.
— O que o senhor está esperando para fazer alguma coisa? Olha o que essa garota causou — foi então que Lilith percebeu que seu verdadeiro primo Davi estava ao lado do pai, a aparência quase idêntica ao irmão, porém o cansaço era refletido em suas orelhas fundas e bem marcadas.
— Que culpa tenho eu se sua mãe é uma inútil e não sabe cuidar da própria casa? Alguém vá imediatamente ao templo mais próximo chamar um sacerdote para levar isso dá minha frente — o conde encarou alguns serventes que se mantinham longe de toda a discurso — O que estão estão esperando? VÃO LOGO!
— Está para nascer a pessoa que irá me trancar dentro daquele lugar sem escrúpulos, pois as que estão aqui não irão — Lilith se aproximou do seu tio com fúria no olhar, ficando cara-a-cara devido a sua altura — E trate de devolver o carimbo que me pertence, sua ratazana ladra.
Isso foi a gota d'água para a paciência de Rodolfo, que não pensou duas vezes em sacar sua espada e apontar para o pescoço da própria sobrinha assim que ela passou por si virando as costas.
— Pai, o que está fazendo!? — Levi tentou ir em direção a eles, mas foi impedido por Matilde que segurou com força sua mão, enquanto negava com a cabeça para que não interferisse.
— Acha que irei tolerar esse tipo de comportamento e blasfêmia na minha própria casa por uma zinha como você? Sua loucura só era ignorada quando Heitor estava vivo e fazia de tudo para te proteger, agora só é uma mulher descontrolada que por sorte possui um nome de família em suas costas. Ia demorar um pouco mais para me livrar de você, mas depois de sua audácia só sairá daqui direto para o mosteiro.
Os dentes de Rodolfo rangiam pela raiva acumulada, enquanto um sorriso vitorioso surgia em seu rosto. Era ridículo como ele, um conselheiro do rei, tinha que sempre ter seus planos arruinados pela família de sua esposa, e agora mesmo tendo o cunhado morto a filha dele queria lhe causar problemas, não, ele não deixaria isso acontecer, iria sumir com ela antes disso.
Porém algo que Lilith não entendia, era o fato de sempre desconsiderarem o que mais repetiam ao seu respeito.
Ela era louca.
Com um virar abrupto, se pós frente a espada, um corte pequeno sendo feito em seu pescoço deixando escorrer uma fina linha de sangue. Os olhos de Rodolfo se arregalaram com a atitude inesperada da sobrinha, e com medo do que poderia acontecer tentou imediatamente retroceder, mas foi impedido pelas próprias mãos de Lilith, que agarraram o corpo da espada sem nenhuma hesitação.
— O que você-!? — Davi tentou avançar para afastá-la de fazer o que quer que fosse aquele ato de loucura, mas seus planos também foram interrompidos ao ver que sua movimentação apenas a fez pressionar ainda mais a espada, cortando suas luvas que aos poucos, ficavam tingidas em um vermelho não condizente com o tecido.
— O que há? Não era isso que estavam querendo fazer? Não estou entendendo a surpresa — um sorriso cínico nasceu em seus lábios ao ver o espanto no rosto de todos.
Estava doendo, óbvio. Na verdade Lilith estava usando toda sua força para não deixar transparecer em seu rosto a dor agonizante que estava sendo ter sua pele cortada lentamente, mas ela precisa usar isso ao seu favor de alguma forma, e essa tinha sido a única maneira rápida de ganhar tempo que pensou.
— Vejam só! Meu próprio tio está tentando tirar minha vida, o que garante que ele não esteja tentando se livrar de mim para ficar com o marquesado? Uma tentativa de assassinato há um nobre aos olhos nus — Lilith aumentou seu tom de voz propositalmente, desviando seu olhar apenas para serventes que continuavam a assistir a cena.
Se há algo capaz de destruir sua reputação em dias, este são rumores, e ela sabia que não havia ninguém melhor que a plebé para isso.
Em um solavanco Rodolfo retirou a espada das mãos de Lilith, que agora manchava o chão com grossas gotas cor carmim, era visível a frustração e raiva que borbulhava no rosto de seu tio, mas ela já havia se arriscado o suficiente.
— Não esqueça que mesmo sendo sua sobrinha, socialmente ainda estou acima de você — as palavras foram cuspidas com cinismo antes de se virar e sair daquela mansão de cobras.
Obviamente, Lilith apressou seus passos e ignorou os berros de ofensas que eram descarregados sobre si, sabia que mais um minuto perto de seus tios seria como assinar sua sentença.
— Lilith, espera! — a voz de Levi alcançou seus ouvidos assim que pisou no degrau da carruagem, o garoto parecia a beira da morte a qualquer instante apenas por ter corrido alguns metros.
— Diga logo — apressou. Matilde já estava saindo da porta da mansão com seu outro filho, em direção aonde se encontrava.
— Cartas... Deve ter algumas cartas no escritório do meu tio — apoiando-se em seus joelhos, Levi tentou miseravelmente trazer algum fôlego para si — Foram trocadas com o meu pai, deve lhe ajudar de alguma forma.
Os olhos de Lilith se pressionaram, estranhando a atitude repentina de seu primo, mas sem tempo para pensar, apenas concordou antes de fechar a porta da carruagem: — Irei procurar.
A última cena que viu do condado Marshall assim que os cavalos começaram a correr, foi Levi caindo no chão e Davi indo ao seu socorro.
— S-senhorita, céus! O que houve com suas mãos? — Dana sem hesitar, puxou a fita que prendia seus cabelos crespos em um grande coque, e segurou as mãos de Lilith tentando inutilmente, parar o sangramento.
— Está tudo bem, não deve durar por muito tempo — ela retirou uma das mãos apenas para encostar sobre o corte de seu pescoço, que ardia incessantemente — Não me lembrava de Levi ser tão fraco... — murmurou para si.
— Perdão?
— Nada, esqueça. Estou tendo devaneios — Lilith tirou a fita das mãos de Dana, tentando estacar o sangue por si mesma.
Pedras mágicas, troca de cartas que podem lhe ajudar... De alguma forma, tudo isso parecia não se encaixar.
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Não era a primeira vez e não seria a última que Levi desmaiaria sem nenhum aviso prévio, porém mesmo acontecendo de forma rotineira, era algo impossível de se acostumar.
— Perdeu o resto de juízo que possuía!? Por que foi correr atrás daquela vadia? Olhe o seu estado agora — tinha acabado de abrir os olhos no sofá da sala de descanso, e não tinha dúvidas do motivo de ter acordado, considerando os berros de sua mãe.
— Eu não aguento mais te ouvir reclamar, isso tudo é sua culpa. Se fosse uma esposa que se prese não teria deixado-a sequer entrar aqui dentro, como vamos recuperar o prejuízo das peças que ela quebrou? — o tom de voz de Rodolfo causaria arrepios em qualquer pessoa perto, ele estava irritado, e isso era o suficiente para a sala não haver mais ninguém além deles três.
— Como pode dizer que é minha culpa? Queria que eu entrasse em uma briga corporal com minha sobrinha? Ela estava com um bastão! — Matilde teve a gola de seu vestido agarrada, por pouco não há sufocando com a atitude de seu esposo.
— Que defendesse como seu corpo, mas até para isso você é inútil. Espero que esteja pensando em vendê-lo para me ressarcir do prejuízo que sua presença causa — lançando sua mulher no chão, foi possível ouvir o som oco de sua queda, e se seu filho não tivesse agido, com certeza teria recebido um chute em sua cabeça.
— Pai, pare! — Levi se impulsionou para fora do sofá, se agachando como uma barreira frente a sua mãe — Quer aumentar os rumores entre os empregados?
Rodolfo hesitou, mas ao ver a respiração falha de seu filho pareceu desistir — Tsk, que desperdício você gastar o pouco de suas forças defendendo essa imunda.
E sem olhar para trás, saiu em passos pesados para o andar de cima, alguns longos segundos silenciosos se estenderam antes de Matilde deixar seu corpo relaxar e recair no abraço do garoto, tentando inutilmente, conter as lágrimas.
— Está tudo bem, mãe, está tudo bem... — Levi murmurou, acariciando as costas da mulher.
— Seu pai... seu pai não irá me deixar em paz enquanto ela estiver por aí. O que eu faço meu filho? Ela está claramente melhor, a única coisa que poderia usar contra ela não está mais funcionando — a voz de Matilde saia trêmula, quase inaudível, suas mãos agarrando as vestes do jovem como a quem se agarra a vida.
Se ela não fizesse nada, iria despertar a ira do marido, e definitivamente, não era o que queria. Enquanto estava sendo acalmada pelo seu filho, uma ideia lhe veio a mente, parecendo espantar todo o temor que lhe aflingia a condessa ajeitou sua postura ainda sentada no chão e segurou os ombros de Levi.
— Confia em sua mãe? — perguntou olhando no fundo dos olhos acinzentados do garoto.
— Isso sequer deveria ser uma dúvida, o que há?
— Seu irmão já está com a cabeça tomada pelo seu pai, só posso confiar em você, Levi. Então por favor, me ajude, eu tenho um plano — a voz confiante de Matilde fez seu filho engolir em seco, sabendo que, vindo de sua mãe, nenhuma ideia seria agradável.
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— O que exatamente estamos procurando, senhorita? — Menas questionou após verificar a quarta estante do escritório.
— Qualquer coisa que ache minimamente suspeita — Lilith estava verificando apenas com os olhos uma pilha de papéis antigos que tinha encontrado em uma das gavetas. Apesar de não ter uma conversa adequada com seu primo há anos, resolveu dar um voto de confiança em sua palavra ao recordar que ao menos quando crianças, ele era a pessoa mais justa que conhecia.
— Neste caso, já encontrei — Lilith ergueu os olhos para a garota com grandes expectativas, abaixando as folhas de suas mãos — A senhorita. O que seria mais suspeito do que voltar nesse estado da casa dos condes, com uma caixa em miniatura bem trabalhada que visivelmente foi vítima de furto, e de repente querer revirar este escritório?
A jovem bufou irritada com o cometário, deixando-se cair sobre a cadeira atrás de si — Não é momento para suas frases ácidas, Menas.
— Não foi minha intenção que soasse dessa forma — suspirou apertando os dedos entres as têmporas, por pouco não erguendo seu monóculo — Apenas veja o tamanho deste escritório, se houver alguma coisa fora do comum não será em uma tarde, muito menos em uma semana que encontraremos, vá tomar um banho e se alimentar de alguma coisa, sua aparência está feita em trapos!
Lilith moveu o olhar para si mesma por um momento, não encontrando palavras para discordar da pequena leoa mal-humorada. Seu vestido estava amassado e com alguns cortes feitos provavelmente ao quebrar algo na casa dos tios, podia sentir os fios de cabelos cobrindo sua visão, e nem ousava falar sobre o estado de suas mãos.
— O sol já se pôs, senhorita. Vá descansar, deixe que continuarei a procurar — ao encontrar os olhos escuros e afiados de Menas, Lilith acabou de algum modo se sentindo reconfortada.
— Esqueça isso, vamos deixar para amanhã — ela acenou com a mão para que saísse, enquanto se levantava da cadeira sentindo todo o seu corpo dolorido. Realmente, precisava de um descanso.
Após tomar um longo banho quente, Lilith sentiu um pouco da tensão que tinha se esvair, sentando-se na cama, começou a escovar seus longos cabelos escuros, encarando o próprio reflexo no espelho da parede.
Era frustrante negar, porém mesmo após receber o aviso que seu quarto já estava restaurado, ela preferiu se manter no quarto de sua falecida mãe, que agora já estava limpo e com um cheiro agradável, livre de qualquer poeira, e por que tinha tomado essa decisão? Estava com medo.
Seu corpo tremia só de imaginar ter uma sacada perto de si durante a noite.
Deixando a escova de lado, Lilith encarou profundamente suas mãos, antes lisas, delicadas e macias, agora eram grosseiras, com uma textura estranha devido as queimaduras e com um longo corte de espada.
— Se algum dia cogitei casar, isso já não será possível. Quem iria querer ao seu lado uma mulher defeituosa? — um riso seco escapou de seus lábios.
Não demorou para que esse riso se transformasse em uma linha trêmula, contendo o que quer que fosse aquilo dentro de seu peito, seus olhos pousaram na sopa que Menas havia deixado em uma bandeja para que comesse, mas assim que encostou na colher, sentiu como se um furacão houvesse revirado todo seu interior, o gosto ácido subindo por sua garganta a fez soltar o talher, ressoando aquele som metálico em seu ouvido, causando uma dor latejante.
Lilith apertou sua camisola com força, respirando profundamente antes de empurrar aquela bandeja para longe.
Um dia sem jantar não faria mal.
Ela não soube exatamente em que momento o sono chegou, apenas viu o mundo apagar, caindo de cansaço em sua cama.
Seus olhos abriram abruptamente, piscando algumas vezes enquanto tentava se acostumar com a claridade do local.
Não estava em seu quarto? Em que momento tinha ido parar no corredor?
— Marquesa, espere! — Lilith olhou para trás se deparando com o antigo mordomo que havia demitido, não pôde evitar de arregalar os olhos incrédula com aquilo — Por favor, me ouça, se ignorar as cartas do sacerdote dessa forma estaremos em apuros.
— Estamos em apuros há mais tempo do que imagina, Elmer. Agora pare de me seguir por aí, eu irei responder a carta — a voz saiu de sua boca, mesmo que não houvesse falado nada. O mordomo deu um longo suspiro de alívio antes de se curvar.
Seu corpo começou a se mexer em direção ao escritório como se possuísse vida própria, Lilith além de confusa, estava começando a ter medo daquela situação, era como se fosse uma espectadora de seu próprio corpo, era tão esquisito a sensação deslocante que chegava a arrepiar.
Assim que chegou no escritório, seus olhos se depararam com o próprio reflexo na janela.
Não era ela.
Um frio percorreu todo o seu interior, sentia seu coração acelerando de pavor mesmo que não a pertencesse.
Aquela garota era idêntica, mas não era ela.
Seus olhos eram escuros demais para dizer que se assemelhavam a ametistas, se viam mais como uma orquídea roxa-escura, opaca, quase sem vida. Seus cabelos estavam semi-presos e não havia nenhum sinal de nascença perto dos lábios.
Quem era essa pessoa que estava se passando por ela?
Como se notasse a observação de Lilith, o corpo voltou a se mexer, conseguindo ver tudo pela ótica daqueles olhos, suas mãos tremiam enquanto se agachava no chão e batia na madeira, uma, duas, na terceira batida moveu seus dedos para a direita, levantando um pequeno espaço com uma chave dentro.
Assim que pegou a chave, foi em direção a última gaveta da mesa , puxando um fundo falso.
— Eu gostaria muito de estar errada, deusa, eu imploro, eu tenho que estar errada ou irei me arrepender pelo resto de minha vida — suas mãos tremiam tanto que quase não conseguia encaixar a chave e assim que o fez...
— ARGH — Lilith arfou como se sua vida dependesse disso, estava sem fôlego, soando, parecia está há minutos sem respirar. Em um salto se sentou em sua cama, tentando recuperar o ar enquanto agarrava seu peito que parecia minúsculo dentro de si.
O que havia sido isso?
Seu coração batia tão rápido que podia sentir sua visão tremer, enquanto tentava regular a respiração, algo surgiu em sua mente, se levantou em seus próprios pés sem muito equilíbrio, mas assim que alcançou a maçaneta da porta, parou.
"Talvez eu realmente devo esta ficando maluca."
— Você está aí, não está? A que fica gritando em minha cabeça... — Lilith ficou em silêncio por um tempo, e ao notar o quão estranho era o que estava fazendo, soltou uma risada fraca entre os lábios voltando a abrir a porta.
Um arrepio cobriu seu corpo por inteiro e no mesmo instante, a janela se abriu com força permitindo que o vento frio entrasse com violência.
— O que!? — Lilith virou espantada, mas para a sua surpresa, não havia ninguém. Seus olhos percorreram o quarto cuidadosamente, mas dessa vez não quis esperar para ver se algo acontecia, apenas disparou para fora do cômodo em direção ao escritório.
Tudo isso era estranho, tão estranho que chegava a considerar irreal, por conta disso não pôde evitar lembrar da fala que ouviu em seu primeiro sonho: "Há algo de errado."
Realmente, agora ela percebia, sentia dentro de si como se alguma coisa estivesse deslocada, uma peça torta em um quebra-cabeça. Ao se jogar no chão do escritório ao lado da mesa, ela bateu sua mão sobre a madeira, uma, duas, e na terceira moveu seus dedos para direita.
— ...Não é possível — o pequeno compartimento de madeira saiu, revelando uma chave de bronze.
Receosa, Lilith pegou aquela chave indo até a última gaveta da mesa, encontrando o fundo falso que havia visto em seu sonho, e tão aflita quanto a garota que tinha visto, destrancou, deixando inúmeros papéis a mostra, seus olhos se arregalando a cada coisa que via, por um instante nem havia notado que sua respiração parou.
— I-isso... o que é essa loucura...?
🥀"A maioria das verdades fundamentais da vida parecem absurdas da primeira vez que as ouvimos."🥀
– Elizabeth Goudge
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