040| Imaginatic addictions

040 | Vícios Imaginativos
BELLAMY BLAKE

Sabe, mesmo depois de tantos anos, eu ainda consigo lembrar perfeitamente o quanto foi difícil entrar naquele foguete sem Clarke e Rayna. Deixá-las pra trás seria uma culpa que eu carregaria pelo resto dos meus dias. Saber que elas morreram nos salvando, jamais soltaria da minha mente.

E da porra do meu coração.

Por anos, repeti minha última interação com Rayna e não importava qual era o meu modo. Se eu estava dormindo, vinha em sonho. Se eu estava acordado, vinha em lembranças, em palavras que ainda soavam em meus ouvidos.

E comecei a me perguntar se eu não estava mergulhado em culpa. Eu praticamente falei que jamais conseguiria viver com ela durante esses seis anos e ela... ficou.

Ela me deixou ir e morreu por isso.

Por anos, eu não soube quem eu poderia ser dentro daquela bolha, como eu poderia ajudar porque dentro da minha mente, eu não passava de um idiota que tinha acabado de matar a pessoa mais importante da sua vida. Rayna é... era.

Sempre que eu tentava esquecer, os pesadelos se arrastavam para mim, me deixando incapaz de esquecer sua voz ou o seu rosto.

Até que, para me ajudar, comecei a fingir que ela estava ao meu lado. Todos os dias, cada passo que eu dava, eu imaginava ela do meu lado, conversando comigo, rindo das minhas palhaçadas ou apenas me observando, como eu amava que ela fazia, pensando que eu não estava percebendo.

Eu até conversava com ela.

Pensava mesmo que estava superando de alguma forma porque a única forma de supera-la, era imaginando-a ali, comigo. Era imaginando que aquelas palavras duras que entreguei a ela não passaram de uma bobeira da minha parte e que ela entrou naquele foguete e me perdoou. Que conseguimos viver juntos.

Então eu comecei a me drogar.

Remédios que me faziam vê-la, acompanhar seu dia-a-dia. Raven e os outros tiveram que intervir, caso contrário, eu teria uma overdose.

Foi quando eles pararam de ser pacientes comigo.

— Ela morreu! — Gritou Aspen e foi quando eu notei que a sua dor era semelhante a minha. — Ela se foi, Bellamy. E não tem nada que você possa fazer. Se drogar, imagina-lá, ela não está aqui, cara.

— Eu a matei — chorei, meus ombros se abaixando e tremendo.

E tudo começou a ficar turvo, o chão começou a mudar de lugar e parecia que meu coração estava se revirando dentro da caixa torácica. Era como se não existisse mais lugar pra mim no mundo.

Não sem ela.

— Eu a matei... — ofeguei, sem rumo. As lágrimas sujaram meu rosto e estou chutando alguma coisa, minha mão deve estar sangrando, não sei.

Mas quando parei, estava sentado no chão, apoiado na parede, suado, sem ar e com dor.

— É... — sussurrou Aspen. Eu poderia ver seus olhos. Ele jamais me perdoaria. — Você a matou. É isso que quer ouvir, porra? Você matou ela. Deixou ela como um idiota. Ela te amava e você virou as costas pra ela. Desistiu dela.

Neguei, lento. Não desisti. Eu apenas... estava cego.

— Ache uma maneira de viver por ela. De honrar sua memória. Caso contrário — ele fez uma careta, com amargura —, eu mesmo mato você nesses próximos cinco anos.

Aspen poderia demorar pra me perdoar, poderia me odiar de uma forma que nunca odiou ninguém. Poderia querer pegar minha cabeça e jogar na parede até que eu virasse apenas um poça de sangue aos seus pés. Mas nada que ele fizesse poderia ser pior do que eu queria fazer comigo.

Os anos se passaram e como uma fase, eu... segui em frente? Não sei dizer se esse é a maneira certa de dizer que eu ainda penso nela. Todos os dias. Rayna não saiu da minha cabeça nem por duas horas durante esses seis anos. Mas... eu não me drogo mais pra vê-la.

E nem fico imaginando ela no meu cotidiano.

Ela se tornou apenas uma... lembrança. Algo que apertava o meu peito sempre que eu lembrava, que me fazia desejar voltar no tempo para fazer mil coisas diferentes com ela.

Mas eu diria que consegui supera-la.

Quando desci pra terra novamente, com a ajuda de Eligius, pronto para proteger nossos povo que devia estar sendo mantido presos por aquelas novas pessoas que antes estavam confinados no Espaço com a gente, eu não podia dizer que esperava.

Eu posso ter pensado nisso, mas eu sabia que era apenas uma parte de mim que ainda queria consertar as coisas que não davam mais para serem consertadas.

Mas então aquela garotinha nos salvou dos guardas que apontavam armas pra gente, esperando suas ordens. E chamou o meu nome.

Então contou que Clarke e Rayna ainda estavam vivas. O mundo pareceu me impressar no lugar, consegui sentir Echo me olhando e a nossa conversa de antes de sair do Espaço voltou pra mim.

Prometi a ela que nada mudaria entre a gente, que seguiríamos firmes e fortes depois que pisássemos em solo. Mas aguentaríamos passar pelo furacão de Rayna Kane? Ou melhor, de Rayna kom Skaikru.

Minha pele se revirou no meio tempo em que levei pra bolar um plano e dar um dever para cada um. Sabíamos que isso estava acontecendo. Era por isso que Aspen, Murphy e Raven estavam lá em cima. Eles tinham 283 garantias.

A garota que se disse se chamar Maddie me levou até uma aldeia, que ela explicou ser o lugar em que elas viveram esses anos. Que foi o único lugar que sobreviveu a Onda Mortal.

Assim que chegamos, já tinham armas apontadas em nossa direção. Impedi Maddie de sair, não poderia colocar uma criança em perigo e, além do mais, eu tenho tudo sobre controle.

Peguei a xícara e sai com as mãos pro alto, deixando claro que eu estava desarmado e que só queria conversar. Depois, confessei que tínhamos metade do seu povo, lá no Espaço, sobre o nosso comando. Poderíamos matá-los enquanto dormiam, se quiséssemos.

E quando a mulher que reconheci como a Coronel Diyoza falou:

— Duzentas e oitenta e três vidas em troca de duas? Elas devem ser importante pra você.

Meu olhar pegou Clarke primeiro, seus cabelos estavam curtos a cima do ombro e com algumas mechas rosa. Ela me olhava com lágrimas, mal acreditando e tinha uma coleira de choque em seu pescoço. Mas então, meus olhos escorregaram para cima e lá estava ela.

Sinceramente, quase não a reconheci.

Rayna estava muito mais magra que a última vez que eu a vi. Sua pele ainda era bronzeada, mas seus cabelos que desciam em ondas estavam com algumas manchas mais claras que outras, como se ela tivesse passado muito tempo no sol.

Suas roupas não passavam de trapos, sua blusa debaixo da jaqueta de couro rasgada mal cobria seu torço, deixando uma parte da sua pele à mostra.

Encarei seus olhos, por fim, e foram os que mais me assustaram. Estava à espera daquele seu brilho que sempre acabava me deixando de joelhos, que quase me fez recuar na nossa última briga, que me conquistou facilmente.

Mas eles... não estavam lá.

Então a analisei novamente, esperando dar um clique em minha mente e perceber que não era Rayna. Mas era ela. Seus olhos estavam mais sombrios e toda sua postura nos braços daqueles homens diziam o quanto ela mudou.

Mas ainda assim, confirmei:

— Elas são.

Depois que eles confirmaram que estávamos falando a verdade sobre estarmos com o seu povo lá no Espaço, começamos a conversar para chegar a um acordo. O tal de McCreary não parecia muito comovido a favor dos seus parceiros em nossas mãos.

Ou eles pensavam que não teríamos coragem.

Se eles não liberarem Clarke e Rayna e não aceitar nossos acordos, Raven vai apertar aquele maldito botão e matar todos enquanto ainda estão dormindo. E se ela não fizer, Aspen com certeza vai tomar a frente.

Deixei meus objetivos limpos em sua frente. Eu queria abrir aquele bunker e libertar minha irmã, junto com os 1200 terrestres que ali se apossaram. Depois, podíamos dividir esse pedaço de Terra ao meio. Não tinha motivos para guerrearmos, se eles aceitassem.

Por sorte, a resposta foi sim.

Fui conduzido para entrar na nave deles logo depois, que seria o meio de transporte em que seguiríamos viagem até Polis. Exigi que fosse levado até as garotas e fiquei feliz por não ter que falar uma segunda vez.

Assim que passei pela porta onde elas estavam, ganhei a atenção de Clarke, que estava deitada em um banco que havia na sala. Procurei Rayna pela sala antes de avançar. Ela estava sentada no chão, pernas cruzadas, os olhos fechados.

Era seus pensamentos. Eles estavam consumindo ela, eu sabia disso.

Segui em frente, até Clarke e abracei ela, cheio de alívio. Meus olhos desviaram novamente para a garota no chão, que agora tinha seus olhos abertos e fixados no chão.

— Maddie? — Clarke quis saber sobre a garotinha, assim que nos soltamos.

Consegui sentir o olhar de Rayna subindo para me ver, demonstrando que ela estava interessada na resposta.

— Ela está segura — garanti, acenando com a cabeça para as duas. Clarke repetiu o gesto, mas ela... é como se eu fosse um inseto. — Está na floresta com os outros. Diyoza não vai atrás deles se estivermos no controle.

— Ainda estão todos vivos? Murphy, Monty, Raven, Aspen...

— Echo, Emori e Harper. Sim. Vocês duas salvaram a todos nós — distribui a atenção entre elas duas, agradecido.

— E agora você está em casa.

Assentimos um para o outro e voltamos a nos abraçar. Dessa vez, nos afastamos quando ouvimos um barulho na sala.

Rayna conseguiu nossa atenção quando ela se levantou. Seu olhar foi direto pra Clarke quando ela se virou para vir pegar sua jaqueta e então, deu as costas pra gente e foi em direção a saída.

— Pra onde você vai? — Clarke interrompeu ela e levantou do assento, se aproximando. Prestei atenção na interação das duas. — Só porquê nos liberaram não quer dizer que...

Levantei lentamente ao ver a cena de Rayna desviando do toque que Clarke ia dar em seu pulso. Então ela se inclinou, o rosto impassível.

Nada mudou — puxei o ar quando ouvi sua voz e abaixei o queixo, lamentando por toda aquela... antipatia em seu tom. — Vou ir pegar minhas armas.

— Rayna, eles não vão dar!

— Eu não estou indo pedir permissão.

Ela desapareceu no corredor. Meu primeiro instinto foi avançar para impedi-la de fazer alguma besteira, que ela parecia não ligar de fazer. Mas Clarke se colocou em meu caminho e eu franzi as sobrancelhas, confuso.

— Deixa ela.

— Não? Temos um acordo recente, Clarke. Se Rayna tentar alguma coisa e sair machucada, eu...

— Ela não vai sair machucada — cuspiu, com escárnio. — Eles vão, se escolher se meter no caminho dela.

Contorci mais a cara e encarei aquele corredor, sem nenhum vestígio de sua presença. Recuei até me sentar no banco novamente. A sala se tornou vazia, fria. Como se ela nunca tivesse estado aqui.

E então o corredor.

Rayna sempre deixou uma marca onde quer que fosse. As vezes, ela não precisava nem falar. Era aquele seu jeito quente de tratar as pessoas, a sua preocupação além do seu ser. O seu instinto de proteger àqueles que não conseguem ser protegidos sozinhos.

Mas agora? Nada disso ficou pra trás quando ela desapareceu da nossa vista.

Era como se minha mente estivesse trabalhando para adequar as versões e quando mais consigo decifrar a dela de hoje, mais a do passado vai escorregando de mim. Eu não sei porque me importo, mas me importo. E quando menos percebo, estou segurando-a com toda a minha força para não escapulir sem deixar resquícios do lugar mais importante.

— O que aconteceu com ela? — Exigi saber, encarando Clarke.

Clarke também parecia mudada. Aliás, com certeza estava e não apenas pelo corte de cabelo. Tinha alguma coisa em seus olhos. Atrás deles também, aquele espaço que denominamos de alma.

Mas ainda conseguia ver sua preocupação e zelo pelos outros e agora, apesar de tudo, poderia dizer até mesmo que ela se tornou alguém que pensa mais em suas decisões de vida ou morte.

Mas Rayna...

— Tudo — Clarke sussurrou, me pegando de surpresa. — Tudo o que poderia acontecer com ela, aconteceu. Sinto muito, Bellamy. Não posso falar mais do que isso, não é sobre mim.

— Eu entendo.

— Só... esqueça a Rayna de seis anos atrás — aconselhou, tocando em meu ombro. — Caso contrário, essa Rayna vai te machucar.

(...)

Uma viagem de cinco horas depois, estávamos em Polis. A nave decidiu por estacionar um pouco longe de onde iríamos começar o trabalho de pegar os destroços de casas que estava sobre aquela Cripta.

Clarke estava mais leve depois de ter falado com Raven, Murphy e Aspen por rádio, que continuam no Espaço com os povos da Diyoza como reféns. Todos eles estavam também depois de descobrir que elas duas estavam vivas.

Aspen perguntou de Rayna, mas ela não estava por perto pra falar com ele. Saber que ela estava viva deveria ser o suficiente, mas eu entendi que na verdade, não é.

Demorou algum tempo para conseguirmos retirar tudo aquilo, mas assim que os mais pesados se foram, o chão foi quebrado ao meio, em um espaço curto o suficiente para descermos e subirmos.

Eu desci primeiro, dando de cara com o que parecia ser uma... arena e minha irmã, Octavia. Trocamos olhares sem acreditar e ela soltou o que parecia ser uma espada, pulando em mim para um abraço. Peguei ela em meus braços, sentindo seu jeito.

Clarke desceu junto segundos depois, tirando um tempo maior do que eu tirei para dar uma analisada melhor no espaço e no que tinha no rosto da minha irmã. Aquilo era sangue?

Elas duas se cumprimentaram e o olhar amedrontado e confuso parou no meu.

Diyoza e McCreary desceram logo depois para ajudar na retirada. Encarei aquele buraco a cima da nossa cabeça, me perguntando se Rayna desceria também. A única vez que encontrei ela depois de a mesma ter saído na missão pra pegar suas armas foi quando aterrissamos.

Ela estava com um cinto cheio de armas, com sua 9mm na cintura e as espadas encaixadas atrás de suas costas, formando um 'X' com os cabos.

Enquanto Clarke ia conferir sua mãe, apresentei minha irmã para a Coronel, que parecia intrigada:

— Octavia, esta é a coronel Diyoza.

— Coronel?

— Costumava ser — explicou, simplista. — Aliás, adorei a pintura de guerra.

O clima ficou fechado enquanto as duas se olharam e decidi interromper a fim de retirarmos essa gente daqui. Diyoza deu a ideia deles irem recolher suas coisas, mas eles apenas recuaram com um aceno de Octavia. Tentei não focar naquilo nesse momento, seis anos se passaram, eu sabia que as coisas mudariam.

— Exatamente quantas pessoas devemos preparar para a extração? — Perguntou McCreary.

— Mil e duzentas — respondi.

Mas Octavia falou por cima:

— Oitocentas e quatorze.

A primeira a subir foi Octavia, enquanto seu povo entoava "Das cinzas, ressurgiremos". Seguido de mim, Nate Miller subiu e nos cumprimentamos com um abraço. Ele estava armado.

— O acordo era sem armas — disse a Octávia, que estava desfrutando da luz do sol que foi privada por esses anos.

— Não o meu acordo.

Seu olhar tomou foco depois disso e ela avançou um pouco, estreitando os olhos para a pessoa que estava sentada aqui em cima, onde tinha os destroços ao redor. Rayna estava de costas para Octavia quando ela começou a se aproximar lentamente, como se não acreditasse.

Mas então Octavia pisou em uma pedra e ela saiu rolando lá pra baixo, assustando Rayna que pulou no lugar em que estava sentada imediatamente, sacando uma de suas espadas e colocando na garganta de Octavia por puro reflexo.

As duas interligaram seus olhos, uma reconhecendo a outra. Octavia abaixou a guarda primeiro que Rayna, que analisou aquele sangue na testa de Octavia e sua vestimenta. De forma lenta, retirando um suspiro de mim, ela abaixou sua espada e voltou a colocar ela no estojo em suas costas.

Indra se aproximou e curvou levemente a cabeça, entoando:

— Heda.

Meu olhar disparou para Octavia, que não teve nenhuma reação contra. Então encarei Clarke, que parecia estar segurando a respiração. Ela percebeu meu olhar e devolveu, reconheci imediatamente o que tinha por trás deles.

Ela estava com medo.

Estava nervosa.

Atrás de Indra, um dos terrestres havia acabado de subir. Ele tinha marcas de Azgeda em seu rosto. Eu me lembrava dele. Era o guarda que tirou Rayna da cela para ela falar com o seu rei, Roan e que ficou apressando ela para ir até o altar, há seis anos atrás.

Ele percebeu imediatamente Rayna ali e se aproximou, ajoelhando-se em sua frente, a cabeça baixa.

Foi quando Rayna pareceu acordar. Mas não de um jeito bom.

Em um movimento rápido demais, ela foi pra trás dele e chutou suas costas. Avancei, assustado e surpreso enquanto via o corpo do homem tombar com os destroços.

Ela não esperou a reação de ninguém e avançou pra descer dos destroços, marchando até o homem que tinha acabado de chegar até o chão. Ele pareceu gemer de dor e tocou na testa, que sangrava.

Todos nós descemos atrás dela, confusos, sem rumo. Até mesmo Octavia parecia sem saber o que pensar nesse curto momento em que Rayna terminou de chegar até ele e puxou seu cabelo pra ele se levantar.

Ajoelhado em sua frente, de costas pra ele, Rayna expôs o pescoço dele e colocou uma adaga ali, ameaçando.

— O que você está fazendo? — Gritei.

Rayna ergueu a cabeça e seus olhos imprensaram nos meus um pouco antes de subir. Virei pra trás, vendo outros subindo e se assustando com a cena da Comandante com uma faca no pescoço de um dos seus seguidores.

— Ele é um exemplo — ela gritou, pouco se importando com a gente bem a sua frente. Ela estava falando para os terrestres que não paravam de subir. — O próximo que se ajoelhar perante à mim ou me reconhecer como sua Comandante, eu quebrarei seus joelhos e cortarei suas gargantas. Poupem-me do trabalho.

Ela voltou a chutar as costas do homem que caiu pra frente, tendo ajuda de Indra pra se levantar. Rayna voltou a colocar a adaga no cinto e levantou o queixo. Os outros desviaram os olhos, mas Octavia deu um passo à frente.

Minha irmã parecia prestes a explodir. E não era de um jeito bom.

Rayna percebeu isso e voltou a encara-lá nos olhos.

— Algum problema?

— Você é Wonkru — ela começou, fria, se aproximando pra ficar cara a cara com Rayna — ou você é inimigo dos Wonkru — então ela estendeu a mão até Indra que hesitou por meio segundo antes de entregar uma espada para Octavia que inclinou na direção de Rayna. — Escolha.

— Oc... — Avancei, mas então meus braços foram pegos por trás.

Era Nate.

Encarei Clarke, que estava na mesma situação, com um dos outros terrestres segurando-a.

Voltei a ver a cena que estava se desenrolando na minha frente, sem saber o que esperar ou se devia me preocupar. Eu chutei que deveria no momento em que Rayna sacou uma de suas espada das costas e bateu na de Octavia, que contra-atacou no mesmo segundo.

As duas travaram uma batalha de espadas, cuja vencedora não estava muito clara em nossos olhos. Ninguém ousou separar. As únicas pessoas que estavam dispostas a fazer isso era Clarke, Marcus — que tinha acabado de subir — e eu. Mas estávamos presos e ninguém mais se atrevia a entrar no meio daquelas duas.

Até mesmo os mineradores do grupo da Coronel Diyoza pararam para ver, mas eles pareciam estar se divertindo.

Um deles soltou um urro quando o cabo da espada da minha irmã acertou o queixo de Rayna, fazendo-a recuar pra trás com a mão na boca que tinha começado a sangrar.

Octavia hesitou e parou. Respirou fundo e não olhou pra gente quando voltou a falar:

— Você é Wonkru ou você é inimigo dos Wonkru — eu, o irmão que a conheceu a vida toda, reconheci sua voz embargada. — Escolha.

— Octavia, por favor! — Gritou Marcus, algemado com Abby ao seu lado.

A cena pausou com Rayna segurando o seu queixo, o rosto virado pra trás, os ombros curvados para o lado. Sua respiração estava ofegante, dava pra ver o suor daqui brilhando na sua pele bronzeada, seu cabelo que havia sido preso em um rabo de cavalo, agora tinha alguns fios soltos e grudados em sua testa.

Um vento passou no momento em que Rayna começou a virar pra encarar Octavia novamente. Foi bem lentamente, como se alguma chavinha tivesse virando em sua mente.

Mas assim que ela voltou a ficar de frente, ninguém teve tempo de analisar seus olhos que brilharam em uma frieza gélida, quase mortal apenas de olhar. Ela simplesmente se abaixou e deu um arrastão em Octavia que, pela surpresa, caiu no chão de costas.

Sua katana se arrastou pelo chão até estar aos meus pés.

Rayna parou em cima dela, sua espada na garganta da minha irmã. Então ela falou, por fim:

— Eu não sou Wonkru e também não sou inimiga dos Wonkru. Mas se fizer alguma palhaçada próxima disso novamente, os Wonkru serão meus inimigos — ela se abaixou sob os tornozelos e colocou a espada em suas costas. Com os antebraços apoiados nas suas coxas, ela encarou Octavia no chão, despreocupadamente. — Estou há seis anos tentando encontrar algum, Oc. Não me faça querer saciar-me logo com os Wonkru.

O que ela quis dizer com isso?

— Eu sou Wonkru — deu ênfase Octavia, se inclinando.

Rayna encarou ela, sem nenhuma expressão.

Lembro-me da época em que conseguia distinguir o que ela estava pensando ou sentindo apenas ao olhar pro seu rosto. Rayna era expressiva. Talvez não por querer, mas ela costumava ser, ao menos. Era fácil ver que ela estava irritada ou que estava presa em um dilema.

Era fácil distinguir sua dor.

Mas até mesmo ela parecia estar sendo guardada à sete chaves do mundo real, da gente. Eu entendo sua frieza em relação a mim. Disse coisas há seis anos atrás que eu... que eu me arrependo.

Mas Octavia? As duas eram praticamente irmãs e agora estão se olhando como se quisessem abrir a cabeça uma da outra. Clarke? Por que Clarke não era a válvula de fuga de Rayna? Por que parecia que o relacionamento das duas apenas piorou nesses anos? Recuso-me a pensar que foi realmente isso que aconteceu, caso contrário, a vida das duas teria sido muito mais solitária do que seria.

Rayna voltou a se levantar, meus olhos agora analisando cada ponto estranho do seu corpo, esperando que a qualquer momento o universo pausasse essa cena e começasse explicar o que aconteceu com ela.

Mas isso, claro, não aconteceu.

Indra ajudou a Octavia a se levantar e Rayna encarou Marcus, algemado.

O homem rapidamente passou por Octavia que o observou com os olhos estreitados e abraçou a filha. Rayna continuou parada, se deixando ser abraçada pelo pai, mas não devolvendo o contato de forma imediata. Aos poucos, ela o abraçou também.

Mas seus olhos não fecharam como costumavam fechar quando ela encontrava conforto nos braço de alguém. Seu olhar continuou focado nas pessoas.

Então ela chegou até mim.

Nossos olhos bateram um no outro, eu forcei a interação, desejei segura-lá.

Mas ela fugiu.

Estreitei os olhos e perguntei pra mim mesmo. O que aconteceu com você?

Espero que estejam gostando.

FELIZ ANO NOVO!

Eu disse que ia tentar escrever uma maratona de 4 capítulos pra postar aqui pra vocês, mas infelizmente, não será possível para o hoje. Mas eu espero que sua virada de ano esteja sendo (ou tenha sido) muito boa!

Obrigada pelos 60K de leitura!! O melhor presente que vocês podiam ter dado pra mim.

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