13• NO LIMITE DA REALIDADE
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"Eu achei que estava completamente preparado para
O desafio que estava por vir
Mantenha seus netos olhos no objetivo
Eu acho que nunca enfrentei meus medos antes
Então fique comigo porque
Agora meu corpo está no limite"
- The line, Twenty one pilots.
•••
Acordei sobressaltada, com a imagem de Ethan em chamas ainda fresca em minha mente. O ornamento da coroação, que eu havia colocado sobre a mesa, agora parecia diferente. As runas antigas pareciam pulsar com uma luz sinistra... E então, senti uma estranha sensação, como se minha magia estivesse se rebelando contra mim.
O peso daquela coroa era maior que eu poderia carregar, nunca pensei que poderia perder o controle desse modo. Massageio a têmpora com a memória do soldado se contorcendo de dor em cima do trem, lembro da sensação estranha que me atormentava naquele momento, estava me sufocando como se eu não tivesse outra escolha senão continuar, eu havia tido prazer em queimar uma pessoa e isso não saia da minha cabeça, ficava repassando a imagem do fogo. Se eu fechar os olhos posso até ouvir os gritos, que agora sinto repulsa ao recordar.
Eu estou com medo, muito medo de me tornar algo ruim, de me transformar num monstro terrível que mata por pura diversão.
Odeio admitir que estou perdendo a sanidade. Mas é inegável que algo não está certo.
Fecho os olhos temendo voltar ao pesadelo.
A realidade aparente é que eu estou perdida em meio a tanta obrigação com minha nova posição, que não era algo que eu fosse esperar a alguns meses atrás quando pus os pés aqui em Penumbra. Talvez todo esse peso do dever esteja me sobrecarregando a ponto de não conseguir sentir a magia por completo, pode ter algo me impedindo de acessar as profundezas onde suas raízes se entrelaçam e pulsam com todo o clamor de serem usadas.
Eu só estou cansada, só isso.
Pelo menos é o que tento me convencer antes de voltar lá para fora e ter de lidar com a torrente de questões sobre qual o próximo passo.
Se eu imaginar que consigo controlar, talvez possa mesmo.
Ao me levantar do chão duro sinto uma náusea e parece que meu estômago revira em protesto, sinto gosto da bile subir pela minha garganta, meu corpo todo se revolta contra minha vontade de seguir mais uma trilha no meio da floresta.
Estávamos acampados numa área mais plana da região fechada da mata, por falta de equipamentos optamos por dormir no relento, não era nada demais para mim que a essa altura já estou acostumada a dormir onde der, desde que esteja segura poderia descansar até pendurada numa árvore - não que eu fosse mesmo fazer isso - mas ao que parece meu corpo não está descansado o suficiente após toda a caminhada de um dia inteiro.
Minhas mãos estão trêmulas e dormentes, isso é estranho, como se os acontecimentos do meu pesadelo tivessem sido tão reais que sinto ter realmente lançado a magia a ponto de me esgotar.
Foi tão real.
Tento me livrar das lembranças quando me dou conta de que guardei o frasco entregue por June ontem a tarde. Deslizo o pequeno vidro pelo bolso do meu kirtle, tentada a tomá-lo. Abro a tampa e um tipo de fumaça negra sobe e dança ao redor de mim. Olho para os lados me certificando de que ninguém esteja vendo, não quero acarretar mais perguntas e ter que dizer "me desculpem se eu atear fogo em vocês, mas estou sem o controle dos meus poderes, por favor não me irritem", não acho que seria apropriado para o momento se eles souberem da minha condição que poderia acabar num enorme estrago.
Antes de tomar hesito.
Eu poderia confiar em June? Até onde vai sua lealdade? Como vou saber se isso que ela me deu não é algum tipo de veneno para me tirar só seu caminho?
Não.
Não posso deixar que esses pensamentos invadam minha mente. Ela está conosco, afinal temos um inimigo em comum, só não estou na posição que ela ache adequada para mim, e que na verdade ela quem deveria estar usando a coroa.
Ela não faria isso.
Pinguei cinco gotas do líquido viscoso. Tem um sabor amargo que pinica minha língua, mas o efeito logo passa e me sinto melhor - com certeza não pronta para mais um longo dia, mas ligeiramente melhor.
Em suma, nossa missão estava finalizada logo após a reunião com o rei de Milimor, tendo consistido basicamente em convencê-lo a seguir minha linha de raciocínio e ser racional quando a economia de seu próprio reino, tendo em vista que essa parte era fundamental para ambos os lados, resultando numa boa e tranquila conversa com direito a um jantar de negócios. Posso dizer que Albert Smith estava aberto a negociações e foi fácil colocá-lo a par do meu plano, o rei não viu nada que pudesse ser melhor para o futuro de seu reino.
Para ser sincera eu não achei que seria tão fácil assim, segundo Phillip, o rei não era tão propicio a aceitar acordos com outros reinos de uma maneira tão civilizada quando essa na qual presenciou, pois em seu curto período servindo como um conselheiro para meu pai, o mesmo homem não havia demostrado tanto interesse num acordo. Mas os tempos são outros, a situação é quase precária para alguns reinos próximos a Tetundhra, principalmente aqueles se se sustentam particularmente de turismo. Vendo por esse ângulo, ele seria um tolo em não aceitar minha proposta, já que com o aumento da guarda militar de Nicodemus, e muitos casos de animais selvagens perambulando pela floresta, dificulta a vinda desses turistas para o reino. Afinal, ninguém em sã consciência gostaria de passear por ai com potenciais monstros místicos e soldados armados por todo lado, eu não me sentiria confortável em dormir numa pousada a beira do lago com vista para uma floresta intitulada de "floresta sombria", nem mesmo caminhar pela aldeia e dar de cara com um soldado carrancudo pedindo para me revistar apontando uma arma para mim.
Em tempos de crise, haja com sabedoria. Vise o futuro e a economia da população.
O rei Albert Smith fez um bom investimento.
A aurora resplandecia pelo horizonte, os pequenos raios de sol se materializando por entre as copas dos abetos trazia uma energia renovadora. O ar frio da manhã dando espaço para o calor reconfortante do sol deixando uma sensação de que o dia seria longo e produtivo, com muitos planejamentos a se pensar e trabalho para fazer antes de voltarmos a Penumbra.
Enquanto todos ainda dormiam envolta dos resquícios da fogueira da noite passada volto minha atenção ao pássaro que canta lindamente uma melodia que eu reconhecia de algum lugar, não consigo me lembrar de onde, mas tinha um toque familiar no som produzido pela ave que pousava no galho mais baixo do carvalho, o modo como o canto soassava ecoando pela floresta era muito acolhedor e remetia a minha infância. O pássaro repetia a música num looping, como se ele soubesse entonar apenas aquela canção delicada e suave, além de sua aparência peculiar quanto aos demais, com penas amarelas quase reluzentes a claridade do sol, suas asas são pontiagudas terminando om um degrade entre o amarelo e o laranja, com uma cauda longa, seus olhos pareciam quase vidrado capturando tudo ao seu redor, mas nunca parando de cantar.
O pássaro me seguiu com olhos até enfim desaparecer entre os carvalhos mais afastados de onde acampamos, o som diminuindo gradativamente deixando o eco levá-lo adiante.
Depois desse estranho acontecimento sigo para o pequeno lago que vi quando estávamos passando.
Faço um formato de concha com as mãos para pegar um pouco da água corrente, levo ao meu rosto me refrescando do que promete ser um dia muito quente. Sinto uma gota escorrer pelo meu pescoço enquanto observo a água escorrer até uma queda de poucos metros, levando para uma trilha. O pouco que escorre pelo meu rosto seca tão instantaneamente como se jogasse numa panela fervente, as gotículas chiando conforme desciam pelos meus braços. O calor do meu corpo sugando cada gota de água numa velocidade surreal para uma pessoa de temperatura normal.
Levo minha mão até a testa e sinto um calor anormal, estou queimando.
Levada pela ansiedade o desespero era iminente e logo levei mais água ao rosto na esperança de baixar a temperatura.
Eu sinto como se meu corpo estivesse pegando fogo e nem toda água do mundo poderia apagar as chamas que ameaçam sair das minhas mãos, eu não estou conseguindo respirar. Tudo que vejo e fumaça, fumaça e ondas de calor tremeluzindo como sol no asfalto.
Imagens distorcidas passam na minha cabeça, não sei dizer se estou alucinando ou se é algum tipo de visão bizarra onde o mundo está em chamas, o fogo consome tudo que vive não restando nada além de cinzas.
Estou caindo, caindo numa vastidão sem fim.
Meu poder tomando conta do meu ser, o som dos gritos é a pior parte.
Estou coberta de fogo, a luminosidade me cegando de ver qualquer coisa a frente, minha visão embaçada com a fumaça e o fedor de queimado sobre ate meu nariz. O desespero de querer aliviar essa sensação de impotência toma conta dos meus sentidos, estou lutando para me manter sã mas tudo que vejo é caos e muito fogo.
O mundo terminara em fogo e caos.
Essa frase fica se repetindo, cada vez mais alto.
Tampo os ouvidos e o som se abafa, já estou encolhida e tremendo. Por que ninguém escuta? Por que ninguém me ajuda?
Quando consigo abrir os olhos tudo que vejo é a silhueta de uma pessoa vindo até mim, mas ela parece machucada, passos mancos e lentos. A forma se parece com uma armadura reluzente. Tento focar a visão e então noto aqueles olhos azuis, o mais profundo oceano na qual adoraria me afogar.
Ele estende sua mão para mim.
Ethan vai me ajudar, sei disso porque ele sente o mesmo que eu. Nós dois temos o peso da coroa em nossas cabeças, nós dois temos uma missão a cumprir, ele me entende.
Seguro sua mão e me levanto devagar, mas o fogo sobe por seu braço.
Não. Não posso deixar isso acontecer, aquilo tinha sido um sonho, mas agora é real, sei disso porque estou sentindo seu toque, sinto sua presença bem aqui. Ele tentou me ajudar e eu o machuquei.
Ethan me olha com súplica nos olhos, ele não diz nada. O fogo começa a consumi-lo, me amaldiçoo por perder o controle e levá-lo a ruína comigo. Sua armadura está derretendo, há lagrimas em seus olhos.
- Eu não me importo em morrer, desde que seja por uma boa causa.
- Eu não queria. - Consigo dizer.
- Você consegue princesa, faz o que deve ser feito. - Ethan fala ainda segurando minha mão. - Só peço para que se possível, um dia me perdoe por tudo que lhe fiz.
- Ethan eu não consigo fazer isso parar. - Digo com lagrimas escorrendo como uma torneira aberta.
- Tudo bem, vai ficar tudo bem. - Sua voz sai falhada.
O calor era intenso, ele não resistiria por muito mais tempo, eu preciso me controlar ou então serei a destruidora de tudo que existe, é meu dever como rainha de protegê-los, mas e se o perigo for eu mesma?
Eu não tenho outra escolha senão aprender a lidar com isso.
- Você consegue princesa. - Essas foram suas últimas palavras antes de desabar e soltar minha mão.
- NÃO! POR FAVOR, NÃO! ETHAN! ETHAN! - Meus gritos soaram abafados, por que ninguém me ouvia pedir ajuda? - ETHAN!
Sinto um chacoalhão. E meu nome sendo chamado.
Então acordo ensopada de suor, desnorteada com o pesadelo realista. Ainda sinto o cheiro de fumaça pairando no ar.
- AUDREY! - Phillip gritava a uma certa distância.
- Vá buscar água seu inútil. - Ouço o ralhar de June uma resposta de Harry, mas ainda estou atordoada pelo sono pesado de modo que demoro um instante para perceber o que está acontecendo.
- E você garota pegue aquele maldito pássaro. - June soava irritada e, preocupada? - Vamos, reaja vossa majestade!
É quando me dou conta do que estou fazendo involuntariamente.
Há fogo em volta de mim, um círculo me mantendo dentro e se alastrando muito rápido. Minhas mãos estão agarradas num emaranhado provocando uma esfera cintilante que soltava faíscas para todo lado.
Phillip corre até a direção do lago com várias garrafas em mãos, Harry... merda!
Harry está desacordado, caído muito perto do fogo e sem proteção alguma, o livro de magia aberto jogado ao seu lado. Aparentemente se feriu tentando me ajudar a acordar e agora está prestes a ser queimado se eu não me controlar.
Camilla tenta atirar num pássaro amarelo que cantava uma melodia conhecida, que me causou uma sensação ruim, um arrepio pela espinha subindo até a nuca, como se eu estivesse o tempo todo ouvindo ele mas só agora me dado conta do que é verdadeiro e do que fora apenas um sonho.
Tive uma paralisia do sono e quase coloquei fogo nos meus amigos.
Me concentro sem saber como comecei para parar a magia que pulsa dentro de mim, querendo mais, sedenta por escapulir para fora.
Fecho os olhos, tento pensar em coisas positivas como Kai me ensinou, mas não sei se funciona como com o clima, são partes deferentes da magia, um pedaço mais mortal por assim dizer, esse que está corroendo de dentro para fora como um maldito verme incontrolável, crescendo a cada segundo. O pior de tudo é que ele se alimenta da minha energia, de modo que estou esgotada para tentar qualquer coisa.
Reúno o máximo de energia drenando-a para algo que possa me manter na realidade, relembrando momentos alegres até que surge uma pessoa, seu sorriso muda tudo, mesmo com os conflitos internos é ele quem me mantem sã quando preciso, ele me ajuda a enxergar a realidade e o que preciso fazer.
Fecho as mãos. A esfera some.
Phillip chega com a água e consegue apagar o círculo de fogo antes de atingir Harry.
June não faz nada para ajudar o garoto caído no chão, então eu me levanto ainda cambaleando pela falta de energia.
- Em vez de ficar dando ordens por que não o tirou de perto? Eu poderia tê-lo atingido. - A aspereza da minha voz me espanta tanto quando a ela, que prontamente tem uma resposta à altura.
- Não venha me culpar quando o único motivo dessa comoção é você e seu problema amoroso que trama com o inimigo. - June parece estranhamente preocupada com a situação. - Caso não tenha percebido, você só acordou porque esse garoto teimoso lançou uma magia em você. Estava gritando como uma maluca e revirando como se estivesse possuída, passou horas falando uma língua desconhecida e se contorcendo, resolvemos intervir quando vi faíscas saindo das suas mãos.
A elfo dizia aquilo num tom de irritação enquanto puxava Harry pelo braço com ajuda de Phil, ambos me encarando como se estivessem com medo.
- Quando aquele pássaro começou a cantar você ficou estranha, acho que a memória provocou um gatilho do passado e se fundiu com o presente, te deixando num estado de transe, presa entre o mundo fictício e o real. O fator das emoções desencadeou seu poder. - Quando Phil explica posso ter uma ideia do que fiz, e não gostei disso.
- O Lancaster te fez acordar para o estrago não ser maior, com isso precisou ficar o mais perto possível até que desabou como um saco de batatas, deve ter se sobrecarregado pegando uma parte da sua dor. - June o coloca encostado no tronco da arvore.
Não acredito em tudo que fiz. O canto do pássaro, o fogo, em parte eram reais, mas Ethan e o lago eram minha imaginação.
- Me desculpem. - Falo envergonhada. - Prometo que isso não acontecerá mais.
- Não faça promessas que não pode cumprir. - June murmura. Seu olhar dizia "eu disse para tomar o antidoto sua burra".
As lembranças estão confusas, não tenho certeza se sonhei que tomei as gotas, ou foi real.
De todo modo, decido que ter June no meu pé seria bom para manter as coisas em ordem e me lembrar de ingerir as doses corretas.
- Que ele não me ouça, mas se não fosse por aquele garoto nem sei o que teria feito parar você. - June fala com sinceridade.
- Tarde demais, já ouvi. - Harry responde com um riso de diversão em seu rosto levemente abatido.
Phillip continha um riso temendo levar um tapa da elfo extremamente irritada.
- Acho que estou na horta errada, porque não foi isso que plantei. - June suspira e revira os olhos com seu humor ácido.
- Peguei, consegui pegar o pássaro. Acho que vão gostar de ver isso, não sei como é a anatomia de uma ave, mas tenho certeza de que não envolve engrenagens e parafusos. - Cami trazia o pássaro desmontado em sua mão.
•••
PRÓXIMO CAPÍTULO EM ANDAMENTO...
O QUE ESTÃO ACHANDO DESSA SEQUÊNCIA?
PS: DEIXA A ESTRELINHA
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