capítulo 4

— Eu acho essa história tão linda, vovô — comentou Leslie enquanto ouvia mais uma vez toda a história de descoberta da ilha.

— Quando crescer, eu também quero fazer várias viagens de barco — disse Thomas, levando a mão acima dos olhos, como se dissesse "terra à vista".

— Vô, a gente pode brincar com barquinhos de papel na piscina? — perguntou Alexander, com uma falsa expressão de tristeza que crianças fazem para conseguir o que querem. — Deixa, deixa.

— Sim, sim, eu também quero — completou Guilherme. — Deixa, vovô, por favor.

Anton estava sentando no sofá da sala de estar, contando as histórias da família aos netos mais uma vez. Era quase rotina; os irmãos adoravam ouvir atentamente como Elias fez parte da descoberta da ilha, desde pequenos. Ele riu ao ver todos os quatro imitando a expressão de Alex, pedindo para brincar na piscina.

— Tudo bem, vou pegar algumas folhas de papel no meu escritório — cedeu ele. — Fiquem aqui por enquanto.

Os irmãos comemoraram, animados para brincar. Antes de se dirigir ao segundo andar, Anton passou na cozinha, onde Sara preparava o almoço.

— O helicóptero vai chegar a qualquer momento, precisamos ficar atentos.

— Sim, senhor. Vou ficar.

— Arthur é mesmo um excelente professor. Obrigado pela indicação.

— Não foi nada. E que bom que ele aceitou, não?

— Foi ótimo — ele suspirou e olhou para os netos, que brincavam na sala de estar. — Agora que estão maiores, eles ali precisam estudar. Mas agora preciso ir — Anton riu. — Eles querem brincar de fazer barquinhos de papel. Na piscina — ele colocou a mão no rosto e riu novamente. — Mereço.

Sara sorriu e observou os irmãos se divertindo. No começo de tudo, ela pensava que aceitar aquilo não poderia ser uma boa ideia, mas agora via como estava errada. Sara era a mãe que os quadrigêmeos não tiveram; estes, por sua vez, eram os filhos que Sara nunca teve.

Cerca de trinta minutos depois, quando Anton já estava na borda da piscina observando os barquinhos com os netos, um helicóptero chegou. Era Arthur, o novo professor particular dos irmãos.

— É ele? — indagou Guilherme ao avô.

— Sim. Vamos conhecê-lo?

E então, acompanhados de Anton, Alexander — que preferia ser chamado de Alex —, Guilherme, Thomas — que preferia ser chamado de Tom — e Leslie foram ao encontro de Arthur.

Descendo do helicóptero com sua mala, o professor dava as boas-vindas à ilha. Um homem comum, de pele escura, cabelo raspado e barba por fazer. Usava roupas simples, mas confortáveis, e não chamava atenção pela aparência. Seu destaque em meio aos outros era o vasto conhecimento que possuía principalmente em exatas, além de outras áreas. Estava ali para educar as quatro crianças que não poderiam ir à escola.

— Bom dia, senhor Anton — disse ele ao ver o seu novo patrão chegando com as crianças.

— Muito bom dia Arthur, quer que eu te ajude com isto? — respondeu Anton, indicando a bagagem.

— Não é necessário — Arthur direcionou seu olhar às crianças, que olhavam admiradas a ele. — Oi, sou seu novo professor.

— Oi, eu sou o Alex — disse o garotinho, acenando e abrindo um enorme sorriso para mostrar a "janelinha" que ficou quando um de seus dentes de leite caiu. — O meu dente caiu antes deles, eu fui o primeiro!

O professor novo riu do comentário, já imaginando o que viria pela frente.

— Crianças, vocês podem por favor ir até o quarto de um de vocês? Preciso conversar com Arthur e Sara por um instante — instruiu Anton

Tristes, mas compreensivos, os irmãos entraram na mansão e foram até o quarto de Tom enquanto os adultos se reuniam na sala de estar e o helicóptero ia embora.

— Muito bem, vocês querem beber algo? — ofereceu Anton.

— Uma água, por favor — pediu Arthur. — A viagem foi bem cansativa.

Anton então buscou na cozinha um copo com gelo e uma garrafa d'água para que Arthur se servisse à vontade. E então iniciou a conversa:

— Bem, Arthur, preciso lhe explicar como as coisas funcionam aqui. E Sara, por favor peço que me ajude com isso. Ainda não sou um velho gagá, mas estou no caminho para isso — brincou e riu, dando uma descontraída no ambiente. — Bem, os meus netos sabem ler, escrever algumas coisas básicas e contar os números. Sabem as cores, os animais e tudo o que poderia ter sido ensinado a eles. São crianças de cinco anos completamente normais. Você não vai ter muito trabalho por enquanto.

"Quanto à nossa rotina, bem... Sara cuida das refeições e das crianças, quando eu não posso. Elas acordam entre às 8:30 e 9:00h e tomam o café da manhã junto comigo na sala de estar. De vez em quando Sara também se junta a nós, quando não está ocupada, e você poderá realizar as refeições conosco sem problemas. Aqui nesta casa não há barreiras neste quesito."

"Durante a manhã até o almoço, elas costumavam brincar, mas agora terão as aulas particulares com você. Ah, sim, e agora obviamente acordarão mais cedo. O almoço é servido ao meio dia em ponto, e após isso todos estamos livres até o jantar, às 19:30. Todos devem estar na cama até às 22:30. Estes são os principais pontos. Algum comentário, Sara?"

Ela assentiu, mas logo complementou:

— Ninguém pode sair da mansão.

Arthur franziu a testa, confuso com o comentário, e Anton logo explicou.

— Ah, sim, claro — ele colocou as mãos à frente do corpo como quem pede calma e prosseguiu — Sabe, Arthur, eu já passei por muitos traumas na vida. Sou incapaz de imaginar como eu lidaria se vocês, qualquer um de vocês, se perdesse por aí ou se machucasse em algum acidente por aí. Jamais me perdoaria. Então, por motivos de segurança, só saia para o jardim e para a piscina, tudo bem?

Arthur concordou em silêncio.

— Ótimo — concluiu Anton, apertando a mão de Arthur e se levantando em seguida. — Agora eu vou continuar a entreter as crianças. Vejo vocês no almoço.

Anton se retirou, deixando Sara e Arthur sozinhos.

— Eu sei, eu sei — disse Sara, como se adivinhasse os pensamentos do professor. — Regras demais. Mas você se acostuma. Eu moro aqui há cinco anos e estou bem, olhe só — disse ela apontando para si mesma e rindo.

Sara foi até a cozinha e Arthur a seguiu. Ali estavam os velhos amigos de infância: vivendo e trabalhando juntos, na mesma casa, de uma maneira um tanto incomum.

— Acho que a minha maior dificuldade aqui vai ser diferenciar os três garotos — cochichou ele, apesar de estarem sozinhos. — Eles são muito iguais.

Sara riu.

— Bem, acho que não vai ser um problema — disse ela enquanto arrumava as panelas no fogão. — Veja bem: se está correndo por aí sem parar, atormentando você com várias perguntas ou insistindo para ir brincar lá fora, é o Alex. Se estiver sentando no sofá folheando um livro infantil ou então assistindo a algum desenho animado, é o Guilherme. E se estiver grudado em Leslie, é o Tom. Esses dois parecem ter nascido agarrados — brincou.

— Ele tem um sotaque britânico muito forte, você sabe se nasceu por lá? — Arthur perguntou referindo-se a Anton.

— Acho que sim, e foi para o Brasil depois — Sara explicou enquanto continuava a cozinhar. — Ele faz as crianças falarem inglês com ele, pra aprender desde cedo. Então comigo, e agora com você, eles falam português, mas com o vô precisa ser em inglês.

— Que interessante. Nunca ouvi falar desse método.

Após Sara dar de ombros, Arthur resolveu ir até os irmãos para conhecê-los melhor. Errou algumas vezes o cômodo em que estavam e percebeu como aquela casa era enorme, e então finalmente chegou até os seus novos alunos, que o abraçaram e fizeram uma enxurrada de perguntas.

— Você dava aula em uma escola? — indagou Leslie.

— Você não vai passar dever de casa né? — foi o questionamento de Alex.

"Vamos ter férias?"; "Que tipo de aulas vamos ter?"; "Suas provas são muito difíceis?"

Após acalmar os pequenos perguntadores, Arthur esclareceu pacientemente suas dúvidas, e também logo aprendeu a diferenciar os três garotos pelas suas personalidades. De fato, eram idênticos fisicamente, mas cada um tinha o seu próprio jeito de ser.

Os olhos dos irmãos já não eram mais azuis como quando nasceram; mudaram para a cor castanha, assim como seus cabelos. Tinham sardas como a mãe, mas Leslie era a única que dava para perceber isso, já que as dos garotos quase não eram visíveis. Os irmãos, apesar de terem crescido sem os pais, não eram infelizes por isso. Tinham, uns nos outros, um amor que era capaz de passar por cima de tudo o que já tinham sofrido. Leslie e Tom, em especial, sempre foram melhores amigos, mas sem deixar os outros irmãos de lado, claro.

Apesar de terem crescido afastados da sociedade, os irmãos eram muito saudáveis, e foram educados de uma forma que, se acontecesse algo que os obrigasse a voltar ao Brasil, se adaptariam muito facilmente. Além de que, claro, eram vacinados e examinados por médicos constantemente. Anton presava muito pela saúde dos netos.

Os anos se passaram e os irmãos, Anton, Sara e Arthur continuaram vivendo na ilha. Algumas vezes Sara tirava uns dias de folga para voltar ao Brasil, e Arthur fazia isso apenas quando instituía férias aos alunos — algumas semanas de julho e de dezembro até fevereiro —, como em uma escola normal. Anton permanecia sempre na ilha, e nunca, desde que fora viver lá, sequer cogitou em sair. Ele sempre esteve ao lado dos netos.

Os quadrigêmeos tiveram uma infância consideravelmente normal até chegarem na adolescência. Também tiveram alguns animais de estimação, como o gato de Leslie, Girassol — por ele ter uma coloração muito próxima ao amarelo —; a hamster de Guilherme, Pandora; o cãozinho de Tom, Mickey; e o Jabuti de Alex, Casca-Grossa. Nenhum desses bichinhos, no entanto, teve muito tempo de vida. Os irmãos não tiveram muita sorte nesse quesito. Aliás, o triste fim de Casca-Grossa foi ter se afogado na piscina. Tom, por engano, pensou que o pequeno jabuti fosse uma tartaruga, e que ele estaria fazendo um favor a ela ao devolvê-la ao seu "habitat natural", a água. Infelizmente não foi bem isso que aconteceu.

E a piscina foi um local muito memorável para os irmãos. Já que não podiam ir à praia, eles passavam os dias de calor ali mesmo, na piscina. Alguns acidentes aconteceram lá, também, além do afogamento de Casca-Grossa, como quando Guilherme bateu a cabeça na borda e ficou com um galo enorme na testa, ou quando Leslie inventou de pular na água de barriga e passou o resto do dia com uma dor insuportável naquela região. Ou mesmo quando Alex cortou seu peito em um azulejo quebrado, e acabou ganhando uma cicatriz enorme.

Mas é claro, acidentes acontecem com qualquer um, e com os irmãos não seria diferente. E apesar de algumas coisas ruins — e inevitáveis — que aconteciam de vez em quando, a vida na ilha era muito feliz. Leslie e Tom eram inseparáveis, e faziam quase tudo juntos. Alex e Guilherme também eram muito amigos, mas não tão grudados. Cada um ficava no seu canto, fazendo suas coisas.

Alex desenvolveu uma enorme paixão por novelas. Ficava da tarde, quando começava sua preciosa novela das seis, até a noite, quando o ciclo se fechava com a novela das nove, sentado em frente à TV. Quando alguma novela começava, não havia alma viva nesta Terra capaz de desviar sua atenção. Ele também decidiu, aos doze anos, que queria ser loiro. Pintou o cabelo e passou a amarrá-lo num pequeno coque no topo de sua cabeça.

O passatempo de Guilherme era ler; desde pequeno ele já tinha essa prática. Seu gênero favorito era fantasia, e ele adorava ler principalmente séries, e de vez em quando anotava algumas ideias para escrever seus próprios livros, mas nunca as levava adiante. Também adorava auxiliar Sara na cozinha sempre que podia.

Já Leslie e Tom faziam tudo o que é tipo de atividade juntos. Assistiam filmes, séries, inventavam histórias, faziam desenhos, origamis, tudo o que podiam fazer para passar o tempo.

E, enquanto os irmãos faziam o que gostavam de fazer, Sara cozinhava, e Arthur preparava suas aulas, Anton se trancava no escritório. E não saía de lá por nada. Antes de começar a fazer isso, sua aparência estava bem conservada apesar da idade. Mas aí começaram a surgir rugas e mais rugas, dores no joelho e nas costas que antes não existiam, e fios de cabelo brancos, até que tomassem completamente sua cabeça. Parecia ter envelhecido vinte anos em dez.

Conforme os quinze anos dos quadrigêmeos foram chegando, a rotina na ilha passou por uma leve alteração. Sara estava louca querendo preparar tudo o que é tipo de doces, salgados e bebidas para a ocasião, e Arthur decidiu dar uma folga nas aulas na semana do aniversário. Anton aparecia com mais frequência, mas também não muito. Era apenas mais um aniversário normal, mas todos queriam que fosse perfeito.

Aquele dia foi perfeito, mas também marcou o início de uma grande tragédia que iria abalar a família perfeita.

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