capítulo 12
— Você pegou o diário.
Não era uma pergunta, mas uma afirmação.
— Vô, eu...
— Eu não acredito nisso! — Anton berrava as palavras com raiva no tom de voz, fazendo a neta se assustar. — Esse diário é particular, quem você pensa que é para roubá-lo de mim?
— Eu não roubei, ok? Peguei, li e devolvi no mesmo instante.
— Que seja, Leslie, isso não torna as coisas melhores! Sente-se — Anton indicou uma cadeira com a cabeça, mas Leslie não sentou imediatamente, pois ainda estava muito confusa e assustada para entender algo. — Sente-se agora.
Leslie então sentou-se e, arrepiada até o último fio de cabelo, resolveu escutar.
— Você não vive exatamente em um país oficial, e tem muitos privilégios por isso. Não existem leis a serem cumpridas aqui — Anton esticava os braços para dar a entender que ele estava se referindo à ilha. — Mas existem regras nessa casa. Eu dito as regras, e você e seus irmãos cumprem, assim como Sara e Arthur. E quando as regras não são cumpridas, existem consequências.
Leslie tentava olhar nos olhos de Anton, mas por algum motivo não conseguia. Ela sentia como se aqueles olhos fossem capazes de sugar sua alma, como uma bruxa vilã dos contos de fada. Em silêncio, ela continuou ouvindo.
— Você vai limpar meu escritório — Anton apontou para um balde, uma vassoura, um esfregão e alguns produtos de limpeza no canto do cômodo, que Leslie mal havia reparado.
Leslie olhou ao redor e ficou confusa. O escritório estava perfeitamente limpo e arrumado, não tinha como fazer nada para melhorá-lo.
— Mas... — disse ela. — Já está tudo limpo.
— Tem certeza? — Anton, que estava parado em pé ao lado da escrivaninha, deslizou sua mão até uma xícara de café e então a empurrou pela borda, fazendo-a cair no chão. Ele também derrubou cadernos e papéis, e vários livros de sua prateleira. Rasgou inúmeras folhas que estavam em cima da escrivaninha e as lançou pelo ar. Em seguida, mergulhou seus pés no balde de água e pisoteou pelo chão, manchando-o com vários pés marcados com terra. Ele tirou a mobília do lugar, derrubou cadeiras e jogou o café do bule nas paredes.
Leslie observava atordoada todo aquele caos. O lugar parecia agora um cenário pós-apocalíptico. Ela não sabia nem o que pensar daquilo tudo.
Anton então parou, caminhou até a porta e disse:
— Limpe. Ah, e os livros ficam em ordem alfabética.
Ele saiu e bateu a porta com força, e Leslie imediatamente se levantou e correu até lá. Girou a maçaneta, mas de nada adiantou. Estava trancada.
A garota se virou e novamente observou o inferno que aquele cômodo se tornou.
— Não acredito nisso.
Ela sentia-se sozinha, ameaçada e com medo. Nunca antes tinha visto seu avô agir daquela maneira. Era ainda pior que a bronca de mais cedo. Aquela situação era desesperadora, e tudo ficava mil vezes pior sem Tom ao seu lado.
— Que droga — disse ela em voz alta, observando incrédula os produtos de limpeza no canto do cômodo. — Eu realmente vou ter que fazer isso.
Não há nada pior nesse mundo que sentir raiva de alguém que você gosta tanto. Você se sente culpado, frustrado, e com raiva de si mesmo também. Era assim que Leslie se sentia naquele momento, desejando que seu próprio avô caísse da escada e quebrasse o braço.
Seu próprio braço doía como se estivesse quebrado — os dois, aliás. Leslie jamais imaginara o quanto livros são pesados, e colocá-los na ordem que fora ordenada a fazer, esforçando-se para reposicioná-los na parte mais alta das prateleiras... bem, não estava sendo uma tarefa muito fácil.
Um saco de lixo era o que ela tinha para recolher a xícara quebrada e os papéis no chão, e nada mais. O balde com água teria que ser usado para limpar o chão e também as paredes, mesmo que chegasse em um ponto em que sua água ficasse mais suja que as próprias paredes.
Leslie tratou de limpar a mancha de café da parede antes que secasse, e felizmente saiu com facilidade. Após finalmente terminar de ajeitar todos os livros e verificar mais de uma vez se estava tudo devidamente organizado da maneira certa, ela ajuntou os cadernos, colocou-os de volta no lugar, e então usou o esfregão para limpar o chão.
Passou-se pouco mais de uma hora, mas na cabeça de Leslie foram dias. Ela tentou ajeitar a mobília exatamente da maneira que se lembrava, mas não teve certeza de que estava tudo certo.
Quando finalmente terminou, Leslie jogou-se na cadeira mais próxima e suspirou aliviada. Sem dúvida aquele foi o pior castigo que recebera em toda a sua vida.
— Tá — disse ela para si mesma, quase sem forças. — E agora?
Ela se levantou com rigidez, levou as mãos à cabeça e entrou em pânico.
— Vô! — esmurrando a porta, Leslie gritou na esperança de ser notada por Anton e mais ninguém. Se qualquer pessoa além de Anton a ouvisse, surgiriam muitos problemas. — Eu já terminei! Abre, por favor! VÔ!
Ela parou ao ouvir um clique na maçaneta, que em seguida girou e fez com que a porta se abrisse.
— Não tinha como fazer mais escândalo?
Leslie se afastou, sem dizer uma palavra. Anton olhou ao redor, vendo que o caos que causara havia sido reparado, suspirou e disse:
— Muito bem — Anton se aproximou e tomou a neta em seus braços e a beijou na testa. — Me desculpe por ter sido tão rígido. Espero que isso não seja necessário novamente.
— Desculpe por ter mexido nas suas coisas — respondeu Leslie, realmente arrependida. Ela deixou algumas lágrimas escaparem. — Não devia ter feito isso.
— Venha, vamos sair desse lugar — Anton desfez o abraço e segurou a mão de Leslie, levando-a embora do escritório. — Sabe, querida, aquilo que você leu...
— Não sei se quero falar sobre isso — Leslie interrompeu imediatamente. Ela já estava farta daquele assunto.
— Tudo bem, sem mais falar disso. Mas eu quero que saiba que isso ficou no passado, tudo bem? Nossa família não é mais assim.
Leslie deu de ombros, sem saber se ainda podia confiar no ser humano. Ela apenas desceu para a cozinha, comeu algo sozinha pois não estava a fim de jantar em conjunto, e foi para o seu quarto dormir.
Após mais ou menos dez minutos — que pareceram horas na cabeça de Leslie —, ela adormeceu.
Naquela noite, Leslie teve um sonho.
Ela estava no quarto de Tom. Haviam papéis sobre sua cama. A janela estava aberta, e o sol, se pondo. Ela se direcionou até a escada e desceu para a sala. Lá, deu de cara com Anton, que estava sentado em sua poltrona.
— O que foi que você fez? — disse ela, quase chorando.
— Apenas o necessário — Anton sorriu.
— Você não sabe o que é necessário. Só sabe o que lhe convém.
Anton gargalhou.
— E o que você vai fazer? Me machucar? — ele se levantou lentamente. — Pois saiba que eu tenho amigos.
Anton levantou os braços e, de trás dele, surgiram duas cobras corais enormes, que se rastejaram por seu corpo e pairaram uma em cada ombro.
— Gostou? — ele disse, sorrindo.
Leslie não conseguiu se mexer a partir daquele momento. Ela encarava assustada os olhares das duas cobras. Não sabia como, mas sentia que sabia seus nomes. Sabia que aquelas duas cobras tinham nomes, e os enxergava de uma maneira quase física.
Uma se chamava Thomas, e a outra, Sara. Ninguém a contou, mas ela sabia.
— Eu poderia ordenar que elas te atacassem — prosseguiu Anton, enrolando seus dedos nos rabos das cobras. — Mas eu vou lhe poupar. Quero que você fique bem viva para reconhecer a minha vitória
Naquele momento, as duas cobras se olharam e sorriram. Antes que Leslie pudesse se perguntar como era possível uma cobra sorrir, elas se enrolaram no pescoço de Anton e apertaram. O homem sufocou, caindo de joelhos no chão. Seu rosto ficou roxo enquanto Leslie apenas observava, de olhos arregalados. Antes que Anton caísse morto no chão, Leslie acordou.
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