Special Rafe pt. 02

Rafe sentia suas mãos trêmulas apertarem com ainda mais força o volante, deixando o carro instável por causa da alta velocidade.

Ele queria se acalmar, mas Louis não saía da sua cabeça. A forma como ele envelheceu maravilhosamente bem também não ajudava.

Ele só queria voltar até o restaurante e socar a cara daquele maldito, ou talvez beijá-lo.

Rafe socou o volante, percebendo pela primeira vez que Heitor estava ao seu lado.

O garoto havia pulado assustado com seu rompante de nervoso e agora tremia dos pés a cabeça.

- H. Eih! - Rafe sussurrou com a voz grave e instável. - Eu preciso me acalmar, mas não consigo se não fizer o mesmo. Pode fazer isso por mim?

Ele não precisava de Heitor para se controlar, aprendeu a fazer isso há muito tempo. Rafe até tinha um lugar especial para enfiar pensamentos que ele preferia esquecer, mas isso ajudou Heitor que agora hiperventilava um pouco mais, moderadamente?!

- Obrigado baby. - Rafe deu um meio sorriso, apertando a mão pequena de Heitor e a trazendo para o seu colo. - Desculpa estragar sua noite. Por que não te levo pra casa e amanhã tentamos jantar em algum lugar calmo?  - Rafe disse distraído com o fato de que ele não fazia ideia pra onde estava indo, até falar aquilo.

- Na verdade… - Heitor sussurrou tímido. Tentando criar coragem para dizer o que tinha pra dizer. - Eu sei que está tentando se acalmar por mim, mas não vai conseguir assim. - Heitor se remexeu no banco do carro. - Deixa eu te ajudar Rafe.

Rafe travou a mandíbula, as pupilas dilatando enquanto suas mãos ardiam com um desejo silencioso de corromper toda aquela inocência nos olhos de Heitor.

- Baby, não acho...

- Por favor. - Heitor se soltou da mão livre de Rafe para alisar sua coxa, os dedos inseguros trilhando um caminho um tanto quanto óbvio.

Rafe não o impediu, mas precisou se controlar para não parar o carro ali mesmo, assim que sentiu Heitor acariciando um começo de ereção no meio das suas pernas.

Ele virou o carro abruptamente, fazendo os pneus reclamarem a medida que voltava com o carro na direção da sua casa.

Ele não deveria, não era em Heitor que ele iria pensar, não estava com humor para medir as consequências de seus atos. Não era certo.

- Eu quero. - Heitor disse baixinho. - Não estou com medo.

Ele sabia.

Sabia exatamente em que Rafe estava pensando.

Rafe estacionou o carro de qualquer jeito em frente ao prédio e saiu com uma nova urgência demonstrada em cada movimento que fazia.

Sua mão nas costas de Heitor guiava o caminho, deixando o menor menos inseguro, mais confiante.

Art. não estava em casa e ele agradeceu aos céus por isso.

Rafe girou Heitor para beijar sua boca, seus dedos o seguraram pelo queixo. Aqueles olhos brilhavam com cada gesto seu.

Ele adorava o jeito que Heitor o idolatrava com seu olhar suplicante.

- Você tem certeza? - Ele perguntou impaciente, beijando o Heitor de um jeito calmo, quase apaixonado. Ele nunca o beijava. O mais velho suspirou assustado e maravilhado com aquilo, implorando por mais de um jeito quase desesperado.

Era impossível Heitor dizer não agora e Rafe sabia. Ele sempre sabia o que estava fazendo.

Heitor estava em cima da cama agora, sua bunda ainda ardia das cintadas recentes, seus punhos estavam marcados com manchas roxas e vermelhas e sua entrada estava um pouco machucada, então ele não entendeu porquê Rafe o encarava com certa adoração.

Ele abaixou a cabeça, agora que havia tirado a última peça de roupa do corpo.

- Levanta a cabeça. - Rafe ordenou, assistindo o garoto obedecer de imediato.

Heitor tinha olhos brilhantes, a boca rosada e cheia, as bochechas avermelhadas enfeitadas por sardas quase imperceptíveis. O cabelo castanho se enriquecia de fios dourados e cobre quando contrastado com a luz, seu corpo delicado estava cheio de marcas, marcas dele.

- Você é tão lindo. - Rafe disse se aproximando.

Heitor sorriu tímido, lembrando de não abaixar a cabeça para esconder a vergonha.

Rafe sorriu, apreciando sua obediência.

- Eu não quero te machucar, mas não consigo evitar sentir vontade de te fazer gritar de prazer por minha causa.

Heitor suspirou baixinho, fazendo um biquinho delicado ao ter o ar passando graciosamente por seus lábios.

Rafe xingou baixinho.

Ele sabia que não deveria. Não deveria tratar Heitor daquela forma, mas não conseguia evitar.

Por que não conseguia evitar?

- Preciso da sua permissão H. - Rafe disse, como sempre, antes de começar.

Heitor engoliu em seco, sua ereção apontando em seu estômago de maneira vergonhosa.

Ele odiava o quanto Rafe mexia com ele, o jeito que ele andava, a forma que suas mãos penteava seu cabelo pra trás, os olhos penetrantes, a língua umedecendo os lábios.

- Por favor. - Heitor pediu rouco, adorando o sorriso de canto que Rafe devolveu em resposta.

- De quatro. - Rafe girou o dedo no ar, indicando que Heitor virasse a bunda na sua direção.

Ele obedeceu o mais rápido que pôde.

Rafe admirou Heitor de quatro, com aquela bunda toda marcada, empinada na sua direção.

Porra!

Ele apertou o volume na sua calça, mordendo os lábios sem querer no processo.

Suas mãos bateram de leve nas costas do Heitor e ele abaixou o corpo, deixando só a bunda para cima.

Rafe colocou um travesseiro no estômago do mais velho, para que ele não sufocasse com o rosto nos lençóis. Foi até a cômoda e tirou algemas duplas de metal.

O barulho de correntes fez um arrepio subir pela coluna de Heitor, o desestabilizando e ele quase caiu na cama, mas Rafe o sustentou a tempo.

Ele prendeu as algemas no tornozelo de Heitor, suas pernas foram para o ar, o fazendo cair com o resto do corpo na cama.

Heitor tremia um pouco, principalmente quando Rafe puxou suas mãos para trás, as prendendo com a outra parte da algema.

Suas mãos estavam atadas ao seu tornozelo agora. Ele tentou se mexer, mas a dor em seus punhos já machucados era insuportável.

Rafe abriu as pernas de Heitor, o deixando completamente exposto, imóvel e vulnerável.

Heitor ouviu Rafe passeando pelo quarto. Suas pernas formigavam por estarem para o alto e seu ombro doía com a posição desconfortável. Sua boca estava seca, mas ainda assim ele gemeu surpreso quando sentiu o lubrificante sendo esparramado na sua entrada. Era tão gelado que o fez suspirar aliviado, já que sua entrada pulsava e queimava.

Rafe colocou dois dedos dentro de Heitor. Ele não era delicado ou paciente, mas fazia Heitor implorar por mais toda vez. Porque ele simplesmente sabia como fazer cada toque calculado virar algo inesquecível.

Heitor gemeu, choramingando manhoso ao receber o terceiro dedo dentro dele. Ele queria que Rafe desse mais atenção ao que fazia. Seu rosto virado de lado para o espelho em frente a cama não podia lhe dar a visão de tudo, mas ele conseguia enxergar Rafe distraído, alheio a tudo isso.

- Rafe, não estou te agradando? - Heitor perguntou com lágrimas nos olhos.

Rafe encarou seu reflexo por muito tempo o fazendo se arrepender da pergunta idiota, mas ainda assim Rafe não disse nada.

Heitor estava confuso, mas era difícil se concentrar, principalmente quando Rafe achou sua próstata e acelerava ainda mais o movimento dos seus dedos. Quando ele pensou que iria gozar Rafe tirou os dedos de dentro dele e voltou a caminhar pelo quarto, deixando Heitor frustrado e com a respiração entrecortada.

Rafe parou entres as pernas levantadas de Heitor tempo depois, o deixando apreensivo e sem saber o que aconteceria.

Suas dúvidas foram respondidas quando sentiu o vibrador grosso, sem lubrificante, invadindo sua entrada mais rápido do que gostaria.

- Rafe.

- Você não merece que eu pegue leve, baby. Por que precisava me questionar, quando tudo que eu queria era te fazer se sentir bem?

Heitor sentiu o grito escapar de sua garganta. Seu pau pulsava dolorido, sujando o travesseiro abaixo dele com pré gozo. Ele queria se mexer, mas as algemas impediam qualquer movimento.

Saliva escorria da sua língua quando ele foi completamente preenchido. Heitor suspirou aliviado pelas pontadas de dor finalmente acabarem, mas durou só até Rafe inclinar o vibrador para atingir o local exato da sua próstata e ligar o maldito aparelho na velocidade máxima.

Ele berrou mais uma vez, a vibração era forte demais, todo seu sangue parecia ter se concentrado num único lugar.

Heitor gozou tanto, que ele pensou se perderia a consciência dessa vez.

Rafe voltou a andar pelo quarto, mas dessa vez ele não queria prestar atenção. O vibrador incomodava, ele estava tão sensível, só queria que aquilo parasse.

Rafe fechou a porta do banheiro, ele estava sozinho. Seus olhos encheram de lágrimas, ele só queria descansar, seu corpo inteiro doía.

Foi pouco depois dele ouvir o chuveiro ser ligado que a excitação voltou com violência, atingindo seu corpo dolorido com uma carga absurda de adrenalina, sua ereção machucava agora, mas a porra do vibrador fazia sua bunda rebolar o melhor que podia para sentí-lo surrar sua próstata novamente.

A segunda vez em que ele gozou demorou muito mais e foi tanto a melhor quanto a pior experiência da sua vida. Porque doía pra inferno e o deixava sensível demais, mas também o deixava sensível para sentir tudo numa intensidade vinte vezes maior.

Ele ainda estava chorando quando Rafe saiu do banho.

O vibrador foi desligado e o suspiro de alívio quando ele saiu de dentro da sua bunda foi muito maior de que quando entrou.

Rafe estava molhado, e seu corpo gelado. Suas mãos ágeis soltaram as algemas das mãos de Heitor, mas Heitor não se atreveu se mexer. Rafe desentrelaçou uma das correntes e voltou a prender as algemas em seus punhos, mas pelo menos agora ele conseguia abaixar as pernas.

Heitor ainda estava decidindo se podia se mexer quando Rafe o puxou pelas corrente, o colocando de pé.

Ele tropeçou, quase caiu no chão, mas Rafe o segurou.

Os lábios gelados do mais novo era como gelo em seu pescoço queimando pelo calor. Ele queria dizer que amava Rafe, porque o amava, mas era mais esperto que isso.

Os dois ouviram quando Art. chegou em casa. Heitor morria de vergonha do garoto, por isso nunca o olhava nos olhos, pelo menos ele achava que era por isso.

- Rafe? - Art. bateu na porta do quarto, fazendo Heitor tremer nos braços do mais novo.

Ele não queria ser visto assim. Rafe o segurou com mais firmeza, dando confiança para ele.

- Estou ocupado. - Rafe disse calmo, mas alto o suficiente para Art. ouvir.

Os dois ouviram Art. bufar e xingar baixinho do lado de fora do quarto.

- Tentem não fazer barulho dessa vez. Tenho que estudar. - Art. disse mais irritado do que o que poderia se considerar normal.

Rafe riu, arrepiando o pescoço de Heitor, que se sentia confuso com aquela relação agressiva dos dois.

- Ele gosta de você. - Rafe disse no ouvido de Heitor.

O mais velho não sabia o que responder, então ficou quieto.

- Você gosta dele também, baby?

Heitor voltou a tremer.

- N... não. Eu juro que não. - Heitor disse gaguejando.

 Rafe o levou a passos curtos até a parede lateral, deixando ele apoiado na parede para se afastar.

Ele voltou arrastando uma cadeira com estofado macio e braçadeiras de metal.

Rafe virou a cadeira para a parede, colocando o assento apoiado ao contrário. Heitor ficou pensando como alguém sentaria ali, mas seus pensamentos foram interrompidos ao ser  puxado com uma das mãos por Rafe, que o colocou na parte de trás da cadeira e o empurrou para frente.

Ele caiu com o rosto no assento da cadeira, sem conseguir se proteger, pois suas mãos estavam amarradas pra trás, mas acabou que não se machucou. Tinha uma almofada ali, então ele só virou o rosto, para não sufocar com ela.

Seus pés saíram do chão por um instante. Seu único apoio eram os dedos dos pés encostando no taco gelado.

Rafe ficou entre suas pernas, encaixando a glande na sua entrada ultrasensível.

O mais novo nunca fez sexo de maneira calma com ele, então ele sabia o que viria, mas não pôde evitar gritar de dor quando Rafe entrou com tudo dentro dele.

Seus pés saíram do chão na primeira estocada de Rafe. Ele sentiu sua cabeça indo nas direção da parede, mas Rafe puxou as algemas das suas mãos nas costas e seu corpo foi suspenso no ar.

Rafe segurou em seu cabelo e voltou a foder sua bunda com tanta força que era praticamente impossível não gritar.

O estofado da cadeira espremia seu pênis, ele deveria sentir dor, mas a esse ponto o estimulava.

Rafe gemeu rouco e baixo, deixando ele extasiado com o som.

Ele estava tão feliz por agradá-lo, que mal conseguia pensar.

Seus gritos iam de encontro com a parede e ele percebeu um pouco tarde que aquela era a parede que dava para o quarto de Art.

Ele fez de propósito.

Seus dentes travaram sua boca e seus gemidos eram engolidos com força.

Heitor nunca mais conseguiria sequer ficar no mesmo cômodo que Art. agora, de tanta vergonha.

Rafe o puxou pelo pescoço, afastando agressivamente seus dentes de seus lábios e o forçando abrir a boca.  

- O Art. não vai conseguir te ouvir assim, H.

- Não. Rafe, por favor. - Heitor implorou.

Rafe bufou irritado, o derrubando mais uma vez na cadeira.

- Você é meu. Ele precisava aprender isso. - Rafe disse irritado.

Ele gozou logo em seguida, saindo de dentro de Heitor que não conseguiria sair daquela posição nem se quisesse.

Foi quando a porra do mais novo escorria por sua perna que Rafe voltou até ele.

- Você é meu? - Rafe perguntou em algum lugar atrás dele.

- Sim. Eu sou seu. - Heitor disse com dificuldade, já que a posição não ajudava.

Ele gritou quando sentiu a primeira cintada queimar no lado interno da sua coxa.

A porra escorrendo só piorou em atrito com o couro.

Heitor não tinha mais controle agora. Ele gritou o mais alto que podia, gemeu ainda mais alto quando Rafe começou a masturba-lo e o fez gozar pela terceira vez, mas nada parecia saciar o mais novo e Heitor já estava se sentindo mole e quase a beira da inconsciência.  

- Eu te amo. - Heitor murmurou entre lágrimas.

Rafe parou com as cintadas e Heitor não sabia o que fazer. Ele queria sentir medo por ter escapado aquelas palavras por seus lábios, mas seu corpo estava exausto e sua mente lenta. Ele não sentiu nada.

- Então porque me abandonou. - Ele ouviu o mais novo dizer antes de deixar o sinto cair no chão.

Heitor não fazia ideia do que Rafe estava falando.


O sol queimava seu rosto. Ele havia esquecido as cortinas abertas.

Heitor estava dormindo pesadamente ao seu lado. Ele sabia que o garoto não conseguiria andar por pelo menos um dia, mas não queria cuidar dele agora. Sua mente estava agitada demais pra isso.  

- Eu não quero atrapalhar, mas preciso de um banho. - Heitor resmungou baixinho.

Rafe notou seus olhos despertos.

- Pensei que estava dormindo. - Rafe disse sem se importar muito.

- E… Eu posso voltar dormir, se quiser.

Ele ajudou o mais velho a entrar na banheira, mas precisou deixá-lo sozinho para atender a campainha irritante da porta de entrada.

Art. parece ter morrido no quarto ao lado e ele não conseguia imaginar quem seria a essa hora em pleno sábado.

Ele poderia brincar de adivinhar, mas assim que abriu a porta, descobriu que nem em um milhão de anos teria acertado o chute.

- Bom dia. - V disse entregando uma cesta de café da manhã daquelas de aeroporto,  escrito parabéns, você vai ser Papai! num cartão azul bebê pendurado na alça repleta de decoração com chocalhos e berços.

- O que faz aqui? - Rafe perguntou, jogando a cesta de café da manhã no balcão enquanto assistia V ligar a máquina de café que ninguém nunca usava.

- Vim ver como está. Imagino que tenha encontrado Louis ontem a noite?

- Não que seja da sua conta. Obrigado pelo aviso aliás.

V se virou só para sorrir inocentemente na sua direção.

A porta do seu quarto foi aberta, fazendo os dois olharem naquela direção.

Heitor estava com a camisa social que Rafe usou na noite anterior, seus cabelos molhados escorriam água pelo tecido branco, já quase transparente. Suas pernas eram tão delicadas e suas mãos puxavam para baixo a barra do tecido leve.

Tão lindo.

- Rafe. Você pode me ajudar? - Heitor mordeu os lábios, piscando várias vezes com o nervosismo.

Rafe engoliu em seco, sentindo seu pau responder prontamente a tudo aquilo. V não estava muito diferente, mas ao contrário de Rafe, algo o incomodava.

- Já vou H. , entra no quarto.

Heitor concordou um pouco ansioso e fez o que ele disse, fechando a porta com delicadeza.

V saiu do balcão, o semblante transtornado, o rosto em pura fúria.

Rafe ia dizer alguma piada sobre isso, mas foi interrompido com um tapa na cara.

Ele sentiu sangue escorrer no lado interno da sua bochecha, por ter mordido sem querer no processo, o que o fez sorrir com os dentes sujos de sangue.

- Vai me explicar por quê to apanhando? - Rafe perguntou fechando os punhos na tentativa de se controlar enquanto sorria de um jeito debochado e defensivo na direção de V.

- Você realmente não vê o que está se tornando, não é?!

Rafe enrugou a testa.

Ele abriu a boca pra perguntar que merda V queria dizer com aquilo, mas V já se distanciava dele.

- Não se mexa. - ele disse entrando no seu quarto e fechando a porta.


Heitor estava sentado na cama, seus olhos vidrados nos dedos dos seus pés. É possível imaginar o susto que ele teve ao ver um estranho entrando ali.

Ele olhou para porta em pânico, suas mãos tentando abaixar  desesperadamente a camisa que vestia.

V não olhou na sua direção, ao invés disso. Ele tirou o cachecol do pescoço, dobrou as mangas da camisa e começou a estudar o quarto em busca de algo.

- Sr. eu…

- V. Você pode me chamar de V.

O estranho sorriu amoroso para ele, o que fez seus ombros relaxarem um pouco.

Ele era alto e estonteante. Tão lindo e imponentes. Ele lembrava o Rafe.

Tanto, que era até assustador.

O estranho trouxe até ele uma maleta que pegou da gaveta, sentou ao seu lado e pegou uma de suas mãos, passando uma pomada gelada em seus machucados. Era tão bom que o fez suspirar aliviado.

Seus movimentos eram delicados e sutis, mas Heitor não conseguia não se envergonhar com aquilo.

V cuidou de todos os machucados de Heitor tirando os que não podia enxergar e que provavelmente estavam em piores condições, mas não havia muito o que ele pudesse fazer sobre isso.

Ele deu um Advil para o garoto e acariciou seus cabelos avermelhados até que dormisse. Não fazia ideia de quanto tempo tinha levado, mas pela cara de Rafe o encarando quando ele saiu do quarto, provavelmente mais tempo que o  normal.

- Ainda fuma no terraço? - V perguntou vendo Rafe concordar cismado.

- Pega o cigarro, precisamos conversar.

Rafe não sabia exatamente porque tinha apanhado, mas não parecia uma boa ideia perguntar. Então, ele subiu as escadas de incêndio, invadindo o jardim da sua vizinha Sra. Gertrude, que morava acima deles e sentou no sofá de vime ao lado do seu tio, carregando um maço de cigarro obedientemente em suas mãos.

V pegou o cigarro e entregou o próprio celular em silêncio.

Rafe pegou o aparelho, vendo que tinha um vídeo congelado na tela e deduziu que ele deveria assisti-lo, o que foi exatamente o que fez.

Ele não deveria, mas assistiu a tudo. Seu silêncio era tanto de incredulidade, quanto respeito ao terminar o vídeo.  V já estava no final do cigarro quando o silêncio passou a incomodar Rafe.

- Por que diabos você queria que eu assistisse isso?

V apagou o cigarro em um dos vasos de planta da Sra. Gertrude e encarou o volume nas calças de Rafe, enquanto o menor tentava não se envergonhar por isso.

- Eu acho que nem sempre o Sr. S foi descontrolado daquele jeito. Quer dizer, lembro quando começamos as primeiras sessões, ele era calmo, centrado, às vezes quase amoroso.

- Tio V, eu…

- Não me interrompa.

Rafe engoliu em seco, assistindo V puxar os cabelos para trás enquanto controlava o nervosismo.

- Todos começam de algum lugar, certo?!

Rafe não respondeu, não saberia a resposta para a pergunta fora de lugar de qualquer forma.

- Enfim. Não era minha intenção te agredir, é só que… - V suspirou desanimado. - Quando vi aquele garoto na porta, vestido com a sua camisa, as marcas roxas nos punhos, os vergões de cinta na coxa, os olhos te encarando quase em adoração…

Rafe sentiu suas bochechas esquentarem, ele não lembra qual a última vez que se envergonhou tanto de algo.

- … acho que eu acabei perdendo o controle. - V completou.

- Não entendo…

- Eu era assim. - V disse distraído. Os olhos encarando a distância com nenhum interesse específico em focar. - Eu era exatamente assim com o Sr. S, pelo menos no começo eu era.

- Eu não sou como aquele monstro. - Rafe travou a mandíbula, quase rangendo os dentes ao falar. As unhas fincadas no lado interno das mãos em punhos.

- Você não é como Woo. Ainda. - V encarou Rafe que o olhava indignado. - Woo foi alguém simples no começo de tudo e tenho certeza que não era tão violento antes, já você…

- Tá dizendo que eu sou pior que o cara que eu tentei matar pra te salvar?

- To dizendo que aquela criança no seu quarto mal consegue sentar por sua causa e seus olhos estão tão opacos e sem vida quanto qualquer outra pessoa que sofre abuso e você nem mesmo se importa ou teria ao menos cuidado dele depois do que fez.

- Eu faria se você não tivesse interrompido. - Rafe gritou, ficando de pé com mais velocidade que calculava.

- Rafael.

- Não. Eu não vou na sua casa lhe dizer como deve levar sua vida. Sugiro que estenda a mesma cortesia a mim.

V se calou, concordando com a cabeça baixa.

- Eu não sou como aquele homem. - Rafe disse irritado e revoltado com o que seu tio pensava dele.

- Ninguém quer acreditar que a crueldade e a compaixão podem viver lado a lado num mesmo coração, até que algum dia você não sabe mais diferenciar o que é, do que um dia foi. Mas não, você não é como aquele homem Rafe. Até porque Woo sempre soube quem era e nunca tentou enganar ninguém fingindo ser bonzinho ou alheio aos próprios sentimentos. - V pegou o celular e se levantou, descendo as escadas sem olhar uma segunda vez para Rafe, que tremia feito um louco com a ira recém instalada no peito.

Era engraçado o fato de que tudo que ele queria quando entrou no próprio quarto era bater em Heitor e fazê-lo gozar até que os dois esquecessem os próprios problemas, mas V o afetou, mesmo que ele jamais admitisse tal feito.

Seu tio havia ido embora do mesmo jeito que chegou, de repente.

Ele não queria sentir uma aflição sem nome ao encontrar Heitor deitado de bruços na cama, dormindo adoravelmente enquanto manchava os lençóis com um pouco de sangue proveniente de algum corte.

Seus dedos levantaram de forma sutil sua camisa no corpo de Heitor. Odiando pela primeira vez o quão excitado ficava ao ver os vergões na bunda do mais velho.

Ele abriu a gaveta no criado mudo, pegando pomada para aliviar a dor que Heitor provavelmente sentia, mas sua mão parou no meio do caminho, tremendo enquanto ele olhava assustado ao afastar a bunda do mais velho e ver o estrago que tinha feito na noite anterior.

- Droga.

- Não tá tão ruim assim - Heitor disse baixinho e mais tímido que o normal.

Rafe se sentiu um idiota por achar que não acordaria Heitor.

- Desculpa. Não quis te acordar.

- Não tem problema. - Heitor sorriu, fechando os olhos enquanto Rafe acariciava uma das mechas de cabelo, caída em seu rosto.

- Eu sempre te deixo assim?

Heitor mordeu os lábios, concordando com a cabeça.

- Sinto muito por não cuidar de você direito.

- Você cuida sim.

Rafe sorriu pequeno para o mais velho, se concentrando em passar a pomada em cada marca deixada por ele naquele corpo tão delicado e sensível.

- Por que deixa eu fazer essas coisas com você?

Heitor deu de ombros, suspirando com dor a cada toque delicado de Rafe.

- Me diga, por favor. - A voz de Rafe era tão quebrada que Heitor ficou sem reação.

- Você gosta. - O mais velho sorriu. - Eu também gosto…

- Não mente pra mim. - Rafe disse firme, fazendo o mais velho tremer com medo.

Rafe notou o medo do garoto e acariciou seus cabelos, tentando acalmá-lo.

- Por que não me falou que não queria? Eu sempre te pergunto antes de sequer encostar em você.

- E...eu tenho medo que encontre outro com mais resistência que eu...e eu realmente gosto, só não sempre. - Heitor ficou vermelho mais uma vez. - Eu sei do que você precisa e eu posso dar, isso me deixa feliz. - Ele completou.

Rafe soltou o ar pelos pulmões, chorando toda dor que guardava esse tempo todo.

Heitor não sabia o que fazer. Ele nunca viu Rafe chorar antes, então tudo que fez foi se virar com um pouco de dificuldade e deitar a cabeça nas pernas do mais novo, o abraçando sutilmente na tentativa de acalmá-lo sem o irritar por tocá-lo daquela forma.

Rafe sentiu o corpo inteiro tremer ao perceber que Heitor o tocava, mas não impediu. Se Heitor podia aguentar tanta dor por ele, não custava nada tentar fazer o mesmo.

- Heitor , eu não te amo.

O mais velho suspirou alto, mas não levantou do colo de Rafe.

- Eu sei. - ele respondeu baixinho.

- E você sabe que merece alguém melhor que eu, certo?!

Heitor concordou meio indeciso com aquilo.

- Não tem ninguém melhor que você. - Ele falou tímido.

- A esse ponto, qualquer um é melhor que eu.

Heitor não respondeu, não era o que ele achava, mas ele não queria chatear o mais novo ao discordar.

- Eu não vou mais fazer nada disso com você Heitor. Não vou te agredir e sugiro que não deixe ninguém fazer isso com você de novo.

- Você tá terminando comigo? - Heitor perguntou, sentindo um aperto horrível no peito.

- Estou. - Rafe acariciou as bochechas quentes de Heitor. - Não vamos mais transar Heitor, mas eu sempre estarei por perto caso precise. Eu vou sempre cuidar de você, pra compensar todas as vezes que não fiz isso.

Heitor sentiu lágrimas escorrerem por seu rosto, mas não havia muito o que ele pudesse fazer ali. Ele não era idiota afinal. Sabia que um dia Rafe o deixaria, era mais que óbvio que o mais novo nunca quis nada além de sexo com ele, mas isso não significava que ele estava pronto para admitir isso em você alta.

- Promete? - Heitor perguntou com a voz cortada

- Eu prometo H. - Rafe disse distraído enquanto acariciava o mais velho.

Os dois ficaram por muito tempo naquela posição. Rafe acabou contando o porquê não gostava de ser tocado e sobre todos os seus medos quanto a sexo e qualquer outro tipo de relação.

Heitor perguntou sobre Louis eventualmente, afinal ele não era cego. Era óbvia, a tensão entre eles no dia do restaurante e Rafe nem sequer pensou muito ao contar tudo sobre Louis para Heitor.

Quer dizer, quase tudo. Algumas partes não tinha como incluir, porque eram segredos que ele levaria para o túmulo.

Rafe contou sobre a importância de V em sua vida e porque sua bochecha estava marcada com seus dedos.

Heitor riu da última parte e não sentiu medo com a cara de bravo de Rafe, porque depois de descobrir que o mais novo era tão humano quanto ele, apesar de ter sofrido o inferno na Terra. Heitor chegou a conclusão de que Rafe era só alguém tentando viver, depois de ter sobrevivido por tanto tempo e passado o impensável quando tão novo. Isso deixava o mais novo mais infantil do que ele jamais imaginou ver antes. O que fazia os bicos de revolta de Rafe, fofos?!

- Você devia encontrar esse Louis novamente. - Heitor disse com dor no coração e inveja escondida por trás do sorriso encorajador.

Rafe estava fazendo chá para os dois enquanto Heitor o assistia do balcão.

- Não. - Rafe parou com a caixa de leite no meio do caminho até a xícara. - Eu não saberia o que dizer de qualquer forma. - ele completou enquanto entregava o chá para Heitor.

Ele colocou mel na mesa e alguns biscoitos. Tomando chá com Heitor, apesar de estar de pé do outro lado do balcão.

- Então não diga nada. - Heitor tomou o chá em goladas enormes, sem se importar que queimava a língua no processo.

Aquilo estava o matando aos poucos. Era basicamente sua concepção de tortura psicológica, mas ele amava Rafe e queria vê-lo feliz. Apesar disso doer pra inferno, Heitor sabia que Rafe jamais seria feliz com ele, porquê o mais novo claramente amava outra pessoa.

Aliás, era tão óbvio quanto a realização de que a lua surgia com o desaparecimento do sol, que Rafe amava esse tal Louis e o pior é que esse sentimento estava reprimido desde a infância deles, era impossível não perceber a forma que seus olhos mudavam de intensidade ao falar ou ouvir falar do tal garoto.

Heitor suspirou, tentando não surtar com tudo aquilo.

- Você não vai encontrar outro amor igual. - Heitor disse para Rafe, mas ele poderia muito bem estar dizendo para ele.

- H. eu…

- Não se preocupa comigo. No fundo eu sempre soube que você pertencia a alguém. - Heitor mentiu.

Rafe sorriu amoroso pra ele.

- Eu vou cuidar de você primeiro e depois vejo isso ok?!

Heitor sorriu, mas no fundo ele queria muito gritar a plenos pulmões uma espécie de “ Por que você tinha que ser tão perfeito demônio?”

O sorriso falso parecia a opção mais adequada no entanto.

Heitor não tinha mais o pouco que Rafe permitiu, por uma mínima quantidade de tempo, ser dele. Ele queria dizer que não se importava com as cintadas, desde que o tivesse por perto. Que não se importava com sua própria dor, desde que isso aliviasse um pouco a dele, mas o que ele sabia ?! Rafe podia muito bem um dia precisar dele. Heitor obviamente não esperaria, mas podia muito bem largar tudo pra trás e se entregar novamente, se um dia o mais novo assim lhe pedisse.

Poderia parecer patético, mas ele não tinha muito o que fazer a respeito. Nem sempre o amor é a coisa mais linda do mundo, às vezes ele é incompatível e só então você percebe o quão cruel esse tipo de sentimento pode ser.


Suas mãos tremiam, seus olhos estavam úmidos e a boca seca, mas Heitor encheu tanto o saco, que no final a ideia de estar plantado na frente do restaurante esperando por Louis pareceu a coisa mais natural do mundo de se fazer.

- Rafe?!

Rafe virou tão rápido a cabeça, que seu pescoço quase estalou no processo.

Louis o encarava com uma sobrancelha levantada, as mãos no bolso e uma roupa que deixava ele ainda mais gostoso do que ele já era, fazendo Rafe xingar Deuses e panteões por isso.

- Se você terminou de me xingar…

- Eu não sei porque vim. - Rafe disse honestamente enquanto limpava as mãos suadas no jeans.

Louis acompanhou cada movimento, analisando o garoto que ele não conhecia mais, apesar de notar a semelhança nos seus traços infantis.

- Eu moro aqui perto. Quer sentar e conversar um pouco ?

Rafe mordeu os lábios, concordando com a cabeça, já que não conseguia falar.

Louis esperou que o menor se juntasse a ele e os dois caminharam  lado a lado, num silêncio confortável enquanto a iluminação precária impedia que eles deduzissem algo de suas expressões confusas.

O apartamento de Louis era pequeno e extremamente confortável.

Rafe descobriu que a irmã de Louis havia se mudado para a instalação da universidade de moda, já que ganhou uma bolsa de estudos em troca de monitoria dos alojamentos e boas notas.

Louis trabalhava muito, às vezes cercas de 16h por dia, mas Rafe também aprendeu que ele amava cada segundo disso.

O garoto parecia ganhar muito bem e tinha até críticas em seu nome nas revistas e blogs mais renomados sobre culinária da região.

Rafe sentia seu peito encher de orgulho a cada novidade.

Ele não sabia se queria, mas voltou no outro dia. Mesmo horário, mesma marca de chá, porém muffins diferentes feitos do zero, pelas mãos talentosas de Louis.

Rafe contou sobre os quadros que o fizeram entrar para faculdade de Artes. Louis lembrava de todos, nos mínimos detalhes. Rafe tentou não sorrir com isso, mas seu peito batia ensandecido e ele não conseguia parar de sorrir.

Louis tinha essa pequena mania de coçar a nuca toda vez que ficava tímido ou abrir a boca de um jeito fofo toda vez que ficava sem saber o que dizer. Eles também perdiam o ar juntos quando seus dedos se encontravam sem querer.

Rafe levou Louis para conhecer suas exposições de artes favoritas. Principalmente o bairro na periferia que foi decorado com grafite em paredes inteiras, atraindo a  atenção de pessoas do mundo todo.

Louis sorria largo toda vez que Rafe fazia uma piada nem tão engraçada assim e concordava animado ao fingir que entendia dos livros que Rafe referenciava sempre que tinha algo embasado a dizer.

Já Rafe, não conseguia disfarçar a testa enrugada, sempre que Louis o fazia experimentar coisas estranhas ao seu paladar.

No final os dois chegaram a conclusão que eram totalmente diferentes, no entanto não podiam ser mais parecidos.

- Você está bem? - Louis perguntou, sentindo Rafe tremer apoiado nele enquanto beijava seu pescoço, se inclinando para sentar nas suas pernas.

Louis tinha medo de Rafe não sentir o que ele estava sentindo pelo menor, mas ficou feliz ao ser convidado pela primeira vez para conhecer seu apartamento.

Ele queria que Rafe confiasse nele, confiasse que não fugiria novamente, mas não sabia como fazer o menor enxergar algo tão óbvio pra ele.

- Eu só estou um pouco nervoso. - Rafe sorriu, mas seu sorriso não atingia seus olhos.

Eles estavam no quarto de Rafe e Louis não conseguia ignorar o nervosismo do menor com esse fato.

- Você quer...sair daqui? Ir comer alguma coisa ou só, sei lá, dar uma volta pelo parque?

- Não. Eu não estou te rejeitando, é só que…eu nunca deixei ninguém encostar em mim dessa forma antes.

Louis arregalou os olhos, afastando as mãos do menor quase de imediato.

Como ele pôde esquecer?

Sua memória foi longe, há anos atrás, quando Rafe amarrou suas mãos com uma gravata e disse que se sentia bem daquela forma, sem ser tocado.

Louis passou a repensar todos os breves beijos e carícias que eles trocaram nesse tempo e sim Rafe sempre se afastava quando ele o tocava. Ele pensava que era um sinal de que precisavam parar com o beijo, mas era só isso que ele pensava.

- Rafe, eu sinto…

- Não é o que está pensando. - Rafe disse ao pegar as mãos de Louis e as juntar nas suas.

Ele se ajeitou no colo do maior e Louis fingiu não se excitar com isso.

- Pela primeira vez, eu quero isso. Quero ser tocado, sentir algo, quero não ter que dizer o que você pode ou não fazer. - Rafe puxou o ar para o peito com violência, tremendo um pouco no processo. - Eu quero isso, com você.

Louis não sabia exatamente o quanto aquilo significava para Rafe, mas pareceu importante e foi exatamente dessa forma que ele lidou com aquela liberdade recém adquirida.

Rafe não entendia como conseguia sentir tudo de novo depois de tanto tempo, era como se Louis nunca tivesse ido embora. Ele se sentia tão amado na presença do maior, que mal se lembrava dos seus medos, até que era tarde demais e ele acaba percebendo que não era tão ruim assim.

Não era tão ruim ser amado, não era tão ruim se permitir sentir, deixar que o tocassem ou que  comandassem suas ações na cama. Não era tão ruim ser beijado de maneira apaixonada, ou se sentir idolatrado por olhos apaixonados. Não era ruim ser tanto o ativo na cama quanto o passivo. Não era ruim quando você se sentia livre pra escolher.

Rafe eventualmente acabou mostrando seus gostos na cama também e Louis surpreendentemente adorou a experiência, apesar de notar que Rafe tinha um cuidado especial quando se tratava de sexo selvagem. Ele arriscou perguntar porquê as ressalvas um dia e tudo que ganhou em resposta foi um “ Só não quero acabar como ele”, o que deixou Louis com as mesmas perguntas de antes, mas com menos entusiasmo para saber o que aquilo significava.

Nem um dos dois falaram sobre o fato de que ele havia cometido um crime na Ásia ou na ideia que sua família tinha dele, porém Louis tinha uma leve impressão se que isso estava prestes a mudar, já que era aniversário de Rafe e toda sua família estava vindo para Londres, depois dele recusar ir para Coreia sem ao menos dar uma explicação do porquê.

Por sorte ele trabalharia num evento fechado até tarde na cozinha de um dos chefs mais renomados do país, que ocasionalmente pedia por seus serviços e ele obviamente nunca dizia não. No entanto, isso significava que ele só veria Louis mais tarde. O que impedia o convite que nenhum dos dois gostaria que fosse feito.

Rafe não queria brigar mais do que já brigava com o pai e querendo não, com os conselhos e opiniões de Louis sobre o assunto, Rafe estava até que em bons termos com Yoongi. O escutando mais e ignorando bem menos suas ligações, parecia sem sentido ignorar o pai por ter sido afastado a força de Louis, já que o tinha novamente em seus braços.

- Você tem certeza que não vai ficar ofendido por eu não ter te convidado para a reunião de família? - Rafe perguntou pela milésima vez enquanto se despedia de Louis na porta do seu apartamento.

- Eu já disse que não Rafe. Sem contar que eu tenho esse evento importante no restaurante em que faço bico vez ou outra, fico feliz que você esteja me dispensando ou eu quem teria que fazer isso.

- Isso seria realmente péssimo. - Rafe sorriu, beijando Louis de um jeito preguiçoso que sempre o fazia suspirar entre seus lábios.

- Eu tenho que ir, preciso buscar meus pais no aeroporto.

- Nos vemos de madrugada?

- Como dois amantes proibidos saídos de uma peça shakespeariana.

- Não acabando em tragédia, está ótimo pra mim.

Rafe riu, se afastando a contragosto dos toques sutis do maior e fez um bico adorável antes de virar o corredor e sumir da sua visão. Deixando Louis com um sorriso bobo no rosto e um aperto estranho no peito ao vê-lo se afastar.


- Não to dizendo que você merece apanhar, mas se não me convidar para sua formatura é exatamente isso que eu vou fazer. - Jin disse revoltado enquanto arrancava com uma paixão excessiva, as pernas da lagosta em seu prato.

Kyung revirou os olhos para o irmão. O que fez Rafe esconder o sorriso que dividiam com o pensamento de Jin todo revoltado, falando rápido demais para que qualquer um entendesse qualquer coisa.

Uma fonte de vinho foi colocada na mesa, ao lado de taças decoradas com uvas e gelo.

- Pai. Você disse que seria só uma reunião de família. - Rafe disse revoltado com o exagero daquilo.

- Não fala bobagem. Não é todo dia que você faz 21 anos e se eu te contasse você ia ter que ser arrastado até aqui a força. - Jimin disse amoroso, apesar das palavras indignadas.

- Não precisava fechar o restaurante inteiro pra isso. - Rafe resmungou, olhando o quão incrível aquele lugar era, principalmente quase vazio.

Ele não conseguiu deixar de pensar em Louis, em como ele o queria ali e em como o garoto apreciaria o tiramissu de frutas vermelhas que era servido no lugar do bolo.

Louis provavelmente reclamaria indignado com a calda extra que Jungkook havia pedido para sua porção, mas seu tio parecia adorar a meleca que fazia com todo aquele chocolate no prato.

Rafe aproveitou para olhar para a pessoa ao lado dele.

V o encarava, seus olhos eram serenos e um sorriso leve atingia o cantos da sua boca.

Ele disse um “ Obrigado” silencioso na direção do tio. O que fez seu sorriso aumentar ainda mais.

V o entendia melhor que ninguém e honestamente?! Havia lhe poupado de uma vida provavelmente desgraçada e cheia de arrependimentos.

Ele jamais esqueceria disso.

V por outro lado se sentia em paz e finalmente quites com o menor. Afinal, ele havia salvado Rafe de uma vida como a dele um dia foi, a mais desgraçada possível.

Agora sua vida era exatamente como nunca havia imaginado que seria. Incrível.

E ele devia isso a Rafe, o menor fez aquilo acontecer, mesmo que sem querer. Se é que o sem querer realmente existia.

- Não gostou do aniversário Rafael? - Yoongi perguntou distraído, enquanto bebia seu Whisky de sempre.

- Obrigado pai. - Rafe disse baixo, já que seu pai estava ao seu lado.

Yoongi concordou com a cabeça.

- Eu odeio parecer um disco arranhado, mas queria realmente que voltasse para Coreia conosco. Eu tenho um amigo que é dono de uma galeria de artes, talvez fosse bom começar seu estágio mais cedo.

- Eu quero ser responsável pelas minhas próprias conquistas pai, mas agradeço o gesto.

Yoongi colocou o copo na mesa com um pouco de violência.

- Eu entendo. - Foi sua resposta. - E gostaria de pedir desculpas pelo meu comportamento anterior, eu só estou preocupado e com saudades.

Yoongi sorriu de canto ao notar que Rafe ficava em choque com a demonstração aberta de sentimentos.

- Eu sei que deveria dizer isso mais vezes…

- É difícil pra mim também. - Rafe disse o interrompendo. - Demonstrar. - ele completou sorrindo para o pai que sorria de volta.

- Eu te amo filho. - Yoongi disse apertando sua mão em cima da mesa.

Rafe queria responder a altura, mas foi impedido pela onda de parabéns que vinha da cozinha.

Uma equipe de funcionários trazia um bolo exagerado nas mãos, como se alguém ali fosse conseguir comer mais, enquanto cantavam os parabéns que logo foi acompanhado por todos que estavam na mesa também.

Rafe odiava a atenção, mas sua família parecia empolgada e seu pai havia dito que o amava então estava tudo bem.

Ele riu do escândalo que JHope começou a fazer enquanto Jihoon tentava se enfiar embaixo da mesa com vergonha, mas seu sorriso morreu ao ouvir o copo de whisky de Yoongi cair no chão.

Rafe olhou para o pai, seguindo seus olhos até a roda de funcionários aleatórios do restaurante.

Jimin começou limpar a camisa molhada de Yoongi, parando só quando Yoongi segurou em sua mão, o afastando de forma nada delicada.

Jimin enrugou a testa e estava prestes a reclamar ultrajado, quando foi interrompido pela voz de Rafe do outro lado da mesa.

- Pai. Eu posso explicar…


Tinha se passado quase uma hora que Rafe e Yoongi estavam trancados na sala adjacente à principal do restaurante, conversando ao berros sobre a presença de Louis no salão ao lado.

Louis se sentia literalmente o elefante branco na sala.

- Sr. Park Min, está se sentindo bem? - Louis perguntou, entregando um copo de água nas mãos trêmulas do pai de Rafe.

- Me de um segundo querido. Estou pedindo para Deus me matar. - Jimin disse enquanto se sentava na cadeira mais próxima.

Jin revirou os olhos com o drama todo de Jimin.

- Fala sério! Não é como se fosse a primeira briga desses dois.

- Definitivamente não é a mais barata delas. - RM disse com certo tédio na voz.

Um barulho de taças se quebrando foi ouvido no meio da gritaria, fazendo Louis precisar se segurar para não correr naquela direção.

Já tinha um tempo que RM não pegava todos os problemas com as próprias mãos mais.

Ele finalmente aceitou que as coisas precisavam seguir seu próprio curso e que se intrometer nos problemas de todos e tentar resolvê-los toda vez, deixava bem pouco tempo para que ele lidasse com os próprios problemas.

RM encarou Jin com certa preocupação. O mais velho virou a cara, fingindo não reparar as encaradas do maior.

- Quanto tempo acha que vamos ficar aqui? - JHope perguntou entediado, ganhando um suspiro horrorizado de Jihoon.

- Pequeno, JHope está certo. - V disse na direção de Jihoon na tentativa de acalmá-lo. - Você pode mandar os funcionários embora Lou? Eu contrato alguém para limpar essa bagunça pela manhã.

Louis olhou a porta fechada, onde o garoto que ele amava estava,  ignorando completamente o apelido que V havia lhe dado.

- Ele não vai à lugar nenhum criança. - Jin disse amoroso.

Louis concordou, correndo em direção a cozinha.

- Eu até entendo o porquê Rafe luta tanto por esse garoto. - V disse olhando para a bunda de Louis enquanto o garoto corria.

Jungkook riu do maior, concordando com a cabeça ao notar exatamente o que V queria dizer.

Jimin bufou irritado mais uma vez.

Kyung não saía do celular, pouco se fodendo pra tudo aquilo e Jimin se perguntou se era essa visão que ele tinha quando decidiu que queria ter uma família grande e bagunceira.

...

- Porra! Quantas vezes vou precisar dizer que você não manda mais em mim? - Rafe disse aos berros na direção do pai.

- Eu não estou mandando você fazer nada. Eu ainda tenho a arma do crime que esse idiota cometeu e adivinha só? As digitais ainda estão nela, então se não quiser ver esse delinquente na cadeia, você vai voltar pra casa comigo.

Rafe passou as mãos no cabelo, notando tarde que Yoongi fazia exatamente a mesma coisa do outro lado do salão.

Eles eram tão parecidos que chegava a irritar.

Espera um pouco! Eles realmente eram muito parecidos.

Rafe puxou todo ar que podia, tentando criar coragem para começar o maior blefe de toda sua vida.

- Quer saber? Faça isso. O coloque atrás das grades, tenho certeza que vai dar um jeito de explicar o porquê você mesmo deu um jeito de arranjar sobrenomes falsos a ele e sua irmã para que saíssem do país. Aposto que deve ter uma explicação plausível para o dinheiro que colocou na conta dele também.

Yoongi sorriu de um jeito assustador e estava prestes a falar algo, mas Rafe não deixou.

- Só saiba que enquanto faz isso, você estará perdendo duas pessoas ao invés de uma. Por que eu nunca vou te perdoar por isso e vou ter certeza que nem você nem meu pai me veja novamente. Quero ver você explicar como isso aconteceu para Jimin.

Yoongi suspirou em choque.

Ameaçar sumir da vida dele era uma constante no relacionamento entre ele e Rafe, mas ameaçar sumir da vida de Jimin era a primeira vez.

Rafe não estava orgulhoso disso, ele odiava admitir, mas estava sendo um pouco egoísta, mas uma coisa que Yoongi nunca conseguiu esconder, era o tamanho do amor que ele tinha por Jimin, aliás era a única coisa que provava que Yoongi era tão humano quanto qualquer outro e Rafe, mais que ninguém, sabia disso.

- Você o quebraria. - Yoongi disse com a voz engasgada. - Tenho certeza, que nem mesmo você é capaz de …

- Eu o amo pai.

Yoongi passou a mão no rosto. Ele não sabia o que fazer.

- Eu amo Louis tanto quanto você ama meu pai.

Yoongi riu incrédulo.

- Não estou pedindo que acredite em mim, mas se quiser ter um relacionamento comigo, vou precisar pedir que aceite.

- Seu pai não é um assassino. - Yoongi disse seco.

- Você deixaria de amá-lo se ele fosse?

Yoongi mordeu os lábios.

Ele não respondeu, mas os dois sabiam o que seria dito.

- Não me peça pra aceitar isso filho. - Yoongi disse com a voz embargada.

- Então não aceite, não me importa. Mas eu preciso que respeite minha decisão pelo menos uma vez na vida ou Deus me ajude pai, eu juro que não existe dinheiro no mundo que vai me separar dele dessa vez. Eu não sou mais uma criança.

- Eu sou a porra do seu pai. Não me trate como se eu fosse um qualquer. Eu fiz tudo que fiz, pelo seu bem.

Rafe ignorou os berros de Yoongi e se aproximou, ficando tão perto que eles quase podiam se tocar. Os dois respiravam audivelmente, os lembrando o quanto aquilo já tinha saído do limite.

- Eu não preciso mais ser protegido. Você vai pegar tudo que sente em relação à Louis e engolir junto com seu ego. Ele é o único motivo para nossa relação ter melhorado nos últimos meses. Eu te amo pai e a não ser que suas palavras na mesa de jantar tenha sido em vão , eu acho que você sente o mesmo por mim.

Rafe sentiu Yoongi balançar os ombros, segurando o sentimento dentro do peito com toda sua força.

- Eu não estou pedindo sua permissão, mas vou me afastar se você tentar nos afastar novamente.

Yoongi concordou, obviamente contra sua vontade.

Rafe aprendeu apreciar pequenas vitórias desde muito cedo.

Yoongi o abraçou, com toda força que podia, agarrando seu pescoço e encostando suas testas juntas.

- Eu vou precisa ouvir pai. - Rafe disse enquanto tentava não chorar.

- Eu prometo que vou te respeitar, mas não acho que conseguirei aceitar isso um dia.

Rafe concordou, já era alguma coisa.

- Se é esse o caso, então vou precisar mais do que sua palavra.

Yoongi se afastou.

- O que quer dizer?

- Vou precisar da evidência que você tem contra Louis.

Yoongi travou a mandíbula, a resposta era não, mas algo lhe impedia de dizê-la.

- E antes que diga qualquer coisa. Isso não está aberto a negociação.

Yoongi encarou o filho por mais tempo que deveria, mas no final concordou com a cabeça.

O que mais ele poderia fazer?


- Onde mesmo você disse que estava me levando? - Louis perguntou enquanto saía do elevador de um prédio caro o suficiente para lhe garantir que nunca esteve ali antes.

- Eu não disse. - Rafe disse divertido, enquanto rodava no meio de uma sala sem móveis.

Louis olhou para o elevador, notando que estavam na cobertura.

No centro da sala tinham um cavalete com uma pintura um tanto quanto infantil, mas com traços definitivamente de Rafe e duas taças de champanhe.

Rafe entregou uma das taças para Louis.

- Esse é o nosso novo apartamento. - Rafe disse, batendo na taça estática nas mãos de Louis.

- Claro Rafe. Adoro a ideia de morarmos juntos. - Louis disse debochado, tomando todo o líquido em sua taça.

Não é que ele não queria, era só que estava acontecendo tudo muito rápido.

- Eu sabia que diria sim, então achei que uma surpresa seria melhor. Mas você ainda pode dizer não. - Rafe pareceu indeciso pela primeira vez.

O menor se sentia confortável tomando decisões e Louis não se importava com isso. Ele faria qualquer coisa pra deixar Rafe feliz, sempre.

- Eu adorei a ideia Rafe, só parece repentino. Isso tem relação com seu pai ou algo assim?

- Que? Não. Art e Heitor são mais barulhentos do que eu estou disposto a aturar, eu suponho que mereça  de qualquer forma.

Louis enrugou a testa sem entender o que o menor dizia.

- E aqui fica perto do seu novo emprego também, eu pensei…

- Sim. Você pensou muito bem. - ele completou, interrompendo Rafe.

- Ótimo.

Louis sorriu, tentando esquecer o convite suspeito para comandar um novo restaurante cinco estrelas num dos hotéis mais caros de Londres.

Ele sabia que foi Rafe, e como o conhecia bem, sabia que ele negaria até a morte de ter se metido no seu futuro. No final das contas, ele teria feito o mesmo se tivesse a grana que o menor tinha e preferia encarar como uma forma de um bom investimento para parte do dinheiro que Rafe tinha recebido ao completar 21 anos.  

- Agora que estamos resolvidos, deixa eu te mostrar a cama.

- Oh! Então a cama a gente tem? - Louis perguntou, já que não tinham móveis nenhum no apartamento.

- Achei que não faria mal escolher sozinho essa parte da decoração. - Rafe disse beijando Louis do jeito que deixava suas pernas bambas e seu coração acelerado.

- Não poderia concordar mais. - Rafe sussurrou pegando o menor no colo e partindo para qualquer lugar.

- Essa não é a cama. - Rafe disse rindo alto ao ser colocado no balcão da cozinha.

- Ah, não? - Louis perguntou distraído enquanto descia a cabeça no meio das pernas de Rafe e o puxava para a direção da sua boca.

O menor fechou os olhos, jogando a cabeça pra trás ao sentir seu zíper sendo aberto pelos dentes de Louis.


Alguém pediu permissão para subir de elevador.

Louis estava terminando de preparar o almoço. Rafe tinha ido buscar o vinho que esqueceu de comprar mais cedo, então ele não fazia ideia de quem poderia ser, mas não podia queimar o Penne à carbonara, então só liberou a entrada.

Foi uma surpresa um tanto quanto inesperada ao dar de cara com Yoongi o encarando do outro lado do balcão com cara de poucos amigos.

Louis desligou o fogo, aceitando que a massa fosse passar do ponto de qualquer forma e se aproximou sem muita vontade.

- Sr. Park Min, eu …

- Rafe está? - Yoongi perguntou, o interrompendo.

Louis secou suas mãos no pano de prato, quase correndo na direção de Yoongi.

- Não senhor, mas ele já está voltando. Posso lhe oferecer uma bebida enquanto espera?

Yoongi ia dizer não, mas Louis já tinha corrido até o bar antes que ele pudesse negar.

Seus pés foram automaticamente para a sala, analisando tudo com cuidado. A maleta em suas mãos parecia pesada de repente.

Louis tirou o Whisky do fundo da cristaleira, já que nenhum dos dois bebia aquilo, mas Rafe quis comprar a bebida mesmo assim.

- Não sei como prefere…

- Assim está ótimo. - Yoongi disse quando aceitou o copo com whisky puro estendido na sua direção.

Os dois ficaram no silêncio mais desconfortável do mundo, mas não o suficiente para que tentassem uma conversa.

- Esse quadro… - Yoongi resmungou, olhando para o quadro que Rafe havia lhe dado de presente quando se mudaram.

- Rafe fez em carvão. - Louis disse orgulhoso. - Foi um presente, apesar de não ser o original.

Yoongi levantou uma sobrancelha, encarando um Louis extremamente nervoso.

- E...ele disse que o desenho original foi feito quando ele ainda era criança.

Yoongi olhou para o desenho de um parquinho de madeira velho. As cordas do balanço era a única coisa que parecia diferente, mais complicado, como se tivesse sido aperfeiçoado ao longo do tempo enquanto o restante do desenho permanecia o mesmo.

- Ele disse com quem estava o desenho original agora?

Louis deu de ombros.  

- Ele disse que ficou com a pessoa que lhe fez se sentir a salvo pela primeira vez.  

Yoongi concordou pensativo.

- Imaginei que estivessem com Jimi… com o Sr. Park min… - Louis desistiu de falar qualquer coisa, ele estava nervoso demais pra isso.

Yoongi terminou sua bebida, deixando a maleta em cima da mesa de centro, ao lado do copo vazio.

 Rafe não estava presente ali de propósito, Yoongi entendeu o recado que aquela pintura na parede lhe dizia e não conseguiu deixar de sorrir pela perspicácia do filho quando se tratava de lidar com sua personalidade forte.

 Yoongi estava ali para consertar seu erro, ou não conseguiria seguir em frente.

- Ele te deu isso por que se sente seguro novamente? - Yoongi perguntou olhando para o desenho uma última vez.

- Gosto de pensar que sim, Sr. - Louis apertou uma mão contra outra, desconfortável.

Yoongi concordou em silêncio, sorrindo pequeno na direção de Louis.

- Se um dia isso mudar.  Eu juro que tiro tudo que você considera importante na vida e eu não me importo se for por sua causa ou não, vou te considerar responsável de um jeito ou de outro.

Louis engoliu em seco, tentando não desmaiar de nervoso.

- Me parece justo Sr. - foi sua resposta quase trêmula.

Yoongi sorriu novamente, dessa vez o sorriso não era nada amigável, fazendo os pêlos da sua nuca arrepiarem.

- Ótimo. Então fico feliz que conversamos.

Louis só conseguiu soltar o ar que prendia, quando Yoongi desapareceu no elevador.

Seu corpo praticantes caiu no sofá e seu coração parecia prestes a explodir.

Ele notou a maleta em cima da mesa de centro, se inclinando pra ver o que tinha dentro, porque nem ferrando ele correria atrás do pai de Rafe para devolver aquilo, apesar dele achar que ele havia deixado ali de propósito.

Se seu coração batia forte antes, agora parecia prestes a parar.

A arma que ele usou para matar o cara que abusava do tio de Rafe estava ali.

Louis não fazia ideia de como Rafe convenceu Yoongi a entregar o único motivo que o mantinha nas mãos daquela família, mas isso só podia significar uma coisa.

O menor o amava e estava lhe dizendo o quão sério era aquilo.

Ele podia muito bem desaparecer, não tinha mais nada que o prendia aonde o pai de Rafe o mandou ficar, mas pela primeira vez, Louis encarou Londres como seu lar, ao invés da sua prisão.

Nem todo cativeiro emocional é indestrutível e felicidade é questão de perspectiva”

Rafe recitou para ele uma vez.

Ele entendia agora.

Seu lar era onde Rafe quisesse que fosse.


Anos antes

Yoongi sentou ao lado do garotinho que olhava com atenção para um parquinho de madeira, caindo aos pedaços no meio do jardim à frente deles.
- Sobre o que está escrevendo? - Yoongi perguntou.
O garoto bateu o lápis no caderno suspirando fundo sem olhar para Yoongi.
- Eu posso saber, por que isso é da sua conta? - o garoto perguntou. Ele tinha uma voz fina, quase estridente, mas firme e autoritária.
Yoongi olhou para o menor, levantando uma sobrancelha e se segurando para não rir do comportamento marrento do garoto.
Ele se inclinou de leve, percebendo que o garoto não escrevia. Ele estava desenhando e era incrível.
A criança havia feito uma réplica exata do parquinho na frente deles. Com tons variados de cinza que a pressão do lápis o proporcionava.
Yoongi arregalou os olhos, o garoto escondeu o caderno olhando feio para ele, que voltou para posição, tentando disfarçar a intromissão.
O moleque suspirou desanimado, juntando as coisas para se levantar e sair dali.
- Bonito desenho. - Yoongi soltou, assim que o garoto levantou.
O garoto parou, olhando curioso por causa da voz de tédio do maior.
Ele viu o brilho nos olhos do garoto pelo elogio, mas o menino disfarçou dando de ombros.
- Tanto faz. - ele falou tentando partir mais uma vez.
- Bonito realmente, pena que não está igual. - Yoongi disse, fazendo uma expressão de quem não estava nenhum um pouco afim de conversar, mesmo sendo ele quem puxou a conversa.
O garoto sentou de novo, analisando o desenho.
- Está sim. - ele enrugou a testa olhando do papel para o parque, como se tivesse cometido um crime.
Yoongi nem sabia porque estava se esforçando tanto para conversar com o garoto. Talvez fosse o fato dele ver tanto dele mesmo no menor, não tinha como não achar aquilo curioso. A forma como ele se concentrava com uma folha velha de papel nas mãos, a preocupação em sinais  no meio da testa, as unhas comidas e os olhos compenetrados.
Yoongi apontou para as cordas do balanço, ao lado da casa com o escorregador.
As cordas estavam trançadas no desenho, mas eram lisas na realidade.
O garoto enrugou a testa confuso, amassando todo o desenho para em seguida jogar o papel na grama.
Yoongi fingiu não se surpreender com a reação.
- Começa de novo. - Ele falou autoritário.
Yoongi sentiu o garoto se arrepiar, o corpo tensionado.
- Por que eu deveria ? Você não manda em mim - ele perguntou abrindo o caderno.
Yoongi  deu de ombros, fingindo descaso. Ele estava impressionado com quanto o garoto parecia mais maduro do que  era.

- Você nunca será bom o suficiente, se não voltar e arrumar seus erros. - Yoongi respondeu honestamente.

- Você desenha? - O menino perguntou perdendo a pose revoltada.
Yoongi negou com a cabeça relaxando no banco.
- Eu escrevo. Comecei quando era novo. - ele olhou para o garoto que o encarava de volta. - novo como você. - ele terminou.
- Não acredito, você já achou o Rafe. - Jimin disse se aproximando, ao lado de uma senhora bem idosa, vestida com um hábito cinza e bege, daqueles que freiras usam.
Yoongi enrugou a testa, analisando melhor o garoto ao seu lado, notando uma marca roxa, quase preta em volta do pescoço, praticamente escondida por uma camisa listrada que já viu dias melhores.

Então aquele era o tal garoto que tentou se matar?!

Rafe era tão pequeno. Yoongi nunca pensaria que ele teria 12 anos. Ele entendia o porquê de Jimin querer tanto adotá-lo, o garoto era encantador.

- Rafael, vai fazer suas malas. Jimin vai te levar para casa. - A freira falou ríspida com o garoto, que tremeu com o tom da voz, finalmente parecendo uma criança.
Rafe sorriu para Jimin carinhoso. 
- Ah! E a propósito, Jimin é meu marido. - Yoongi falou, sorrindo de forma maquiavélica para o garoto.
Rafe engoliu em seco, assustado ao notar que tinha acabado de fazer merda o tratando mal, afinal a adoção era sua última opção para não acabar nas ruas, ou com um tio que abusava dele.
- Vamos garoto, não temos o tempo todo. - A freira bateu palmas enxotando Rafe.
Rafe levantou com o caderno e o lápis grudado no peito, ele ia correr, mas travou virando para Yoongi.
- Desculpa senhor.
Yoongi bagunçou os cabelos de Rafe com um sorriso torto no rosto.
O garoto correu depois disso, sendo seguido pela freira mau humorada.
Jimin sentou onde Rafe estava, com um sorriso largo no rosto, a felicidade contida.
- Ele parece um anjo. - Yoongi comentou distraído.
- A freira disse que acha que é por isso que deram o nome de Rafael para ele, por causa do anjo.
- Isso é papo de freira. - ele resmungou.
- Ele não é incrível? - Jimin perguntou mudando de assunto ao virar de frente para Yoongi.
Ele suspirou, sabendo o tipo de problema que o garoto poderia causar com aquela personalidade, somado com um passado ruim.
- Ele é definitivamente peculiar. - Yoongi respondeu pensativo.
- Você viu que ele deixou você tocá-lo? - Jimin perguntou todo animado ao lado de Suga.
- Não amor, não tinha reparado. - Suga abraçou Jimin que mal conseguia parar no lugar com a excitação.
- Ele não deixa ser tocado por ninguém, mas pareceu natural quando foi com você. Ele me lembra tanto você quando nos conhecemos, todo marrento, fingindo odiar o mundo. - Jimin disse se afastando para olhar Yoongi com olhinhos apaixonados.
Yoongi sorriu de volta, beijando o menor.
- Você é inacreditável Jimin.
Jimin sorriu com seu Eye Smile, quase fechando os olhos.
- Isso é algo bom?
Yoongi concordou com a cabeça, com o olhar perdido na direção do parquinho.

- Definitivamente é.

Fim...

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