017 | Care


017 | Cura
RAYNA KANE

Uma vez me disseram um pouco sobre o que esperar de pessoas que não são sua família. Fui ensinada desde cedo em quem confiar e em quem não, como se portar como essas pessoas.

Não é que fossem inimigas, mas também não eram amigas. Kane gostava de reforçar tanto isso que deixar de pensar sobre nesse momento é algo impossível.

Como eu fui idiota.

Eu sabia que só podia ter algo errado, mas continuei em frente por puro medo de realmente estar prestes a ser tudo destruído. Como eu pude ter sido tão esperta de ter chegado até aqui mas tão burra em não pensar nos poréns, nos adiantamentos, nas formas do depois.

Não que isso importe muito agora, pois duvido muito que haverá um depois.

Mas como eu pude ser tão estúpida? Como eu deixei-me ter tantas esperanças de sair daquela jaula? De descobrir qualquer resquício de meias verdades?

Apesar dos ensinamentos lá na Arca, sei agora que eu não entendo nem 1% da humanidade na Terra e pensar que sim foi o que me destruiu. O que me trouxe até aqui. Nesse exato momento.

— Rayna — a voz sussurrava desesperadamente, sons de ferro se chocando no fundo. — Rayna, acorde. Acorde, por favor.

E foi como se fosse um disco arranhado, dando replay sem parar, na mesma frequência de tom, de palavras, de urgência. Minha consciência foi acordando, a voz foi se tornando escassa e o incômodo por todo o meu corpo foi aparante demais para ignorar.

A primeiro coisa que eu senti foi o gelo nos meus tornozelos e em cada um dos meus pulsos. Era como se eles fossem compostos por metais e com ajuda do ambiente, o gelo foi instantâneo.

Abrir meus olhos foi difícil, principalmente porque a iluminação do local estava reforçada em dobro. Tive que estreita-los para conseguir enxergar algo com clareza.

Não precisei de muito para reconhecer que minha pele não tinha sido feita de metal e sim que eu estava presa por um. Meu coração acelerou com o susto e me debati, tentando com pouca agilidade, me livrar daquelas amarras de metal em meus pulsos e tornozelos.

Mas era impossível e eu estava presa. A sala era da mesma estrutura da qual eu estava presa, só que muito maior. Tinha um armário de ferro em uma parede e ao lado da minha maca acolchoada, tinha uma mesinha de ferro, daquelas que os médicos usavam para deixar seus utensílios.

Mas ela estava vazia.

— Rayna, consegue me ouvir?

Esbugalhei os olhos e por um momento, quando apertei minhas pálpebras com a dor de cabeça insuportável que me invadiu, achei que estava delirando. Mas então, voltei abrir meus olhos, minha cabeça agora direcionada para frente e eu o vi.

— Benjamin?

O garoto estava na mesma situação que a minha; pulsos e tornozelos presos. Ele tinha seu corpo inclinado para a frente, sua voz era firme, mas não tão alta e quando eu o encarei nos olhos, totalmente confusa, ele pareceu se desmanchar de... alívio?

— O que está acontecendo?

Se eu estar presa daquela forma não fazia muito sentido para mim, vê-lo dessa forma muito menos.

— Tem uma trava debaixo da maca — seu dedo apontador insulta na minha direção, se contorcendo no agarre. — Precisa alcançar e puxa-la. Isso vai te libertar.

Tento fazer o que ele diz, estico minha mão para baixo, mas o bracelete maltrata a minha pele do pulso.

— Eu não... — ofego, pois meu corpo começa a formigar e uma pontada na cabeça me faz se encolher. — Não consigo.

— Consegue sim. Você precisa sair daqui.

Encarei a forma como ele analisava a sala, era um olhar diferente do meu. Ele não estava confuso com a situação e estava acordado tempo o suficiente para perceber a trava debaixo da minha maca.

Nada perto do que eu teorizei se encaixa nessa cena de agora; nele preso, sendo tratado como eu. Se ele estava encenando, devo dizer, ele é bom pra caralho nesse jogo.

— Eu não consigo — dei ênfase mais uma vez, relaxando meu corpo na maca. Ele faz o mesmo, mas seus olhos não param. Ele parece enraivado. — Pode me dizer o que está acontecendo? Por que eu estou aqui? Por que você está aqui?

— Rayna, eu...

O barulho da porta se abrindo atrás de mim cala a sua possível explicação. Seus olhos dançam para a pessoa que está entrando, consigo ver daqui suas íris queimando de ódio. Tento ver quem era, mas é impossível diante as minhas condições.

— Solte-a — Benjamin rosna, me fazendo se assustar com o seu descontrole.

Não que ele fosse o exemplo do controle diante de tudo. Ele sempre pareceu meio... instável quando eu o vi, como se estivesse prestes a estourar à qualquer momento, mas agora... agora parecia que esse momento chegou.

— Não — respondeu simplista, uma voz familiar. Cage saiu de trás de mim, parando entre as duas macas, ignorando totalmente a circustância do filho. — Olá, Rayna. Finalmente.

Foi ele, lembro-me, que atirou o dardo de tranquilizante quando eu estava invadindo o escritório de seu pai. Cage conseguiu dar um jeito de me sequestrar dentro de um sequestro.

— O que quer de mim? — Vocifero pra ele, sentindo um gosto no final do meu estômago, me fazendo contorcer a cara em dor.

— Oh, isso aí — ele aponta com seu dedo indicador — deve ser o seu corpo reagindo a nossa desintoxicação do TurnBlood.

Dante tinha falado comigo sobre isso, que os sintomas não demorariam para aparecer, só não imaginava que fosse tão fortes. O que eu estava esperando, afinal? Tomei esse remédio durante toda a minha vida e agora, parar de tomá-lo, significa todo o meu organismo se revirando para ser consertado.

— Onde está o Presidente? — Pergunto após uma curta pausa para engolir em seco.

As palavras da doce Maya fazendo uma moradia constante em minha cabeça. Ela parecia assustada... Não, aterrorizada com a ideia de eu conversar com o Cage.

Eu não sei o porquê ou quais circunstâncias foram que me colocaram aqui, mas eu deveria temê-lo.

— Meu pai não quis ver isso — respondeu me dando as costas, indo até o seu filho que não parou de maltrata-lo com o olhar. — Ele realmente é muito emocional. Você o conquistou, Srta. Kane.

— Isso não aconteceu com o senhor, eu imagino — diante ao desespero, meu sarcasmo começa a aparecer.

— Não me leve a mal. Eu com certeza teria simpatizado com a sua... causa — pontuou colocando a mão no ombro do seu filho, me encarando de longe. — Mas há coisas mais importantes das quais não podem ser envolvidas emoções no momento.

— Sim?

Cage sorri ao perceber qual é o meu jogo; eu queria saber o que estava acontecendo aqui. Mas ele não pareceu totalmente contra essa ideia, diferente do seu filho:

— Pai... Por favor. Libere-a.

Cage ignora completamente o pedido cansado do seu filho. Quase como se... como se eles tivessem tido essa conversa milhares e milhares de vezes.

Minha mente se limpa de qualquer ingenuidade e começo a observar cada partícula que tem em minha frente.

Primeiro, meus olhos estão em Cage e na forma formal que ele se veste, assim como o Presidente, o seu pai. Seu cabelo negro está jogado completamente para trás e sua pele branca e pálida não reflete nenhuma vida.

Não há nenhum remorso dentro daquelas suas íris e sei que tudo aquilo não é apenas porque eu ameacei a vida do seu filho. Havia algo a mais.

Deslizo minha atenção para Benjamin na maca em frente à minha. Ele está com a mesma roupa que há pouco tempo, então só posso teorizar que ele foi pego logo depois que saiu do seu quarto e me deixou sozinha lá. Sua manga estava amassada para cima, deixando seus braços a mostra para mim pela primeira vez.

Haviam veias naquele braço, mas não do jeito convencional da coisa. Eram veias negras... quase como se algo maligno tivesse proclamando o seu lugar.

Aquelas veias subiam para além do que só a pele mostrava e isso parecia doer. Ele ver que eu tinha as notado, parecia doer.

Creio que meu filho não comentou sobre a sua... situação em uma das escapulidas que deram na madrugada — ironizou Cage, parecendo feliz por eu ter usado o meu tempo em silêncio para pensar sobre aquilo.

Saber que ele tinha o conhecimento das "escapulidas" do filho pra me encontrar, só me fazia ficar com um pé atrás. Se ele sabia e ele era tão contra à mim andando por aí, por quê permitiu? Seria um plano deles dois?

— Que situação? — Meus olhos escorregam até os olhos de Benjamin, mas ele desvia quase que instantaneamente.

— Benjamin nasceu com alto risco de radiação. Um nível muito maior do que qualquer um de nós. Não conseguimos viver no solo — ele aponta para o teto — porque não fomos adaptados. Mas meu filho... foi quase como se ele tivesse respirado um pouco de radiação por todos esses anos.

Minha mente me leva até o seu arquivo que eu consegui ler antes de perder a consciência. Lá constava que ele tinha alta radiação.

— Aos poucos, isso se tornou uma doença — Cage se mexeu para se aproximar do filho que o fuzilava. Mas ele nem piscou quando abriu os botões da camisa do filho, revelando seu peitoral. — Mesmo aqui, sem nenhuma radiação da Terra. Está no sangue dele.

Não pude me impedir de passar meus olhos por toda a pele exposta nesse momento. Sei que não deveria estar fazendo, principalmente por algo que começa com "priva" e termina com "cidade", mas... aquilo ali era insano.

Como eu imaginei, aquelas veias negras não paravam em seu braço. Estava por todo o seu peitoral. Veias subiam de dentro de suas calças, de suas costelas e estavam quase chegando no seu peito, onde habitava o pulmão e logo acima o coração.

Aquilo era uma forma de medir o seu tempo? Quando chegasse ao coração, já era? Ou aos pulmões? Aquilo o deixaria sem respirar?

Olhei nos olhos de Benjamin e dessa vez, ele me retribuiu. Seus olhos se transformaram. Pela primeira vez, desde que acordei aqui, não havia ódio brilhando em suas íris. Ele me olhava com algum outro sentimento, mas eu não conseguia saber qual. Era estranho.

Me fazia encarar Cage e perguntar, com o peito pesado pela possível resposta:

— Há uma cura?

O momento é cortado pela risada obscura de Cage.

— Se uma cura? — Ele repete a minha pergunta, se aproximando de mim. O encaro com as sobrancelhas franzidas. — Srta. Kane... como eu digo isso — ele solta um falso suspiro ao parar ao meu lado. — Você é a cura.

Tudo à minha volta para.

Encaro ele estupefaça, tendo quase certeza que eu estava ouvindo errado, que uma parte da minha mente que nunca para de trabalhar, tinha trocado as verdadeiras palavras de Cage. Mas era só encarar Benjamin que eu sabia que tinha ouvido certo.

Meus olhos caem para baixo. Lembro-me de como ele ficou quando eu insinuei que eu era a sua cura. Ele tinha levado a sério, pois ele sabia muito mais do que eu o quão certa eu estava.

De repente, tudo começa a se destravar na minha mente, deixando às claras e respondendo todas as minhas perguntas.

— Como eu posso ser a cura dele? — Questiono em meios as engrenagens do meu cérebro.

Eu compreendia que era por causa disso que eu estava aqui. De alguma forma, algo meu podia curar aquela radiação de Benjamin, mas como? Não é como se dependesse tudo de um beijinho. O que eles queriam...

Desde sempre foi o sangue. Eles tirando meu sangue para uma "testagem", Dante vindo me explicar a verdade sobre mim; sobre o meu sangue. Era isso, não é? Só podia ser. Mas como era que eles queriam? Encher uma bolsinha de sangue e fazer Benjamin beber até a última gota?

Fazer algum remédio com meu sangue?

— Acho que você já se respondeu isso — observou Cage, colocando suas mãos no bolso da sua calça social. — Faça a pergunta que você não tem como responder sozinha.

Meus olhos não ameaçam nem por uma fração de segundos passar por Benjamin quando eu os ergo para encarar o mais velho.

— Como eu posso cura-lo com o meu sangue?

— Rayna, não! — Benjamin avança o quanto pode, mas é cortado por um gesto do seu pai, que me encarava admirado.

— Você quer curar o meu filho? — Cage perguntou, sua cabeça tombando um pouco em dúvida fascinante. — Não vai me dizer que ele conquistou você, Rayna querida. Isso foi tudo um plano. Ele estar lá naquele quarto hospitalar com você ao receber a notícia que seus amigos morreram... Tudo.

Escaneei Benjamin que estava de olhos esbugalhados enquanto negava com a cabeça minimamente. Mas eu o ignorei porque apesar de negar com culpa, ele não desmente o seu progenitor.

Eu já sabia que podia ser um plano e não me surpreende e nem me dói. Diferente do que Cage pensa, seu filho não me conquistou. Eu estaria disposta a ajudá-lo com o lance da doença, porque sou humana e não quero que ninguém morra sendo que eu posso ajudar.

É claro que uma parte minha poderia confiar de verdade em Benjamin se mais sessões daquela acontecesse, tanto é que para o começo do meu plano, tudo dependia do quanto ele se importava comigo.

Mas eu sempre estive com os pés firmes no chão sobre sua possível trairagem. Todavia, Cage não precisava saber disso agora.

Torci minha cara em uma expressão que ele poderia facilmente ligar à uma pessoa se sentindo traída. Depois, abaixei meus olhos lentamente e não voltei-os para cima.

— Sinto muito se isso te machuca — disse de forma falsa e eu me segurei para não revirar os olhos. — E aí, ainda quer curar o meu filho?

Não encenei o ódio que sentia por Cage ao levantar minhas íris para ele, que entendeu a minha resposta para a sua pergunta.

Depois de alguns dias presa naquela cela, eu precisei entender uma coisa; tudo isso aqui é um jogo. Ele precisa entregar suas cartas, eu preciso rebatê-las e assim vai até algum ganhar. Qualquer jogo requer confiança, manipulação e ser uma boa atriz. Mas se você tem a manipulação nas veias, você já vai longe.

Pensar sobre esse jogo era o que me fazia persistir e também que minha mente não desligava.

Meu ataque foi batido de frente pelo Cage, agora eu precisava manipula-lo, pois necessito entrar nesse jogo novamente.

— Ótimo. Sendo assim, acho que você precisa conhecer uma nova pessoa.

Ele adicionou e saiu da sala.

— Castanhas, eu...-

Não! Não tínhamos tempo para isso.

— Meus amigos — o interrompi, saindo do papel, uma voz mais desesperada do que antes. — Eles estão vivos?

Benjamin intercalou seus olhos entre minhas duas íris e assentiu. Meu peito afundou de alívio e eu perdi a força no cotovelo que estava me segurando para deixar meu peito pra frente.

— Escute-me — ele pareceu implorar, seu corpo elevado pra cima, seus pulsos quase se torcendo. — Fui noticiado da sua existência quando eles descobriram sobre o seu sangue. Então, eu achei que...

— Tudo bem se me usasse pra ficar vivo? — Não pude me impedir de interrompê-lo novamente. — Deixe isso pra lá, Benjamin. Eu curo você, pego meus amigos e sumo daqui.

— Você não está entendendo — ele pontuou com os dentes apertados um no outro, o que me fez dar mais atenção pra ele. — Só existe um tratamento. Ele foi descoberto há pouco tempo, menos de quatro dias.

Franzo as sobrancelhas aos poucos, fazendo as contas e sabendo muito bem que eu estava naquela cela há muito mais de 4 dias.

— Eles me prenderam sem saber se eu podia cura-ló?

— Eles sempre souberam. No livro onde há informações sobre pessoas como você — rapidamente me lembro da conversa com Dante —, comenta também que são os únicos capazes de sobreviver à radiação. Então eles pensaram que podiam usar isso pra me curar. Fizeram um experimento antes.

— É por isso que acordei com aquela agulha grossa? — Associo rápido. — Tiraram o meu sangue para usá-lo no experimento do remédio?

— Remédio? — Ele repetiu, franzindo o cenho e me encarando. — Não nenhum remédio.

— Então como...-

A porta é aberta novamente. Nós dois se olhamos e quando ele percebe quem está entrando, suas íris tremem com um novo sentimento: medo.

Virei meu pescoço para ver o que estava acontecendo, mas não foi preciso muito trabalho, pois logo lá estava ela.

Era uma mulher negra, cabelos lisos com algumas ondas. Ela tinha algumas olheiras embaixo dos olhos e sua pele, como a de todos aqui, necessitavam de vitamina D.

— Sou a Dra. Tsing — ela se apresenta, Cage saindo de trás dela para ir até o filho. — Vou fazer o tratamento nesse momento.

— Espera, agora?!

Ela sorriu de forma gentil, mas eu pude ver a forma retraída que ela pegou ao virar para Cage com uma falsa expressão desentendida. Reconheci ela como uma nova jogadora.

— Algum problema? Será bem rápido — ela adiciona voltando o olhar pra mim, sua mão se conectando ao meu ombro.

A doutora não esperou que eu a respondesse, apenas apertou um botão ao lado da maçã que a fez descer de forma automática. Então agora eu estava reta, meus braços ainda presos, tanto quanto o meu tornozelo.

— Rápido? Pode me dizer como será esse negócio? — Aponto instintivamente para mim.

— Você não sentirá nenhuma dor — sua mão ainda está em meu ombro e estou começando a achar que é o seu jeito de me manipular. — Vou te dar uma anestesia, não vai sentir dor na maior parte do tempo.

A doutora estampa mais um de seus sorrisos e se afasta para preparar a mesinha de ferro que estava ao meu lado. Jogo meu corpo para o lado para que eu consiga ver Benjamin ao abaixar a cabeça. Ele tinha acabado de cuspir na cara do pai.

E então ele se virou pra mim e gritou:

— Rayna!

Tentei levantar meu peitoral, mas a Dra. Tsing acalmou-me com a palma de sua mão, enquanto a outra segurava uma injeção com corpo de ferro e uma agulha enorme e bem grossa.

— Vai ficar tudo bem. Procure acalmar a sua respiração — ela falava por cima da voz estridente de Benjamin que gritava algo pro seu pai. Então, ela aproximou aquele objeto da minha veia e eu me debati. — Srta. Kane...

— Eu não quero mais! — Decretei, o medo que Benjamin mostrava por mim invadindo o meu subconsciente.

— Tá tudo bem. Vai ficar tudo bem.

— Não!

— Shhh — ela sussurrou, a agulha penetrando a minha pele e logo em seguida sendo maltratada pelo líquido.

Tentei murmurar mais algo, todavia, o efeito reagiu de forma imediata e meu corpo amoleceu, minha fala se tornou preguiçosa e a forma como ela continuou murmurando "shh" perto do meu ouvido, foi o suficiente para eu cair no sono.



A primeira coisa que eu sinto é frio. Inconscientemente, abraço o meu próprio corpo e depois é que eu procuro saber onde minha mente desacordada me levou.

Era uma sala fechada e bem clara. Em minha frente tinha uma mesa trabalhada na tecnologia, refrigerado por cadernos e potes de vidros que me lembram os experimentos que eu precisava fazer de Química.

Uma pequena olhada ao redor, me respondia que eu estava na Arca novamente. Em uma parte que eu não havia conhecido, como eu sei que minha mente não pode criar cenários assim do nada, sem nenhuma referência, começo a me perguntar o que era tudo isso.

"— Rayna. Eu estava te esperando."

Perdi o ar, junto da minha coragem quando soltei um gritinho e me virei para a voz.

Me arrependi instantaneamente pela dor que se apossou da minha cabeça e resultou na pressão caindo.

"— Aqui, deixe-me te ajudar" — continuou a pessoa desconhecida por mim, me empurrando um banco giratório. "— Seu corpo está respondendo a desintoxicação."

"— Quem é você?" — Perguntei, minha mão direita segurando minha têmpora e minhas íris buscando estudar a mulher.

Ela não parecia muito mais velha do que eu. Era alta, pele clara, cabelos escuros presos em um rabo de cavalo e olhos castanhos. Quem quer que fosse, quando sorriu para mim, me assustou.

Tínhamos o mesmo sorriso.

"— Sou da família."

"— Não confio em pessoas da família" — minha língua é mais rápida do que a minha mente, que associa a resposta a Marcus Kane.

"— Sim, seu pai. Sinto muito por isso, mas acho que deva me culpar mais do que a ele."

A mulher desconhecida que está em minha mente e diz ser da minha família, se afasta de mim e rodeia a mesa/computador. Ainda estou esperando uma explicação quando viro o banco pra ela e ignoro as pontadas na cabeça.

"— Como assim?" — Decido questionar ao ver que ela não faz muita questão de me retirar a dúvida.

Então ela ergueu a cabeça e seus olhos se perderam na minha aparência. Ela parecia... nostálgica.

"— Eu que criei o TurnBlood."

"— O remédio que mudou a cor do meu sangue?" — Ela concordou e eu franzi o cenho. "— Por quê? Quem é você?"

"— Sou Becca Franko e você precisa acordar."

"— Como...?"

Ela avança de forma bruta.

"— Acordar. Agora!"

Puxo o ar com força e não tenho tempo para estudar o local, a posição que estou, pois grito. É um grito estridente, que vem lá do fundo do meu peito, mas não é pra liberar nenhum sentimento preso. É pela dor que se apossa do meu quadril na hora em que ouço o zumbido de uma máquina.

Lágrimas se acumulam em meus globos oculares, tento me remexer, mas meu corpo ainda está no efeito de paralisia; menos a minha boca.

Estou deitada de barriga para baixo, na mesma maca de antes. Com o buraco que tinha no lugar em que apoiávamos a cabeça, não havia problema para mim em ficar com o rosto encaixado ali, respirando.

Sinceramente, a falta de ar não me preocupa agora. Apenas a dor. Parece que estão perfurando o meu osso com uma furadeira.

Arregalo os olhos quando reconheço a possível autenticidade desse pensamento. Grito mais. Tento mexer a cabeça para procurar por Benjamin, sussurro seu nome no meio dos gritos, dos suspiros que me faz torcer para que acabe logo, para que eu volte a sonhar toda aquela loucura.

Mas ele não responde. A dor não passa. Eu não volto ao meu sonho. Tudo é real.

A dor é real.

Meu grito é real.


Espero que estejam gostando.

Sinceramente, a partir daqui, as coisas se tornaram muito mais tensas. Se preparem porque é só o começo para a Rayna.

Não se esqueçam de interagir!!!

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top