- vi.

gotham city, 10:11am,
cemitério de gotham


               MADDIE OCEANS manteve o olhar fixo no gramado úmido pelo máximo de tempo que pôde. Eventualmente sentia mãos afagarem seus ombros e ouvia palavras de consolo. Mas não se mexia ou respondia, esperava que isso fosse o bastante para as pessoas desistirem, funcionava depois de alguns segundos.

               Naquela manhã, ela escolheu o seu melhor par de calças pretas para o velório. Acordar foi estranho, Maddie perdeu alguns minutos se perguntando se tudo não passara de um sonho maluco. Mas ela tinha marcas em todo o corpo e pingos de sangue no carpete da sala para provar que os últimos dois dias foram bem reais.

               Depois de vestida, parou por alguns minutos na frente do espelho, tentando entender o próprio semblante, os próprios sentimentos. Havia uma sombra de tristeza em seus olhos castanhos, mas seu maxilar estava travado e além disso, havia pouca ou nenhuma expressão ali. Ela se perguntou se isso não faria os outros suspeitarem dela, e por algum motivo, escondeu a arma no cós da calça, se sentindo um pouco mais segura, mas bem pouco.

               Pegou um táxi, e não conseguiu prestar atenção na história do motorista sobre seu filho estar quase se formando em direito. Ou seria engenharia? Parecia que estava debaixo d'água, e todo som vinha de quilômetros de distância, soavam abafados e ecoavam.

               — Você é Madeleine Oceans, certo? — uma voz a despertou de seu transe. Não era uma voz conhecida, e por isso ela se assustou e quase levou a mão até o cabo da arma.

               Ela também não conhecia aquele rosto. Teria se lembrado. Era anguloso, o maxilar era bem definido, e pálido, muito pálido. Mais do que o padrão de palidez em Gotham. Retirou os óculos escuros e os pendurou na gola da camiseta, onde também pendia um distintivo. Distrito Policial de Gotham.

               — E quem é você?

               — Eu sou Louis. Duquense. — Ele estendeu a mão.

               — Isso não esclareceu nada. — murmurou após alternar o olhar entre a mão e o rosto do homem.

               — Ele é o novo integrante da equipe. — O Capitão surgiu do nada, e apertou a mão de Louis Duquense, que ainda pairava no ar.

               — Já temos um substituto? O corpo do Mitch ainda nem esfriou.

               Aquele comentário infeliz interrompeu o aperto de mãos entre os dois. O Capitão pareceu uma estátua, mas seu bigode se mexeu, entregando o nervosismo. Louis Duquense se manteve sério por uns seis segundos, e quando se retirou, sob o pretexto de que o velório iria começar, Maddie pensou ter visto a sombra de um sorriso cortando seu rosto.

               — Maddie, — o Capitão começou, ela sentiu a raiva paternal no seu tom de voz. — eu sei que isso está sendo difícil pra você. Mas tenha paciência. Vamos pegá-lo.

               Ela ficou em silêncio.

               — E o Duquense não é um substituto, ele é um reforço.

               Um reforço. Para pegar o Capuz Vermelho. Ela assentiu com a cabeça, não querendo prolongar qualquer conversa, não estava se sentindo muito sociável. E, claro, havia a preocupação de que ela não sabia com certeza qual dos seus colegas estavam sentindo raiva do Capuz Vermelho por ter matado um policial bom, ou por ter matado um policial corrupto. Mas com certeza sabia que uma boa parte das pessoas ali estava de olho nela, conseguia sentir durante sua caminhada no gramado úmido até a fileira de cadeiras brancas mais próximas do caixão.

               Caixões de policiais eram sempre cobertos pela bandeira americana. Um representante religioso dizia algumas palavras bonitas, homens uniformizados com postura impecável mantinham o semblante sério durante longos minutos, e em algum momento, se dividiam em duas filas, de frente uns pros outros, erguiam suas espingardas e atiravam. Depois disso, os policiais se aproximavam do caixão, já disposto em um profundo buraco na terra, e, um a um, jogavam flores brancas.

               Maddie tinha acidentalmente quebrado o caule da rosa em sua mão, e furou o dedo em um dos espinhos tentando consertar. Chegou a sua vez e ela levou um ou dois segundos para lembrar de como se anda. Pé direito, pé esquerdo, pé direito, pé esquerdo. Ela parou milímetros antes do limite da cova, um pouco da terra cedeu e caiu sobre a bandeira americana e as rosas atiradas anteriormente.

               Não saberia dizer quando ou porque seus olhos se encheram de água, estavam fixos no caixão e de repente, tudo ficou embaçado. Ela piscou e uma única gota quente deslizou até a sua mandíbula. Soltou a flor, que caiu em câmera lenta. Agora com a mão direita livre, passou-a pela lateral do rosto, recompondo-se tão rapidamente quanto tinha recaído. Feito isso, caminhou não de volta para sua cadeira, mas em linha reta, em direção aos portões de ferro que limitavam o cemitério. Mas se deteve depois de percorrer alguns metros e olhou para trás.

               Louis Duquense foi o próximo. Ela o observou. Parecia tão calmo que qualquer um podia acreditar que enterros faziam parte da sua agenda semanal. Talvez fizessem. Ele era um mistério irritante, um problema do qual Maddie não precisava. Não que ela precisasse dos outros (se ver no meio de um esquema de corrupção policial e ser salva por um vigilante procurado [e depois salvá-lo] curiosamente não estavam na sua lista de ambições), mas agora ela precisava descobrir de qual lado ele estava, ou se ele sabia que tinham lados ali. Por enquanto, era Madeleine Oceans contra o mundo.

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