13. Conhecimento e Desastre
"A economia da porção das Ilhas leste é baseada na pesca, sua proximidade com áreas de grandes cardumes de peixe branco do mar, o preferido em todo reino de Rubi, é favorecida em relação aos demais pontos de pesca do reino. Mesmo assim, sua oferta é capaz de atender apenas a própria porção, isto porque os peixes brancos do mar conservados no sal são oferecidos a preços muito mais baixos pelos mercadores do reino da madeira pelo tratado de peixes e pedras celebrado entre os dois reinos."
Deixei o livro fino de lado, para pegar uma enciclopédia velha e empoeirada que tinha servido para me ajudar a decifrar os demais.
"O tratado de peixes e vinhos foi um dos primeiros documentos assinados entre o reino da Madeira e o primeiro Rei de Rubi da era pós hereditária. Nesse tratado, o reino de Rubi reduziu o imposto cobrado sobre as cargas de peixes que cruzavam a fronteira, em contra partida, o reino da Madeira reduziu na mesma proporção as taxas sobre as pedras preciosas vindas do reino de Rubi que eram vendidas aos montes para a nobreza mercantil que enriquecia na Madeira."
Minha leitura tinha ficado melhor, além disso, apesar de falarem a mesma língua as palavras eram escritas de uma forma mais fácil aqui no reino de Rubi, não usavam tantas letras que não tinham som algum e colocavam as palavras em uma forma mais parecida com o que era falado. Peguei novamente o livro fino sobre a economia e política da porção que agora era senhora.
"A porção das ilhas leste tem vastas áreas de preservação que não podem ser transformadas em plantações, além dos locais de pesquisa da antiga civilização administrados pelo Clã dos Magos. A região tem rica história mágica, com florestas que fazem qualquer um prender a respiração com tamanha beleza. Recebe pesquisadores das academias de todos os cinco reinos. E é o único lugar com grande atividade de dragões ainda selvagens do reino de rubi. Mesmo assim, pouco disso pode ser explorado. Com agricultura de subsistência sendo a única permitida, e nenhum potencial mineral como o resto do reino, a região não tem escolha a não ser depender do mar.
Ainda, com o preços mais altos do que os do reino da Madeira, participando do sistema comum de impostos do reino de Rubi, não restou escolha a administração da porção a não ser proibir a entrada de mercadorias da madeira na região, com base em uma brecha na lei da preservação. Essa atitude fez com que os pescadores da porção das ilhas leste conseguissem vender seu produto e o pouco comercio originado na região continuasse. Contudo, isso também onerou ainda mais o povo mais desfavorecido da porção, que pagava mais por produtos internos. Para o reino de Rubi, é claro, o tratado foi bastante lucrativo, os impostos que recebiam pelas vendas em massa de pedras preciosas superavam em muito a receita vinda do comércio de peixes de uma porção que a muito não tinha líder."
Suspirei, minha cabeça começando a doer com o esforço. Eram muitos problemas e eu não tinha ideia de como resolvê-los.
— Helgan, comece o programa de educação com o tolis que Kareno deixou. — Falei antes de abandonar os livros, e levar da escrivaninha para finalmente terminar o dia. — Sei que vai acabar rápido, mas vai servir até eu conseguir pensar em algo.
A mulher que também trabalhava em alguns papeis assentiu solenemente.
— Sim, senhora. — Ela disse, tomando minha preparação como um deixa para sair de meus aposentos. — Vou fazer isso imediatamente.
Deixei uma risada cansada escapar quando Helgan se apressou para recolher o resto de seus papéis.
— Pode cuidar disso amanhã, Helgan. Vá descansar. Isso é uma ordem.
Ela sorriu sem jeito.
— Sim, senhora. — E deixou o quarto.
Eu já tinha tomado um banho, já tinha trocado minha armadura por roupas frescas da melhor seda feita em Rubi. Meu cabelo, estava maior caindo sobre mus ombros com ondas castanhas e sedosas, graças aos produtos que sempre abasteciam meus aposentos. Minha pele perfumada e cremosa, minhas mãos e unhas limpas e macias mesmo com os vários calos feitos pela minha espada e meu hálito fresco.
Eu deitei na cama macia e encarei o telo elaborado por alguns segundos, prestando atenção em mim mesma, na estranha sensação de conforto, e tranquilidade. Não existiam armadilhas ao redor da minha cama, eu não precisava me privar de sono, me deitar com a armadura e toda a sujeita do dia, por ter raras oportunidades de me lavar sozinha. Prestei atenção no meu peito subindo e descendo a cada respiração, sem amarras, sem o medo constante de morrer e sem a dor de matar.
Mas ainda não estava tudo bem. Me lembrei.
Ainda temos muito o que fazer. Modesh concordou comigo.
***
Não estava mais no castelo real de Rubi.
Era uma sala pequena, mas completamente mobilhada com riquezas, parecia um lugar de tesouros, de troféus.
— Majestade, não deveríamos ter nos afastado tanto assim da capital. — Uma voz fina falou, mas não pude ver quem havia dito.
Como se para responder meus pensamentos a porta da sala se abriu e dois homens surgiram. Um era algo, vestia um uniforme nobre vermelho e tinha uma coroa dourada em sua cabeça o outro era ainda mais alto, e vestia uma amadura de aço da cabeça aos pés.
— Ninguém sabe que estamos aqui, encarregado. — O rei falou. — Por isso viemos sem os dragões. Você viu que a vidente estava certa, só meu sangue abriu a porta de pedra.
O rei olhou em volta, seus olhos passando por mim como se eu não estivesse lá.
— Se ela realmente estiver aqui, vai ser uma arma. Uma arma que precisamos contra ele.
Meu estomago se revirou e uma energia avermelhada disparou por todos os cantos. Eu sabia exatamente quem era o dono daquela magia, tinha visto ela ser usada para matar antes. Abri a boca, mas não produzi nenhum som. O rei e seu encarregado continuavam alheios, procurando o tesouro que vieram buscar.
— Acredito que devemos enviar um grupo para levar todos estes tesouros para o castelo, agora que o selo da porta se desfez. Mas por enquanto vamos levar apenas a esfera do tempo.
A magia vermelha ficou mais forte, apodrecendo toda a energia do equilíbrio que protegia o lugar. Eu podia sentir o caos em cada fio de cabelo, desorganizando as teias do destino, trazendo o desespero e dor. E então eu sabia que o destino dos dois não seria diferente do de Kareno.
Eu ouvi seus passos antes de vê-lo.
Dessa vez o rei desconhecido e seu encarregado também ouviram.
— É ele. — O rei falou e se virou para seu homem entregando para ele uma pequena esfera negra. — Aqui. Deve ser isso. Saia daqui e corra para a capital...
Tarde demais.
Na porta pareceu seu rosto branco, seu corpo frágil, e suas mãos de papel. Mesmo assim, o campeão da névoa parecia mais forte do que da ultima vez que o tinha visto.
— Que bom que se dispuseram a buscar a esfera para mim. — Ele falou, sua voz quase fantasmagórica. — É minha única chance de saber onde aquela mulher selou meu dragão, minha chance de recuperar minha glória e vocês me trouxeram diretamente para ela.
O rei engoliu seco, mas não falou nada. Eu pude ver que ele sabia seu destino, pude ver a traição estampada em seus olhos, ele sacou a espada de sua cintura, assim como seu encarregado.
— Por esse favor, vocês vão morrer rapidamente.
Senhora!
Os dois correram na direção do campeão, mas a morte chegou para eles antes que conseguissem o alcançar.
***
— Senhora! — A voz alta de Helgan me despertou. Mesmo no escuro e com a mente anuviada pelo sono eu pude ver sua urgência.
— Por todo o sangue dos cinco reinos, o que aconteceu, mulher? — Falei me levantando.
— Aconteceu um problema e todos os herdeiros foram chamados para uma conferencia com a rainha.
Enquanto Helgan me ajudava a entrar nas vestes formais de senhora, as lembranças do meu sonho me deram o conhecimento do que iriam nos informar.
***
— Detesto chamar vocês assim, tão subitamente. Mas vou compartilhar uma notícia que vai mudar muito todo o continente. — A rainha falou. — E quero que saibam que nossa decisão sobre a guerra, não vai ser alterada, nós vamos esperar.
Olhei em volta, Kiram estava quieto sentado ao meu lado, assim como o resto de meu círculo. Os herdeiros não ousavam tirar o olhar da rainha, que tinha um olhar afiado por trás das palavras urgentes.
— Hoje a noite recebi a mais alarmante das notícias por meio de um nos nossos olhos, o rei da madeira morreu dois dias atrás.
Kiram endureceu e meu queixo caiu, minha mente juntando as peças do quebra cabeça rapidamente.
Eu olhei para o cavaleiro e cabelos azuis ao meu lado e sua pele estava pálida como papel. O que isso significava para ele? Kiram era da próxima geração de sua casa de comerciantes, e isso significava que iria participar da eleição para rei.
E pior, Kiram amava o tio.
— Não está claro, como aconteceu. Mas a magia proibida do caos foi detectada em todo o local. — Ela continuou.
Minha mão procurou a de Kiram, que aceitou o toque com fervor, segurando tão firme quando podia, como se estivesse agarrando sua própria sanidade.
— O que isso significa? — A herdeira Nira perguntou antes que qualquer um pudesse.
— Bom. Por enquanto, vamos aguardar. A eleição na madeira acontecerá em cinco semanas como é a tradição, até lá os príncipes herdeiros farão sua campanha e suas alianças. — O olhar da rainha parou em Kiram.
Nira não falou. Com o destino do reino da madeira incerto, não era hora de comprar briga com o reino do Ouro, independentemente das circunstâncias.
Batidas altas na porta interromperam a conversa.
— Quem tem a ousadia de interromper uma reunião real? — Um dos membros do círculo da rainha gritou.
— Urgente. — Uma voz do outro lado da porta gritou. — Trago uma mensagem urgente para a Senhora da Porção das Ilhas Leste.
Me levantei e lancei um olhar para Starne, que imediatamente correu para a entrada do salão. Depois de trocar uma dúzia de palavras com o mensageiro, ele trouxe um pergaminho encantado do tipo usado para mensagens mágicas.
Quando ele me entregou o papel eu desenrolei, sentindo o olhar de todos cuidadosamente sobre minha reação.
Anevoados tomaram conta de parte da floresta encantada e estão atacando as vilas da região, precisamos ajuda imediatemente. São centenas deles e dezenas de mortos do nosso lado por enquanto.
O símbolo da porção era toda confirmação necessária.
Respirei fundo e me virei para Helgan.
— Quantos dias de viagem daqui até a sede? — Perguntei.
— De dragão, sete dias. Caravana pelo menos quinze.
três dias. Modesh falou para mim.
Assenti.
Me levantei e limpei a garganta.
— Bom. Receio que não vou poder participar das competições esse ano, a porção esta sendo atacada por anevoados e minha presença foi requisitada. — Falei, arrancando alguns suspiros surpresos e xingamentos dos presentes. — Vou sair pela manhã, vossa majestade, espero que possa visitá-la logo após o amanhecer para discutirmos que tipo de ajuda o reino irá enviar. Se me dão licença, preciso fazer alguns preparativos para a viagem.
Olhei para a rainha, esperando.
Senti um aperto no peito. Mesmo que eu nunca tivesse pisado no lugar, que eu fosse uma herdeira falsa, eu nunca os deixaria morrer sob minha responsabilidade.
— Claro, herdeira. Vou esperá-la ao primeiro raio de sol.
***
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