Capítulo 5
Meio dia. Os raios de sol invadiam os espaços entre as folhas das árvores atingindo a parte baixa da floresta e a iluminando. Apesar do chão estar quase totalmente seco, algumas poças d'água espalhadas indicavam que havia chovido na noite anterior. Rolando em uma dessas poças estava uma família de capivaras, os pais e dois filhotes que não paravam de se mexer na água suja. Vários lagartos diferentes, borboletas de vários tipos e um número grande de pássaros voando e cantando no alto das árvores também estavam à vista. Marcos levantou os olhos adimirando-os. Eram das mais variadas cores e tamanhos, os cantos se juntavam formando uma mistura agradável aos ouvidos mesmo não sendo possível distinguir todos eles.
Ainda estava de cabeça para o alto quando acabou pisando em um tronco podre encobrindo seu pé com uma madeira escura e alguns vermes que estavam do lado de dentro. Rapidamente, Marcos captou a mensagem. Deveria esquecer as distrações do ambiente, não sabia a qual perigos estava exposto. Felizmente o canto das aves ajudava a espantar da floresta o ar de solidão que ela apresentava a todo momento.
Pequenos inchaços apareciam em seus braços, resultado das picadas dos inúmeros mosquitos presentes ao seu redor. Uma coloração vermelha e algumas marcas produzidas pelas unhas também se espalhavam por todo o membro, e aumentavam, ao passo em que tentava diminuir a coçeira presente. Apenas quando ele balançava as mãos os mosquitos se dispersavam, mas não durava muito pois logo retornavam a incomodá-lo. Mesmo morando em um apartamento onde direto era incomodado por esses animais, sempre achou um exagero uma pessoa gastar dinheiro comprando uma raquete daquelas feitas especificamente para matar esses mosquitos. Porém agora era isso que ele queria. E muito.
Os vários tipos de animais, plantas e o grande número de flores das mais variadas cores levaram Marcos a fazer uma suposição a cerca de sua situação: presumiu que essa ilha na qual estava não deveria ser muito visitada, isso se fosse conhecida.
Apesar da floresta possuir uma grande variedade de tipos de árvores, uma boa parte delas parecia ser da mesma espécie. Já cansado da caminhada, Marcos parou para descansar e se encostou em uma delas. Sua casca, naturalmente áspera, começava a se contorser e se desgrudar do tronco principal mostrando o quanto era grossa para proteção. Ele as observou atentamente. Não tinha dúvidas de que elas não estariam ali se aquela ilha fizesse parte ou ficasse perto de algum continente. Mesas, cadeiras, comôdas, guarda-roupas... são alguns dos móveis fabricados através da madeira que antes, pertencia a uma árvore, muitas vezes nativa, que foi derrubada na floresta sem o menor remorso e muito menos planejamento para tentar evitar ou até repor o impactos climáticos e naturais que essa derrubada provocaria.
Com o fôlego restaurado, ele se levantou e seguiu em frente. Caminhar por um terreno irregular, algumas vezes fofo demais e outras muito duros, deixava Marcos cada vez mais cansado e andar aleatoriamente sem saber para onde estava indo era frustrante. A falta de água só piorava ainda mais a situação.
Certas partes da floresta eram cobertas por pequenas árvores e outras por capim, que acabavam deixando o terreno totalmente coberto. Enquanto andava reparando no ambiente ao seu redor um barulho de capim se mexendo chamou sua atenção. Parou e ficou estático ao perceber uma cobra grande e escura passando ao lado do seu pé. Era grossa, mas não muito grande. Ao que parecia devia ter acabado de passar por alguma dessas poças d'água espalhadas pelo chão pois suas escamas manchadas com marcas circulares brilhavam na luz do sol.
Quando pequeno, enquanto assitia a um filme de terror na televisão, Marcos escutou de um parente, o qual não se lembra qual foi: fica tranquilo, uma cobra só vai te morder se você pisar nela.
Nunca procurou saber se essa afirmação era verdade, mas era nesse pensamento que estava confiando no momento. Não sabia se a cobra era venenosa e estando a horas de distância do mais próximo posto de saúde, preferiu não arriscar. Resolveu ficar imóvel na tentativa de não assustá-la mas não funcionou, assim que ela o avistou, começou a deslizar rapidamente fazendo ele se esquivar do animal e começar a correr.
Sem ver o chão por causa do capim Marcos tropeçou em uma raiz e caiu, começando a rolar. Sem perceber, o chão começou a ficar íngreme e a poeira se levantou esfumaçado o ambiente. A areia fina não oferecia resistência à seu corpo e quando foi perceber estava deslizando descontrolado em uma barranceira. Sua camisa começou a se levantar nas suas costas e na tentativa de parar, Marcos agarrou um galho que acabou se quebrando e deixando ele ainda mais desesperado. Seu coração acelerou e na agonizante situação não conseguia raciocinar com cautela pois não tinha tempo para isso. As árvores passavam em alta velocidade na frente dos seus olhos e os animais corriam assustados com seu grito de desespero. Marcos avistou o que parecia ser o final da barranceira, e não parecia ser bom. A cada segundo passado a queda se transformava em um resultado que parecia inevitável e, numa última tentativa, ele se jogou pra lado e conseguiu se agarrar a um tronco que estava por perto. Devido a velocidade, seu corpo girou para o lado e seus dedos deslizaram um pouco ao redor do tronco até encontrar resistência e parar.
Depois de alguns segundos esperando a poeira sumir e a adrenalina passar, Marcos se levantou ainda tossindo um pouco e, olhando pra frente, observou um penhasco. Era fundo, escuro e longo mas não divia toda a a ilha. Apenas uma parte dela. O eco do canto das aves rebatia nos paredões pouco iluminados dando um efeito que ele nunca tinha visto. Suspirou fundo e subiu o morro com cuidado, então resolveu seguir seu caminho ao lado do penhasco pela parte plana do terreno até que pudesse dar a volta nele.
A caminhada acabou consumindo sua energia o deixando completamente exausto. Definitivamente não tinha preparo físico para lidar com uma situação como essa. Sua boca seca e suas pernas fracas já começavam a eliminar sua esperança de encontrar água quando, ao longe, escutou um barulho parecido com o de uma torneira aberta. No desejo de que fosse água doce, Marcos acelerou as passadas seguindo o barulho e à medida que se aproximava, o volume ficava mais alto e claro. Ao chegar no lugar, encontrou um grande poço de água clara e acima dele uma cachoeira alta e volumosa que formava no poço uma enorme espuma branca graças a força com que despencava.
Apressado, se debruçou na beirada e começou a beber com tanta vontade que parecia que acabaria com toda a água disponível.
Satisfeito, ele se jogou para trás e deitado, suspirava para recobrar o fôlego enquanto sentia sua cabeça doer e seu estômago começar a roncar de fome. Estava de olhos fechados quando começou a sentir os olhos e nariz esquentar, o sol havia se movido e agora sua luz acertava em cheio seu rosto. Para tampar a claridade, Marcos levantou seu braço e assim que a sombra formada por ele atingiu seu rosto enxergou com definição o símbolo em seu pulso. Analisou-o por alguns segundos mas, o sangue começou a descer de seu braço o deixando pesado pra se sustentar no ar, então ele se sentou.
Tentava buscar em suas memórias algo que fosse relevante mas não conseguia se lembrar nem de como veio parar naquele lugar, quanto mais de um símbolo daquele tamanho. Apenas alguns flash de memória apareciam. Seu João, dona Ana, Julia, e cenas da sua rotina eram algumas das lembranças. Também se lembrava de luzes, o chão balançando e uma fila de pessoas mas as imagens eram vagas e deformadas. Resolveu desistir. Não estava adiantando e tinha coisa mais importante para se preocupar no momento. Estava com fome e não fazia ideia de onde poderia encontrar algo para comer.
Marcos se aproximou da beirada do poço e observou seu reflexo na água. Estava com olheiras e algumas folhas ainda estavam grudadas em seu cabelo. Tirou-as e bocejou por um instante. Se inclinando para frente ele encheu as mãos e lavou seu rosto, limpando o suor e aliviando o calor que sentia. A água mexia-se freneticamente deformando a imagem do seu rosto e quando parou de se mexer, Marcos observou o que seria sua salvação: o reflexo de uma bananeira do outro lado poço. Era pequena e as bananas dos seus dois cachos estavam maduras.
Para não se molhar atravessando o poço ao ir buscá-las, ele desceu um pouco mais para baixo no riacho e atravessou em uma parte com pedras escorregadias que quase o derrubou.
A cada mordida dada a sensação era de que aquela era a melhor banana que ele já havia comido. Provavelmente essa sensação era devido ao tempo que ele ficou sem comer nada, ou talvez porque ela não continha agrotóxico, ou poderia ser que aquela banana seja realmente a melhor que existe, enfim, não tinha como saber.
Sabia apenas que comer era do que precisava e, sem muito tempo para refletir sobre qual tipo de banana era aquela ou se teria o suficiente para o resto do dia, sua paz foi roubada pelo barulho do capim se quebrando e sendo afastado indicando que pessoas se aproximavam do poço.
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