039| Past lives
039 | Vidas Passadas
CLARKE GRIFFIN
"Querida, Rayna
Seria demais pedir pra não me achar um covarde? É que o mundo passou dos limites comigo, sinto como se precisasse passar dos limites com ele também. Mas foi quando eu entendi e, preciso que entenda também, não foi o mundo. Foram as pessoas.
As pessoas destruíram tudo desde sempre. Desde as bombas lançadas há anos atrás, que nos fez nascer no Espaço, condenados por regras que, apesar de tudo, nos mantiveram vivos e sãos. Desde que pisamos na Terra, tudo o que sabemos sobre ela é que dói. Sei que pode ter existido momentos felizes, mas todos eles fogem da minha compreensão quando eu lembro dos tristes.
Quando entenderemos, por fim, que o problema é a gente? Seres que preferem guerrear até a morte em vez de torcer um pouco o braço pra dizer que erraram? Mas quem errou nisso? Os terrestres, que só queriam sobreviver? Os montanheses, que só queriam sobreviver? A gente...? Que só queria sobreviver? Consegue perceber o princípio? Ficamos focados tanto em sobreviver que nem percebemos que somos nós que colocamos nossos limites. Todas as mortes, toda a dor que você, eu e tantos outros passaram, ninguém tem mais culpa do que nós mesmos.
Nós envenenamos a terra e como a gente, ela só está tentando se defender. Essa Onda da Morte há alguns dias da gente é só uma arma de defesa. Ela quer sobreviver, mas entende que para parar de se machucar, precisa se sacrificar.
Essas palavras não é para a Comandante dos 13º clãs. Não é para a grande Heda. Nem para a Azheda. Nem para Rayna Kom Skaikru. Nem para a Rainha da Nação do Gelo. Nem para aquela garota que assassinou Cage Wallace a sangue frio. Essas palavras são para Rayna Kane, a garota que foi presa pra salvar o melhor amigo da flutuação, que foi traída por um guarda que só tentava proteger sua irmã. Essas palavras é para Rayna, que perdeu Benjamin Wallace. Que torturou seu melhor amigo e que matou sua súdita.
Desista da Terra, Rayna. Só... pare de lutar. Vai se sentir melhor. Eu me senti.
Sempre a invejei. Pela coragem, no ínicio. Depois, por ter conseguido salvar Benjamin Wallace de Monte Weather. Queria ter salvo Maya. Invejei você por todo esse tempo, Rayna. Espero que se limpe depois que eu for embora.
P.S: Eu ainda estou te devendo um encontro.
Com amor, Jasper."
Essa foi a carta escrita a mão por Jasper antes dele se matar, para Rayna. Encontrei entre os dois meses que fiquei rodando a terra, tentando encontrar um lar e suprimentos. Junto com uma caixa — a única coisa que sobrou de Arkadia — repleta de lembranças, tinha essa carta destinada a Rayna e ao Monty.
Tentar me infiltrar na Cripta de Becca foi um erro que eu logo percebi.
Tentei fazer barulho, tentei retirar cada maldita pedra daquele lugar, mas tudo o que eu conseguia era mais trabalho, mais decepção e menos suprimentos de sobrevivência.
Minhas esperanças pode ter começado no minuto em que escavei até encontrar esse Rover, mas elas acabaram assim que encontrei cada lugar que já chamei de casa em ruínas. Essa era a minha vida durante todos esses anos. Solitária, esperando resquícios de chuva para conseguir sobreviver e comendo frutas podres pra ganhar tempo.
Mas eu não tinha esse tempo e nem um lugar sustentável para viver.
É doentio dizer que a única coisa que está me mantendo sã é falar sozinha por um rádio inútil que não transmite mensagem para ninguém? Mas eu finjo que sim.
Os campos solares foi uma das minhas tentativas de esperança. Eu sabia que eu podia estar certa, então... caminhei. Caminhei por dois dias no deserto, com um único cantil de água e zero suprimentos.
Mas não tinha nada.
A terra havia sugado tudo.
Eu estava cansada de lutar. Estava prestes a acabar com o meu sofrimento de uma vez por todas. Viver não valeria mais a pena. Seria doloroso fingir estar conversando com alguém. Seria prejudicial começar a comer as árvores. E sobreviver pelas chuvas não era vida.
Eu estava cansada de sobreviver.
Eu não tinha mais motivos.
Então eu gritei:
— Chega! Está me escutando? Eu perdi tudo! Perdi meus amigos. Meu pai! Minha mãe! Perdi a Rayna! Não tenho mais nada.
Não fazer o que eu tinha que fazer — que no momento era meter um tiro na minha testa — era só adiar o inevitável. Jasper tinha razão. Não tínhamos mais motivos pra lutar. Eu não tinha mais nenhum motivo para lutar. Para querer sobreviver.
Mas então eu encontrei.
Junto com uma floresta, uma pequena aldeia colorida com árvores verdes, um lago com água e casas. Suprimentos. Esperança.
Era como se a Onda Mortal tivesse pulado esse espaço do mundo. Um... milagre. A placa dizia que era o Clã do Vale Raso e que a aldeia se chamava Shenandoah. Entrar lá e ver tudo com vida foi uma experiência alucinante. Mas ver todos aqueles corpos que não sobreviveram a radiação...
Mas o mais surpreendente? Foi saber que ainda havia vida nesse lugar.
Foi difícil entrar em contato. Resultou em muita perda de sangue da minha parte, paciência e desejo de viver, mas consegui o que era impossível para a minha eu de algum tempo.
Ela se chamava Maddie.
E seis anos depois, se tornou alguém tão importante para mim que era como se fosse do meu sangue. Como se fosse... minha família.
— Só estou dizendo, Skairipa é uma fera. É claro que ganharia o conclave.
Com ajuda de um caderno de desenho com a cara de cada um dos meus amigos, eu passei todos esses anos contando cada história de sobrevivência que havíamos passado. Deixando de fora apenas... ela.
— Foi o que eu disse! Mas ninguém deu ouvidos pra mim.
— Tia Rayna! — Maddie se levantou rapidamente do meu colo, esquecendo a pintura que eu estava fazendo em seu cabelo para correr até a mulher encostada em uma árvore.
Maddie rodeou sua cintura, com um sorriso maior do que antes. Acabei sorrindo também. Mas não muito.
Encarei Rayna, vendo-a sorrir tão pequeno que não dava para saber se ela estava mesmo animada. Então ela deu uns tapinhas na cabeça de Maddie e se afastou, pegando um dos fios do cabelo dela.
— Rosa não combina com você — debochou enquanto Maddie revirava os olhos, que estavam mais brilhantes agora.
— Chegou há quanto tempo? — Questionei, me levantando e parando em sua frente.
Sem cumprimentos, sem boas-vindas. Nada. Era como se fôssemos duas estranhas dividindo o único espaço que sobreviveu na terra.
— Há alguns minutos. Passei na aldeia pra reabastecer o congelador.
— Carne de coelho? — Maddie fez uma careta.
— Consegui encontrar alguns esquilos. Acho que eles estão procriando.
— Veio pra ficar? — Cruzei os braços, sem saber como agir perto dela. Eu não sabia desde aquele dia... — Voltou mais cedo que o costume — ela desviou os olhos e eu já sabia o que significava.
Desviei o assunto, deitando ao lado de Maddie, que começou a relembrar algumas histórias que passamos há alguns anos, sempre colocando Rayna na conversa que contribuía com um levantar de queixo e um dar de ombros, seus olhos perdidos na fogueira em nossa frente.
Até que Maddie dormiu.
Continuei ao seu lado, observando seu rosto sereno e sem dor. Algo que seria muito diferente se os Guardiões da Chama encontrassem ela, que era uma Natblida de sangue puro, assim como Rayna.
Olhei para a mencionada, vendo ela encarar o fogo na mesma posição.
Delicadamente, retirei Maddie dos meus braços e cobri ela com um cobertor. Então rodeei a fogueira e me sentei ao lado de Rayna, que continuou a descascar as castanhas como se eu não tivesse aqui.
— Voltou cedo demais — voltei a comentar, sem desviar os olhos da chama. — Sei o que isso quer dizer. Vai ficar fora por quanto tempo?
— Algumas semanas. Meses, no máximo — respondeu, a voz fria que eu já estava acostumada.
Ela nunca ficava aqui. Desde que eu encontrei esse lugar e fui a procurar pra vivermos juntas. Ela começou saindo pra se exercitar, voltando dias depois. Suas desculpas eram que ela estava explorando a área, reconhecendo os suprimentos que essa floresta poderia dar.
Então, um ano depois, essa desculpa se esgotou. Rayna então começou a caçar, demorava semanas pra chegar em casa, mas quando chegava, estava carregada de pássaros, sementes para plantio e alguns objetos que fazia a alegria de Maddie.
Até que os dias e as semanas viraram meses.
Eu não sabia pra onde ela ia nesse tempo, mas tinha certeza que não era apenas nessa área limitada da floresta. As vezes, ela pegava o Rover, mas as vezes, ela ia de pé. Era quando ela demorava mais.
Mas ela sempre voltava, pela Maddie.
Foi quando reconheci o ciclo. Sempre que ela voltava antes de completar três semanas fora, ela estava prestes a sumir por meses.
— Vai passar a noite aqui?
— Vou pra aldeia — se levantou e eu segui ela. Nos afastamos da fogueira para não acordar a Maddie. — Preparar o que eu preciso pra ir. Não vou levar o Rover. Maddie quer algo de especial?
— Não — neguei. — Rayna...
— Então eu já estou indo. Quando ela acordar, fale que eu volto logo.
— Por que não fica até amanhecer? — Sugeri, colocando as mãos no bolso da minha calça. — Ela gostaria de acordar com você aqui, pra variar.
Ela escutou o meu sussurro final e estreitou os olhos sombrios em minha direção. Apesar de tudo, não desviei o olhar do seu. Não queria que ela escutasse, mas não me bota medo se escutou.
Já fazia 6 anos dessa merda toda.
No começo, eu podia entender, mas agora estava começando a magoar Maddie e, sinceramente, a mim também. Maddie e ela criaram um laço desde o momento que se viram. Rayna tentou afastar a garota, mas cada vez que tentava, Maddie ultrapassava algumas barreiras. Até que chegou o momento em que Rayna voltava pra cá apenas por causa dela.
Eu não a culpava por tudo o que passamos e nem me desfazia da sua dor, principalmente porque parecia muito que ela fazia isso por nós duas.
Rayna errou o tiro há seis anos atrás, quando tentou se matar logo depois de pensar que eu morri. Mas isso não aconteceu. Nosso Sangue Escuro conseguiu metabolizar a radiação até que ela parasse de ser um problema, como tínhamos parado de acreditar.
Quando eu acordei, com dor de cabeça e dolorida, mas viva, me assustei com a cena de Rayna caída no chão com a arma em mãos e o ouvido sangrando.
Acho que a pressão foi tão grande que quando ela foi dar um tiro, a mão tremeu e raspou em seu ouvido. Por conta da distância mínima, ela desmaiou e acabou ficando em estado grave por alguns dias.
Cuidei dela o quanto que eu pude, da sua audição, principalmente. Ela teve sorte de não ter perdido permanentemente.
Mas antes mesmo de estar 100%, ela me abandonou. Deixou-me com o carro, com as coisas do Jasper, com os suprimentos. Tudo. Acho que lá, ela queria morrer. Então me abandonou no meio da noite.
Foi quando minha solidão começou reinar em mim.
Mas quando encontrei esse lugar, fiz questão de procurá-la por todos os cantos dessa terra. No fim, ela estava no morro a cima de Polis, embaixo de uma árvore de nozes, deitada quase morta em uma elevação da terra. Perto, tinha uma cruz de madeira com o nome de Benjamin Wallace escrita.
Desacordada, peguei ela, coloquei no carro e nos levei de volta para a única parte viva da terra. Lá, com a ajuda de Maddie, consegui tratar do seu ressecamento e da sua fome.
Quando ela acordou, ficou tão surpresa quanto eu sobre existir aquele lugar e entendeu que ali era sua única chance de sobreviver. Por algum motivo, um motivo que me alegrou, ela quis sobreviver.
Mas... apesar de sobreviver, de estar viva, Rayna não era mais aquela garota.
Nem a Comandante. Ela não era... nada.
Me proibiu de dizer a Maddie que ela era uma Sangue Escuro de verdade, que já havia sido uma Comandante e qualquer participação sua pra nos salvar. Nas histórias que eu contava para Maddie, era como se Rayna kom Skaikru nunca tivesse existido.
E olhando-a agora, pergunto se já existiu.
— Que seja — ela cuspiu, me dando as costas.
Não impedi ela de avançar.
No dia seguinte, quando Maddie e eu fomos ver o pôr do sol juntas antes de voltar para a aldeia, algo aconteceu. Uma nave desceu. No princípio, tive esperanças que fosse meus amigos, mas percebi que não era ao ler o rótulo daquela nave.
Corporação Eligius.
Não era a Arca, ou seja, poderia ser inimigos.
Coloquei Maddie dentro do Rover e dirigi rapidamente até a aldeia, esperando — torcendo — para que Rayna não tivesse saído.
Para a minha forte, assim que estacionei, ela estava colocando sua mochila nas costas. Ela percebeu que tinha algo de errado de forma imediata. Maddie disse alguma coisa pra ela e foi se esconder como eu havia pedido.
Rayna olha em minha direção e eu fixo nossas íris por um tempo antes de abrir a porta do carro e descer.
— Temos visita — suas sobrancelhas se crisparam, em preocupação. Mas ela pareceu aliviada quando eu afirmei: — Não são nossos amigos.
O clima pesou, aquela era minha forma indireta de pedir sua ajuda, ela conseguia ler. Agora era sua decisão se me ajudava ou não. Sinceramente, não estava esperando que ela subisse no Rover, mas quando ela subiu, não esperei nem um segundo pra entrar e dar partida dali.
Dirigi até o morro que Maddie e eu estávamos e deixei o Rover. Rayna saiu do carro, deixando sua mochila nele e pegando apenas o essencial. Sua arma 9mm, suas espadas prensadas em suas costas e as milhares de adagas no cinto da sua calça encardida de lama e sangue.
Descemos pelas árvores, em silêncio e usando elas para nos esconder até chegar em uma pedra grande o suficiente. Ela me ajudou a montar a arma de longa distância e com uma mira de telescópio.
Aquela nave estava há menos de 300 metros.
Era enorme e a primeira pessoa que eu vi foi uma mulher, que retirou a máscara e deu as costas para gritar que estava tudo limpo. Então homens e mais homens saíram de dentro da nave segurando armas, trajados adequadamente para uma guerra.
Rayna e eu trocamos um olhar significativo sobre.
Continuei observando-os pela arma, checando suas armas, seus portes que não eram de deixar a desejar... Até que vi uma arma estranha, diferente das outras ou de qualquer uma que me deparei.
Estendi a arma até Rayna para que ela visse.
— Eles tem armamentos pesado — comentou, afastando-se da arma. — Vamos. Precisamos consultar o arsenal.
Era assim que chamávamos a caverna que guardávamos nossas maiores armas, era perto da aldeia e foi fácil ouvir o tiro. Era Maddie. Eu disse a ela que atirasse quando fosse essencialmente necessário.
Corremos o mais rápido possível até a aldeia, mas Rayna se sobressaiu a minha velocidade. Me surpreendi por um momento, lembrando daquela garota do começo que tinha asma e traços de sedentarismo. Mas quando alcancei ela, a mesma não tinha nenhum rastro de respiração ofegante e já estava descendo para a aldeia.
Onde Maddie estava no chão, com dois guardas. Um apontando a arma pra ela enquanto outro estava ao seu lado.
Rayna pega uma adaga de sua cintura e lança precisamente até o homem armado em uma distância de dois metros, em movimento. A faca atravessa o crânio do homem e ele cai por cima de Maddie, que recua assustada.
Cuido do outro, o acertando com minha arma e deixando-o no chão.
— Espere — Maddie me interrompeu quando eu apontei minha arma para ele. — Ele tentou me ajudar. Ele pode ser um dos bonzinhos.
Rayna desdenhou da fala dela e a arrastou pra dentro pra cuidar de qualquer ferimento que ela possa ter. Atrás dela, atirei na cabeça do homem desarmado, pois não existiam bonzinhos.
É... acho que Rayna não foi a única que mudou.
Não precisou de dez minutos para Rayna formular um plano. Era como se ela estivesse preparada para esse momento por todo esse tempo, mas eu não reclamei, porque eu não tinha nenhum.
Ajudei ela com os preparos e quando estávamos quase finalizando, ela disse que ia cuidar pra pegar o nosso pássaro. Trinta minutos depois, ela voltou no mesmo estado, com um corte curto sangrando no canto da boca, mas o homem que ela segurava estava bem pior.
Olhei em volta, confirmando se Maddie estava no Rover lá em cima, ela não deveria ver aquela cena.
Sem esperar pela aprovação, Rayna posicionou um dos homens que desceu para a terra em frente ao pau erguido por a gente, com duas lâminas bem afiadas que assim que entraram em contato com a pele do cara, o cortou. Ele gritou, chamando ela de vadia.
Como resposta, ela apenas empurrou ele mais para a estaca até que as duas lâminas estivessem atravessando o seu tronco.
A posição delas eram específicas o bastante para doer como um inferno, mas não matá-lo até a hora que ela quisesse. Ele começou a gritar e a gente correu até as montanhas a cima. Posicionei minha arma em uma pedra e ela ficou ao meu lado.
Escondida entre as pedras e árvores ao nosso lado, Maddie estava lá.
Como o esperado, os gritos de dor do homem pedindo ajuda atraiu os outros. Assim que ficou na mira, atirei bem na testa de um e Rayna fez o mesmo, escolhendo o coração.
Mas com sua arma de 9mm.
Eles se esconderam entre as árvores, com vantagem. Vantagem até demais.
Com aquela arma de origem e funcionalidade desconhecida, atiraram na gente. Era uma arma que soltava explosivos! Meus ouvidos zumbiram com dificuldade e protegi Maddie.
Dei apoio pra ela se levantar e Rayna nos deu cobertura pra adentrar a floresta. Assim que estávamos escondidas pelas árvores, começamos a correr.
— Por aqui — ela tomou a frente. — Conheço um lugar para esconder ela!
Continuamos correndo os mesmos passos até chegar em um buraco no chão coberto por alguns galhos. Rayna retirou eles para que Maddie pudesse entrar e virei pra ela, que já estava negando:
— Não vou sem vocês duas.
— Não há tempo de discutirmos isso, Maddie. Entre. Agora. A gente vai afastá-los.
Depois que ela estava dentro e sentada, Rayna começou a cobrir o buraco com os galhos de antes e até mais alguns que ela encontrou ao nosso redor. Dei minha arma para Maddie, torcendo para que ela não precisasse usar.
— Clarke — Rayna chamou, alarmada, olhando ao nosso redor. — Precisamos ir. Eles estão há pouco tempo da gente.
Me questionei como ela podia saber, já que eu não ouvi nada, mas como eu disse, não era tempo de discussões. Apenas começamos a correr para afastá-los o máximo que conseguirmos de Maddie.
Passamos por árvores e mais árvores. Ousei olhar para trás por um momento, vendo eles passando o buraco onde Maddie estava. Suspirei aliviada, conseguindo a atenção deles.
Suas armas foram apontadas pra gente e eles atiraram. Apressei meus passos, mas assim que me virei pra correr, vi Rayna sendo cercada por homens com dezenas de armas apontando pra ela. Ela avançou, cortando o braço do homem em sua frente e desviando de outro ao seu lado, apenas para socar a cara do que estava indo até suas costas.
Depois pegou a arma que estava sendo apontada pra ela e direcionou pro cara que estava se restabelecendo para atacá-la, os tiros soaram e o homem recebeu todos eles antes de cair no chão.
Virei pra frente, encontrando um homem de touca e um rádio. Os homens atrás dele avançaram para Rayna e conseguiram contê-la com um soco na cara. Avancei para ajudá-la, mas fui impedida.
— Relaxe, Coronel — ele disse, com um sorriso sádico. — Disse que íamos pegar-las e pegamos. Elas parecem ser bem mal-humoradas. Mas são lindas.
— Bom trabalho — falou a voz feminina no rádio. — Traga-as para mim. Temos muito para conversar.
(...)
Rayna e eu estávamos amarradas em uma cadeira, uma do lado da outra. Nos mantivemos em silêncio desde a nossa chegada, analisando cada um deles, fiscalizando as ameaças que representam.
Principalmente o homem de touca que nos capturou e que estava agora apertando as amarras dos pulsos de Rayna.
Notei ele se aproximando, raspando o dedo sujo na bochecha dela — a qual estava começando a ficar vermelha pelo soco — com um sorriso asqueroso.
— Você é deslumbrante — ele soprou e se aproximou de seu rosto.
Respirei fundo, sentindo-me mal por não poder fazer nada além de olhar enquanto ele está cada vez mais perto dela. Azar o dele.
Rayna se tornou uma arma. Não uma pessoa com uma arma na mão, que sabe usar uma arma. Ela se tornou uma arma.
Todo o seu corpo.
Então, com sua cabeça indo de encontro direto com a dele, ela fez um belo de um estrago. Ele avançou, irritado, prestes a bater nela amarrada.
— Pare! — Impediu uma voz. Era um homem, com uma roupa diferente que os outros estavam usando. — Precisamos dela.
Então o de touca pegou ele pelo pescoço. Quem separou foi a mulher, que eu chutaria ser a líder desse grupinho desorganizado. Encarei Rayna, que percebeu a mesma coisa.
— Ele não é um de nós — discutiu o homem que nos capturou, falando do cara que tentou nos proteger. — Perdemos mais de quatro homens, e ele nem liga.
— Ele é um de nós — rebateu a mulher. — Não estaríamos aqui sem o Shaw.
Depois de separa-los, ela ordenou que ele formasse uma equipe para sair em busca dos meus "amigos". Ela jamais acreditaria que só tinha uma pessoa naquela floresta e que era uma criança.
E então, voltando-se para nós duas, ela notou meu sangue escorrendo em uma coloração diferente da sua. O homem de pele escura, Shaw, soube reconhecer rapidamente que era uma mutação genética e que foi a forma que conseguimos sobreviver aqui.
A mulher pegou seu rádio e depois pediu por um kit médico. Ela está tentando ganhar a minha confiança. Ou prefere que eu esteja viva pra saber das coisas.
Ela pegou uma cadeira e colocou no espaço entre nós duas.
— Nós começamos com o pé esquerdo — diz olhando para Rayna, mas contando com nós duas. Encarei o rádio, que soltava as notícias se eles iriam encontrar ou não a Maddie. — Não fazíamos ideia de que havia sobreviventes aqui embaixo. Como saberíamos? Só estávamos tentando voltar para casa. Imagine nossa surpresa quando descobrimos que não havia uma casa para voltar.
Rayna se manteve inalterada, sem expressões que manchasse demais o seu rosto.
— E, então, seu povo começou a matar o meu. Sei que conseguem entender por que estou chateada.
Vejo o reflexo da mão de Rayna se apertando na cadeira, mas ela manteve a boca fechada. Era a primeira vez, dentro de seis anos que eu a via sem todas aquelas armas para se proteger.
Ou se machucar.
Continuei encarando o rádio, focando nas informações.
— Assim como ficaram chateadas quanto tomamos a vila de vocês — se inclinou, olhando nos olhos de Rayna. — Eu não as culpo. Quando o governo facista tentou tomar minha casa, eu também queria sangue. E consegui. Ninguém mais precisa morrer hoje. Diga-me o que preciso saber, e podemos chegar a um acordo bom para todos nós. Que tal?
— Talvez elas não falem inglês — contribuiu Shaw, parado ao lado de Rayna.
— Elas falam inglês. Cada vez que a patrulha se comunica — pegou o rádio —, a loira olha para isso. Ela está rastreando nossos movimentos. Só isso importa. Não querem falar, tudo bem. Não falem. Mas veremos como se sentem quando encontrarmos quem vocês protege.
Ela se levantou da cadeira, pronta para falar ao rádio.
A nova ordem era atirar pra matar.
Virei a cabeça para olha pra Rayna, mas ela estava firme e posturada enquanto tinha um olhar fixo pra frente. Respirei fundo, sabendo que seria uma longa viagem de volta para os erros do passado.
Mais tarde, quando o sol partiu, ela acabou tossindo pela garganta seca e Shaw se aproximou com um cantil, colocando na boca dela e depois na minha.
Eu bebi.
Agora ela...
— Qual é? — Shaw se abaixou em sua frente, sussurrando. — Que mal dizer o nome de vocês pode causar?
O olhar dela se desviou pela primeira vez daquela janela lá fora, onde as pessoas estavam andando pela nossa vila, pegando o que uma vez foi nosso. Ela olhou pro homem a sua frente e cuspiu toda a água na boca dela. O rosto dele molhou e ele fechou os olhos.
Depois, enxugou o rosto com a manga da camisa e disse:
— Acredite ou não — se levantou, sem alteração —, essa é a melhor conversa que tive em mais de 100 anos. Eu era uma coroinha em uma igreja como essa. Saginaw. A umas duas horas de Detroit. Na minha Harley, fazia em uma hora. Cara, que saudade que sinto daquela moto. Mais do que sinto de muita gente.
— Alguém saiu correndo daquela caverna — o homem do rádio conseguiu minha atenção de volta. — Harris, cuidado com as costas. Espere. Esqueça isso. Ela está indo a norte. Está na mira.
Arregalei os olhos, totalmente preocupada e mandei a merda qualquer plano.
— Não — falei alto, conseguindo a atenção de todos. — Ela é só uma criança.
— Ela fala.
— Por favor.
— Quantos mais estão na floresta? — Perguntou a mulher, se aproximando.
— Ninguém mais. Somos só nós três. Eu imploro. Diga para não atirar.
— Atire quando quiser.
— Entendido.
— Eu sei onde eles estão. É nossa área de caça do verão. Ela está levando-os a uma emboscada. Me escute. Se não pararem agora, eles vão morrer.
— Eu acredito nela — Shaw afirmou.
— É a verdade.
A mulher encara Rayna ao meu lado, conseguindo sua atenção. Em busca de algo que a faça chegar a algum raciocínio de que eu esteja mentindo. Mas Rayna apenas da de ombros e diz, por fim:
— Eu não teria sido tão boazinha.
— Se deixá-la ir — digo —, eu conto tudo.
— Todas as unidades, recuem — ela disse, por fim, me fazendo suspirar de alívio. — Câmbio — seu parceiro discute sobre. — Falk, se McCreary desobedecer, atire na perna dele. Harris, se Falk desobedecer, atire na cabeça dele.
— Recuando.
Depois de confirmar que eu estava falando a verdade e que havia mesmo armadilhas perto da área em que eles estavam, ela exigiu saber como o mundo acabou. Encarei Rayna, sem saber como responder.
Foi quando ela conseguiu a atenção deles dois novamente e sorriu, sem nenhum pingo de graça.
— O mundo acabou por minha causa.
Bufei, chamando a atenção. O mundo não havia acabado por causa dela. Rayna precisava nos salvar da Alie e então, depois, tudo apenas desandou.
Esperamos até que os guardas estivessem voltado para ouvir a historinha. Quando enfim aquele psicopata de touca e seus amigos voltaram, eu decidi começar:
— Na Arca, nos ensinaram que a guerra começou como um primeiro ataque chinês, mas estavam errados. Começou com uma IA chamada Alie.
— Minha trisavô — adicionou Rayna, sarcástica.
— Sua intenção era reduzir o...
Fui interrompida novamente, mas dessa vez pelo rádio.
— Coronel, mais cinco hostis. Ao menos um está armado. Ainda seremos bonzinhos?
Ela me olhou, mas eu encarei Rayna, sem saber o que pensar.
— Espere — pediu ela, levantando da cadeira. — Descubra onde estão e reforce a posição deles — apontou para os guardas no recinto. — Você não, McCreary.
— O que disse que aconteceria se mentissem para mim? — Ela perguntou, inclinada ao meu lado.
— Eu não menti. Não sei...
Ela deu um tapa em mim.
Rayna se debateu na cadeira, desperta.
— Vadia! Se tocar nela mais uma vez, eu...
— Levem as duas pra fora — ordenou ao McCreary e ao Shaw. — Use a coleira na loira. Faça o que quiser com a morena.
Shaw tentou rebater, mas McCreary já estava com a coleira e vindo em minha direção. Ele colocou em meu pescoço e ofeguei com o aperto. Depois, soltou Rayna e pegou-a pelos cabelos.
Fez o mesmo comigo.
A diferença é que quando chegamos lá fora, ele me jogou no chão, enquanto com Rayna ele preferiu deixá-la ao seu lado, havia um controle na sua outra mão. Logo soube de sua funcionalidade. Era uma coleira elétrica.
Gritei quando ela foi ligada em meu pescoço, eletrocutando-me. Os homens ao redor riram quando tentei me arrastar pra longe. Rayna foi jogada para outros deles, que a pegou com fome nos olhos e sussurrou algo em seu ouvido.
Tentei explicar mais uma vez que eu não estava mentindo, mas recebi mais uma sessão de choques.
— Eu não sei quem era.
Houve uma pausa maior dessa vez até a próxima sessão. Cai no chão, fraca, sem tempo pra desfrutar da dor e gritar. Quando parou, percebi o Rover se aproximando com os faróis ligados.
— Maddie — sussurrei, desesperada. — Não.
Mas não era a Maddie. O porte era forte demais e alto demais para ser ela. E a voz...
— Estou desarmado. Só quero conversar.
— Conversar? — Repetiu a Coronel. — Me dê um bom motivo para não matá-lo onde está.
— Que tal eu lhe dar 283? — Ele finalmente apareceu. Choraminguei no chão, sem acreditar. Aliviada. Com medo da esperança que cresceu em meu peito. — É o número de pessoas do seu povo que morrerão se nós não fizermos um acordo.
Então ele ergueu uma xícara.
Eu não fazia ideia do que ele estava falando, mas a Coronel parecia saber bem. Ele ergueu a mão em um punho e o Rover recuou, provavelmente com Maddie dirigindo.
— Parece justo. Duzentas e oitenta e três vidas por duas. Elas devem ser muito importante para você.
Ele me olhou por meio segundo, mas estão seu olhar ergueu de mim e sabia para quem ele estava olhando. Encarei o rosto de Bellamy franzir em preocupação e desagrado e me virei, encarando Rayna que estava estagnada nos braços dos homens.
Rayna olhou pra Bellamy e o reconheceu.
Bellamy olhou pra Rayna e a analisou, como se estivesse a procura de alguma coisa que faltava. Ele não estava acostumado com ela daquele jeito, eu entendia.
Mas para mim, que estava, aquele franzir de sobrancelhas choroso era o máximo de emoção que eu havia visto nela depois... daquele ano.
— Elas são.
Espero que estejam gostando...
Sei que estou SUMIDA, e quero pedir desculpas por isso. Estou passando por umas barras pesadas que não vem ao caso comentar com vocês agora, mas isso acaba desgastando muito de mim e quando sento pra escrever, não sai mais nada.
Não é nada com a história. Pelo contrário, ISSO AQUI me ajuda demais, principalmente quando leio seus comentários.
Enfim, só quero dizer que pode ser que eu demore pra postar, mas, não se preocupem, eu SEMPRE vou voltar.
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