Capítulo 17 - parte 1 (em revisão)

"Deus é contra a guerra, mas fica ao lado de quem atira melhor."

Voltaire.


Arthur abriu os olhos e viu logo que estava em um quarto de hospital. Pela pouca luz, era ainda muito cedo. Logo depois, deu-se conta de que alguém segurava a sua mão e virou o rosto para ver Anabela com a cabeça deitada na cama, segurando-a, na certa vencida pelo cansaço. Mais uma vez, ele atinou-se que esteve bem perto da morte e ainda estava vivo, sem falar que o que mais desejava encontrava-se bem ali, ao seu lado. Soltou um sorriso, olhando para o seu rosto sereno.

Mal se mexeu um pouco para se ajeitar, Anabela ergueu a cabeça e olhou para si, sorrindo em seguida.

– Oi, meu amor, você quase que voltou a me matar de susto, sabia? – disse a delegada, com uma lágrima no olho. – Mais uma dessas e você perde a noiva e o bebê, viu? Será que agora acabou?

– Ele está morto? – perguntou Arthur. – Consegui cumprir a minha promessa?

– Com toda a certeza – disse ela, rindo. – Morreu pouco depois que você desmaiou. Acho que foi na hora que nós carregamos você para dentro do carro de forma a trazer para o hospital e chutei a cara do filho da puta com tudo, sabe? Do tipo assim como quem não quer nada. Moisés disse que eu era muito desastrada e precisava de me cuidar para não ficar tropeçando por aí.

– Imagino – disse Arthur rindo e logo após soltando uma careta de dor. Fez um carinho no rosto da noiva e parou de sorrir. – Então, acho que acabou de vez. E a Cíntia, o que aconteceu com ela?

– Sinto muito, Arthur – respondeu a noiva, ficando séria. – Faleceu na mesa de cirurgia. No caminho para cá ela falou comigo e depois lhe conto.

– Queria tanto poupar Pedro disso – disse Arthur, com lágrimas nos olhos. – Nem sei o que vou lhe dizer, meu amor, e o pior é que a culpa foi minha de novo.

– Seu pai já lhe contou, mas, se precisar falar algo, diga as coisas boas dela...

Bateram à porta, bem de leve, e apareceu Jorge. Ao ver o filho acordado, entrou, feliz.

– Oi, filho – disse, beijando sua testa. – Tudo bem Anabela? Vim ver como você está, mas não posso demorar porque não deixam Pedrinho entrar e ele está lá embaixo com a sua mãe. Vim fazer o reconhecimento do corpo da Cíntia.

– O senhor me espera aqui antes de sair, Jorge? – pediu Anabela, gentil. – Prometo que não demoro.

– Você tá com a voz de quem pretende aprontar alguma – disse o delegado.

– Nada demais, amor – respondeu ela. – Vou buscar meu enteado e quero ver me impedirem. Enquanto isso, conte as novidades para seu pai.

Anabela beijou Arthur e saiu, bem decidida.

― ☼ ―

Sem paciência para esperar o elevador, desceu os três andares pelas escadas e alcançou a rua em poucos minutos. Viu logo o carro do sogro e aproximou-se, sorridente. Fez um aceno para o soldado ao volante, abriu a porta e pegou Pedrinho, que logo a abraçou, ainda com cara de triste. Com toda a calma, disse:

– Oi, Sara, venha conosco. Vamos ver o Arthurzinho.

– Não vão deixar eu entrar tia Bela...

– É não me vão deixar entrar, meu amor – corrigiu ela. – Pode ter certeza de que vão sim, nem que eu precise arrumar um escarcéu.

– Meu papai vai morrer, tia Bela? – perguntou o pequenino, preocupado. – Eu sei que o vovô disse que não, mas tô com muito medo.

– Não vai, não, meu amor. Você verá daqui a pouco. – Anabela foi andando, tranquila. Em vez de ir para o elevador que ficava em frente a recepção, foi para as escadas. Quando já estava a meio do primeiro lance, um enfermeiro que descia barrou o seu caminho.

– Desculpe, senhora, mas o seu filho não tem idade para entrar...

– Olhe, meu querido – disse ela gentil, porém séria. – Eu adoraria que fosse meu filho, mas ainda não é. Infelizmente, a mãe dele veio a óbito ontem na mesa de cirurgia aqui mesmo e o pai está lá em cima ferido com uma certa gravidade. Você vai fingir que não nos viu e eu vou entrar com meu futuro enteado para ver o pai que foi ferido no cumprimento do dever, entendeu?

– Senhora, essa regra é para a proteção da criança por ser mais suscetível e infecções, mas acho que podemos abrir uma exceção, neste caso – disse ele, sorrindo bonachão. – Para todos os efeitos, eu não vi nada, entendeu?

– Bah, nem estou vendo você aqui – disse ela, sorrindo. Depois sussurrou. – Obrigada, você é um amor.

Continuaram até ao quarto sem serem interrompidos e a delegada imaginou que os outros talvez pensassem que a criança tinha uma autorização especial, uma vez que não foi barrada na entrada.

Assim que Pedrinho viu o delegado, correu para a cama e agarrou-se ao pescoço dele, ficando calado, apenas abraçando o pai.

– Oi, mãe – disse Arthur. – Desculpe dar-lhe esse susto de novo.

– Eu entendo, meu filho – disse Sara, sorrindo e pegando a sua mão. – Lá embaixo podia jurar que ouvi Anabela falar em futuro enteado, então gostaria de saber o que aconteceu.

– Bem – disse Arthur. – Há uns dias pedi a minha gaúchinha em casamento e ela aceitou. Claro que mandou que me divorciasse primeiro, mas agora... – encolheu os ombros.

– Ora, meu filho – disse Jorge, radiante. – Você ainda não contou a melhor parte!

– Que melhor parte? – perguntou Sara.

– A família vai aumentar, mãe – respondeu Arthur.

Pedrinho ergueu o rosto e perguntou:

– O que é que tão falando? Não entendi nada!

– Filho, eu e Belinha vamos casar.

– Minha mãe disse que você ia fazer isso – afirmou, triste.

– Então, meu amor, agora você vai ter duas mães – disse Arthur, esfregando os cabelos dele. – Uma lá no céu que cuida sempre de você e, aqui, a Belinha.

– Tá bom – disse o pequeno, sentando-se na cama –, mas eu vou querer...

– Um irmão? – perguntou o pai, interrompendo.

– Não, papai – disse o garoto, decidido. – Eu quero uma irmãzinha.

Anabela aproximou-se do pequeno e abaixou-se, olhando nos seus olhos.

– Daqui a cinco ou seis meses, meu amor, você vai ganhar uma irmãzinha, pode ter a certeza.

– Jura? – perguntou a criança, arregalando os olhos. – Sério, vou ganhar uma irmã?

– Juro para você, filho. – Num impulso, a criança abraçou Anabela que lhe acariciou os cabelos, emocionada. – Você verá, logo logo estará com sua irmãzinha no colo, cuidando dela como um bom mano.

– Seis meses demora muito pra chegar? – perguntou o pequeno, suspirando. – Queria que fosse agora.

― ☼ ―

– Você não devia der jurado uma coisa que não sabe – disse Arthur, depois que estavam a sós.

– O que não sei?

– O sexo do bebê...

– Mas eu sei o sexo. Assim que cheguei tive um mal-estar súbito por causa da tensão e Moisés pediu ajuda. Quando ele disse que estou grávida, o médico mandou fazer muitos exames e uma ultrassonografia, amor. Você vai ter uma filhinha sapeca.

Arthur olhava para a janela, pensativo.

– Se, no início de Novembro, me tivessem dito que hoje estaria assim, eu chamaria a pessoa de louca varrida e internava no hospício, mas olhe só como estamos.

– Você chamou aquele diabo de Simão, amor – disse Anabela, curiosa. – Que tal me contar o que aconteceu?

Arthur calou-se por alguns segundos, lembrando-se do passado, na verdade, uma parte dele que não gostava nada. Olhou para Anabela e disse:

– Simão era meu amigo no exército. Éramos considerados os melhores oficiais e vivíamos fazendo farra quando não estávamos de serviço. Ele tinha uma certa inveja de mim, muito mais do que imaginava, pelo jeito, porque nunca conseguiu me derrotar nem em tiro e muito menos nas artes marciais, mas era um posto acima de mim. Outra coisa que o deixava fora do sério é que as garotas todas davam em cima de mim, mas eu não ficava com nenhuma por causa da minha noiva. O que eu não conhecia era o seu outro lado, que tinha uma grande tendência para o crime – explicou o noivo. – Resumindo tudo, uma vez ele disse que fomos convocados para testar a segurança de certos lugares, como uma simulação de guerra onde precisávamos de invadir um prédio inimigo e roubar documentos secretos. Ele aproveitou-se da minha ingenuidade e amizade. Como era um oficial com uma patente acima da minha, eu nem pensei em contestar ou desobedecer ordens. Ele queria usar as minhas habilidades muito superiores às dele para me fazer roubar pretensos documentos secretos, mas acabei descobrindo que isso era fachada para furtar valores e informações. Por conta disso, tivemos uma briga muito grande. Para se livrar das provas, provocou um incêndio e tentou fugir, mas nós caímos na pancadaria e coloquei-o a nocaute, deixando o desgraçado preso em um quarto. Depois disso, corri desesperado para tentar salvar os guardas que ele colocou a dormir e que estavam sitiados pelo fogo. Não tive tempo nem vontade de o ajudar e deixei-o para morrer naquele incêndio, de tanta raiva que eu tinha. Depois, fui falar com o oficial superior e contei toda a verdade. Por causa disso, ganhei mais uma condecoração. Não sei como ele sobreviveu e deve ter feito muitas plásticas porque estava bem diferente. Acredito que ele descobriu tudo e saiu do sério. Daí essa raiva que ele tinha de mim.

– Bem, agora ele vai ter raiva no inferno.

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