Capítulo Seis: Minérios
O silêncio na sala ainda perdurava. Nem Nathaly se pronunciava nem muito menos os seus pais respondiam-na, até que Steven começou a se aproximar da filha. Ela ficou temendo quanto à sua aproximação lenta e feição esquisita, como se fosse dar algum bote.
– Quer dizer que você não é a nossa filha?
– Não exatamente... Pois tenho parte de vocês em mim – presumiu. – Talvez, o nosso DNA esteja atrelado a ela, a Mãe Natureza.
Steven olhou para trás, em direção à esposa, e tornou a olhar para a filha.
– Será que sua mãe também teve alguma alteração em seu DNA?
– Acho difícil, pai. Caso ao contrário, ela teria os meus... poderes.
– Onde você se encontrou com ela, filha?
– Eu fui levada por golfinhos até o Brasil, no Estado do Amazonas. Para ser mais direta, estive na Floresta Amazônica.
– Ual... – impressionou-se Clara.
– E o que ela pretende contigo? – perguntou o pai, desconfiado.
– Ela disse que há um propósito em mim, e ser para ela a sua exclusiva herdeira.
Steven começou a andar pela sala com uma das mãos levadas à boca, pensando naqueles relatos. Ele pareceu tenso. Muito tenso. Nathaly o acompanhava com os olhos, em um olhar assustado.
– Já que ela é real, vamos usar das suas habilidades para ir até onde ela está. Preciso conversar com ela.
– Não posso, pai.
– Como não, filha? Você acabou de vir de lá – disse ele, contrariado com a negação. – Ela tem que nos dar muitas explicações, pois foi ela quem quase arrebatou você e sua mãe naquele raio.
– Ela não pode ser tocada, e muito menos ser comunicativa com os seres humanos. Não sei por que, mas somente eu posso a ouvir e falar com ela – justificou. – E já a questionei por aquele dia que você tanto se sentiu aflito.
Nathaly ainda contou sobre o porquê que a Mãe Natureza demorou tanto para se revelar a ela. Uma das coisas que mais a frustrou.
– Filha. Diga-me uma coisa... – O pai colocou as duas mãos sobre os ombros de Nathaly, e fixou seus olhos nos dela – Seja sincera em seus lindos olhos. Você não aceitou tal destino que ela tem para você. Aceitou?
Nathaly engoliu seco sua saliva com aqueles olhos verdes quase que estáticos diante do olhar do pai, e balançou lentamente a cabeça em negativo ainda com os seus olhos fixos no pai.
– Certo... – disse Steven, pressionando levemente os ombros da filha e confirmando consigo mesmo com a cabeça, e olhou para baixo. – Bem, você está muito suja. A viagem foi longa. Vá tomar seu banho e se trocar. Já está ficando à noite para o jantar.
– Está bem, pai.
Ela se retirou da presença dos pais cabisbaixa, subindo as escadas. Vendo Steven parado, olhando para onde Nathaly passara, Clara colocou sua mão no ombro do esposo, e ele correspondeu colocando a sua sobre a dela. Entretanto, parecia muito chocado.
Na tarde do dia seguinte, uma imensa pista fora reservada para test driver com um dos veículos recém-fabricados pela empresa de Max Hunt. Por ali, ele, um cientista principal e mais alguns, que foram cedidos pela Butzek Corporation, além do pessoal da técnica, estavam todos reunidos no local.
– Pisa fundo, meu amigo. Aproveite enquanto o tanque está cheio – disse Max ao motorista profissional em testes automotivos, sorrindo pela janela do motorista no lado de fora.
Max tomou distância da pista, ficando no acostamento. Dali, ele olhou para os cientistas que agora estavam sendo avaliadores finais, e recebeu o sinal. Então, olhou para o motorista e também deu um sinal. O motorista ligou o carro, que ligou a todo vapor. Um leve aceleramento com o freio de mão puxado mostrava a potência do veículo, faminto por velocidade. O motorista olhou para o empresário como se estivesse aprovando aquela imponência sonora e sua braveza. Apesar de ser mais luxuoso, o design era de acordo com os carros da época. Isso era um fato desde o princípio. Mas aquela potência era similar aos carros que viriam anos depois. Poderia dizer que era o futuro chegando precocemente quanto à força motora de um automóvel.
O carro saiu em disparado pela pista, e outros sons do motor puderam ser ouvidos pelo motorista, além de sentir aquela sensação ótima de estar em um carro evoluído. Após um tempo testando, ele deu a meio volta com o automóvel quando estava a alguns metros de onde partira, e chegou buzinando e encostando-se ao acostamento, com uma parte em cima do gramado baixo.
– Era para testar o carro, e não nos atropelar – disse Max, sorrindo de lado.
O motorista saiu sob risadas do carro com a chave em mãos, e as jogou nas mãos de Max.
– Potência e conforto aprovados, senhor – aprovou o motorista.
O capô do carro foi aberto. Nas laterais do motor, haviam dois cilindros de combustíveis, um em cada lateral. Eles eram meio transparentes, e o líquido parecia meio esverdeado com algumas interferências de coloração na composição.
– Vejam só isso. Ainda cheinho, cheinho. Além de trazer potência inimaginável, ainda traz economia – comentou o empresário. – Vamos dar uma pausa, pessoal. Nem tivemos almoço ainda.
Todos foram almoçar, deixando o carro estacionado por ali. Em seu cano de escapamento na traseira, pingos caíam sobre uma pequena flor que nascia despercebida naquele gramado. A vegetação estava sendo corroída gradualmente pelo líquido mal evaporado.
À noite, em uma pequena sala reservada para experimentos científicos na fábrica, aquele cientista intitulado como o principal da equipe levantado por Eduard em nome da Butzek Corporation estava sentado na bancada, examinando uma amostra do combustível, que fora colocado sobre uma pequena plaqueta quadrada transparente mirada ao microscópico. Ele observava suas composições por moléculas. De repente, seus olhos se arregalaram em frente ao equipamento de observação minuciosa.
– Não pode ser – disse consigo mesmo, incrédulo.
Atrás dele, a alguns metros, Max estava parado na porta, que o cientista deixara aberta.
– Algo lhe incomoda, amigo? – perguntou ele, adentrando a sala com as mãos no bolso. Ele ouvira o espanto daquele profissional.
O cientista levantou imediatamente, e ficou diante de seu subordinador.
– Não podemos seguir adiante com o projeto. Em outras palavras, não pode haver o lançamento dos novos veículos.
Max desmanchou um sorriso que fizera ao entrar, fechando sobremodo o seu semblante, estranhando. Além disso, ele tirou lentamente as mãos do bolso, e fechou seus punhos, com eles encostados à calça.
– Não há como voltar mais atrás, meu caro cientista. – Ele o olhou de lado com a cabeça um pouco mais elevada em alguns graus. – Por que logo agora um impedimento?
– O combustível que os carros utilizarão ainda não está em totais condições para consumo.
– Mas vocês, cientistas, já tiveram muito tempo para ver esses detalhes – criticou indiretamente. – Já investi muito neste projeto. E em vocês também.
O cientista percebeu que Max demonstrava chateação profunda quando o observou durante suas respostas. Nenhum dono, após um investimento pesado, gostaria de ouvir algo que trouxesse empecilhos aos objetivos finais. Ainda mais empecilhos de últimos momentos.
– Desculpe-me, mas foi uma descoberta de última hora – disse o cientista, demonstrando pulso firme como profissional da área. – Estarei reunindo a minha equipe para uma reunião sobre isso amanhã, e saberemos se será ou não viável o uso do combustível. Se não for aprovado por nós, será necessário engavetar o lançamento por algum tempo, até acharmos um melhor meio para reverter o quadro.
Max ficou mudo diante dele.
O profissional foi à bancada, jogou a amostra dentro de um pequeno recipiente, o colocou em sua pasta.
– Com licença, Sr. Hunt. E boa noite.
Ele passou pelo empresário e virou à direita do corredor. Max se aproximou daquela bancada e apoiou suas mãos sobre ela, encurvando o seu tronco. Seu olhar era totalmente fissurado sobre a mesa branca.
Com o seu jaleco branco dobrado sobre o braço e segurando sua pasta, o cientista caminhava pelo estacionamento nos fundos da fábrica, indo ao seu carro – a noite estava sendo um pouquinho castigante devido ao frio. – Chegando ao seu carro, ele pegou as chaves e abriu a porta; entrou no veículo cuidadosamente, colocando seu jaleco e pasta sobre o banco do carona e em seguida fechando a porta. Assim que ele encaixou a chave e a rodou para ligar o carro, algo penetrou na lateral da parte dianteira do automóvel, o local do motor, e provocou uma explosão repentina, criando um imenso clarão nas distantes paredes da fábrica. Na janela dos fundos do segundo andar, um revólver saindo fumaça pelo cano estava na frente do atirador; quando a arma foi abaixada, era Max quem atirara certeiramente no motor do carro. Aquele distante brilho das chamas enchia seus olhos enquanto assistia o consumir do fogo.
Pela manhã no escritório executivo, o telefone começou a tocar. Uma mão masculina o pegou. Sendo levado ao ouvido, era Eduard quem estava em seu próprio escritório no momento certo.
– Butzek Corporation. Eduard falando.
– Querido? – disse Luiza, com a ligação um pouco abafada devido à distância entre Alemanha e Inglaterra. A distância não era tão longa, mas, naquela época, era inevitável uma ligação não "perfeita".
– Luiza. – Abriu aquele surpreso sorriso de brilhar os olhos. Ele deu rapidamente à volta pela mesa, chegando a derrubar algumas canetas de um pote com o fio do telefone, e sentou na cadeira. – Achei que tinha esquecido sua própria família.
– Muito engraçado... O que foi isso, amor?
– Nada, Luiza. Apenas derrubei algumas... canetas – respondeu. – Como estão as coisas em nossa matriz?
– Não é das melhores, Eduard... Na verdade, o nosso país está passando por uma precária condição econômica – contou Luiza. Do outro lado da linha, Eduard desencostou suas costas do encosto da cadeira e inclinou-se para frente, apoiando um dos braços horizontalmente na mesa enquanto o cotovelo do outro, que estava com o telefone, sobre ela. – Desde a última vez que nós viemos, eu nunca vi tamanho buraco financeiro em nossa planilha. Precisamos, e muito, transferir um pouco da renda daí para cá convertida para nossa moeda.
– Esses reflexos pós-guerra... Versalhes... – Ele passava a mão pelos arrumados cabelos louros. – Bem, o melhor que temos que fazer é ter calma. Temos que honrar a memória de meu pai à qual investi sua herança para ter essa empresa; a doença pode ter me vencido através dele, mas essa empresa jamais... A propósito, recebi adiantadamente o dinheiro do acordo que fiz com o Sr. Hunt. Podemos usar parte do pagamento.
– Que ótimo, querido! – alegrou-se. – Irá nos ajudar aqui.
– Mas apenas tenha paciência para que eu possa fazer a troca da moeda ainda hoje. É uma parte da quantia que contém altos valores, e o governo britânico pega no pé. Quando se trata de receita financeira alemã então...
Eles aproveitaram aquele momento particular à distância para colocar o assunto em dia, e dar algumas pinceladas amorosas de casal, uma paqueirinha. Quanto menos esperava, Luiza teve que encerrar a ligação para voltar aos trabalhos na presidência da matriz. Quando Eduard desligou o telefone, sua secretária bateu na porta e colocou sua cabeça entre o vão criado entre as portas duplas. Ele a olhou daquele jeito, e autorizou sua entrada.
– Sr. Butzek. Aconteceu um incidente com um dos nossos empregados cedidos à empresa do Sr. Hunt. Ele morreu – reportou.
– Minha nossa! – Ele levantou-se, colocou a cadeira sob a mesa e colocou o seu palitó. – Qualquer coisa, anote recado. Dependendo da situação, não estou. Até mais.
Eduard saiu apressadamente. A secretária estava sentida com a notícia. Olhando para sua prancheta que carregava em mãos, notou que Juliana iria à empresa após a escola. Aquele esquema adotado era para ela ter o controle das idas de Juliana à empresa, principalmente por causa da ausência da mãe, e Eduard precisava de uma ajuda extra na supervisão.
– Sr. Butzek! – disse ela, crescendo os olhos.
Ela saiu atrás do cientista para avisá-lo sobre a filha, o que seria tarde demais logo depois.
O intervalo chegara. Nathaly, Juliana e Allan estavam andando juntos pela escola conversando. Juliana passou perto de um lixo com a tampa deslocada, quase caindo. Ela resolveu ajeitá-la. Quando olhou dentro, viu um jornal dobrado. E o pegou para si.
– Olha isso, gente! – chamou-os, após desdobrar o papel e ver uma matéria. Todos pararam.
– Agora ficou nessa de pegar jornais por aí? Ainda mais em latas de lixo? – perguntou Nathaly, sendo humorada para descontrair até ela mesma, cruzando os braços.
– Haverá uma conferência a céu aberto sobre o anúncio da nova linha de carros. E parece que será interessante... Aqui diz que o nome do projeto apenas será revelado no momento da conferência – informou Juliana. – Pelo jeito, nem o meu pai sabe o nome.
Nathaly frisou seus olhos sobre a matéria, focando mais o título. Seus olhos se movimentavam preocupadamente.
– O seu pai está envolvido? – perguntou Allan, curioso.
– Sim! – respondeu-lhe, empolgada. – Ele fez um acordo ao ceder parte de seus cientistas a essa empresa.
– interessante... Parabéns!
– Obrigada!
Juliana e Allan olharam-na com os seus sorrisos desfeitos. Nathaly pegou o jornal das mãos da amiga vagarosamente, e continuou a frisar na matéria, agora lendo parte do texto na íntegra.
– O que foi, amor? – perguntou Allan.
Eles a olhavam com uma super cara de curiosidade. Nathaly ergueu seus olhos, e os avistaram assim.
– Nada... Nada... É apenas interessante.
Na realidade, não seria um nada. Estava começando a ser tudo. Ela começou a juntar as peças do aviso que recebera da Mãe Natureza com aquela matéria.
Em um dos pátios a céu aberto, em uma das laterais da fábrica, distante do que ocorrera no estacionamento dos fundos, a conferência marcada para anúncio dos novos veículos estava sendo realizada. Muitas pessoas se reuniram, inclusive, a imprensa local e nacional. Sobre o palanque, estavam Max, Eduard e seus cientistas que trabalharam no projeto, além dos trabalhadores que cooperaram com o feito. Steven estava lá, para o orgulho de sua esposa, que estava entre a multidão diante do palanque.
– Após respeitarmos um minuto de silêncio quanto ao triste acontecimento que ocorreu na última noite, e que o nosso colega esteja em um bom lugar, agradeço a todos que estão aqui presentes, e agradeço aos meus companheiros que me ajudaram. – Max parou o que estava falando e deu uma olhada para Eduard, que estava atrás. – Se não fosse pelo Sr. Butzek, nada disso estaria acontecendo. Foi ele quem nos concedeu os melhores profissionais científicos para oferecer o melhor produto final. Portanto, senhoras e senhores, eu oficialmente os anuncio o projeto, chamado Projeto Minérios. Bem-vindos à nova era automotora!
Todos o aplaudiram intensamente. Um grande avanço estava prestes a ser realmente consumado na indústria. Max sorria diante das câmeras fotográficas, e apreciava aquelas palmas.
Na empresa do pai, Juliana andava pelos corredores o procurando e o chamando. Os seus chamados eram em alemão, já que ela tinha um pouco de receio de estar ali, cercada por ingleses desconhecidos. Conforme ia, ela olhava salas abertas, outras fechadas... Até encontrar uma que lhe chamou mais atenção. Nunca reparara antes todo esse tempo. Ela foi até ela e testou a maçaneta. Estava trancada. De repente, uma mão repousou sobre o seu ombro.
– Aí, não! – Encolheu-se.
– Calma. Está tudo bem – disse aquela secretária. – Desculpe, se eu a assustei.
– Tudo bem. – A jovem ainda se recuperava emocionalmente do susto. – Onde está meu pai?
– Ele foi para a conferência marcada. – Ela fora avisada por Eduard que não voltaria tão cedo por causa do evento. Isso ajudou a sua assistente a não dizer outra coisa, que no caso seria para tratar da morte de um dos funcionários. Poderia preocupar a jovem alemã. – Ele acabou esquecendo-se de avisá-la para não vir hoje.
– Acontece – riu Juliana, sem muita graça. – Escuta... O que há por detrás desta porta?
A assistente olhou lentamente para a respectiva porta, hesitando-se.
– Infelizmente, Srta. Butzek, não posso dar as informações sem a autorização do seu pai. É confidencial – sorriu. – Vamos. Eu a acompanharei de volta à porta principal e o motorista lhe levará para casa.
Ela levou Juliana dali. O olhar da jovem era persistente àquela porta, por alguns segundos, até que o seu pescoço não aguentou a certa distância.
Os jornalistas presentes à conferência faziam perguntas sobre o projeto. Um deles fez uma pergunta direta:
– Sr. Hunt. Por que o senhor resolveu nomear seu projeto com o nome Minérios? Qual é o segredo e do que é feito esse novo combustível para os carros? – interrogou-o, olhando para os colegas de profissão e para o empresário.
– Embora possa ser óbvio, eu farei igual a uma marca de refrigerantes norte-americana: Eu não revelarei a composição do mais novo combustível, e digo o mesmo quanto à escolha do nome do projeto. Ah! Mas garanto a vocês: É muito seguro e econômico – sorriu largamente.
Enquanto isso, Nathaly estava em pé em seu quarto. Ela estava coxeando entre pensamentos: Ou dava ouvidos à Mãe Natureza ou manter-se-ia neutra na situação. Como já era sabido, ela estava muito frustrada com a sua considerada Mãe. O pior de tudo era que ela começou a recordar, de forma persistente em sua cabeça, aquela voz da Mãe Natureza alertando-a:
"...Ouça-me. Seus familiares e amigos estão correndo um sério risco com o que está para acontecer. Inclusive, você..."
Ela segurava sua cabeça com as duas mãos, e seu olhar era um de uma pessoa que ficava fissurado por causa de alguma droga, sinalizando o começo de um conflito íntimo.
– Meus pais... Meus amigos... – disse ela, ofegante. – Nãoooo!
Nathaly sentiu seus olhos queimarem por ardência e, imediatamente, virou sua cabeça para o lado, emitindo raios de calor sobre um porta-retrato da cômoda, com uma foto dela ao lado de seus pais quando era mais nova. O suporte ficou em chamas, e a foto que antes era preto e branco estava a ganhar as cores do fogo. A mão de Allan apareceu rapidamente de forma intrusa, jogando o objeto pela varanda.
– Allan? – estranhou, quando olhou para ele – Você entrou sem bater na porta lá embaixo?
Calado, Allan aproximou-se vagarosamente dela com uma das sobrancelhas erguidas e franzindo a testa, ficando de frente a ela.
– Como você fez aquilo, Nathaly? Veio dos seus mais belos olhos – disse o namorado, paulatinamente.
Nathaly arqueou levemente as sobrancelhas, estando com sua boca entreaberta, estática por alguns instantes.
– Preciso ir.
Ela saiu apressadamente do quarto. Allan chamou-a, indo atrás até a porta. Ali, parou para vê-la correndo pelos corredores e virando à sua esquerda para descer as escadas e sumir de sua vista.
A conferência terminara, e todos já tinha ido embora. Satisfeito, Max saía cantando vitória dentro de si pela porta dupla dos fundos da fábrica, onde era o estacionamento. Seu carro estava a poucos metros dali. Ele entrou no carro e o ligou. Quando acelerou, o veículo deu um tranco, e os pneus traseiros derrapavam sobre o asfalto conforme acelerava. O carro mal saía do lugar. Olhando para o para-brisa, ele viu Nathaly encurvada com as suas mãos sobre o capô, fazendo força contrária ao do carro, utilizando-se da força de um elefante. A pressão era tanta, que o capô chegou a afundar um pouco com as mãos de Nathaly. Vendo aquela cena espantosa, Max parou de pressionar o pedal e desligou o automóvel, saindo depois.
– Sr. Hunt. Gostaria de conversar com você.
Nathaly começou a ir em direção ao empresário. Com medo, ele deu alguns passos para trás e virou-se, correndo para o interior da fábrica, de onde saíra. Nathaly ficou parada por alguns momentos, observando com aqueles olhos verdes a porta que ele entrou, e decidiu ir atrás.
Ela abriu um lado da porta dupla decidida o que iria fazer. Após ficar da porta para observar aquele imenso pátio à sua frente, ela começou a dar seus primeiros passos para entrar em definitivo no lugar. Em certo ponto, Nathaly passou a sentir um forte incômodo em todo o seu corpo, trazendo-lhe fisgadas. Ao olhar suas mãos, ela via aquela irritação de suas veias que subia aos seus braços e a cor de sua pele se alternava entre escura e sua cor natural. Era o estado corrosivo sendo iniciado. Havia radiação naquele lugar. Imediatamente, Nathaly usou sua visão infravermelha em direção a algumas caixas de madeira que possuíam vãos e, com extrema dificuldade por causa da fraqueza, conseguiu identificar níveis altos de calor inflamável sendo irradiado pelo ambiente. Escondido, Max saiu de trás de uma máquina, e viu Nathaly quase se ajoelhando de tanta dor e sua pele ressecando.
– Quem é realmente você, jovem? – questionou, olhando esquisito para Nathaly.
Max andava devagar para se aproximar dela. Ele pegou cautelosamente uma barra de ferro e segurou-a com ambas as mãos, e continuou a caminhar até ela.
– Por favor, Sr. Hunt. Quero apenas conversar com você – dizia Nathaly, segurando o seu gemido e com um dos braços levado ao abdômen.
– Não. – Ele armava a barra em suas mãos. – Também não será você a me impedir de nada.
O empresário segurou firme com as mãos o objeto e a golpeou de baixo para cima, jogando-a um pouco acima da porta. Nathaly caiu de bruços diante da porta. Ela fazia força para tentar se reerguer; já Max foi até uma das caixas e pegou um dos cilindros do combustível produzido. Em seu selo, dizia ser à base de Flourita e Quartzo. Nathaly conseguiu ler aquilo quando estava quase ficando de pé, e entendeu o porquê de suas fraquezas.
– Isso é perigoso, Sr. Hunt – advertiu Nathaly, com um lado da boca manchado de sangue.
– Será perigoso se eu deixá-la se meter em meus assuntos!
Max levantou aquele cilindro segurando com as duas mãos com toda sua força para o alto, acima de sua cabeça, e mirou em Nathaly para batê-la. O cilindro desceu em sua direção, e ela pôde se afastar indo para trás. O armazenador acertou o chão, e uma explosão ocorreu. A pressão jogou Nathaly para fora da fábrica graças à porta dupla; mas Max não teve a mesma sorte. A mesma pressão o tragou para dentro, destruindo tudo que havia no interior da fábrica e desmoronando-a; os primeiros carros feitos que seriam colocados no mercado todos foram consumidos pelas chamas. Nada sobrou daquela fábrica.
A mobilização foi rápida diante da desmoronada indústria de automotores, e a repercussão levou apenas meia hora para se espalhar pela cidade, sendo anunciado como notícia de última hora pela rádio local. Steven não tirava o seu ouvido de perto do rádio, que estava na cozinha.
– Meu Deus... A fábrica em qual prestei serviço, Clara...
– O que será que provocou isso? – perguntou Clara, surpresa, indo para perto do marido.
Nathaly chegou com o seu vestido e rosto encardido de fumaça. Seus pais ouviram o abrir e o fechar da porta, e olharam em sua direção.
– Eu estive lá – disse Nathaly, sendo direta, já presumindo a notícia vinda do aparelho.
– Nathaly – Clara correu para perto da filha –, você não se machucou?
– Ainda estou me cicatrizando na boca – respondeu.
– A questão não é ela ter ou não se machucado, Clara. – Steven se endireitou, e andou um pouco para frente. – A questão é o que ela estava fazendo lá.
– Talvez, ela achou que você ainda estivesse lá, querido – disse Clara, olhando para o esposo e para a filha.
– Não, mãe. Não fui procurar o meu pai.
Nathaly começou a falar sobre o motivo de ir ao endereço e as consequências que levaram à destruição do lugar e a morte de Max.
– Você disse que não se aliaria a essa pessoa que se declara como sua mãe.
– Mas eu tive que evitar que algo viesse prejudicar vocês e os meus amigos, pai. Ela me alertou sobre aquele projeto. Eu me senti sem escolha.
– E você não vê que você foi conspirada por ela, uma pessoa que nem mostra sua face? – O pai se aproximou da filha, pegando-a delicadamente pelos antebraços. – Somos nós que somos a sua verdadeira família. Você tem o nosso sangue, filha. Não são os seus dons que vão justificar ao contrário.
Nathaly se encontrava em seu quarto, sentada em seu mesário, tentando fazer as lições de casa. Mas não estava tendo cabeça para isso. Ela fechou os seus livros e o seu caderno, e colocou os seus braços sobre eles, estando a pensar. Um moderado vento batia na porta de sua varanda. Como a porta estava entreaberta, o vento teve a força suficiente para empurrá-la e abri-la, bem devagar. Ouvindo aquele gemido da porta, Nathaly levantou sua cabeça e olhou para trás. Ela ficou sentada de lado na cadeira com um de seus braços sobre o encosto por um tempo, até que decidiu se levantar para ir à varanda. Seus delicados passos mostravam cautela. Ela saiu, estando exposta àquele vento, que era fresquinho; mas tornava-se gelado conforme o tempo de exposição.
– Obrigada por retroceder em sua decisão, filha. – Uma voz veio aos seus ouvidos. Àquela voz parecia estar mesclada com o vento, trazendo-a até ela.
Ela logo a reconheceu enquanto seus cabelos eram agitados pelo vento, e olhou para um céu parcialmente nublado naquela noite.
– É você... Não me chame de filha! Eu já disse que tenho uma família, que me ama como eu sou.
– Eu também a amo como você é. Eu tive a honra de fazê-la assim – respondeu, sempre em um tom suave, quase que orquestral. – Seus pais tentam lhe convencer que eles são os únicos em sua vida. Mas não são.
– Você tem lido a mente deles? É isso?
– Não. Percebo em suas preocupações quanto ao caminho a seguir. E como mãe, eu sinto o que você sente.
– Não é possível... Não é possível que isso esteja acontecendo. Estou sendo vigiada por você! – indignou-se, colocando as mãos sobre a cabeça e fechando os olhos. – Saia da minha mente...
– Não faça isso, filha. Eu ainda tenho que falar algo para ti...
– Não! Você não faz parte da minha vida. Saia dos meus ouvidos. Saia dos meus pensamentos!
Devido àquela determinação e concentração ao máximo, Nathaly não ouviu mais a voz da Mãe Natureza. Inclusive, o vento que soprava parou imediatamente de soprar sobre o alto da casa. Então ela abriu os olhos, e percebera que tudo sumiu. Mais aliviada quando colocou sua mão na altura do peito, ela virou-se para entrar no quarto novamente, pois já estava com o seu corpo gelado. Erguendo sua cabeça, viu alguém parado na porta.
– Allan? – disse Nathaly, com os braços cruzados por causa do frio que sentia.
– Com quem estava falando? Eu ouvi você.
Mais uma vez, Nathaly teve aquela engolida seca. E não era à toa. Já eram duas prováveis evidências que o namorado poderia ter dela sobre coisas anormais. E foi ali, no quarto, que ela contou tudo para ele. Sim. Ela revelou que tinha dons, como prova, aquela emissão dos raios de calor sobre aquele porta-retrato que o próprio Allan presenciou, e sobre a conversa na varanda. Allan a olhava fazendo mistério em sua expressão, sendo impossível saber se ele aceitaria ou não aquela verdade. Para aumentar aquela apreensão, os dois estavam de pé, um de frente para outro; porém, estavam distantes, bem distantes.
– Se você não me aceita mais por causa dos meus dons ou por me achar uma louca ou uma aberração...
Nathaly ergueu a mão que estava a aliança de namoro à meia altura e, com os dedos indicador e polegar da outra mão, começou tirá-la lentamente do dedo.
– Não! – Ele correu para perto – Não tire a aliança do seu dedo... Eu apenas fiquei surpreso por isso.
Ela tomou um leve susto com aquela reação tão inesperada da parte dele, logo no momento em que ela quase se desfazia do anel.
– E seus pais sabem disso?
– Ninguém mais sabe, se não vocês.
– Bem... – Ele ria para dentro, sem jeito – Acho que terei mais de uma sogra, então.
– Eu não a considero como a minha mãe – disse Nathaly, cruzando os braços sob um olhar sério.
– Já que foi ela quem lhe deu esses dons... uma herança há. E se há herança...
Allan notou sua namorada encurvando a cabeça. Ele agiu rápido àquela ação, abraçando-a.
– Eu sei que não é fácil, Nathaly... Eu sei que não é.
Com a cabeça sobre o ombro dela enquanto a abraçava, ele não fazia sinais expressivos. Apenas estava com uma expressão muito neutra. Olhando, não era possível decifrar o que ele realmente pensava naquele instante do abraço.
Sob a escuridão da Floresta Amazônica, porém com grandes refletores mirados na terra, os cientistas da Butzek Corporation trabalhavam intensamente em escavações profundas. Um dos responsáveis em cavar o chão sentiu sua pá batendo em algo duro, fazendo um barulho no atrito involuntário. Ele chamou os demais que estavam por perto para ajudá-lo. Então, todos cavaram juntos, achando algo muito raro, uma descoberta.
– Vejam isso – disse o escavador que pediu a ajuda, agachando-se lentamente. Com as luvas em mãos, ele pegou o que acabara de achar.
– Impressionante – admirou-se o outro do grupo.
Eles acharam um cristal em formato de um diamante. Seu tamanho era de aproximadamente cem milímetros – ou seja, dez centímetros – de diâmetro. Era de cor azulada e possuía uma transparência nítida, sendo possível ver o outro lado – a refração à luz poderia trazer mais dessa nitidez. – O incrível do material era que sequer um grão de terra permanecera sobre ele, não grudando, deixando-o com uma aparência nova, limpa. Nem parecia que estava soterrado.
– O que fazem parados aí? – estranhou um cientista, que liderava o trabalho.
– Achamos isto. – Mostrou-o.
O cientista ficou admirado com aquele cristal. Aquela admiração era perceptível em seus olhos.
– Levem o sólido para o container. Vamos tentar examiná-lo depois – disse ele. – Bom trabalho quanto a isso, rapazes.
Ele se retirou. Então, o escavador levou o cristal até as mãos de outro cientista da equipe. Este continuou a levá-lo para o interior do container para isolamento e eventual estudo. A aparência do cristal-diamante pareceu cativá-los e intrigá-los bastante, mais do que eles apresentavam estar.
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