VII
Benjamin ficou inquieto naquela noite, não conseguiu dormir de forma alguma. Revirou-se na cama tantas vezes, que os lençóis amanhecerem completamente bagunçados. Por mais que tentasse colocar as lembranças no fundo da sua memória, elas voltavam com uma tempestade em alto-mar.
Era perturbador admitir e sentir, mas o reencontro com John o fez perceber o quão sentia falta daquela amizade, que há tantos anos tinha sido perfeita, sem nenhum defeito.
Levantou-se da cama determinado a esquecer aquele assunto, precisava de alguma distração, algo que o fizesse ficar ocupado por horas, e como consequência, o deixasse cansado o suficiente apenas para se jogar na cama e dormir. Então se lembrou dos colonos, fazia muito tempo que não iria visitá-los, tinha deixado essa incumbência para sua mãe enquanto estava viajando pelo mundo.
Abriu as cortinas do seu quarto observando como estava o clima; bastante nublado, como era de se esperar.
— Milorde, bom dia. Deseja tomar seu desjejum no quarto?
— Não, vou descer. Obrigado.
— Precisa de alguma coisa?
— Não, pode ir.
O homem assentiu e saiu do quarto.
Benjamin se arrumou rápido, estava completamente faminto. Provavelmente encheria seu prato com muita comida, o que com certeza faria sua mãe reclamar por ser falta de educação. Comer muito não era falta de educação, era uma necessidade do corpo.
Desceu em direção a sala de jantar animado, cantarolando sua música escocesa preferida.
Esbarrou com seu mordomo no meio do corredor. O homem parecia ansioso para comunicar alguma coisa, o que fez ele arquear as sobrancelhas, pois não tinha muito tempo que tinha saído do seu quarto.
— Milorde.
— Aconteceu alguma coisa?
— O visconde de Falkland deseja conversar com o senhor.
— John está aqui? — perguntou atordoado, o motivo da sua insônia estava simplesmente esperando por ele algum lugar da sua casa.
— Sim, milorde.
— Onde ele está?
— Pediu para ir até seu escritório, não pude impedi-lo.
— Não se preocupe.
Andou até seu escritório.
A fome que estava sentindo desapareceu no mesmo instante em que imaginou qual seria o assunto que John queria tratar. Praguejou mentalmente, ele tinha ficado anos sem se comunicar, sem nenhuma explicação, e quando resolveu dar, escolheu justamente a manhã, estragando seus planos de ter uma alimentação em paz.
Abriu a porta do seu escritório, avistando John sentado em uma poltrona em frente à mesa. Seu olhar estava perdido em alguma das prateleiras, não saberia dizer qual.
Seu antigo amigo ainda não tinha entrado naquele lugar com ele sendo conde, era a primeira vez. E Benjamin jamais pensou um dia que fosse daquela maneira.
— John.
— Benjamin. — o visconde saiu do seu devaneio, se levantando da poltrona. — Graças ao bom Deus, pensei que não fosse me receber.
— Era o que deveria ser feito. — fez um gesto para que ele voltasse a se sentar. — Odeio o fato da minha curiosidade ser maior do que tudo. Na verdade, acho que temos muitas lacunas para serem preenchidas. Porque eu nunca soube de muitas coisas, apenas por alguns deslizes fui descobrindo os segredos que me rondavam. — sentou-se na antiga poltrona de couro do seu pai. — Por quanto tempo fugiria de mim?
John encolheu os ombros, colocando as mãos em cima da mesa.
— Sinceramente? Por muitos anos ainda. Não esperava encontrá-lo na casa da Sra. Harrison, foi uma grande surpresa. A verdade é que nunca mais tive coragem de olhar em seus olhos, você não merecia ser traído. Nunca fui religioso, sabe muito bem disso, mas naquela época eu fui muito. Pedi a Deus para conseguir achar uma solução, algum meio de me dar coragem para conversar, explicar tudo. Conheci Madison antes do seu pai e o pai dela fazerem o acordo do casamento de vocês.
— Lembro quando me contou que estava arruinado por estar começando a se apaixonar por uma mulher, que pediria para permissão para cortejá-la. Queria fazer segredo, pois iria me apresentar em algum baile em Londres. Tinha medo de que não fosse correspondido, e eu perturbasse eternamente sua fase apaixonado, sendo um libertino como era. — aquela lembrança o fez sorrir. — Com certeza eu perturbaria.
— Todo baile nos encontrávamos, conversávamos, conhecendo um ao outro. Benjamin, ela era a mulher perfeita para mim. Nosso primeiro beijo foi na estufa do duque de Westminster, em um baile tão lindo quanto nosso primeiro momento a sós. E, naquela noite, fui o homem mais feliz do mundo. — suspirou. — Até que ela me enviou uma carta dizendo que iria se casar. Fiquei desesperado, era surreal termos trocados tantas promessas, para depois ela decidir se casar com outro. Fui atrás de respostas, e fiquei perplexo com elas. O amor da minha vida estava noiva do meu melhor amigo. Senti tantos sentimentos naquele dia, que em algum momento pensei que iria explodir, estava sendo insuportável. Quando comecei a me distanciar, não foi fácil, não mesmo, estava odiando olhar no seu rosto. — encarou Benjamin nos olhos pela primeira vez.
— Poderia ter me contado. — sussurrou, quase sem voz. — Alguma coisa teria sido feita.
John deu uma pequena risada.
— Benjamin Lawson traindo o pai? Por favor, nunca desafiaria o conde a tal ponto. Sempre quis ter a aprovação dele, e conseguiu muito bem.
— Não pode afirmar como seria minha reação! — alterou a voz. — Éramos amigos, eu não amava Madison, nunca desejei esse casamento. Poderia muito bem ajudá-los a fugir para se casar. Pelo amor de Deus, se ao menos fosse sincero comigo, não estaríamos aqui hoje com tantas mágoas. Eu teria o maior orgulho de ter ajudado meu melhor amigo a ter sua amada.
Benjamin respirou fundo, antes de olhar novamente para John sem querer acertar um murro no rosto perfeito dele.
— Madison me contou absolutamente tudo.
— Tudo? — perguntou surpreso
— Sim, tudo. — ele deveria estar se referindo aos encontros escondidos deles, após do casamento.
— Santo Deus. — seu rosto ficou corado.
— Apenas não entendo o motivo de não ter vindo vê-la em seus últimos dias de vida. Ela o chamou, muitas e muitas vezes. Posso não me recordar exatamente das minhas palavras, mas implorei por sua volta. Madison precisava de você. Independentemente de qualquer coisa, tinha a obrigação de ter vindo. — sua voz ficou embargada. — Volta e meia tenho pesadelos com ela doente em cima daquela calma. Lembro perfeitamente do último suspiro dela. Foi um dos piores momentos da minha vida. — lágrimas começaram a descer por seu rosto. — E sabe o que desejei? Sua presença ao meu lado, principalmente ao lado dela. Mesmo que tenha enviado sua mãe com as flores preferidas de Madison, era você quem deveria estar ali. John, tenho milhões de motivos para odiá-lo, mas o que mais me faz ter mágoa de você, foi sua ausência. — levantou-se da poltrona. — Nunca tive irmãos de sangue, no entanto, Deus o colocou no meu caminho. Sinto muito que tenhamos chegado nesse ponto, realmente sinto muito. Um dia quero conseguir cumprimentá-lo sem pensar em coisas ruins. Desejo apenas sua felicidade, John Parker. Acho que acabamos por aqui.
— Ben...
— Acho que muitas coisas ficaram claras, John. — colocou a mão no ombro. — E uma delas foi a sua covardia.
Afastou-se do visconde, que estava pálido.
E saiu da biblioteca.
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