Capítulo X

O otimismo dos homens gerou a espada, o pessimismo gerou o escudo[...]

Zajac

Os cânions majestosos das terras altas dos Magos negros, era o convite de boas-vindas, ao lagar do povo que trazia a magia tão solene em seu portfólio.

"Os magos negros são escolhidos pela divindade para carregar a marca do sacro, do solene e digno, não cabe aos indivíduos a escolha por artesanato , cuidar da terra ou construção associado ao concreto".

Os olhos de Pruig, fundos como duas lentes de vidro, permeavam a terra alta de Artarus. O berço da civilização. Os mantos negros que dançavam, dando apenas uma pequena abertura na região dos olhos, a porta de entrada para a Nis de alguém. A lembrança, nublada pelas ervas do oriente, fizeram com que a criatura visse o cadáver flácido ser arrastado como um saco, sem vida, rejeitado em seus testes.

Tuuum. Tuuum.

Sentiu uma pequena pontada no peito e continuou caminhando, olhou para baixo e deixou destacar os nós de seus dedos. A sensação de náusea lhe incomodava, fazendo com que sentisse um gosto amargo em sua boca.

Os testes à sua volta, jovens sem o manto, sem despojo. Túnicas seriam uma maneira afrontosa de responder aos seus superiores. Completamente nus, estavam sofrendo com o relento e a estrela redonda escaldante, mas não se escutava um grito, nenhum grunhido ou urro, nenhum murmúrio ou atrito. Faziam de bom grado, planejando em seu amago o manto negro.

Veio à mente do mago negro os dedos irrequietos de Nice, os dedos finos e cumpridos com toda sorte joias cintilantes.

Bons tempos, bons tempos.

Roubou-lhe momentaneamente a atenção, o que o fez cair na desprestígiosa realidade, o corpo esquelético de um garoto de no máximo sete anos, com duas cordas no dorso puxando generosas pedras de concreto. O terror dos treinos, as vertigens acompanhado pelos bolsos de sangue na pele e as marcas que não cicatrizariam eram compensadas pela dignidade em chegar ao lar com um manto. O poder recolhe dos homens um preço. De alguns era a lamentação pela ausência de dias inesquecíveis e bons, para outros era a penumbre onde deveria existir uma lembrança. Todos tinham contas para pagar, sendo poderoso ou não.

Maus dias, maus dias. —pensou Pruig.

O descontentamento intrínseco acompanhava o mago negro, no orvalho, nos dias sem as nuvens carregadas. Ao cantar dos bardos, as constatações mais infames.

— Pruig, não te vejo com uma garrafa de gin, o que houve? — a voz de Briuk era forte, precisa e ribombava por uma distância considerável.

— As manhã aparecem para serem gracejadas, cortejadas e admiradas. — sorriu, mas o sorriso não poderia ser visto. A parábola do rosto coberto ante a toda face do mal e do bem.

— Ficou sabendo das novas?

— Apenas das que são tão velhas que me incomodam, o que há?

— Uma guerra se aproxima de nossas terras.

— Pensei que treinávamos os nossos jovens para um evento. — a voz continha escarnio e descontentamento.

— Os demônios se aproximam, Pruig. Eles grudam os pés por baixo da terra. Ou morrem em campo ou saem vitoriosos, mas não abandonam o posto; são insanos. — disse procurando os ombros do amigo. — Eles não têm piedade.

— E desde quando nosso povo foi conhecido por tamanha qualidade? Somos a razão dos cânticos de dor. Abstemo-nos de toda aparecia mansa e misericordiosa.

— Estou te dizendo, Pruig. Tenha respeito pelos costumes. Tenho percebido um grande desleixo de sua parte. — Como desleixo de minha parte? todas as sanções posicionadas. Todos os dias na casa de meu pai. Honrando os tempos e conjurando as divindades que perdi a minha fé há tantos anos. Como mais? Vocês querem todo o labor de um dia? Não. Vocês querem toda a minha vida. Os pensamentos foram instantâneos e a reação que viera a seguir deixa bem clara a posição do mago. As mãos de Pruig distanciaram a destra de Briuk.

— Somos amigos, mas não te convém dizer aquilo que não sabe. Não convém a ninguém em todo o campo. — os olhos passeavam pelas silhuetas desastrosas. No momento um pequeno garoto com a cabeça pelada e machucada pelo relento, sofrimento e desprezo. O maldito desprezo. Os contornos daqueles que embora tivessem uma sombra, não poderiam sonhar.

— Agora, se eu ainda tiver a liberdade de tomar meu álcool. Farei isso com prazer. — disse levantando a destra, um sinal que indicava que estava saindo.

Todos os dias são monótonos. São ruins da mesma maneira. E as lembranças da jovem. Das juras não ditas. Nada era verbalizado, tudo vinha com a aurora e morria na penumbra, apenas os alertas como os de Briuk reverberavam.

Uma vez ao olhar as pedras preciosas em um baú de madeira, sem vida, mas recheado pelos adornos caros de requinte. Seu pai lhe disse: Pruig, meu adorável filho, tudo que há nessa vida tem um preço. E quando digo tudo, isso corresponde a nós também. Existe o homem que diz que é impossível comprá-lo. Posso vê-lo detido aqui por algumas dessas pequenas. Vendido em parcelas a cada segundo de sua vida miserável.

Ai que saudade dos dias bons. Duraram pouco, mas eles existiram.

Os olhos de Pruig observaram uma pequena vendinha. Sentiu o comprimir dentro de si, era o sinal de que a fome havia chegado. Todo homem tem o seu preço. O meu são as malditas tortas e o vinho de quinteiras.

Havia ali uma criatura que para Pruig era asquerosa, Ciar, o maldito Ciar. Dissecava com o olhar quem se aproximasse, como um cirurgião. Abrindo e observando o interior de cada um de seus pacientes. Igualmente ganhavam por isso.

Pruig sentia que por baixo dos panos de Ciar havia uma máscara. Uma que estava enraizada na face rente a outra que possivelmente existia para garantir que tesoura alguma a arrancasse e pudesse ver a essência daquele ser.

O olhar de Ciar buscava cumprimentos, mas todos ao seu redor enrijeciam o dorso e aumentavam copiosamente os passos. Como coelhos ao verem um predador.

— Pruig, não te vejo com uma... — foi interrompido com a voz cortante do mago negro que estava vindo em sua direção.

— Já me falaram isso hoje. — replicou, com o cenho franzido , tolamente. Ciar não conseguiria fazer suas considerações.

— É sinal que tem bebido muito, meu amigo. — disse dando saudosos tapas em seu ombro. — sinto inveja.

— Gostaria de estar em posição de alguém invejável. — observou. — Anne, preciso daquelas tortas de sempre. — disse ao ver a jovem se aproximando, ela acenou com a cabeça e garantiu que em pouco tempo o seu pedido estaria à mesa.

A abóboda celeste se tornava escura. Os ventos uivantes bradavam veemente.

Maus presságios.

O som gutural de um jubilo cortante entre a flamula com um símbolo demoníaco vinha. Os passos reverberavam pelo copo de Ciar. Os dois magos negros não esperavam por aquilo, nem eles e nem os que estavam por ali. Muitos guerreiros ainda treinavam. Os pés descalços batiam firme no chão e os calos aparentes dificultavam nos saltos. As pedras no encalço.

Apenas conjurar feitiços não era suficiente. Corpo saudável, mente firme. O poder de um mago negro com o corpo poderoso é imensurável.

— Ciar, qual o problema? — a voz trovejou distante.

Pruig concebeu visões, resmungos desdentados das velhas. O salão de adornos revirado, exibindo seus adereços, símbolos sagrados como se fossem anátemas. Tudo comprimido ao seu redor, em uma perfeita simetria.

A cerâmica se partia, o copo estava no chão e a mão de Ciar estava em seu cajado. Um rugido colidiu no ouvido de cada indivíduo presente.

A frente do primeiro portão, guardas se aglomeravam nele. O descontentamento junto com a guerra batendo a porta.

Silencio.

Silencio.

Batidas poderosas no portão. Uma batida exigente.

— Não vejo a hora de desmembrar alguns demônios. — Ciar era maligno. As pálpebras dos olhos tremiam e as gotas de suor invadiam a sua fronte. Era perceptível. Aquilo era euforia. Em seu estase. Puro frenesi.

Um silêncio sepulcral.

E o silencio escorre pelos dedos com um barulho temeroso. Os portões caíram. E uma massa negra, semelhante ao enxame, vinha. Aos gritos. E a massa sombria arrebatava os jovens guardas.

Um mago negro não teme a morte. Um demônio muito menos.

As garras com seus saudosos trinta centímetros. Os dentes semelhantes a cerras, o corpo de ombros largos e a extensão em suas asas longas. As cores diversificavam, alguns possuíam chifres. Os olhos fundos sem íris, e o cheiro pútrido de sua presença invadiram o lugar.

O barulho do bradar das espadas dos mais novos com as garras dos demônios eclodiam em uma canção. Os bárbaros do Oeste.

Ciar deu dois toques firmes em seu cajado e uma criatura mística apareceu. Um dragão de duas cabeças. Ciar saltou nele e gesticulou para que Pruig o acompanhasse, esse não pestanejou. Eu não consegui nem comer uma tortinha.

— Se não escolhem pelo bradar das ideias e sim pelo aço. Eu lhes mostro o quão terrível pode ser o fruto de sua escolha. — E em uma velocidade insana, Ciar pegou dois demônios. O dragão expeliu fogo pela sua boca, queimando outros que se levantavam contra os mais novos. Pruig não havia reparado na espada que seu companheiro carregava, uma espada de corte assombroso, uma lâmina negra e que por um pequeno instante, o mago negro jurou ter visto olhos ao fio da espada, agora ela estava gotejando sangue, o vermelho tenso e de consistência grossa e no dorso do dragão os corpos sem cabeça tremiam em um ataque de espasmos que fez com que Pruig entendesse quem ele tinha como parceiro, e se sentia aliviado por não ter aquele mago negro como inimigo.

— A misericórdia é uma quimera, não dura para sempre e pode ser destruída. — Brandava o demônio em seu idioma natal. A voz gutural daquele monstro banhado em sangue era uma visão que contaminou Ciar que em um salto gritou: Nefisnik'pritinis.

A espada se tornou um monstro e em segundos rompeu o corpo do demônio, como se fosse papel. O barulho das costelas quebrando jaziam aos ouvidos do mago negro que sorria por baixo dos panos. Um sorriso nefasto. Até que o corpo se partia em dois. A massa de carne que pendia em sua espada explodiu no rosto daquele que não parou em momento algum.

— A misericórdia é uma quimera. Eu mato quimeras! — vociferou solenemente.

— O que vem em minha casa, mata meus jovens e clama por sangue. Terá o que lhe apraz. — disse Pruig. E ao levantar as mãos um símbolo surgia em cima de sua fronte. — que os teus lençóis freáticos sejam destruídos. O teu campo reduzido ao nada, pois do nada tu vieste. — a voz ganhava a sensação de várias entonações. Uma apoteose de poder. E raios azuis foram lançados do símbolo indo de alcance aos demônios que estavam em sua frente. Apenas o pó restara de onde havia guerreiros.

A eugenia, a displicência e a arrogância fizeram com que não houvesse tantos guerreiros entre os magos negros. Que eram estraçalhados pelas garras impetuosas. O emaranhado de órgãos caindo como se fossem nada.

Múltiplas explosões ao castelo central, suas colunas de glorias e as paredes que mantinham os primórdios ao êxito do povo sendo derribadas. Pedras sobre pedras.

Tudo aquilo sendo a moldura para com que os anciões apontavam, não havia uma tática, apenas a brutalidade dos demônios que lançavam corpos ao alto como se fossem nada.

A magia era conclamada. A força bruta sendo usada constantemente. E do no nevoeiro escuro, da fumaça extensa que subia, surgia uma massa disciplinada de formas fugazes; garras curvilíneas e um bafo quente. Os dragões voavam como corvos à procura de alimento. E ao romper dos ventos fortes, pegaram alguns corpos demoníacos que tentavam em vão debater com constância no alto. Os seres eram enormes, atingindo mais de 10 metros, com uma velocidade exorbitante e os dentes que eram semelhantes aos aros de cristal. As escamas verdes corromperam a escuridão. E para a alegria dos magos negros destrocaram os demônios.

O cheiro putrefato de mil corpos nos portões, somado ao mar de sangue no centro, era de criar as mais profundas náuseas. Aos montes, os que sobreviviam ao seu primeiro confronto vomitavam. Com o corpo mirrado, sentindo como se estivessem possuídos por uma força. Estavam sendo atingidos pelo fator biológico. É assim mesmo.

Vieram mais dragões, e os vultos saltaram do dorso dos dragões. Eram homens. As silhuetas dos caçadores. Mercenários que desembainhavam suas espadas, machados e adagas. Os olhos amarelos combinados com o cenho de prazer, enrijecia o mais experiente dos inimigos.

E naquela luz cintilava as cores vermelhas, amarelas e um azul. Uma presença agorenta.

Porém nenhum demônio fugiu.

Pensou em fugir.

Ou desistiu das investidas.

Os demônios eram poderosos, tinham um acervo de golpes e uma facilidade para matar que os faziam soberanos em suas terras, mas os magos negros eram tão poderosos quanto e tinham algo que faltava aos seres malignos, algo primordial, bons relacionamentos com as guildas. Pruig observou que algo faiscou ao seu lado. Um relâmpago globular e dentro dele vinha um demônio com os olhos mais densos que já teve o desprazer de ver. Foi quando uma espada. A espada negra de Ciar o salvava. Ele julgou ser uma ilusão, mas com os olhos entre abertos, viu a espada se alimentando da carcaça do demônio.

Estouraram o quartel de auxílio.

Destruíram as fontes de Apres.

Os gritos dos seres, vinculado a sensação excruciante fazia com que a batalha exigisse muito mais do que os magos estavam dispostos a apresentar em seus sacrifícios.

Até que um grito reverberou.

— WIKL WIKL EXODUS — e semelhante a enxames as vozes dos demônios se tornavam uma. E um esfera negra e que crescia veementemente se colocava no meio do lugar. No alto. E com o fechar e abrir dos olhos a esfera começou a sugar todos.

Por isso que esses malditos enterram os pés. O pensamento de Pruig repercutia a sua descoberta.

Ciar rompeu todas as leis e fluindo até a esfera sussurrou algo inenarrável para a espada e uma explosão se fez presente.

O impacto fez um zumbido florescer nos ouvidos de todos que restaram, em um cenário repleto de corpos e sem um castelo para contemplar.

E foi assim, que os magos negros se tornaram os reis da cadeia alimentar. Os demônios que restaram, saíram frustrados. Alguns cometeram suicídio, outros aos prantos cavaram até as profundezas.

Mas aos montes que saíram das terras de Artarus, um seria destaque, o seu nome é Osnikias. O impuro.

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