Largo do Marechal, Venetogrado, 18 de janeiro de 800 D.F.

Estimado amigo,

Pensei muito no que o senhor me disse no dia anterior. Naquela sua quebra de ética profissional.

Um rapaz inteligente, engraçado e francamente um ótimo contador de história com um ótimo futuro pela frente. É o que penso sobre Raimundo. O motivo de tê-lo trazido ao senhor é francamente meu medo do rapaz adoecer depois daqueles onze dias fatídicos no subsolo. Diante de tanto estresse e o pouco avanço que teve na terapia. Mas ainda há esperanças.

Por favor, seja gentil ao rapaz. Nesses tempos de incerteza, é natural que a nova geração seja a mais transtornada até então. O mundo não é mais o mesmo, com a velocidade na circulação de informações pelo rádio e o enfraquecimento de nossa relação com a magia. Em um mundo sem guerras, de paz, esse jovens não conseguem achar um propósito para si próprios. Nem mesmo os melhores psicólogos e antropólogos entendem o que está acontecendo e que consequências as tecnologias terão nas nossa vidas. Seja solidário ao rapaz, esse é seu dever como o profissional de saúde e adulto que é o senhor.

Era de se esperar que mesmo depois de medalhas, atenção da mídia e quase morte, o rapaz ainda não estaria bem. Ou que lidaria melhor com seus sentimentos de rejeição A mente humana é um mistério não só como adoece, mas como percebe seus arredores. Só filosofia e uma vida virtuosa não ajudam a nossa mente. Então, por favor, rogo-lhe! Prescreva um tratamento sério ao rapaz e, opinião de amigo, não aplique a lobotomia. Minha pobre esposa até hoje não se recuperou do procedimento. Não sente mais nada, mal vive.

Jamais perdoaria o senhor se aplicasse num jovem tamanha barbaridade. Por favor, reflita. Estes são novos tempos, nova geração, novos problemas. Com nossas cabeças retrógradas, somos incapazes de acompanhar o que se passa com nossos jovens e é nosso dever como profissionais tentar tratá-los com toda a dignidade possível.

Atenciosamente, Dr. Graciano Musil