Capítulo Um: Sacrifício

A manhã seguinte era totalmente tomada por expectativas para Steven e Clara voltarem a ver a filha livre da prisão ainda antes de terminar o ano e poder dar sequência aos seus estudos. Como prometido, Eduard chegou à casa da família acompanhado de seu advogado no carro.

– Bom dia, Sra. Kate – cumprimentou Eduard, sorrindo.

– Olá, Sr. Butzek – respondeu Clara.

– Bom dia, Sr. Butzek. – Steven surgiu de repente por detrás da esposa. – Parece que chegou a hora.

– Sr. Kate? Achei que estivesse trabalhando agora – disse ele, sorridente.

– Eu pedi licença para tratar da minha filha – explicou. – O pessoal da empresa precisou me entender.

– Realmente, vocês são ótimos pais.

– Vamos entrando? – sugeriu Clara.

Ele e o advogado entraram e se acomodaram na casa da família.

– Bem, senhores. Esse é o meu advogado de confiança – apontou, apresentando-lhe.

O casal cumprimentou o advogado com apertos de mão.

– Dentre os seus casos mais recentes, ele colocou em liberdade aquela garota chamada Alice – relembrou. – Diria que um grande passo foi dado ao caso da filha de vocês.

Eles não demoraram muito na sala com as diretrizes que os advogados normalmente passam aos seus clientes para manter o caso sustentável até chegar a esperada resposta final das autoridades. Para não incomodar, Steven insistiu em ir à delegacia em seu carro com sua esposa enquanto Eduard poderia ir com o advogado. Dessa forma, o carro da família Kate foi à frente para conduzir o cientista até o distrito policial.

Na casa dos Taylors, as coisas finalmente tinham sido arrumadas, ainda sob as responsabilidades de Alice, Ryan e John. Isso porque a Sra. Taylor ainda tratava dos últimos detalhes para a alta de seu marido e firmar o seu tratamento em Liverpool. Todas as caixas com as coisas mais complexadas estavam encostadas em uma parede da sala enquanto as malas com as roupas e objetos menos expressivos estavam em outra, tudo bem organizados.

– Finalmente, acabamos – suspirou John, levando a mão à cintura. – Como prometido, eu irei visitar Nathaly na delegacia. Eu já volto.

John já ia saindo, chegando a pegar na maçaneta da porta.

– John? – chamou-o Alice.

Sob a voz da ainda sua namorada, ele olhou para ela parado próximo à porta.

– Achei que você ia me perguntar se eu queria ir com você para vê-la.

Ouvindo aquilo, ele parecia não acreditar nas suas palavras. Mas ela estava falando sério. Ele sorriu com extrema satisfação e prazer em poder contar com ela para ir juntos à delegacia. Alice, em seus raríssimos momentos, abriu um sorriso olhando para John.

No momento em que eles se preparam para sair, Ryan apareceu:

– Aonde vão?

– Iremos visitar a Nathaly, Ryan – respondeu Alice pelo John.

– Parece que virá uma forte nevasca, maninha – riu.

– Engraçadinho – disse ela. – Olha, para lhe consolar, cuide da casa.

Eles saíram, deixando Ryan sozinho. O jovem olhava para as coisas na sala, para o teto, para a porta... Era muito provável que ele estivesse pensando em algo. De repente, ele se apressou e pegou um casaco dentro de um das malas. E saiu.

Eduard e o seu advogado chegaram com os pais de Nathaly à delegacia. Eles entraram e tiveram liberação para irem ao gabinete do delegado. Após uma breve conversa, o advogado do cientista quis ver Nathaly em sua cela. O delegado conduziu a todos até a cela onde a jovem tinha sido mantida. Mas eles se depararam com a cela vazia.

– O que significa isso, senhor delegado? – questionou o advogado.

– Eu não entendo... Ela estava aqui até ontem à noite.

Todos começaram a tentar entender o que estava havendo, gerando um burburinho diante da cela. John e Alice chegaram acompanhados daquele carcereiro. Dessa forma, tanto os jovens quanto o funcionário que sabia de tudo acabaram envolvidos com a conversa do sumiço de Nathaly.

– Senhor? – chamou seriamente o delegado ao carcereiro.

– Sim, senhor delegado.

– Você sabe o que houve ontem aqui?

– Infelizmente, não – respondeu. – Assim como o senhor, eu também estou pasmo com a situação. Eu a vi aqui; talvez possa ter fugido.

– A minha filha não faria essa barbárie, senhor carcereiro – contestou Steven. – Ela é honesta nas coisas.

– Mas tudo pode acontecer, Sr. Kate – defendeu-se, mantendo a postura.

O delegado ficou observando com uma das mãos ao queixo aquela troca de opiniões entre Steven e o carcereiro.

– Ok. É hora de agirmos – interrompeu o delegado. – Vamos montar uma equipe de buscas e investigação desse caso. Precisamos encontrá-la.

Ele e o pessoal saíram andando pelos corredores em passos rápidos. Eles se encontraram com Ryan, que virou ao corredor naquele momento. Daquele montante, Alice e John pararam, não seguindo o delegado.

– O que faz aqui, Ryan? – questionou Alice – Eu não lhe disse para cuidar da casa?

– Eu não aguentei, e quis visitar a Nathaly.

– Você veio em um momento ruim, Ryan. – John hesitou-se, colocando a mão sobre o ombro dele. – A Nathaly desapareceu ontem à noite.

Ryan olhava para John, e John olhava para Ryan, sem o que dizer mais.

– Vamos ver o que o delegado irá fazer. – John abraçou Alice de lado e continuou andando. Mas viu Ryan parado. – Não virá conosco?

– Eu já estarei indo.

– Ok.

Ele ficou sozinho naquele corredor vazio. Ele foi até a cela e pegou nas grades lentamente, olhando aquele vazio e pensando com a cabeça escorada em uma das barras. De repente, ele se lembrou do dia anterior, e saiu dali ligado em qualquer movimento.

Inconsciente, Nathaly estava deitada com o rosto voltado para o teto. Ela parecia um anjinho dormindo. Ao abrir os olhos, ela via um teto quase que infinito por ter um formato triangular, pontudo. Rapidamente, tentou se colocar sentada, mas não conseguiu. Seus pés e mãos estavam presos com braceletes de metal fixos à mesa retangular de concreto no meio do espaçoso lugar. No mesmo instante, ela sentia uma leve dor de cabeça e náuseas. Olhando em volta, viam-se lamparinas e velas com aquela mesma radiação esverdeada espalhadas.

– Finalmente, acordaste – disse o monge líder.

– É você – reconheceu Nathaly, com uma voz cansada. – O que quer de mim? O que é isso?

– Valeu à pena não desistir de encontrá-la para obedecer às ordens de nossos deuses e salvar esse planeta. – Ele chegou perto e começou a passar a mão nos cabelos dela. – Agora, temos você conosco... Filha.

– Filha? Eu não sei sobre o que está falando – disse ela, com medo. – Deve haver algum engano.

– Não... Não...

O homem se direcionou a um dos candelabros, pegou uma vela e inclinou-a para derramar uma grande quantidade de parafina derretida quente sobre um pires. A coloração do material tornou-se verde devido às chamas anormais. Ele voltou para perto de Nathaly, observando-a na testa. Assim, ele pegou uma pequena espátula e passou aquele líquido na fronte dela de modo a desenhar algo. A dor fazia Nathaly ranger para segurar o grito e lacrimejar no fechar dos olhos. Terminado os traçados, era vista na testa dela a letra N dentro de um círculo e um risco na diagonal, cortando a letra. Em torno da região, eram perceptíveis algumas veias da testa aparecendo sorrateiramente por causa de sua alergia.

– Isso apenas prova que é você.

– Por que dessas iluminações verdes?

– Fluorita. Fiz questão de escolher essa cor à base do mineral industrializado para combinar com os seus olhos – contou. – O sacrifício aos nossos deuses precisa ser bem tratado antes de oferecê-lo...

– Sacrifício? O que quer dizer com isso?

– Enquanto isso aproveite o seu último presente em nossa terra. Ainda não é a hora, Filha.

O líder deu às costas e saiu dali, deixando Nathaly contida e incapaz de fazer alguma coisa por causa daquelas radiações provocadas por cada iluminador presente. O medo batia nela após ouvir aquela frase do homem.

Eduard retornou à sua empresa. Ele ia em direção à sua sala bastante inquieto. Seus ligeiros passos pelos andares e corredores mostravam isso. No meio do caminho, ele acabou encontrando sua esposa à sua procura.

– Finalmente, eu lhe encontrei – disse Luiza, aliviada. Ela logo deu um leve pique na direção dele. – Temos ótimas notícias: os aviões aterrissaram no Amazonas. Estamos em solo brasileiro para pesquisas, querido.

– Ótimo, Luiza...

– Está tudo bem, Eduard?

– Não muito – respondeu, olhando-a. – Nathaly sumiu da delegacia durante a madrugada.

– Ah! Achei que fosse algo mais importante do que a chegada da nossa equipe no Brasil.

– Nesse momento, nada mais é importante do que o sumiço da jovem – disse ele em um tom de indignação, ou como se estivesse perdendo algo. – Precisamos encontrá-la.

– Por que tamanha preocupação com ela, Eduard? Percebo na sua aflição.

Luiza ficou de braços cruzados esperando a resposta do marido. Por sua vez, Eduard pensou por alguns segundos, e olhou-a.

– Eu prometi a nossa filha que iria ajudar a Nathaly. E você sabe disso – disse ele. – Agora, ela precisará ainda mais de nós.

Após de praticamente se desvencilhar de sua mulher, Eduard entrou em sua bem trancada sala. Ele foi diretamente à gaveta onde o diário da própria filha estava guardado. A maneira como ele abriu e depois reagiu consigo mesmo, pegando o livro, parecia que estava aliviado em vê-lo intacto no mesmo lugar. Ainda pausou quando segurava o diário, olhando-o e pensando. Voltando ao que ia fazer, o colocou dentro da mala e deixou mais uma vez o seu escritório.

Chegando à sua mansão, Eduard estranhou o silêncio anormal dentro dela, pois estava certo que Juliana estivesse ali. Mas ele não se importou muito naquela ocasião, e foi direto ao quarto dela. Não a achando lá, viu a oportunidade em deixar o diário na mesma gaveta que havia pegado para levar. Ele tirou o livro da mala e abriu a gaveta cuidadosamente. Estava perto de ser bem sucedido na devolução indireta do material à Juliana.

– Quando eu disse a você onde manteria o meu diário guardado, você prometeu nunca mexer nele – disse Juliana, escorada na parede perto da porta. – Mas parece que o tempo apagou de sua memória. Não queria acreditar que fosse você.

O pai tomou um verdadeiro susto dentro de si quando ouviu aquela reconhecida voz.

– Filha? Achei que não estivesse em casa – disse ele, sorrindo.

– Eu até pensei em sair um pouco, mas preferir ficar em casa.

– Entendo. Porque quer notícias da sua amiga.

– Uhun. Mas também precisava achar o meu diário. – Juliana se endireitou e foi estar diante do pai. – Agora que eu já o achei, queria saber o porquê que você o pegou.

Os dois estavam frente a frente. Pai e filha. Eduard mantinha a calma enquanto Juliana já estava ficando curiosa da ação do pai em ter pegado algo tão pessoal dela. Era também o mais óbvio que Eduard precisasse se preparar para dar a notícia sobre o sumiço de Nathaly. Entretanto, o percentual de ele omitir quaisquer coisas ou desviar o assunto sobre a "apreensão" do diário era menor naquele momento.

Dentro da delegacia, o carcereiro andava pelo lugar, até conseguir achar o grupo de policiais comprado pela a seita religiosa dos monges:

– Pessoal. Tomem cuidado. O delegado já está organizando uma intensa busca pela jovem – alertou o carcereiro, falando baixo.

– Se o que nos disseram é verdade, valeu à pena entregá-la ao grupo e passar por uma eventual situação – disse um dos policiais, sereno e despreocupado em suas palavras. Ele recebeu apoio dos demais colegas pelo o comentário.

– Eu também estou nesse mesmo raciocínio – concordou. – Entretanto, tomemos cuidado.

– Estamos bem preparados, amigo. – Mostrou a arma juntamente com os seus colegas.

– Vou ver se eu terei o aval em poder acompanhar o meu líder com a missão.

Atrás de um pilar, Ryan acompanhava tudo, e pôde ouvir algumas coisas da conversa. Aproveitando que os policiais saíram dali, ele ainda seguiu o carcereiro até os fundos da delegacia, escondendo-se atrás de uma pilha de caixas. O carcereiro pegou um telefone de parede para fazer uma ligação.

Na igreja tomada pelo grupo dos monges, o líder estava em um momento de confecção, usando luvas e máscara. Diante de uma pia de concreto, quase com as mesmas dimensões de uma banheira, ele banhava parte de um material com extrema cautela no quente líquido cinzento.

– Precisa de mais líquido, senhor? – perguntou um de seus servos, segurando uma lata.

– Não precisa. – O líder tirou a parte do material submerso, dando uma olhada no objeto que estava ganhando forma de uma média espada pontiaguda. – Apenas mais algumas marteladas e já está pronta.

O servo deixou a lata por ali, ao lado das outras vazias. No selo de cada uma delas estava escrito "Pirita concentrada derretida". Uma espada estava sendo formada por um material à base do mineral modificado e industrializado.

O outro servo lhe apareceu para dizer da ligação. Então, o homem pediu que ambos terminassem de confeccionar o objeto, e foi até o telefone em outro setor. Era o carcereiro. O monge líder recebeu as últimas notícias do que estava ocorrendo na delegacia com a ausência de Nathaly, e ouviu pressa para consumar o que estava para ser feito. Por fim, o carcereiro recebeu sinal verde para ir até a igreja. Sem perder as atenções, Ryan ouviu tudo.

Angustiados em casa, Steven e Clara esperavam notícias sobre o trabalho que estava sendo realizado pela polícia e o acompanhamento do advogado como representante da família. Eles ouviram o bater da porta. Clara, já com os olhos vermelhos de tanto chorar de apreensão, deu praticamente um salto do sofá para atender.

– Sra. Kate. Eu sei onde Nathaly está – disse Ryan com os olhos arregalados.

O lenço que estava sendo usado para enxugar os olhos desceu para a boca quando Clara ouviu aquilo e tratando como uma luz no fim do túnel.

Na casa dos Taylors, Alice e John conversavam entre eles, momentos antes de se separarem. Até que retomaram um temível e insistente assunto:

– Agora, faltam apenas os meus pais chegarem para partirmos.

– Nem me fale, Alice. Só em pensar como serão as nossas vidas distante um do outro, mesmo havendo a possibilidade de nos encontrarmos e manter contato por cartas, telefone... Não é a mesma coisa do que uma rotina.

O que já era difícil ver em uma pessoa tão otimista e sorridente como John a tristeza, essa tornava-se cada vez mais frequente nele. O maior ápice já alcançado em relação a ele tinha sido o descer de uma lágrima, mesmo sendo uma única lágrima na qual até tentou segurá-la. Alice não soube como lidar com aquilo. Ela simplesmente ficou sem ação. Uma falta de reação pouco característico de uma pessoa que sempre mostrou-se apegada a ele todo esse tempo.

No meio daquele momento triste, eles começaram a perceber algo:

– Alice... – John levantou a cabeça – É minha impressão ou o seu irmão não chegou ainda?

– É verdade, John. O que ele deve estar fazendo?

Os dois se olharam, estranhando a situação. Mas mal sabiam que Ryan estava servindo como testemunha do sumiço de Nathaly. Os pais dela retornaram à delegacia junto com o rapaz, que contou sua versão ao delegado. Imediatamente, o delegado deixou sua mesa e procurou pelos denunciados carcereiro e policiais junto aos demais oficiais, o casal Kate e Ryan. Mas não mais os encontraram por ali.

– Vamos direto ao nosso alvo, rapazes. É o melhor que fazemos – disse o delegado, colocando a arma de volta na cintura.

Três carros foram preparados para a missão em recuperar Nathaly das mãos dos sequestradores. Ryan, Steven, Clara e o delegado foram em um mesmo carro com um policial ao volante. O carro deles ia à frente dos outros dois.

– Você tem certeza que eles levaram a Srta. Kate para o caminho indicado, Sr. Taylor?

– Obsoluta, senhor.

No meio do caminho, o delegado olhou para trás e avistou mais duas viaturas.

– Pedimos mais reforço? – perguntou, olhando para o motorista.

De repente, eles começaram a ouvir tiros em suas direções.

– Abaixem-se! – gritou.

Naqueles dois carros estavam os corruptos policiais envolvidos no caso. E uma perseguição com troca de tiros se iniciava pelas ruas. Mas não durou muito. Um tiro certeiro no pneu de um dos carros perseguidores fez o veículo derrapar e cruzar na frente do outro, se chocando.

– Isso mostra que estamos no caminho certo, senhor delegado – comentou Steven.

Uma das viaturas acompanhantes das buscas parou para prender os policiais infratores; apenas o carro com o delegado e o outro seguiram ao destino.

O carcereiro chegou à igreja, entrando sutilmente pela porta da frente, já que tinha as chaves do lugar. À sua frente, viu aquela iluminação diferenciada dentro do ambiente e identificou a Nathaly sobre aquela mesa de concreto ao centro do lugar. Em passos lentos, ele aproximou-se dela; Nathaly, já sem muita força e suando, teve que encontrar forças extras para apenas mexer o pescoço e olhá-lo.

– Não era para ser assim. Mas foi preciso. E é preciso – comentou o carcereiro.

– Por que fazem isso comigo? – perguntou-lhe, quase virando os olhos de tanta fraqueza.

– O seu destino definirá as nossas vidas. A sua pessoa não pode nos cativar ao seu mundo. – Ele tirou um canivete de seu bolso. – Eu comprei essa coisinha para deixar a minha marcada em você.

Ele pegou o braço de Nathaly com uma mão enquanto a outra se posicionava para cortar na altura do antebraço com o objeto.

– Pare! – repreendeu o líder – A oferta tem que ser perfeita. Portanto, não a machuca sem permissão.

– Vamos logo, então.

– Calma. – O homem fez um sinal, aparecendo um de seus servos que segurava uma peça de roupa de monge, e foi até o também servo carcereiro. – Antes, esteja à caráter. Veste-se para o ritual.

Como fora ordenado, ele se vestiu daquelas vestimentas. Estando tudo pronto, ele, os demais monges e o seu líder fizeram um circulo enderredor de Nathaly. Para iniciar o anunciado e esperado ritual, eles começaram a falar em línguas totalmente estranhas – o carcereiro não conseguia acompanhar devidamente as pronuncias, mas estava concentrado. – Terminando, voltaram às suas atenções "terrenas".

– Estamos próximos de definir o futuro da nossa humanidade. Humanidade essa que precisa ser livre, viver a abundância com tudo que esse planeta pode oferecer e nos satisfazer. Não viemos à Terra para ser ditados por alguém ou coisa alguma – discursava o líder.

O discurso ainda continuava, caracterizando uma sessão de sentença com leitura de textos justificativos antes da tal execução final.

Lá fora, as viaturas chegaram com extremo cuidado na frente da igreja desativada. Todos saíram e ficaram por ali; o delegado organizava a estratégia de ataque com os seus subordinados.

– Quero a minha princesa de volta, amor. – Clara abraçou Steven, chorando muito. – Ela é a nossa única filha com quem compartilhamos o nosso amor.

– Calma, querida. Nós vamos conseguir.

Quando Steven olhou para o lado, sentiu a ausência de Ryan. Ele havia sumido dali.

Enquanto isso, o ritual se aproximava do fim. Um dos servos trouxe aquela espada enrolada em um pano ao seu líder.

– Infelizmente, ela é as algemas de nossa Terra. – Ele descobriu a espada. Nathaly olhou para aquele objeto e temeu, mesmo sem muita força para expressar. – Mas o destino será devolvido às nossas mãos.

Mais uma vez, todos pronunciavam línguas estranhas. Em seguida, o líder se posicionou de modo a ficar alinhado à altura do umbigo de Nathaly. Totalmente concentrado, ele armou a espada com as duas mãos, levantando-a lentamente a altura de sua cabeça. Era o preparar do golpe.

– Que os nossos deuses recebam essa oferta. A oferta da liberdade incondicional para que evoluamos pela Terra.

Quando ele ia sacrificar a Nathaly, jatos de água começaram a ser lançados contra todos pactuantes daquele evento sacrifical, jogando-os ao chão. Os jatos também atingiram os candelabros com as velas, apagando-as, enquanto as lamparinas caíram e se quebraram no chão, também tendo o mesmo findar das velas. Ryan era o salvador, usando de uma mangueira emergencial encontrada ali dentro.

– Nathaly!

Ele correu até a mesa que a mantinha presa.

– Ryan?

– Calma. Estou aqui.

Ele a desprendeu rapidamente, colocando-a sentada. Mas o carcereiro se pôs de pé, e sacou uma arma em direção a eles.

– Que a minha oferta aos deuses seja em dobro – determinou.

– Faça alguma coisa, Nathaly – sugeriu Ryan.

– Eu não posso fazer nada – disse ela, temerosa.

– Eu sei que você pode, Nathaly. Eu sei quem você é.

Ryan fixou o seu olhar nos olhos dela, transmitindo uma certeza absoluta de que ele já sabia algo muito mais profundo sobre ela. Nathaly sentiu isso naquele olhar do rapaz. Ela olhou para o homem mirando em suas direções, e elevou os seus olhos para o alto, vendo uma velha madeira suspensa acima dele. Então, ela usou sua visão de calor contra as cordas que seguravam o material, cortando-as com o intenso calor. A madeira se soltou, despedaçando em algumas partes antes mesmo de cair ao solo. O carcereiro tentou sair da mira, mas foi acertado pelos pedaços, ficando preso debaixo deles.

– Vamos sair daqui, Nathaly – disse Ryan, pegando na mão dela.

– Espera... – hesitou. – Como sabe do meu segredo?

Ele olhou para ela e, em uma fração de minuto, começava um rápido flashback provocado pelas palavras dele:

– Naquele dia que minha irmã foi jogada naquele lago, eu vi você escondida atrás de uma árvore, bem distante dali, toda molhada. Eu não quis acreditar na sua boa intenção por ser tomado por um perfil de irmão defensor da minha irmã para vê-la feliz, e não contei nada. Mas o dia que fui espionar você e John, eu vi aquela repentina agilidade em subir naqueles carros para resolver algo. A partir dali, comecei a pensar sobre você, e ainda passei a gostar de você; vi quão pura é. A maior prova que eu tirei foi quando você foi tomada pelo espírito da Lauren. Ela simplesmente usou seus poderes com aqueles olhos avermelhados, perto de tostar minha irmã. Mas você negou aquele fato inevitável. E o que dizer sobre a sua sobrevivência daquele afogamento? Essas e tantas outras situações que só reforçaram sobre sua pessoa. E sempre os mantive em segredo.

Nos olhos de Nathaly, era percebido um olhar fissurado às lembranças revividas, além de sua total imobilidade. Um grande impacto tomou o seu ser. De repente, houve um barulho entre eles. Nathaly ainda perguntou o que era. Ryan, com os olhos arregalados, não respondia, até que pouco de sangue começara a escorrer do lado de sua boca. Quando ela olhou para a barriga dele, viu as mãos dele levadas ao centro cheia de sangue. O objeto inserido nele pelas costas foi tirado, e a vítima caiu. O líder dos monges foi quem matou o rapaz usando da mesma espada que pretendia sacrificar Nathaly.

– Agora, é a vez da maior oferta.

Na hora que ele ia desferir o golpe, os policiais invadiram o local, distraindo o homem. Nathaly aproveitou o vacilo para empurrá-lo e pegar a arma. Quando pegou, era evidente que sua mão começasse a ser corroída por causa do material feito, e largou na mesma hora. Steven e Clara apareceram e correram para abraçar a filha. Mas aquele abraço não era o suficiente para apagar aquele triste cenário, e a sua provada inocência de ter matado a Katie Harvey não traria Ryan de volta.

Mais tarde, na Butzek Corporation, Eduard recebia a visita de seu advogado no escritório:

– Alguma novidade, doutor? – perguntou Eduard.

– Sim, Sr. Butzek. A jovem Nathaly foi achada e teve sua inocência mais que provada.

– Hm... Conte-me mais. Como foi isso?

– Ela foi achada sob domínio de uma seita religiosa, que alegava que a jovem seria uma ameaça às nossas gerações. Então, eles mataram uma de suas servas, a Katie Harvey, e incriminou Nathaly para sequestrá-la dentro da própria delegacia.

O cientista riu educadamente com os relatos reportados pelo seu advogado, e se inclinou para frente da mesa.

– E você acreditaria nisso, doutor?

– Confesso que não. Apenas vendo para crer.

– É... É o mais óbvio, não? – Ele se escorou novamente na cadeira. – Estou muito feliz pela notícia. Quanto mais estará minha filha. Obrigado, doutor.

– À disposição.

O advogado saiu de sua presença. Sozinho, Eduard fechou um pouco aquele sorriso simpatizante e ficou mais sério, batendo o lápis na mesa. Depois, pegou o telefone para noticiar a filha.

Voltando para casa, após sair da delegacia totalmente com a ficha limpa, Nathaly relatava sua má experiência sob o domínio daquele estranho grupo. E seus pais a ouviram atentamente até o fim, sem interromper o raciocínio da filha.

– Eles queriam lhe matar para libertar o mundo? – estranhou Steven.

– Era o que eu mais ouvia deles, pai – reafirmou. – Eles diziam que eu não devia viver entre as pessoas, tratando-me com uma ameaça a todas elas.

– E é claro que você não deu ouvido a essas afirmações "proféticas", deu? – disse Clara, convicta.

– Eu não posso lhe dar essa certeza, mãe. Eu ainda tenho muito ao que saber de mim – disse ela. – Aliás, o líder daquela organização me chamava de "Filha" ao invés de meu nome. O que seria aquilo?

– E quanto aquele N riscado que estava em sua testa? – perguntou Steven – Coincidia com a letra inicial do seu nome e, consequentemente, com sua corrente.

Nathaly imediatamente passou a mão na testa e não sentiu mais aquela cicatriz que formava a letra comentada pelo pai, pois sua regeneração a desfez, sendo aquela informação uma novidade e ao mesmo tempo enigmática para ela.

A família Taylor teve que permanecer por mais alguns dias para o funeral de Ryan. No dia do enterro, além dos pais, estava sua irmã, John e Nathaly. Após o sepultamento, Nathaly foi até o túmulo do amigo e deixou aquele buquê de flores que o próprio Ryan havia dado a ela, estando no mesmo estado que ele comprara. Ela estava sozinha ali, expondo o seu luto em particular.

– Meu irmão foi um herói para você. Tudo porque gostava de você – disse Alice, aparecendo ao lado.

– Isso eu não posso negar. Ele ultrapassou regras para me tirar daquela situação.

– Amanhã estarei partindo da cidade.

– Ótima viagem – sorriu timidamente.

– E gostaria de me despedir de você na frente do meu irmãozinho.

Nathaly olhou para ela, surpresa. Quando ela virou, estando de frente, Alice deu um abraço nela. Elas ficaram abraçadas por um tempo.

– Tenho a certeza que John estará em ótimas mãos – sussurrou Alice no ouvido.

Ela deu alguns passos para trás e foi embora, deixando Nathaly com aquele pensamento sobre as últimas palavras dela.

O dia de partir chegou. Logo pela manhã, a família Taylor e John estavam na estação de trem a espera da locomotiva. O trem chegou. John ajudou no carregar das malas até o respectivo vagão, além de ajudar o Sr. Taylor a subir com sua cadeira de rodas. Depois de alguns minutos, o trem apitava, anunciando sua partida rumo à Liverpool. Alice estava assentada pela janela, ao lado da plataforma. Ela olhava para John totalmente desolado, embora estivesse sorrindo para passar segurança a ela. Então, o trem começou a andar. Conforme ia, John acompanhava, até que ele chegou ao limite da plataforma, e Alice desapareceu de sua vista. Era definitivamente o adeus.

Na véspera de Natal, faltando algumas horas para a virada, Clara preparava os últimos detalhes para a ceia. Nathaly estava na cozinha ajudando a mãe. Pelo comportamento, Nathaly parecia muito incomodada dentro de si.

– Está tudo bem, filha?

– Sim, mãe... Na verdade, estou pensando em convidar a John para cear conosco.

– Mas ele perceberá que você não come tais alimentos.

– Eu não posso considerar isso como um empecilho. Ele é o meu amigo.

Em sua casa, John estava sentado na mesa da cozinha, lendo mais uma das cartas registradas de Alice. Uma carta especial de Natal. Ele sorria lendo cada palavra dela. O que o deixava mais feliz era aquela impressão real de que ela estava ainda mais mudada em relação a sua pessoa e a progressão na recuperação de seu pai. Quando terminou aquela leitura, ele ouviu o bater na porta.

– Deixa que eu atendo! – dispôs-se.

Ao abrir, era Nathaly em seu jeito delicado de ser e com as suas mãos para trás.

– Nathaly? Que surpresa.

– Oi, John. Eu queria saber se... se você gostaria de ceiar comigo.

John ficou surpreso com aquele convite. Como um cavaleiro, ele acabou aceitando, e foi colocar uma melhor roupa para participar dignamente na casa dos Kates. E a ceia foi algo muito bom para todos, especialmente para ele, trazendo renovações. E o que era temido pela mãe de Nathaly não aconteceu. A filha soube disfarçar muito bem.

Naqueles últimos dias do ano, John pôde esquecer um pouco do difícil término daquele longo namoro com Alice e lidar com a dor dela com a morte de seu irmão. Tudo isso colaborou com aproximação do rapaz com Nathaly, intensificando uma amizade que já estava bem encaminhada desde o princípio, mas que era bloqueada. Agora, o caminho estava livre.

Ano de 1938. Era primeiro dia de aula do último ano escolar para Nathaly, Juliana, John e tantos outros alunos da unidade de ensino do bairro. Nathaly estava a caminho da escola, até que alguém a tocou por traz, trazendo uma certeza que era John.

– Você não me assusta mais, John. – Ela parou e virou-se. E desfez o sorriso. – Quem é você?

– Desculpa, senhorita. Meu nome é Allan. Allan Thompson. Prazer.

– Prazer... Nathaly – sorriu, desconfiada.

– Eu sou novo na cidade e no bairro. Aí, como a vi com a mochila... E se você não se incomoda de eu ir com você para escola...

Ela estranhou aquela abordagem sem nexo da parte daquele jovem, que tinha cabelos com tons louros, que se estendiam até o início do pescoço, com alguns fios cobrindo as laterais da testa, e olhos castanhos.

– Tudo bem... Vamos – aceitou sob risco.

Eles iam juntos para escola. John, achando que ia chegar primeiro para acompanhar a amiga, acabou mesmo flagrando aquela cena dela com outro rapaz. Mas ele continuou andando para escola. E em passos reduzidos.

Naquele tumultuado no pátio com a checagem das listas de turmas e salas, John chegou, e Juliana o viu.

– John... Você viu a Nathaly por aí?

– Sim. E a vi com um novo aluno.

– Hm... Olha, eu espero que caiamos na mesma sala. Você, Nathaly e eu – torceu. – Eu que digo que isso aconteça comigo. Cair na sala da minha amiga.

– Esqueça. Parece que não iremos estar em uma mesma turma.

– Por quê?

John apontou às suas frentes. Ambos viram Nathaly alegre com o recém-aluno Allan diante de uma das listas do mural. Eles comemoravam algo.

– Isso deve responder à sua pergunta.

Nathaly os viram por ali, e foram até eles junto com o aluno.

– Allan. Essa é Juliana Butzek, minha amiga, que estará mais um ano na minha sala.

– Ótima notícia, Nathaly – sorriu Juliana.

– Prazer, Srta. Butzek – cumprimentou Allan. – Vamos nos dar bem na mesma turma.

Eles se viraram para John.

– E esse é o meu amigo, John Mitchell – apresentou-o, sem graça. – Infelizmente, ele não é da nossa sala.

– Prazer, Sr. Mitchell – cumprimentou-o sorridente. O seu aperto de mão foi bem apertado, e John sentiu. – Vamos nos dar muito bem, também.

– Prazer é meu, Allan.

– Bem, Allan é de Cambridge. E se mudou para Manchester – disse Nathaly. – Agora, estudará aqui, conosco.

– Isso aí. Bem, já devíamos estar em nossa sala, não é mesmo? – disse Allan, olhando para o seu relógio. – Até mais, Sr. Mitchell.

Quando eles iam para a sala, Nathaly olhou para John com um sorriso sem graça, como se quisesse dizer ou justificar algo. Já ele acenou normalmente para ela, na garantia de conversar depois. Mas não foi isso que ele esperava. Mais especificamente na hora da saída, ele avistou Nathaly novamente com Allan conversando e logo indo embora juntos.

– Os dois estão bem próximos – comentou Juliana, aparecendo ao seu lado.

– Até acredito nessa tese por você ser testemunha – concordou John. – Mas isso cheira a algo muito estranho.

Johnolhava-os bem distante pelo caminho, estando a pensar.

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