Trecho Encontrado do Diário do já Finado Dr. Marajar

Dezesseis de dezembro

De todos os casos que venho lidando ao longo dos anos, creio este ser o que mais me provocou indignação. O caso que tenho em mãos é o de um sujeito verdadeiramente solitário, um vagamundo de feições vagas com o futuro incerto. Raimundo Gaarder, filho único de uma família respeitável, com bonança monetária devido aos empreendimentos bem sucedidos do pai na mineração de ouro na região do Deserto das Dores.

O rapaz, bonito, que usa sobretudos de marcas respeitadas daqui da Capital, de pele morena e cabelos negros lisos e desengonçados — certamente por escolha própria — veio diretamente a Venetogrado para receber um tratamento para seu transtorno mental.

Tento ser gentil por se tratar de um paciente e em respeito às suas origens. Mas dentro de mim, gostaria de ralhar com ele para largar dessa estupidez. Ora, tantos jovens em situação muito pior que a dele conseguem viver com tranquilidade sem nem questionar o seu "propósito"! Ora essa, estuda em uma universidade, tem amigos, renda e certamente terá pretendentes. Que motivo teria para tão infundada melancolia?

No meu tempo, os jovens não tinham essas cabeças de vento. Eram às guerras que prestávamos atenção, tendo que equilibrar trabalho à tarde e estudo à noite, fora lidar com a bendita violência das gangues. Hoje vivemos no melhor período da história de Fantasto. De paz! E ainda assim, existem rapazinhos que tropeçam em si mesmos.

Bem, um paciente é um paciente. Pelas gravações enviadas por um psicólogo colega de profissão, o rapaz ainda não se recuperou do choque de passar tantos dias preso nas ruínas da extinta civilização Maura e, segundo o próprio, "das dores da vida". É notório que o Dr. Graciano tentou ao máximo cuidar do paciente do modo convencional. Então, já sem esperanças, indicou-lhe um psiquiatra para receitar algumas drogas. Ou mesmo poções!

[...] Não acho que as drogas serão capazes de controlar as deliberações do rapaz, mas não custa tentar. Se não surtirem efeito, a lobotomia há de ser o melhor remédio. Certos colegas já começaram a aplicá-la com resultados extraordinários contra a histeria. Talvez seja disso que Raimundo precise.


Junto a partes do diário do Dr. Marajar, os historiadores e cronistas também encontraram a gravação completa das conversas entre o paciente e o psicólogo que o recomendou, sendo parte destas aqui transcritas.

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