Capítulo 16
Lei LongWei
Minha mente estava confusa, como um mar revolto. Não existia razão, reflexão ou medo. Apenas ódio e fúria animalesca que me devoravam, como canibais arrancando pedaços de carne sem nenhuma consideração. Eu não distinguia ninguém, não reconhecia ou definia rostos, eram todos meus inimigos e todos deveriam morrer. Minha barriga esquentou e jorrei, sobre a massa indistinguível de pessoas, mais um mar de lava vulcânica. Seus gritos eram músicas aos meus ouvidos. Vingança.
Mais daquelas flechas se afundaram em minha pele, estavam mais para arpões gigantes. A dor atiçava mais da minha loucura, minha essência primordial se descascando em traços de poder, a energia que não havia se recuperado, mas se esvaía cada vez mais rápido. Não demoraria muita para meu ódio me custar caro demais.
Mas, não havia retorno. Já perdi muito do meu povo e de mim mesmo.
Meu qi estava acabando tão rápido que a tontura me alcançava, a visão se obscurecia num alerta para a energia baixa.
Jorrei mais fogo sobre as ameaças abaixo.
O ambiente de mármore vulcânico, as colunas com dragões talhados, aquela era a sala do trono do Palácio das Nuvens. Eu vestia a roupa do dia da coroação, o dragão bordado em fios de ouro ocupava a frente do meu hanfu preto. Meus súditos estavam ali, a festa era ouvida mesmo pelos grossos muros do castelo, glorificavam meu nome, desejando benesses ao bixia.
Me levantei do trono e o cenário mudou. Era um descampado, ossadas de dragões cobriam cada canto da grama amarelada. Meu povo. Morto. Ódio, raiva e ira ferveu dentro de mim, borbulhando e se derramando, não havia mais nada na minha mente além de vingança.
– Mate todos eles. – disse uma voz, parecia a minha voz. – Não detenha a espada, a pegue para si e queime seus inimigos até as cinzas.
– Mate eles. Vamos, pegue a espada! – insistiu outra voz.
– Que espada? – eu perguntei absorto, a vingança engolindo minha mente.
– Essa espada.
Um vento me empurrou, um raio de luz riscando o céu. Um cometa descia a terra, sua imensa massa se chocando contra o solo a poucos centímetros de mim. O impacto me fez cair dos céus e rolar pelo chão. Minha forma se contraiu e eu voltei a ser humano. Havia ferimentos em todas as partes do meu corpo, eu mais parecia uma ferida gigante do que algo humano. Sangue ardeu nos pulmões, tossi e escarrei o líquido rubro.
Cada músculo estava dolorido, esticado, como se eu tivesse sido torturado por dias. Pedras brilhavam ao meu redor, uma canção macabra subia entre lamentos de vozes humanas. Magia de espectro, percebi tarde demais. Senti uma agulhada, algo me adentrava pelo ferimento em meu peito, uma dor sobre-humana me fez revirar os olhos. Gritei, mãos escavando o peito. Meu corpo se contraiu, cai ao chão, algo se enrosva em meus ossos, rodeava meu coração como uma mão pesada e cruel. Lágrimas de dor me escaparam, meus gritos subiram junto aos lamentos humanos. Um choque passou pela minha coluna, meus músculos espasmaram. Parou. Respirei, a dor sumiu tão rapido, o alívio me fez arfar. Então, a voz em minha cabeça estava mais alta, reverberando pela minha mente.
– Pegue a espada e vingue seu povo, não é isso que quer? – Incentivou uma voz.
– Eles mataram seu povo, um a um. – adicionou outra.
Eu via os dragões caindo, como as gotas de chuva.
– Seus pais, seus tios, seus primos. Machucaram a sua irmã, ela nunca poderá voar e morrerá cedo.
– Nunca vai voar. – murmúrios se somavam à voz principal.
– Pegue a espada! – urrou impaciente.
O ódio me consumia, mordida atrás de mordida.
Imerso em caos, me ergui, desengonçado, como uma marionete sendo movida por um principiante. Atrás da nuvem de poeira, uma escuridão me chamava. Lá estava a lâmina negra, opaca, brilho algum era emitindo, era como um pedaço material das trevas.
Uma voz ao longe gritava algo, mas não chegava aos meus ouvidos. Não havia ninguém e nada que fosse tão importante quanto aquela espada. Minha vingança seria, enfim, cumprida e para isso, era só empunhá-la. Mais um passo para perto, as vozes estavam altas.
– Pegue a espada, queime cada um dos seus inimigos. Os veja implorar por clemência aos seus pés, como você fez um dia.
Fechei os olhos. Vi Seitas de cultivações em chamas, corpos de humanos se somando em montes de cadáveres pútridos. Eles corriam de mim, temiam meu nome. Não ousavam olhar para mim com desprezo.
Assim, eu tomei a espada. Seu punho se encaixava perfeitamente em minha palma, como se fosse feita para ser usada por mim. Um véu de escuridão se manifestou em meu entorno, me vestindo de preto, curando meu corpo. Meu ódio maquiava minhas feridas e me fortificava como uma muralha.
Quando abri os olhos, minhas emoções não existiam, eu só pensava em uma coisa: matar.
– Bixia, solte a espada! – falou um homem de cuja identidade eu desconhecia.
Não respondi, um olhar meu e eles foram jogados a metros de distância, batendo contra os troncos das poucas árvores restantes. Não eram ninguém, mas também não eram meu alvo, por isso eu não precisava perder tempo com eles. Cultivadores vieram em ondas, eu os eliminei como se fossem nada além de formigas, sendo esmagadas. Vingança, só queria todos os cultivadores mortos, então poderia abdicar da minha alma.
Sim, eu me entregaria às trevas de bom grado.
Quanto mais sucumbia, mas minha mente se eclipsava e menos controle eu tinha das minhas próprias ações.
Um chute. Tombei para o lado e bolei no solo pedregoso.
– Me devolva, meu Lei Long Wei! – rugiu um desconhecido, ele brilhava como um deus.
Franzi o cenho, eu o conhecia. A sensação era forte o bastante para me fazer hesitar.
"Vingança, apenas pense em vingança, se lembra do que nos prometeu?" Minha mente voltou a vagar enquanto meu corpo se movia atacando e golpeando vorazmente aquele homem. Ele era forte, sua espada tinha a exata energia oposta e potente o suficiente para aguentar golpe atrás de golpe.
– Por favor! Não posso te perder, está ouvido?
Sua voz, ele é alguém importante para mim, mas eu não conseguia lembrar. O próximo golpe lhe arrancou sangue, mas ele conseguiu se afastar a tempo, ou sua vida teria sido ceifada.
– Não faça isso! Lei LongWei! Vingança não vai te levar a nada! Vai consumir a sua alma e te deixar vazio! Exatamente como o demônio Xing Tian quer! Ele deseja tomar seu corpo, não pode ceder ao ódio ou à vingança, ou ele o devorará! Por favor, Lei LongWei! Não me deixe!
Parei. Ele despertava algo em mim, como uma gota de esperança em meio ao turbilhão do caos. A palavra amor veio de alguma parte de mim. Não. Eu era como um deserto árido, não havia sentimentos e nem muito menos amor. A espada desceu alguns centímetros.
Não. Parei de novo.
Havia algo nos recantos da minha mente.
Vi minha irmã, seu sorriso fazendo seus olhos se assimilarem a duas luas crescentes, "enquanto tivermos um ao outro podemos aguentar tudo". Minhas mãos tremeram.
Outro flash, Chao KangLi me dando um abraço, "vamos nos esforçar, juntos! Vamos conseguir sobreviver!". Vi rostos me encarando com esperança cintilando nos olhos, "viva ao Bixia, que sua vontade de fogo queime pela eternidade".
Mais uma memória me tomou a mente, eu fugia, quando bati em algo e caí no chão, quando ergui o olhar, lá estava o homem vestido de verde, responsável por me mostrar que até num deserto há um oásis.
"Amor? Não seja tolo! Mate e cumpra a sua parte da promessa".
O ódio é como segurar um carvão em brasa na intenção de jogar em alguém, é você quem se queima (Buda). Depois de tantos anos, entendi que se continuasse nesse caminho, por mais que eu tivesse razão, por mais que fosse a vítima ali, eu me perderia.
"Não pode fazer isso! MATE ELE! AGORA!"
"Não. Eu decido isso e não você", repliquei.
A minha vingança será meu povo se reerguendo e não mais mortes.
Esse ciclo de dor e sangue termina aqui.
Larguei a espada. Trôpego dei alguns passos, trevas me envolvendo como um redemoinho, algo obscuro rondava meu peito, uma pressão forte me fez curvar, uma substância pastosa e escura começou a sair pela minha boca. Me queimava, gemi, mas vômito escuro, um gosto de podre me fez arquear. Meus corpo esquentava e esfriava, mais vômito e algo serpenteou, sendo projetada para fora. A coisa me deixou, abandonando meu corpo mole. Era uma cobra, que rapidamente sumiu em alguma brecha entre as pedras.
Minha visão estava borrada, desabei no chão, eu me sentia fraco. A espada virou piche e sumiu na terra, como se nunca tivesse existido, mas eu sabia que entraria em sono e um dia tentaria retornar.
Liu YuanQi me pegou em seus braços, antes que eu alcançasse o chão, ele me abraçou forte.
– Por um momento achei que te perderia.
– Eu nunca te deixaria. Enquanto existir, serei seu. Seus inimigos serão os meus, seus amigos serão os meus, o seu destino será o meu. -- minha voz arranhava a minha garganta.
– Isso é uma promessa? – ele perguntou com um sorriso florescendo em seus lábios rosados.
– Sim, é uma promessa.
– Então, eu também a farei. Enquanto existir, serei seu. Seus inimigos serão os meus, seus amigos serão os meus, o seu destino será o meu. Sou um imortal e a minha imortalidade será vivida ao seu lado.
Ele beijou suavemente meus lábios, como se selasse nosso juramento.
E naquele momento entendi, que mil espadas poderiam ser forjadas, mil lâminas poderiam ser afiadas e polidas, mas na batalha contra a escuridão e o caos, só uma séria realmente a espada que corta as trevas: o amor.
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