Capítulo Um: Emboscada

Floresta Amazônica. No imenso contêiner de pesquisas de sua empresa, Eduard estava reunido com os seus funcionários na sala onde a equipe guardara e mantivera o raro cristal. Muito próximo e com um olhar atento ao objeto, ele se mostrava muito surpreso enquanto a equipe preparava uma máquina radioativa.

– Onde encontraram isso? – perguntou Eduard, direcionando a pergunta ao líder da equipe. Este se aproximou de seu patrão com toda a sua atenção.

– O encontramos soterrado a poucos metros de onde estamos instalados para pesquisas, Sr. Butzek – respondeu. – O senhor quer que nós o levamos até o local da descoberta?

Eduard, ora encurvado para observação do objeto, endireitou seu tronco, e virou para o seu subordinado.

– Não se faz necessário – sorriu. – O importante é que vocês fizeram um ótimo trabalho, embora os detalhes ainda sejam desconhecidos.

– Obrigado, Sr. Butzek.

Outro cientista estava mexendo na caixa que Eduard trouxera. Ele chamou o empresário, que veio em sua direção. O empregado, usando luvas de couro, tirou daquela caixa um cilindro transparente de porte médio cujo conteúdo interno era um líquido prateado, e parecia estar energizado por apresentar um brilho, pronto para uso; havia mais unidades daqueles cilindros.

– Nunca vi isso antes, Sr. Butzek. Ainda não matou aquela curiosidade que relevei ao senhor minutos atrás – comentou o líder. – O que seria isso?

– Pirita derretida – respondeu, sendo direto. – Ela será o combustível para que usemos naquela máquina de leitura eletromagnética, pois está com suas partículas, digamos, estimuladas para uso.

O homem que segurava aquele cilindro ficou muito surpreso com as explicações, quanto mais o seu líder de equipe, matando sua curiosidade com essa bomba de informação. De repente, Eduard levou uma das mãos ao queixo, baixando a cabeça, e ficando indiferente diante de seus funcionários.

– Está tudo bem, Sr. Butzek? – perguntou o cientista líder.

Ele ergueu sua cabeça lentamente. Sua fisionomia deixava claro uma precoce preocupação com algo.

– Terminem de preparar as coisas. Preciso tomar um ar.

Seu empregado não entendeu a mudança repentina de comportamento, e trocou olhares com o seu colega de trabalho, que arqueou uma das sobrancelhas, também achando a situação estranha; Eduard saía da sala com um semblante ainda preocupante, e dando passos ligeiros. Ele ainda se desviou de um intruso esquilo, não recebendo devida atenção dele, que correu de sala adentro antes que a porta se fechasse. O animalzinho observava sentado aquele cristal sobre a mesinha, uma observação que durou poucos segundos quando foi gentilmente pego por um dos profissionais e levado para fora da sala e, eventualmente, seria devolvido à natureza. E assim aconteceu. O esquilo olhou para um lado e partiu na direção em que olhara.

O blackout sofrido pelo impacto se expirava no ser de Nathaly. Ela começou a se mexer, encravando as unhas das mãos no solo, que era formado por terra. Após ter uma pequena luta para abrir os olhos, ela notara que estava de bruços sobre uma grama pouco alta, e começou a se levantar também com certa dificuldade. O seu rosto estava esfumaçado, assim como seu vestido parcialmente encardido com terra, e algumas folhagens de grama estavam presas em seus cabelos negros. Marcas de arranho e sangue coagulado na própria face e pelos braços insistiam em manchar a sua beleza – mas era certo de que seus dons cuidariam dos hematomas espalhados pelo corpo.

Olhando para os lados, notou que ela fora arremessada a um terreno baldio cheio de vegetações. Virando-se para trás, uma recordação antecedente ao apagão do desmaio sobreveio à sua mente, vendo aquele estabelecimento secreto da Butzek Corporation destruído pela explosão a alguns metros à frente, que fazia divisa com o terreno. Imediatamente, a jovem lembrou-se da sua amiga.

– Juliana – pronunciou, arregalando os olhos de preocupação.

Ela não pensou duas vezes, e começou a correr em direção aos escombros sob uma feição desesperadora. Ela escalou desesperadamente aqueles escombros, e iniciou as buscas pela a amiga, pegando pedras pesadas utilizando os seus dons de força animal.

– Não era para ter acabado assim. Não... – lamentou-se – Juliana.

Suas mãos eram corroídas pela a presença radioativa, provocada pela explosão, dos restos dos minerais, mesclado a uma porcentagem de carbono, também perigoso ao seu organismo. Ela ainda insistia em prol de sua amiga, até que uma maior debilidade a forçou tomar distância do local do acidente sob lágrimas presas aos olhos, quase os transbordando de água, e uma respiração ofegante por causa do cansaço e entalo de um choro. O que restava era levar as mãos à cabeça, passando-as em seu rosto. Um sentimento de culpa achava lugar nela.

Em meio àquele desespero interno, Nathaly ouviu uma serena voz:

– Nathaly. Preciso que venhas aonde habito.

Era a Mãe Natureza, voltando a falar com a sua considerada filha, após muito tempo ausente por negligência. Nathaly começou a ficar inquieta ao reconhecer aquela voz tão suave, mas um pesadelo para ela.

– Como ousa entrar em meus pensamentos? – questionou, mudando o semblante. Mas logo entristeceu novamente – Não vê que estou angustiada?

– Por exatamente estar angustiada, eu consegui falar contigo, minha filha; pois a sua mente e coração foram abertos para mim, mesmo que não percebestes.

– O sofrimento a alimenta, então? Não é à toa que tenho tido dores de cabeça, e certas coisas têm acontecido comigo.

– Na verdade, e infelizmente, é na dor que os humanos dão atenção. Mas tu és maior do que o próprio sofrimento, pois tal coisa não me pertence – explicou. – Quanto às dores na cabeça, elas são circunstâncias do que eu preciso que tu faças.

Uma leve corrente de ar passou diante de seus olhos, que tiveram suas lágrimas secadas, e o vento fez sua cabeça virar lentamente para o lado. Quando olhou naquela direção persuadida pelo vento, viu uma árvore cujo suas folhagens balançavam harmonicamente por causa da penetração daquele sopro. Então, Nathaly percebeu que a pessoa da Mãe Natureza estava simbolicamente sobre aquele vegetal. Seus olhos verdes cresceram, e sua boca estava entreaberta, ficando extasiada com o que via.

– Agora, pois, preciso que tire um cristal do domínio dos humanos. O cristal em seu formato diamante azulado contém um futuro, e não pode estar em mãos erradas, porque não têm a devida sabedoria para tê-lo e nem cogitando de minhas coisas, senão por uma pessoa especial – disse a Mãe, aproveitando o silêncio na conversa. – Prometo que não importuná-la-ei mais, pois tudo será diferente com a posse do... Cristal do Conhecimento. Apenas quero que vás sozinha, Nathaly.

– Qual futuro? O que será de diferente? – questionou Nathaly, estando ainda admirada. Mas, ao mesmo tempo, havia muitas lacunas em mente.

Ainda vidrada com os seus olhos naquela "árvore falante", uma nova corrente de ar saiu dali, vindo ao seu encontro e entrando agora em seus olhos, fazendo-os fechar involuntariamente. Foi nesse curto período de tempo que a ação trouxe uma recordação nunca vivida por ela antes, formando em sua mente imagens físicas do cristal e onde ele poderia ser encontrado naquele exato momento, em um ângulo de visão de baixo para cima. Mãe Natureza compartilhara sua visão com a dela, fazendo uma ponte com as lembranças daquele esquilo. Era incrível.

Piscando seus olhos várias vezes, Nathaly voltou às suas condições reais. Quando virou para o lado, teve uma surpresa ao ser agarrada pelos antebraços:

– Allan? É você? – Os olhos se arregalaram naquele rosto ainda manchado, encardido pela fumaça.

– Ei, estou aqui. – Allan demonstrava-se muito preocupado, olhando-a de baixo para cima. – Me perdoe pelo o que fiz.

– Como soube que eu vim para cá?

– Eu as segui até aqui, Nathaly – respondeu. – O que houve?

Sem ação, Nathaly olhou para a árvore, que não mais possuía aquela harmonia grandiosa; depois, levou seus olhares em direção aos escombros, lembrando-se novamente de Juliana. Ela estava muito aflita com tudo em sua volta. Era nítido em seu olhar. Ela olhou para Allan, esquecendo-se de tudo que acontecera entre eles.

– Preciso que venha comigo.

Ele a olhou sob uma neutra expressão como reação ao que ela acabara de dizer a ele. Mas um leve sorriso labial de lado e o balançar positivo da cabeça mostraram algum interesse em acompanhá-la.

Em um mercadinho a algumas ruas do acidente, um homem completamente desnorteado e todo sujo entrara no estabelecimento, assustando o dono e os clientes do local. Suas vestimentas eram pretas, um terno. Ele era um dos seguranças que sobreviveram à explosão, e foi até o balcão.

– Meu senhor. Você está assustando a minha clientela e...

– Preciso fazer uma ligação... – disse ele, ofegante – Rápido!

Temeroso, o dono do mercado colocou o telefone do balcão ao alcance do segurança. Trêmulo, ele o pegou do gancho e discou um número, que começou a chamar, sendo atendido.

– Chame a Sra. Butzek. Algo terrível aconteceu! – disse ele, com os olhos quase saltando do globo ocular por tamanha aflição.

Com aquelas palavras, até o dono cresceu seus olhares para cima do homem, estando impactado.

Sob um olhar sério e de braços cruzados, Jennifer observava uma paisagem totalmente deserta por uma das janelas do esconderijo de sua quadrilha, sendo um terreno completamente sem graça, assim como o seu olhar. Às suas costas, ocorria toda uma movimentação, que parecia ser de mudança. Havia caixas de vários tamanhos. Michael, de costas para ela enquanto acompanhava e coordenava os seus subordinados do crime, virou-se em direção à sua xodó do time, observando-a.

– Já está sentindo saudades de Manchester, minha jovem americana?

– É NORTE-Americana – corrigiu-o, sendo enfática. Ela não tirava os olhos da janela.

– Ok, senhorita norte-americana mimada – disse Michael, sendo debochado. – Vamos. Ajude-nos com as coisas. Precisamos voltar à cidade de onde viemos. Londres. Parece que nada mais presta em Manchester, depois que obtivemos muitas coisas que queríamos, apesar de alguns fracassos... – Ele abaixou a cabeça, estando um pouco desapontado. Olhando para Jennifer, viu nenhuma reação da parte dela. – Você está surda hoje, menina? Já disse, ou melhor, já a ordenei para vir nos ajudar. Vamos!

– Eu não vou!

A tamanha ignorância na resposta fez Michael dar alguns passos de encontro a ela, estando bem próximo dela. Ambos se deram conta daquela proximidade física.

– Pressinto que essa resposta não se refere apenas a sua negação em nos ajudar.

– Achei que você fosse humano, Sr. Dolman – disse Jennifer, olhando rapidamente nos olhos de seu chefe, abaixando o seu olhar logo depois. – Ler mentes é uma dádiva para poucos.

– Eu prometi ajudá-la a encontrar o culpado por seu trauma. Não pode desistir agora. Há um acordo entre nós.

Jennifer respirou fundo, e finalmente o encarou. Nem parecia aquela comparsa, a arma secreta do mais bem-sucedido criminoso.

– Considere-o rasgado.

– Aquela jovenzinha dos olhos verdes está lhe convencendo a mudar de lado, Srta. White?

– Um convencimento de fazer o que é certo – rebateu, aproximando sua face da dele.

– Desconsidere a minha ordem para ajudar. – Michael a surpreendeu pegando-a por uma das orelhas, levando-a quase que arrastada. – Vamos esfriar mais a cabeça enquanto arrumamos tudo para partirmos.

Jennifer gemia de dor por causa da força excessiva sobre a sua orelha, deixando algumas lágrimas aparecerem e escorrerem pelo rosto, iniciando um choro calado. O cruel homem a levou até um quartinho, que cheirava mau, jogando-a ao chão sem ter um pingo de piedade. Ele ainda se agachou perto dela.

– Seus pais já estão mortos. Agora, eu sou seu pai e mãe ao mesmo tempo. – Abrindo um sorriso, ele soltou uma leve risada, fechando sua cara na sequência. – Respeite-me.

Afastando-se, ele foi até a porta, e parou. A jovem o olhava com um medo jamais apresentado por ela até aqui, estando com o rosto molhado das lágrimas já derramadas. Michael deu às costas, fechando a porta com força; Jennifer tornou-se uma criança desolada, largada no chão, e emocionalmente fraquejada.

Michael voltava aos cuidados da mudança quando um de seus capangas o abordou, continuando a andar:

– O que ela fez para que agisse daquela forma, chefe?

– Ela pensa em nos deixar, me afrontando – respondeu-o, estando sério.

– Espero que ela não nos deixe e muito menos o senhor venha puni-la severamente a essa altura. Precisamos muito dos conhecimentos dela para que terminemos em definitivo a nossa...

– Pouco estou me lixando com isso! – retrucou, parando junto com o seu comparsa. – Somos muito maiores do que simplesmente uma jovem traumática com o seu próprio passado.

Ele estava muito estressado. Notando isso, o homem não insistiu mais em suas palavras, e apenas continuou o acompanhar.

Como houvera dito, Eduard estava tomando aquele ar puro que uma floresta poderia dar a um ser humano, chegando até a apreciá-la. O cientista responsável pela equipe apareceu atrás dele, e o chamou para a sala. Chegando lá, lhe mostraram que a máquina radioativa estava pronta para usar contra o cristal ao centro da sala.

– Está tudo conforme orientado, Sr. Butzek.

– Ótimo – disse Eduard.

Outro profissional apareceu na sala, chamando por Eduard. Ele foi avisado que sua esposa estava no telefone querendo falar com ele urgentemente. Prontamente, ele dirigiu-se à sala onde estaria o telefone, o pegando rapidamente.

– Querida? Aconteceu alguma coisa?

– Sim, Eduard... A nossa filha... Ela...

– Diga logo, Luiza.

O tremor invadira a sua mão cujo estava o telefone, parecendo tirar uma conclusão certeira do que estava sentindo dentro de si. Ele teria que ser forte para ouvir uma notícia nada agradável e, ao mesmo tempo, incerta para a família.

Confinada no quartinho, Jennifer estava escorada à parede, estando com os braços sobre os joelhos e com a cabeça apoiada neles, estando encurvada. Ela estava completamente sem ação, até que algo despertou dentro dela. Erguendo a cabeça, um olhar sério surgiu, como sua grande característica. Ela se colocou de pé, estufando o peito, e olhou para uma pequena janela retangular cujo havia grades de ferro maciço; o seu olhar se fechou ainda mais.

Alguns minutos depois, Michael usou de sua pouca misericórdia para se preocupar com a saúde física de Jennifer. Ele pedira ao mesmo capanga que levasse um sanduíche feito em pão de forma mais um copo de água para complemento. Ele aproximou-se dele, mostrando os alimentos sobre uma bandeja.

– Espero que isso mostre que não sou tão ruim como vocês dois pensam que sou – disse Michael. – Agora vá.

O homem chegou ao quartinho e, usando um jeitinho com uma das mãos, pegou a chave do bolso e abriu a porta, dando uma empurrada de lado. Ora de cabeça baixa, prestando a atenção no que estava sobre a bandeja, ele a ergueu, e não viu mais a jovem por ali. Michael foi imediatamente avisado por ele, e eles retornaram ao pequeno quarto.

– Devemos ir atrás dela, chefe?

– Não. Deixa-a ir.

– Mas o que seremos sem ela conosco?

Michael o olhou com cara de desaprovação à pergunta.

– Eu já lhe disse que somos maiores e melhores do que ela – repreendeu. – Ela ainda terá um dia muito amargo por nos trair. Temos mais coisas importantes para se fazer.

Seus olhos fitaram o alto do quartinho em direção àquela janela, que teve suas grades retorcidas e com suas extremidades destruídas. Aquele cenário era as últimas lembranças de Jennifer para Michael.

Nathaly chegara à Floresta Amazônica junto ao seu ainda namorado. Eles caminhavam pelas trilhas naturais da floresta.

– Pressinto que vamos nos perder no meio desse imenso lugar que sua mãe criou e cultiva.

– Ela não é a minha mãe, Allan. A minha verdadeira mãe está me esperando, talvez estando preocupada agora – disse ela. – E nós não nos perderemos. Sei onde estou indo.

Eles chegaram ao contêiner da Butzek Corporation. Nathaly imediatamente congelou em seu andar.

– Não pode ser. Ele está ali – disse consigo mesma.

Ela se surpreendeu. O cristal estava nas mãos da empresa do pai de Juliana.

– O que foi? – perguntou Allan, olhando-a de lado.

– Nada – respondeu, desconversando. – Vamos.

O casal continuou andando em direção ao estabelecimento. A forma como Allan a seguia demonstrava algum interesse, pois em nenhum momento ele tentou impedi-la de fazer o que fora orientado.

Steven andava pela casa, inquieto, olhando para o seu relógio de pulso e, não achando o suficiente, dava uma olhada em um de parede, que estava entre a sala e a cozinha. Sua esposa o seguia sob um olhar de agonia ao vê-lo daquela forma.

– Ela já está vindo, querido – disse Clara, sendo otimista. – Acalme-se.

– Já está ficando escuro, Clara. Pelo o horário, já era para ter voltado. – disse ele, apontando para o seu relógio no pulso. – Será que aquele garoto fez algum mal para ela?

Clara aproximou-se do marido, colocando em prática o papel de uma mulher edificadora:

– Nada de mal aconteceu com ela, amor. – Ela o abraçou de lado, dando um beijo em sua boca. – Você está apenas ansioso. Acalme-se. Tenha fé em nossa menina.

Steven assentiu, e arrochou mais aquele abraço dado por ela, puxando-a para mais perto.

– Sim. Ela é a nossa menina.

Alguém batera na porta, despertando-os daquele clima romântico que se instalara entre eles. Clara logo fez um gesto alegando ser a filha, sorrindo. Ao invés de Steven ir atender, foi ela quem foi à porta, impedindo o próprio esposo de ir. Ela não esperava que fosse uma pessoa já conhecida pela família.

– Boa tarde, se ainda posso dizer isso.

Clara deu alguns passos para trás sem reagir, e Steven logo apareceu atrás já munido com um cabo de vassoura.

– Ela veio levar a nossa filha de volta àquele mundo podre do crime. – Ele ergueu aquele pedaço de madeira redesenhado. – Eu não a deixarei.

– Pelo ao contrário. Vim para agradecê-la – disse Jennifer, sendo a pessoa que batera à porta, dando um gole seco.

Clara colocou uma das mãos sobre o colo, e Steven abaixou vagarosamente aquele cabo; e Jennifer os olhava com arrependimento.

A mobilização era grande envolta do acidente ocasionado pela explosão no estabelecimento, contando com a presença de carros da polícia e bombeiros. Luiza chegava ao local no carro do marido, e deixou o veículo assim que parou. Passando pelo meio do tumulto formado por profissionais de segurança e socorro, e curiosos. Ela foi abordada por um policial:

– Sra. Butzek?

– Sim, sou eu? – respondeu-o, olhando estranhamente para aquele endereço.

– Precisamos confirmar alguns dados do agora inexistente estabelecimento. Estou com alguns papéis aqui.

Ela ficou sem reação por um tempo, pois ela não sabia sobre tal lugar alugado pela empresa alemã. O que poderia girar em sua mente era: Como assim? Pegando aqueles papéis, começou a analisar as informações.

Os bombeiros trabalhavam duro sobre os escombros com auxílio de máquinas e ferramentas possíveis daquela época.

– Ainda é possível achar sobreviventes nesse lugar? – comentou um dos bombeiros, em forma de pergunta.

– Acho impossível, amigo. Não é qualquer acidente – disse o outro ao lado.

– Na verdade, é possível, sim! – gritou o outro de longe, chamando a atenção.

Os homens se reuniram em um único trecho do acidente. Em círculo, eles presenciavam uma cena: um resgatador da corporação agachado, acomodando em seus braços Juliana inconsciente, mas ainda com sinais vitais em funcionamento. Ela estava evidentemente suja por pó de concreto; era um verdadeiro milagre.

– Sra. Butzek. Temos notícia – anunciou o bombeiro-chefe, correndo e parando a alguns metros da mãe.

Luiza virou-se para ele, ainda em choque com a situação. Ambos se olharam seriamente.

Pelos fundos daquele contêiner, um pequeno feixe de luz surgira no miolo de uma porta de metal. A tal porta se desprendeu, abrindo-se, e Allan e Nathaly conseguiram entrar no lugar graças à visão de calor usada por ela naquele miolo. Às suas frentes, havia um imenso e estreito corredor, que partilhavam de caminhos alternativos ao longo de sua extensão.

– É tudo ou nada. Vamos – disse Nathaly, receosa em sua fala e observando os lados.

Eles caminharam e puderam explorar uma boa parte do lugar, pois, coincidentemente, não havia nenhum dos funcionários por ali. Tal sorte os fez chegar à sala onde estava o cristal. Ambos pararam após entrar, estando na porta. Os olhos de Allan mostravam sua surpresa ao ver aquele lindo e azulado diamante raro e desconhecido por todos os autores da descoberta; Nathaly estava com sua boca entreaberta ao admirar o que a Mãe Natureza lhe pedira. Ela decidiu ir à frente em direção ao cristal.

– Por que ela quer esse maravilhoso... diamante? – perguntou Allan, estando bastante interessado.

Nathaly parou no meio do caminho, provavelmente pensando: dizer ou não o porquê daquela "missão"? Ela virou-se.

– Segundo ela, contém um futuro, que não pode estar em mãos erradas. Ela disse que aquele cristal é o Cristal do Conhecimento – contou. – Ainda tenho minhas dúvidas quanto às coisas que ela me fala...

Allan arqueou as sobrancelhas enquanto abria sua boca, estando compreensível para ele. Ele parecia satisfeito com as informações. Depois, olhou de lado, retorcendo a cara. Nathaly o olhou receosa por ter falado aquilo, e seguiu em direção ao diamante. Mas uma forte fisgada a acometera, encurvando-se e levando uma das mãos ao braço oposto. Olhando ao lado, avistou aquela caixa com cilindros de Pirita modificada radioativa aberta. Imediatamente, se afastou para o lado.

– O que foi, Nathaly?

– Nada... – Ela resistia em dizer a verdade – Na verdade, eu tenho alergia... a certos minerais modificados.

Allan caminhou até a caixa onde sua namorada apontara, e olhou estranho tanto para o conteúdo do cilindro quanto para ela.

Nathaly finalmente tocou no interessado cristal. Ela o erguia da mesinha com extrema cautela enquanto observava uma perfeição contida no objeto natural. Quando ela deu alguns passos para trás e pensou em se virar, Allan a surpreendeu tomando o diamante dela e a empurrou, fazendo-a cair ao chão. Ele não deu tempo de reação ao derrubar alguns daqueles cilindros no chão, que quebraram e começaram a espalhar o líquido de cor metálica em direção à Nathaly; a radiação triplicou sendo exposta ao ar, e ela via seu namorado fazendo fuga da sala enquanto era insuportavelmente atacada pelas radiações. Não pôde acontecer outra coisa a não ser cair ao chão por tamanha dor. E agora?

Na sala onde recebera a ligação de sua esposa, Eduard aguardava por um retorno. Todos os cientistas estavam acompanhando aquele dramático caso familiar, e por isso os demais setores estavam vazios. Então, o telefone tornou a tocar, e Eduard o atendeu de pressa.

– Alguma notícia, querida?

– Sim. Encontraram a nossa filha.

– Ela está... – Eduard dizia em tom triste.

– Ela está viva, querido; porém, inconsciente – disse Luiza, interrompendo-o.

Eduard olhou para todos os presentes na sala, ficando mudo. Ao menos, a aflição por algo pior já fora descartada.

Estirada de barriga para cima e respirando fundo, Nathaly apenas torcia para não morrer ali, mesmo que o próprio Eduard ou alguém a visse. O que estava em jogo era sua vida, e nada interessava mais do que isso. Seus olhos queriam se fechar, mas ela resistia.

Pelas tubulações que traziam ar para dentro do imenso contêiner pelo teto, algo andava por ela, sendo longo em seu corpo. O peso era tão grande que Nathaly pôde ouvir alguns barulhos vindos do teto, e começou a observar as bocas das tubulações. Mas seus olhos se fecharam involuntariamente, e sua cabeça virou para o lado. Ali ficou estirada, inconsciente. De repente, as grades de uma daquelas entradas das tubulações se desprenderam de suas extremidades, caindo próximo à Nathaly. Uma extensa cauda descia como uma corda, uma cauda um pouco oleosa e rígida por músculos firmes, além de ser possível ver algumas pintas espalhadas por ela. Nathaly, então, começou a ser envolvida, sendo cuidadosamente enrolada e suspensa do chão, até ser levada dali.

No lado de fora do contêiner, ela foi deixada no chão, e aquela cauda se desenrolou de seu corpo. Nathaly acordou no mesmo instante. Recuperando-se da corrosão com a regeneração rápida da pele, ela se colocou completamente de pé, e a primeira coisa que ela fez foi olhar para cima. Então, ela viu quem a salvou da morte gradual: uma gigante sucuri típica do Amazonas, que estava enrolada ao galho de uma resistente árvore a olhando firmemente enquanto sua língua repartida saía pela boca – uma cobra daquele tamanho olhando para uma pessoa poderia, claro, trazer alto grau de terror a ela. – A serpente desceu daquela árvore. Nathaly temeu, dando passos para trás, mas se surpreendeu quando o animal parou com o seu extenso corpo atravessado diante dela, como se fosse uma linha demarcando um limite. Ela demorou a entender o recado, mas percebeu que a cobra apresentava de alguns hematomas pelo corpo. Eram hematomas provavelmente ocasionados pela exposição da alta radiação produzida pela Pirita modificada dentro da sala. Agachando-se lentamente, sua intuição a fez repousar suas duas mãos sobre um dos lugares feridos. Então, um brilho saiu debaixo delas, trazendo a cicatrização perfeita da carne do animal, estando novinha. Foi impactante. A sucuri saiu rastejando de mato adentro em uma rapidez normalmente usada para um ataque, que não era o caso; Nathaly remexia os olhos e observava suas mãos, estando impressionada.

Já distante do local onde deixara Nathaly, Allan apreciava aquele troféu, olhando o cristal azulado por todos os ângulos possíveis em mãos. A perca da noção do tempo o fez perder a posse daquele objeto em um piscar de olhos. Quando olhou à sua frente, viu Nathaly agachada com o cristal abraçado ao seu corpo. Ela usara a infalível agilidade felina em caça para pegá-lo de volta.

– O que você está fazendo? – perguntou Nathaly.

– O que me convinha sobre você. Finalmente eu descobri sobre você, digamos, quase por completo.

– Sobre o que você está falando, Allan?

– Allan está morto a partir de agora. Aliás, ele nunca existiu.

Nathaly fez uma cara de desentendida enquanto se levantava. E viu o que nunca imaginara: Allan deu lugar à Aidan, transformando-se. Sim! Aidan, o antigo aluno da escola se passou por um alguém que nunca existira.

– Sou eu, doce Nathaly.

Ela arregalou os olhos.

– Sabe... Eu retornei em pele de cordeiro para justamente saber mais sobre você. Mas todo esse tempo juntos me fez me apaixonar ainda mais por você. Sua beleza passou a me fascinar cada vez mais. Isso explica por que muitas vezes eu tentei lhe proteger de certas circunstâncias. Inclusive, jogar John para escanteio.

– Então, foi realmente você quem tentou matá-lo... Você não deveria ter o envolvido nessa história.

– Juro que tentei ser amigo dele! Mas o amor é capaz de tudo, Nathaly. Ainda mais quando há algo a ser feito, que era conhecê-la mais. Tudo poderia me atrapalhar. – Ele se posicionou de lado e estendeu a mão direta aberta em direção a ela. – Agora, como o seu amado, dai-me este cristal, e seremos verdadeiramente felizes pelo o que ele pode nos oferecer. Aposto que seja um presente de sua mãezinha da Terra para nós.

– Não. Não irei lhe dar.

– Você já ouviu falar que, uma vez o homem e a mulher unidos por uma aliança, a mulher passa a se sujeitar ao seu homem?

Imediatamente, Nathaly se tocou no enigma jogado por Aidan, e tentou tirar a aliança do dedo.

– Eu realmente não queria que acabasse dessa forma, meu amor – disse ele.

Já era tarde. Ele foi mais rápido quando ela começou a ser forçada a andar até ele com o braço onde estava o anel estendido com o cristal na mão, sem nenhum controle consciente. Parecia que ela se tornara um imã, sendo atraído por outro, que era o jovem. Como ele estava fazendo aquilo, atraindo-a forçadamente para si? O fato era que Aidan obteve êxito em recuperar aquele diamante tão disputado.

Após pegá-lo das mãos de Nathaly, Aidan maravilhava-se observando o cristal à frente de sua vista e palpável novamente. Ele olhou para a Nathaly, e a empurrou bruscamente, fazendo-a voar do chão e cair a alguns metros dele devido a sua força. Atrás dele, mais uma surpresa: Diana apareceu com aquele seu uniforme grego.

– O amor é lindo! – exclamou Diana, em alta voz, enquanto ria. – Veja como ela obedeceu à ordem de entregar algo tão precioso ao seu parceiro.

Ainda no chão, Nathaly a olhava. Seu olhar mostrava a certeza de que ela fora vítima de muitas coisas diante de Aidan disfarçado de Allan por causa do bendito anel enfeitiçado, que os fazia se unirem, e até mesmo fazê-la ficar cega para muitas coisas, inclusive aos conselhos de seu amigo John.

– Ok. Não se exalte, Diana – disse Aidan. – Agora, faça-a se apaixonar por mim definitivamente. Pois ambos de nós sabemos quem ela é, e viveremos felizes com a herança em minhas mãos.

– Claro... querido – sorriu, maliciosamente.

Diana deu alguns passos à frente. Chamas surgiram em suas mãos, formando seus aparatos fatais: arco e flecha de fogo. Então, ela se armou mirando em Nathaly.

– O que você pensa em fazer? – questionou Aidan, retorcendo as sobrancelhas – Não era esse o acordo.

– Seu destino já está traçado. – Ela apenas disse aquelas palavras, puxando a flecha inflamável contra o barbante de fogo.

Nathaly apenas encarou aquela flecha sendo direcionada a ela a alguns metros. Então, Diana atirou aquela flecha que ardia em chamas em uma velocidade considerável à força mecânica exercida para o disparo. Mas alguém entrara na frente de Nathaly; e, no meio de seu percurso, as chamas que formavam a flecha estranhamente começou a mudar de aparência, criando densas partículas que intimidavam a luminescência do fogo, até se transformar em partículas de água. A água penetrou nas vestimentas da pessoa que atravessara na frente de Nathaly para protegê-la. Era um vestido. Ao olhar mais acima, via-se Jennifer olhando para Diana de forma séria.

– Como você fez isso? – perguntou Diana, franzindo o cenho.

– Já ouviu falar que fogo consome o oxigênio? Então. Eu apenas inverti os valores físicos, transformando suas partículas em água.

– Mas só desta vez – disse Diana, se garantindo.

Quando Diana se preparava para atirar mais uma flecha, Jennifer apareceu em sua frente em fração de segundos, e a jogou contra uma das árvores testemunhas daquela batalha. Mas ela foi surpreendida por Aidan que, com uma mão, conseguiu suspendê-la pelo pescoço. Agachada, Nathaly mirou seus olhos na mão de Aidan, e usou sua visão de calor. Entretanto, ele jogara Jennifer antes, e, virando-se, os raios de calor atingiram o cristal, que o irradiou sob um clarão repentino. A energia recebida o fez criar "vida", levitando-se; todos o admiravam subir, sem nenhuma ação, até que o diamante partiu sob um intenso brilho azulado, passando entre as folhagens das árvores e cruzando um céu entardecido para algum lugar da Terra. A dupla Aidan e Diana fugiram pelo meio das matas, pois tudo estava perdido naquele momento.

Nathaly se colocava de pé quando Jennifer se aproximou dela.

– Como soube que eu estava aqui? – perguntou Nathaly, impressionada.

Jennifer apontou para si mesma em direção a um dos ouvidos.

– Eu lhe localizei através da sua voz – respondeu. – Mas antes, eu fui à sua casa. Não lhe encontrando, perguntei aos seus pais onde você poderia estar. Como eles temiam que estaria aqui por causa do seu sumiço, eu vim para cá.

Uma cara de espanto tomara o rosto de Nathaly. Porém, ambas começaram a sorrir timidamente uma para outra. De repente, ela foi surpreendida por um abraço apertado da jovem.

– Obrigada. Obrigada por você não ter desistido de mim, Nathaly.

Ora sem jeito, Nathaly cedeu àquele abraço tão gratificador, correspondendo. Enquanto estavam abraçadas, uma expressão facial era estampada nelas sobre o ombro uma da outra: Jennifer fechara os olhos, deixando descer uma lágrima; Nathaly permanecia estática, pesando tudo ao mesmo tempo, desde o que acontecera até aquele momento do abraço e reencontro delas.

– Vamos para casa agora – disse Jennifer, sorrindo com os lábios um pouco carnudos.

Nathaly assentiu com a cabeça, ainda incrédula com muitas coisas vividas até aquele momento, e elas saíram andando uma do lado da outra rumo ao Rio Amazonas, sendo um tipo de bússola, referência para retornar de onde vieram.

Na salinha do contêiner, praticamente uma reunião acontecia para discutir sobre o acidente que envolvera Juliana. Eduard ficou impaciente, e despertou uma pressa:

– Chega, pessoal. Chega. – Gesticulou com as mãos. – Vamos resolver logo o que me fez vir para cá. Preciso voltar urgentemente para Manchester. – Todos ficaram estáticos, o olhando. – Não se preocupem comigo... Vamos terminar logo isso – disse-lhes, estando visivelmente apagado, sem muito entusiasmo.

Todos deixaram a sala. Eduard ia logo atrás da equipe. Caminhando até a sala que estava o cristal, os cientistas pararam de repente, congestionando a porta com os demais que ainda entrariam.

– Por que pararam? Continuem andando – disse Eduard, passando por eles.

Quando o empresário passou com dificuldades pelos homens e olhou em direção onde todos estavam olhando, obteve aquela surpresa: o cristal sumira. E uma extrema bagunça estava diante deles.

Nathaly finamente chegou em casa junto com Jennifer. Já era totalmente noite sobre a Inglaterra.

– Nathaly! Filha! – Clara correu para abraçar a filha, sorrindo. – Que bom que nada lhe aconteceu.

– Mãe... – pronunciou Nathaly, sentindo-se segura ao estar ao lado de seus pais novamente. Steven também veio abraçá-la na sequência, sendo um abraço em conjunto.

Distante, Jennifer observava aquele momento tão lindo e feliz em família, chegando a inclinar a cabeça. Talvez, ela tivera recordações sobre a sua. Steven soltou-se de sua família, e olhou para ela, tendo ainda um pouco de resistência para dizer qualquer coisa.

– Obrigado por ter trazido a nossa filha de volta – agradeceu-a.

Jennifer concordou com a cabeça, como resposta ao agradecimento.

– Já fiz a minha parte por hoje – disse ela, já se virando à porta e pegando a sua maçaneta. – Boa noite.

– Não vá – pediu Nathaly, soltando-se da mãe e estando ao lado do pai. – Você pode ficar conosco esta noite.

De costas, ela pensava nas palavras de Nathaly, que queria convencê-la de não ir por estar sem teto de agora em diante. Ela largou aquela maçaneta, e virou-se.

– Eu não quero incomodá-los.

– Mas para onde você vai?

– Eu não sei, Nathaly. Mas pode estar certa que eu estarei bem.

– Você sempre será bem-vinda aqui, Jennifer.

– Eu sei disso. – Jennifer sorriu timidamente, sem mostrar os dentes. – Boa noite.

Ela deixou a casa, deixando Nathaly um pouco triste.

Estando reunida com os seus pais, Nathaly aproveitou aquela noite para contar e explicar tudo a eles. Ela não teve coragem em esconder nada deles, procurando ser o mais transparente e franca possível diante deles. Mas o assunto não poderia se estender, tomando o maior tempo da noite, pois ela teria que encarar a última prova do ano e qualificadora para terminar os estudos essenciais de um ser humano. Apesar do eventual descanso, a pergunta era: será que ela teria o emocional o suficiente para realizar a prova e seguir a vida? Juliana ainda estava em sua cabeça.

No dia seguinte na sala de aula, Nathaly realizava a prova, mas sempre olhando para um único lado, que provocava em sua mente os dois extremos: o ruim e o bom. O ruim era o falso namorado, que brincara com os seus sentimentos para explorá-la e, mais tarde, confessar que realmente a amava (mas que amor era aquele?); o bom era justamente sua amiga Juliana. Sua carteira teve uma total atenção de Nathaly, que a observava tristemente e ao mesmo tempo sorria lembrando-se dos tempos passados com ela. Entretanto, uma culpa vinha para deixá-la para baixo. Era preciso muita força. Força essa que jamais poderia encontrar em seus dons tão nobres.

Após todos terminarem suas provas, incluindo as outras turmas do colégio, todos foram liberados. Nathaly andava cabisbaixa pelo corredor principal da escola, rumo à saída.

– Nathaly? – John apareceu logo atrás. Ela parou e o olhou. – Cadê... o seu namorado?

Ela ergueu sua mão cujo havia o anel. Porém, não havia mais.

– Terminamos – respondeu. – E ele mudou de cidade, voltando para Cambridge.

– E a Juliana? Também não a vi hoje.

Nathaly teve que emendar as explicações com outra mentira, alegando que não tinha notícias sobre ela, e que iria procurar saber. John compreendeu, sendo inocente. Mas outra notícia nada boa voltaria à tona:

– E você vai mesmo servir o exército em Londres?

– Sim. E estarei deixando Manchester ainda hoje – disse ele. – Por isso lhe chamei, justamente para... – Ele hesitava baixando a cabeça. – Para me despedir de você.

Nathaly engoliu seco, e apenas o olhava. Ele aproximou-se dela, dando um abraço.

– Obrigado por ter sido a minha amiga, Nathaly.

– Eu... Eu digo o mesmo.

O abraço foi apertado. Eles ainda caminharam até a calçada do portão principal. John avistou o carro de seu pai logo mais a frente. Ele deu mais um abraço nela, o último, e foi em direção ao carro; Nathaly o acompanhava no olhar, estando cada vez mais distante um do outro. Era o adeus.

Três dias após de terminar os seus estudos, Nathaly estava sentada em sua cama, cabisbaixa e com os dedos entrelaçados. Sua mãe entrou. Vendo sua filha ali, resolveu se sentar ao lado dela. Nathaly olhou para ela, e baixou novamente sua cabeça.

– Eu poderia ter evitado muita coisa – lamentou-se.

– Ter dons não quer dizer que você imunizará a todos em sua volta, filha.

– Eu deveria ter contado à Juliana sobre o meu segredo, ter ouvido John me alertando sobre o meu relacionamento com Allan, que era Aidan... Agora, estou regressada ao zero, sem amigos, sem ninguém além de vocês. – De repente, seu semblante mudou. – A Mãe Natureza provocou tudo isso para que eu ficasse sozinha.

– Como assim, filha?

– Ela tinha dito que ela somente pôde voltar a falar comigo por causa da minha sensibilidade emocional quando perdi Juliana. – Olhando perdidamente, ela fechou seus olhos sob um profundo suspiro. – Como eu ainda posso acreditar nela, meu Deus?

Nathaly levantou-se bruscamente da cama. Sua mãe levantou-se na sequência, surpresa com aquela reação.

– O que pensa em fazer? – perguntou Clara.

– Preciso conversar com ela.

Nathaly deixou o quarto enquanto Clara ia atrás da filha. Seus passos eram rápidos, descendo as escadas e chegando à porta em poucos segundos. Quando abriu a porta para sair, ela deu de cara com seu pai ao lado de Eduard. E aquela visita não foi à toa. O empresário alemão tinha uma notícia para a própria Nathaly. Provavelmente, Steven já soubera antes, no caminho a casa.

– Ela não morreu? – perguntou Nathaly, incrédula.

– Não, Srta. Kate. Por um milagre, ela sobreviveu – disse Eduard, reforçando. – Mas ela está totalmente inconsciente, sem estímulos...

– Eu quero vê-la. – Ela olhou para Steven. – Pai, me deixe vê-la agora.

– Calma, filha. – Steven repousou sua mão no ombro dela, e olhou esperançosamente para Eduard. – Sr. Butzek tem outra coisa a dizer, não é mesmo?

– Exatamente.

Eduard tirou do bolso uma folha dobrada, e a entregou à jovem. Nathaly a desdobrou e começou a ler o que estava escrito. Seus olhos verdes brilharam, e uma das mãos foi levada à boca. Era um processo de êxtase.

– Quer dizer que... que...

– Sim, Srta. Kate. Você tem em mãos a oportunidade de se tornar bióloga – disse Eduard. – Muito provavelmente, seria o maior pedido da minha filha para sua amiga. E eu fiz por ela – sorriu.

– Como fez isso?

– Peguei suas notas de Biologia e Ciências na escola, e as apresentei em uma das mais colocadas universidades de Londres – explicou. – E não se preocupem. Reservei um apartamento para que a família se hospede ao longo dos anos de estudos na capital. E o Sr. Kate será transferido para uma das unidades adquiridas pela empresa por lá.

– Lembra que eu disse que um dia você retornaria à Londres, filha? – disse Steven, recordando-a.

Finalmente, Nathaly abriu um sorriso, apesar de ser um sorriso ainda não muito completo ou desejado. Clara, que acompanhou logo atrás, abraçou a filha por trás, e todos sorriam. Mas Nathaly não se esquecera do desejo em ver Juliana.

Eduard a levou para a até então sede da Butzek Corporation em Manchester. Ambos caminhavam pelos corredores já conhecidos por Nathaly sem ele saber. Parando em frente a uma porta, Eduard a abriu, e deu espaço para Nathaly passar primeiro. Em sua vista, o interior da sala se assimilava a um quarto comum de hospital, com aparelhos que mantinham Juliana respirando e alimentada. Andando mais um pouco, ela viu Juliana serenamente deitada sobre uma confortável cama, com suas roupas trocadas.

– Ainda não consigo acreditar que ela está viva, depois do que me contaram – comentou Nathaly.

– Quanto mais eu, Srta. Kate – respondeu Eduard, estando mais atrás. – Ninguém sabe como ela se salvou. Acredito que possa ter sido o anjo da guarda dela.

Ao ouvir "anjo da guarda dela", Nathaly congelou, recordando o que Juliana falara um dia, em um leito de hospital. Ela chegou a cogitar em sua mente que esse anjo seria ela mesma. Era visto tal pensamento em seus olhos assustados. Mas relevou, estando confiante de que ninguém soubesse que ela estivera junto à filha do empresário no dia do trágico acidente.

Voltando aos pensamentos presentes, Nathaly não tinha coragem em chegar perto da amiga por eventuais lembranças que a deixaram naquele estado. Mas acabou criando coragem para estar perto da amiga, que respirava mansamente. O último estágio daquela relutância interna foi o momento do tato. Respirando fundo, ela vencera aquela batalha, e repousou sua mão sobre a de Juliana. Quando fez aquilo, sua mão imediatamente começou a ser acometida pelo surgimento das veias no local, já alcançando o punho, e uma aguda fisgada foi sentida por ela. Era sinal de que um pouco daquela radiação mineral estava sobre Juliana; Nathaly levou sua mão afetada junto ao estômago para garantir que Eduard não notasse.

– Está tudo bem, Srta. Kate? – Eduard acabara por notar um estranho movimento dela.

Nathaly ainda ficou de costas a ele, sem responder. Olhando para sua mão, ela viu que ela voltara ao normal. Então, virou-se.

– Preciso ir, Sr. Butzek.

Ela passou por ele, que retorceu as sobrancelhas.

– Por quê?

Nathaly parou, o olhando.

– Não aguento vê-la neste estado.

– Deixe-me levá-la de volta para casa.

– Não se preocupe. Não quero lhe incomodar. Obrigada.

Antes que ele falasse mais alguma coisa, ela simplesmente deixou o quarto, e ainda se esbarrou em Luiza, que vinha de encontro à sala. Nada disse. Apenas seguiu em passos rápidos. Eduard saiu da sala, ficando ao lado da esposa enquanto olhava Nathaly andando, até virar a um dos lados do final daquele corredor.

– O que deu nela? – perguntou Luiza, sendo curiosa.

– Nada demais, querida. – Ele continuava olhando o final daquele corredor. – Ela apenas não aguentou ver a nossa filha em leito daquela forma.

– Fez bem ela ter ido, pois precisamos conversar, Eduard.

Eduard olhou para a esposa, e direcionou os seus olhares para uma das mãos dela, que segurava papéis logo reconhecidos por ele. Eram os papéis sobre aquele estabelecimento de Liverpool, palco da tragédia com Juliana. Luiza o olhava com decepção e, sobretudo, com os olhos um pouco úmidos por causa do drama vivido pela família.

– Você mentiu para mim, Eduard. Como pôde fazer isso? – disse ela. – Você jurava que não tinha se envolvido naquele minério que explodiu em busca desses minerais.

– Querida, eu apenas tive curiosidade com os estudos e pesquisas que os ingleses têm aderido ao longo dos anos para beneficiar a indústria. Isso pode nos favorecer também.

– A sua curiosidade está custando à vida da nossa filha agora, Eduard. Se você tivesse sido transparente comigo, nada disso teria acontecido! – Ela começou a folhear os documentos. – Olha isso! Tudo sem o meu consentimento. Eu ainda sou sua sócia e, sobretudo, casada com você!

Como a porta do quarto estava aberta, Luiza foi tomada por uma sensibilidade de mãe, e olhou para a filha. Ela percebeu o escorrer de lágrimas pelo rosto dela. Luiza paralisou-se, deixando Eduard apreensivo. Vagarosamente, ela passou pelo marido, entrando no quarto, e foi até Juliana, que ainda deixava escorrer lágrimas pelo o rosto. Eduard seguiu sua mulher, e acabou vendo aquela cena também. O casal ficou extasiado, e nada mais foi dito ali.

Dias se passaram, alcançando as festas de final de ano. Para Nathaly, foi o pior final de ano já vivido por ela – talvez não fosse tão pior por causa de seus amáveis pais, que sempre a mantinham firme. – Mas teria que superar aquilo, pois um novo e promissor ano estava prestes a chegar. E chegou. A humanidade abria alas para o ano de 1939.

Logo na primeira semana daquele novo ano, a família estava preparando as coisas para se mudarem para Londres. Em seu quarto, Nathaly estava colocando suas últimas peças de roupa em sua mala. Quando fizera aquilo, ela foi até a cômoda. Ao abrir a gaveta, viu aquela caixa de chocolate ainda muito bem guardada, do jeito como foi recebida. Vendo seu estado intacto, a fez lembrar do gesto sincero de John, como forma de desculpas pelo o mal que Alice fizera contra ela, com a entrega daquela caixa, no mesmo dia que eles se conheceram:

– (...) antes de ir embora... – John abriu sua bolsa e mexeu no que havia dentro dela – Gostaria de entregar isso.

As primeiras palavras recordadas, "antes de ir embora", soou como se ele estivesse se despedindo dela pessoalmente naquele exato momento, entregando-lhe a caixa como se fosse a primeira vez. Uma analogia bastante intrigante, e triste. Um de seus olhos encharcou-se, deixando uma lágrima escapar e cair sobre a singela embalagem; ela fechou os olhos, erguendo seu rosto para o alto enquanto levava a caixa com as duas mãos até à altura de seu colo, apertando-a levemente ao seu corpo. E ali ficou.

A casa foi simplesmente fechada com os móveis cobertos, pois o apartamento reservado já proporcionava as tais necessidades de um lar, sem ser comprada ou alugada por terceiros; a família tomou a decisão em mantê-la "intocável", e dando a oportunidade em voltar à casa sem haver burocracias. Uma inteligência considerável.

Então, a família Kate iniciara sua viagem no carro, levando algumas horas devido à distância entre a capital e uma das mais consistentes cidades do país, que era Manchester. Eles passaram pela ponte mais bem arquitetada e chique do Reino Unido: a Tower Bridge. De cabeça baixa e pensativa no banco de trás, Nathaly notou algumas sombras, e elevou seu olhar. Então, seus olhos brilharam ao ver aquela ponte de perto, chegando a ser refletida em cada uma de suas íris esverdeadas, desfazendo aquela expressão tão morta.

– Que bonita... – disse Nathaly, sem ação. Seus pais se entreolharam e deram um sorriso ao escutar a filha.

Realmente, era lindíssimo ver aquela ponte de perto. Era tão inacreditável que parecia efeitos visuais muito bem elaborados. O carro da família ainda passara a tempo quando o tráfego teve que parar para o erguer da ponte em suas duas partes e abrir passagem para uma embarcação. Aquela movimentação completava sua beleza arquitetônica.

Enquanto isso, ao lado de sua esposa, Eduard estava junto aos demais cientistas da empresa para a inauguração do novo edifício e agora principal da corporação dentro de territórios britânicos, tornando a sede de Manchester em uma secundária. Eram numerosos em frente à entrada principal do imenso prédio. Havia também um fotógrafo particular para registrar o momento. Na porta, havia uma fita vermelha a ser cortada.

Eduard pegou sua tesoura do bolso e foi até a fita. De costas para as pessoas, inclusive sua esposa, ele hesitou em cortá-la por algum tempo. Ele parecia mentalizar sua filha que, infelizmente, não poderia desfrutar daquela nova etapa da empresa dos pais. Respirando fundo, a cortou, para aplausos de seus empregados e novos habitantes da nova sede, e para os primeiros flashes da câmera fotográfica. Ele se afastou da porta e começou aplaudir entre os demais como protocolo. Seus aplausos eram secos, e olhava sua esposa também na mesma condição, sem motivos para tanta alegria que todos apresentavam ali. Motivo? Juliana ainda não acordara de seu profundo sono.

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