Capítulo 5

Meu pai obrigou-me a sentar-me novamente e ficar calma, tentei ao máximo faze-lo, porém, a raiva ainda era bem visível em meu rosto.

A minha vontade é quebrar a cara desse principezinho intrometido.

Já tio Felix parece muito calmo, ele deve está adorando o que está acontecendo. O rei e seus filhos também voltaram ao seus assentos, Mason até agora não falou nada — o que é estranho —, ele devia ser o mais interessado, afinal, ele será coroado rei de Arrem, o que for decidido aqui também afetará seu futuro. A não ser, que seja com ele que terei que me casar. Não pode ser, ou um de nós terá que deixar a coroa, e assim como eu, ele parece ter sido preparado para isso.

Kit nos olha atentamente, tentando entender a situação, enquanto meu pai a explica. Ele acha, que ela sendo minha conselheira, irá me convencer a aceitar o acordo, mas nem Kit vai me fazer mudar de ideia. Não vou me unir a um Wannell, já os odiava antes, agora os odeio ainda mais, é impossível me imaginar vivendo ao lado de um deles.

Quando acordei hoje pela manhã, pensei que meus problemas seriam apenas ir atrás de um grupo de contrabandistas, em vez disso terminei com uma faca no pescoço. Estou correndo sérios riscos, quase acertei um soco no rei de Arrem, e tenho certeza que ele não deixará isso passar em branco.

A sala na qual estamos é enorme, no entanto, para mim está parecendo um cubículo sugando todo meu ar, me deixando sem chão, é como se estivessem cravando um punhal em meu coração, me matando aos poucos. Estou em uma batalha, e acho que vou perde-la.

— E se não aceitarmos o acordo? — Kit perguntou calmamente ao rei.

Ela consegue manter uma calma inacreditável nessas situações. Assim como eu estudei para ser rainha, ela estudou para uma diplomata. Mesmo meu pai querendo que Tyler seja meu conselheiro, ele concorda em manter Kit ao meu lado, ela é a única que consegue me acalmar quando estou zangada. Mas, hoje não.

— Se vocês não aceitarem, romperemos todos os acordos que temos com seu reino. — O rei Fhilips parece muito calmo.

Soltei um riso frio.

— Você não faria isso — foi a vez de meu pai ficar com raiva.

— Não vou manter alianças com uma rainha recém coroada, que não é confiável.

— Mas seu filho também será coroado, que garantias vocês nos dariam que ele também não irá nos trair — Kit interveio.

Dei um sorriso de contentamento, Kit sabe muito bem esse jogo, e não parece disposta a perder. O rei parece ter sido pego desprevenido, e mastiga uma resposta que a solta imediatamente.

— Mason é o mais interessado nesse tratado, e ele nunca foi contra o tratado.

— Isso não é garantia — Kit soltou.

— Assim como a palavra da princesa.

Observamos quem irá vencer essa disputa, o rei ou minha conselheira.

— Imagino então, que seja o seu filho mais novo a moeda de troca.

Olhei para James, que abaixou a cabeça quando percebeu. Parece que ele também é contra essa loucura, mas não pode recusar.

— Meu filho não é uma moeda de troca — a máscara de tranquilidade do rei começou a cair.

— Como não? Seu filho se casar com a princesa Rachel é uma garantia da lealdade dos reinos. Não vejo outro nome para isso — ela sorri triunfante.

— Meu filho concordou que isso seria o melhor para nós.

— Mas não para nós — sibilei.

— Vocês não tem escolha — ele recuperou a calma.

— Temos — Kit respondeu.

— E qual seria? — ele recostou-se no sofá.

— Rompemos o acordo. Erdenville é o maior Reino, não seria difícil achar outro aliado.

Esse é um jogo perigoso, será que ela sabe o que está fazendo? Meu pai parece preocupado com o rumo da conversa, mas não se intromete, ele quer ver do que somos capazes. Tio Felix por outro lado, está começando a ficar inquieto. Kit está blefando, sabemos que não seria conveniente romper o acordo, ela só está tentando me ajudar.

O rei de Arrem solta uma gargalhada amarga.

— Misser é a região mais cobiçada pelos outros reinos, e sabemos que eles só não os ataca, por causa dos seus exércitos aliados aos nossos.

Kit começa a perder a confiança, o jogo começou a virar.

— Se vocês ficarem desprotegidos com uma rainha recém coroada, eles não hesitariam em ataca-los. E se vocês oferecerem um acordo, não creio que irão querer somente vinte por cento do território de Misser.

Kit permanece em silêncio, reconhecendo a derrota, ou tentando um contra ataque.

— E então, qual sua decisão princesa? — ele se volta para mim.

Mordo a língua, para conter uma onda de insultos.

— Rachel — Kit se volta para mim — posso falar com você? — ela perguntou preocupada. Apenas assenti.

Fomos para o canto da sala que estava menos iluminado. Kit parou à minha frente, seu olhar era pura decepção, como que se pedisse desculpas por algo que ela não tinha culpa.

— Ei, não é sua culpa — coloquei a mão em seu ombro — você fez o que pôde.

— Rachel ele tem razão. Eu sei o que significa a coroa para você, e esse acordo seria ótimo para seu futuro e o futuro do reino.

— Eu não posso Kit... eu odeio Arrem, odeio eles...

— Não é uma questão de gostar, é o melhor a se fazer. Se eles romperem o acordo seu fracasso é iminente. Você precisa deles...

— Não...

— Esquece esse seu orgulho, isso não vai te levar a lugar nenhum. Aceitar esse acordo é o melhor a ser feito.

Um nó prendia minha fala, as lágrimas inundaram os meus olhos, mas as contive. Meu pior pesadelo acaba de se realizar — eu que tanto desprezei casamentos acordados, estou sendo vítima de um —, posso recusar, mas os riscos que corro são altos demais.

Uma vez, Melanie disse que eu estava obcecada pelo trono, ela tinha razão. Cresci ouvindo todos ao meu redor dizendo para me sacrificar pela coroa se necessário — eles diziam coroa, não pelo povo —, será que é por isso que adquiri essa frieza?

Não sei o que fazer. Kit continua me encarando à espera de uma decisão.

— O que você decidir, saiba que irei te apoiar. Só pensa bem no que vai dizer.

Concordei com a cabeça.

— Seja forte — ela finalizou.

Quando voltamos para nos juntar aos demais, tentei parecer o mais calma e confiante possível. Fiquei de pé em frente a eles, Kit continuou ao meu lado.

— O que decidiu? — o rei Fhilips ficou de pé.

Olhei para meu pai, preciso ouvi-lo primeiro, exigir uma explicação aceitável, saber porque ele não me disse nada sobre a insegurança dos nossos aliados. Isso é uma traição, confiei tanto nele, e ele escondeu isso de mim.

— A quanto tempo o senhor sabia disso?

Ele me olhou com pena.

— Há quatro meses.

Não contive a surpresa — quatro meses conspirando meu futuro sem meu consentimento.

— Por que não me disse nada?

— Queria te poupar. Tentei convence-los que isso não seria necessário, mas não consegui. Você sabe... esses acordos são feitos o tempo todo, ninguém escapa deles.

Soltei uma risada falsa.

— É, ninguém escapa — nem mesmo eu. — E o senhor, o que acha tio?

Minha pergunta o deixou sem jeito, ele não esperava ser chamado na conversa .

— Acho melhor não me intrometer, essa decisão cabe somente a você.

— Preciso de uma resposta — o rei insistiu.

Desviei o olhar de meu tio, e os voltei para ele. Imagino se James não se opôs a esse acordo. Minha resposta muda tudo, estou em uma corda bamba e a queda é iminente, não encontro saída desse labirinto, não tenho uma opção segura.

— Eu aceito — as palavras me cortaram como uma faca.

— Ótima decisão — ele sorriu.

Senti raiva da minha fraqueza, raiva de ter cedido as chantagens dele, contudo, eu não tive escolha — tive, só escolhi a mais fácil. O príncipe James não parece contente, ótimo, vai ser fácil mantê-lo longe.

— E como será isso? — perguntei com tom de nojo na voz. Vou deixar claro que fui forçada a isso.

— Amanhã no jantar de despedida da família de Arrem, anunciaremos o noivado — meu pai tomou a palavra —, o príncipe James e a rainha Carolyn ficarão aqui, até o casamento.

— Quando? — perguntei.

— Como a sua coroação será daqui há três meses... achamos melhor... é para não...

— Quando? — perguntei impaciente.

— Um mês.

— Um mês? — meu coração disparou.

Ele confirmou com um aceno de cabeça. Não pode ser, é um pesadelo, tem que ser um pesadelo.

— Fico mais tranquilo, agora que tudo se resolveu — o rei Fhilips se virou, me oferecendo um sorriso. — É bom ver você tomar uma decisão sensata.

Abri um meio sorriso irônico para o rei, seu olhar era de triunfo sobre mim. E meu pai não disse nada para me defender, ele ficou calado, olhado eu ser pressionada até ceder a chantagem do nosso — "aliado" —, a única explicação que vejo para isso, é que ele também tem medo que eu fracasse.

Não importa, esse novo acordo não vai mudar nada, eu já me sacrifiquei antes, vou me sacrificar de novo. E quanto ao príncipe, é só mantê-lo longe, isso não será difícil, já começamos mal.

— Estou liberada? Ou vocês tem mais alguma exigência?

— Não, pode ir, eu cuido do resto — meu pai disse ficando de pé. — Kit pode ficar, depois ela lhe informa os detalhes.

Dei uma última olhada na sala, e sai sem pensar duas vezes, antes de cruzar a porta meu pai me chamou, parei de costas para ele.

— Não comente com ninguém o que foi discutido aqui.

Nem havia pensado nisso.

Sai apressada da sala, não pretendo voltar para lá. Caminho pelos largos corredores iluminados do castelo com o coração na mão, deve ser mais de meia noite, quero dormir e esquecer esse dia.

Liam... Me esqueci completamente dele.

Desviei pelo outro corredor, que dava na ala leste do palácio, é um acesso mais rápido que os empregados costumam usar para facilitar seu trabalho em eventos grandes. Esses corredores dão para qualquer parte do castelo, dentro e fora, eles são mais apertados, porém são mais iluminados também. Sempre os uso quando não quero ser vista, os guardas não patrulham aqui, então é fácil chegar ao jardim sem incômodos.

O jardim está muito escuro, as lâmpadas estão todas apagadas, só consigo ver as sombras dos arbustos, das árvores, a tenda onde costumo vim nas horas vagas, e as pequenas flores. Não vejo Liam em canto algum, ele deve ter se cansado de me esperar.

De repente sinto alguém cobrir meus olhos por trás. Liam... Ele me esperou afinal. Levei as minhas mãos sobre as dele retirando-as, para em seguida me virar, estava muito escuro mas deu para perceber que ele já estava sem o uniforme. Nos perdemos no silêncio de um abraço por alguns segundos, era tudo que eu precisava naquele momento.

Depois de algum tempo sem falar, ele resolveu ser o primeiro a dizer algo.

— Falou com seu pai?

Estávamos sentados na grama úmida, ao pé de uma árvore, sentei entre as pernas dele, apoiando a cabeça em seu peito, ele me abraçava segurando minhas mãos.

— Não consegui.

— Ou não teve coragem?

— Ele estava ocupado com o rei de Arrem — falei com desdém na voz.

— Fiquei sabendo que eles estão aqui... o que eles querem?

Meu coração gelou com a pergunta, não faço ideia de como dizer a ele que irei me casar — só a palavra me enoja. Liam nem desconfia desse meu destino que acaba de ser traçado por um rei ardiloso.

Isso vai ter volta, não sei como, mas vou dá o troco. Espero que o rei Fhilips não esteja achando que esse acordo irá lhe salvar da minha ira, não importa quanto tempo demore, mas ele vai pagar por isso, com uma simples visita ele virou minha vida de cabeça para baixo.

Liam parece tranquilo como sempre, seus lábios roçam meu pescoço, provocando-me arrepios. Quando fiquei sabendo que minhas atividades junto a nossas tropas tinham acabado, temi ficar muito tempo longe dele, nem imaginava que esse não seria meu maior problema, agora tenho que me separar dele para sempre.

Por mais que esse casamento seja um acordo, eu nunca seria capaz de traição, é contra meus princípios, além de não ser justo com Liam, ele merece alguém por inteiro, que o faça feliz. A raiva me consome, porque essa pessoa não será eu.

Meu silêncio começou a deixa-lo inquieto.

— E então Rachel, o que eles vieram fazer aqui?

— Liam... — minha voz começou a falhar. — Eu... eu vou me casar.

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