capítulo 6

No sábado de manhã, dia seguinte ao aniversário dos quadrigêmeos, Leslie foi acordada por um barulho vindo do corredor. Ao olhar para a janela e perceber que o sol ainda estava começando a dar as caras, percebeu que poderia ainda dormir por mais algumas horas e se irritou por ter sido acordada. Ela se levantou de uma só vez, apenas movida pela raiva, e andou a passos brutos até a porta do quarto, pronta para dar uma bronca severa em quem quer que fosse a pessoa que a acordara.

— Mas será possível que ninguém consegue fazer silêncio em plena manhã de sábado? — disparou sem nem olhar com quem estava falando.

— Desculpa — respondeu Tom, com uma voz culpada. — Eu só queria beber água.

— Ah, é você — Leslie se aproximou de Tom e apoiou a mão em seu ombro. — Foi mal. Você tá bem?

— Pergunta pra essas olheiras que eu ganhei depois de não conseguir dormir nada — respondeu apontando para os próprios olhos cansados.

— Eu realmente não consegui entender esse seu desespero de ontem. Um nariz sangrando não é nada demais.

— Eu gosto de pensar assim, mas não sei se tenho certeza — Tom desfez o abraço e apontou com o dedo para as escadas. — Você vem comigo?

Sem dizer nada, Leslie seguiu o irmão até a cozinha. Tom foi até a geladeira e retirou de lá uma jarra de água e pegou um copo do armário. Em seguida, encheu-o até a metade com a água do filtro e o resto com a água gelada. Bebeu tudo em apenas alguns segundos, e logo repetiu o processo enquanto Leslie apenas observava.

— Então... — Leslie resolveu quebrar o gelo. — O que aconteceu antes, depois de... aquilo acontecer?

— "O que aconteceu depois de aquilo acontecer"? — repetiu Tom, debochando da frase da irmã.

Leslie riu e deu um tapinha no ombro de Tom.

— Ah, nada demais. A Sara me levou pro meu quarto e ficou me vigiando que nem uma águia pra garantir que não iria acontecer de novo. Depois que ela saiu, eu tentei dormir, mas... — Tom riu e novamente apontou para os seus olhos. — Nitidamente não deu muito certo.

Leslie não respondeu, e Tom começou a fuçar nos armários em busca da cafeteira.

— Você sabe onde a Sara guarda aquele negócio de fazer café?

— E você sabe fazer café? — rebateu Leslie com um sorriso irônico.

— Não... mas eu posso aprender. Achei!

Tom colocou a cafeteira no balcão da cozinha e a observou por um tempo. Então ele decidiu pegar o pote de café em pó e ferver água na chaleira.

— Acho que não precisa ferver a água antes — disse Leslie ao ver o irmão ligar o fogão e posicionar a chaleira sobre uma das bocas. — A cafeteira faz isso.

— Sério? — Tom riu ao passo que Leslie se inclinou para trás de tanto gargalhar. — Acho que eu não sirvo pra esse tipo de coisa.

— Posso ver o porquê.

— O que vocês dois estão fazendo? — Sara surgiu na cozinha como uma galinha que aparece quando seus pintinhos estão ameaçados. — Isso é hora de fazer bagunça na cozinha?

— Desculpa, Sara, eu só queria tomar um café — explicou Tom, segurando a chaleira com a água já meio morna e apontando para a cafeteira. — Eu não consegui dormir esta noite.

— Mas de jeito nenhum você vai beber café! — Sara tomou a chaleira das mãos de Tom e a colocou na pia. Em seguida, guardou o pó de café e a cafeteira. — Não é assim que se resolvem as coisas. Anda, se você não conseguiu dormir à noite, vai dormir agora. E você, Leslie, pode voltar pra cama também.

Sara, com as mãos nos ombros dos irmãos, os levou até seus quartos, deixando Leslie na porta do seu e entrando junto no de Tom.

— O que aconteceu? Por que você não dormiu?

Tom deu de ombros.

— Sei lá. Acho que aquele sangramento aleatório foi um choque bem grande.

Sara o encarou com reprovação.

— Você ainda está pálido. Se continuar assim, vamos ter que chamar um médico.

Tom inclinou a cabeça para trás e revirou os olhos.

— Eu estou bem, Sara. Juro.

— Então — Sara encostou nos ombros de Tom e o deitou na cama. Fechou a cortina e andou até a porta. — Trate de dormir até não poder mais, ouviu bem?

— Sim, Sara.

Ela fechou a porta e Tom afundou-se no travesseiro, mas demorou para conseguir se desligar da vida real e dormir.

Leslie acordou algumas horas depois, e Sara estava na horta coletando algumas especiarias para reabastecer a cozinha. Além dela, apenas Arthur e Guilherme estavam acordados. Alex, como de costume, dormia até não poder mais, enquanto Tom recuperava o sono que não conseguira ter durante a noite.

Ela foi até a cozinha para comer algo. Comeu um pão puro, sem colocar nada dele, e bebeu suco de uva. Após terminar, subiu até o seu quarto e começou a ler. Ela leu algumas páginas, mas parou ao ouvir um barulho esquisito vindo de outro quarto. Parecia que alguém havia se machucado feio.

Leslie se levantou e seguiu o som, e se assustou ao perceber que ele vinha do quarto de Tom.

— Tom? — ela bateu levemente na porta, e em seguida abriu. Tom estava deitado em sua cama, com os braços envolvendo seu abdômen, com uma careta de dor. — Ai, meu Deus!

Ela correu para a cama do irmão e o levantou, fazendo-o sentar-se na cama. Em seguida, gritou por Sara, esperando que ela fosse socorrê-los. Ela havia acabado de entrar na casa quando escutou Leslie, e correu até lá chegando alguns segundos depois, se perguntando o motivo de tanto escândalo.

— Nossa Senhora! — assustou-se ela ao ver a situação em que o garoto se encontrava. Ela rapidamente recuou até o andar de baixo para pegar um remédio. Durante o caminho, ainda no corredor, assustou-se ao olhar para baixo e avistar uma pequena criatura correndo perto de seus pés.

Malditos ratos, pensou.

Tom lutou para conseguir ingerir um remédio para o intestino de gosto horrível, mas conseguiu. A dor obviamente não recuou na mesma hora, e ele continuou gemendo e apertando os olhos, sem conseguir suportar a dor.

— Te dói mais alguma coisa? — perguntou Sara.

— Os... m-meus... eu não s-sei — respondeu o garoto, quase sem forças. — Acho q-que os meus ossos? Eu não sei. Ai!

— Leslie, você pode, por favor, sair do quarto? Vamos deixar o Tom repousar, ok?

Leslie aceitou sair, mas logo se arrependeu.

Eu devia ficar, pensou ela, eu preciso apoiar o meu irmão, e cuidar dele.

Mas não foi o que ela fez. Leslie retornou ao seu quarto e voltou a ler.

Na tarde daquele dia, ela resolveu voltar para ver o irmão. Entrou em seu quarto e percebeu que ele estava acordado.

— Oi, Tom.

Ele levantou a cabeça, com os olhos semicerrados de sono.

— Oi.

— Tudo bem com você?

Tom deitou a cabeça novamente.

— Não.

Leslie baixou a cabeça, sentindo-se horrível pelo mal-estar do irmão.

— Mas você já tá melhor, né?

— Um pouco. Pelo menos minha barriga não dói mais — ele deu leves tapinhas em seu abdômen.

— Consegue levantar?

— Acho que sim. Não tentei ainda.

— Então, venha.

Leslie aproximou-se dele e o ajudou a levantar.

— Vamos comer alguma coisa, ok? E depois vamos ao banheiro externo, você precisa se animar.

— Ah, eu não sei se eu quero...

— Você quer, sim — Leslie o interrompeu. — Vamos logo.

Os dois desceram até a sala de jantar, e Tom ainda estava de pijama. Tom comeu um pão francês e tomou um copo de água. E então, Leslie levou o irmão até o banheiro ao ar livre, local da mansão favorito dos dois.

O banheiro externo era uma cúpula de vidro que ficava do lado de fora da casa. Havia uma espécie de hall de entrada, com uma poltrona e uma cômoda com toalhas, sabonetes, shampoos e outros itens de higiene pessoal. Não tinha vaso sanitário nem pia, e servia apenas para banho.

Após o hall de entrada, a porta se abria para uma ponte, que passava por cima de uma piscina rasa e ia até o box com o chuveiro, feito de vidro espelhado. Quem estava no banho via tudo o que estava fora, mas por fora só se via seu próprio reflexo.

As paredes e o teto, ambos feitos de vidro, possibilitavam a vista das árvores, do gramado, do céu, e até da praia. Era simplesmente lindo, e Leslie e Tom adoravam passar o tempo lá, boiando na rasa piscina e admirando a maravilhosa vista.

Ao chegarem lá, os dois usaram roupas de banho e adentraram na água. O dia lá fora estava mais nublado que o anterior, mas de vez em quando o sol ainda aparecia. Eles ficaram boiando na água, de olhos fechados. Era uma sensação incrível de liberdade, embora estivessem presos na ilha.

Quando ficaram próximos um do outro, Leslie sentou-se, ficando somente com as pernas e uma parte do abdômen submersos na água.

— Irmão.

— Oi — Tom abriu os olhos e sentou-se também.

— Eu te amo muito. Você sabe disso.

Tom sorriu.

— Sim, eu sei. E eu também amo você.

— Sabe, eu não consigo ver você assim. Eu sinto uma angústia enorme por não saber o que você tem — o olhar de Leslie de repente ficou triste.

— Eu vou ficar bem. Isso é passageiro.

— Sim, eu quero muito que isso aconteça, e eu sei que vai acontecer — ela segurou nas mãos de Tom. — Mas olha só como você está! Todo pálido, magro. Sangrando pelo nariz. Vou pedir ao vô para chamar um médico!

— Leslie, você não precisa se preocupar.

— Thomas, eu sei muito bem que você também está aflito. Eu te conheço.

Ele riu. Era incrível como Leslie sabia exatamente tudo o que Tom sentia.

— Olha. Eu entendo a sua preocupação. Mas vai ficar tudo bem. Prometo.

Os dois se abraçaram, de repente esquecendo de todos os seus problemas. Enquanto estivessem juntos, nada poderia estragar suas vidas.

O dia passou deste jeito. Leslie tentava dar uma sacudida geral em Tom, enquanto Alex e Guilherme cuidavam da própria vida. Anton, aos poucos, se livrava do acúmulo de trabalho que tivera nos últimos dias e Arthur elaborava suas aulas e lia seus livros. Sara, após o incidente com Tom, viajou de helicóptero até o Brasil para as compras, permanecendo o dia todo lá.

Quando retornou, no início da noite, Tom se sentiu mais aliviado. Ele sabia que Sara cuidaria o bem.

Sara, ao mesmo tempo em que não se preocupava muito com o que estava acontecendo com Tom, temia que a situação fosse piorar. Por um lado, aquilo tudo poderia passar rápido, e logo o assunto seria esquecido. Mas nunca havia acontecido nada desse tipo com ninguém na ilha.

O garoto precisava do diagnóstico de um médico.

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