009 | Biological weapon

009 | Arma biológica
RAYNA KANE

Eu avisei ao idiota que eu não saberia como reagir. Não foi falta de aviso, foi falta de inteligência. Agora ele estava por aí, andando pelo acampamento cheio de birra, escondendo o quão decepcionado estava comigo por eu ter fugido.

Mas, novamente, a culpa é inteiramente dele. Ok, eu poderia ter recusado de novo, assim como a outra vez da noite na caverna... eu sei lá o que deu em mim, mas eu retribui. Era a vez dele de ser sensato e se afastar.

Mas não. O idiota só se aproximou mais e quando suas mãos começaram a fazer um caminho perigoso para a minha nuca, achei que seria a melhor hora de me afastar.

Foi quando eu o encarei nos olhos e, bem como pensava, não soube o que fazer. Então eu apenas dei as costas e sai daquele lugar, sem olhar para trás e, certamente, sem olhá-lo por alguns dias.

Hoje era o dia da União, então tivemos que aturar o nosso querido Chanceler fazendo o seu discurso através de uma transmissão ao vivo, mas não foi por muito tempo. Logo, algo aconteceu e perdemos o sinal.

Isso foi bom pra maioria, já que eles queriam festejar e aproveitar antes que seus pais descessem, daqui a três dias.

Eu deveria estar aproveitando também, aliás. Kane estaria aqui em menos de 72 horas e eu sabia bem que não seria fácil. Teríamos que continuar aquela conversa em que eu o deixei falando sozinho e ele tentaria voltar a ser aquele pai super-protetor, como se nada tivesse acontecido.

Como se ele não tivesse me jogado em uma cela por dois anos.

Mas afinal, é isso, não é? Descemos pra esse Planeta sem nenhuma esperança de vida e, então, descobrimos que a Terra é habitável e que os cem adolescentes que foram enviados para morrer, realmente teriam uma segunda chance.

Todos estavam felizes por isso, independente do que aconteceu antes e independente de saberem que toda essa liberdade se romperia no momento em que os responsáveis pisassem em solo, mas eles não ligavam.

A maioria estava focando no quão irreal era aquela nossa chance, de que veria seus pais mais uma vez, de que viveriam algo que pessoas de 97 anos atrás não acreditavam.

Por que eu não posso pensar desse jeito?

Meus olhos param em Bellamy do outro lado, conversando algo com Clarke. Já estava de noite e montaram uma fogueira para dançarem, beberem e conversarem em volta dela.

Estava tudo animado, mas eu estava aqui, sentada em um tronco caído. Sem bebida, sem companhia e sem sentimentos de que deveria aproveitar.

Bellamy, apesar de não ter sido um dos cem enviados como castigo — assim como Aspen e eu—, tinha recebido uma segunda chance ao descer com a gente e descobrir que o ar é respirável. Ele merecia uma outra chance?

Noutro dia, estava lutando contra uma autoridade que nunca ousaria bater de frente há alguns anos, apenas para que o Blake não morresse e fosse perdoado. Estaria eu sendo uma hipócrita não o perdoando?

Ele merecia o meu perdão? O crime dele foi tão grave assim? Ele estava apenas protegendo Octávia e, apenas Deus sabe o que eu faria pra proteger Aspen nessa altura do campeonato.

O que eu fiz.

Bellamy merecia o meu perdão ou eu só estava confusa com tudo o que vinha acontecendo nesses últimos dias? Eu poderia realmente o perdoar, de todo o meu coração? Sei que antes do... que rolou na floresta, havíamos começado a manter uma conversa sem discutir, mas por conveniência, por pura sobrevivência.

Poderíamos olhar nos olhos do outro, nesse momento de lazer, sem proferirmos palavras que arrebentariam a mente do outro? Eu acho que não, mas queria que sim.

Queria ter coração o suficiente para encara-lo nesse momento e ser sincera ao dizer: "Escute, Blake, tinha razão. Não te perdoei, mas vou começar a entrar nesse processo."

Sinto que se eu parar de culpá-lo sobre o que houve, não sobraria mais nada pra eu passar pensado em momentos assim. Eu seria apenas um corpo sem pensamentos racionais, olhando através das brasas, das pessoas e vendo... percebendo que não conseguia ser como elas.

Que não conseguia sorrir como elas, beber e se esquecer de todos os problemas. De olhar pra floresta e não pensar que poderíamos estar sendo vigiados, esperando uma oportunidade para sermos dizimados, por conta daquele terrestre que se libertou.

Afinal, se eu não quero viver, por que estou tão preocupada em sobreviver?

— Está tudo bem? — Perguntou Aspen, ao se afastar dos amigos e se aproximar de mim.

— Claro — sorri. Sorri até que ele fechasse aquela cara de preocupação. — Não se preocupe, só estou pensando. Vá se divertir.

Aspen assente com a cabeça, torcendo os lábios, como se estivesse planejando algo. Mas em vez de me contar diretamente, ele se inclina e com a mão que não está segurando um copo que mais parece um coco, me puxa para cima e depois para mais próximo da fogueira.

— Aspen... — choramingo, quase forçando meus pés no chão para não o acompanhar. — O que está fazendo?

— Me divertindo — respondeu, gritando. — Com você.

Ele começou a pular e dançar e fazer uns passos estranhos, mesmo sem música. Parecia insano, mas naquele meio segundo que eu fiquei o encarando, parecia a única coisa que fazia sentido naquele momento.

Era confuso, mas fazia mais sentido do que pensar nas coisas em que eu estava pensando.

E ao ver seu sorriso de orelha a orelha, achei que se o seguisse, conseguiria a mesma paz, a mesma felicidade. Mais pessoas acompanharam a gente na maluquice de pular e sorrir e ser feliz.

Mas mesmo depois de parar por conta da respiração ofegante e rir do Jasper que estava puxando um Aspen super asmático, me senti uma telespectadora. Daquelas que sonha em viver, mas acorda todos os dias em sua realidade, apenas sobrevivendo através de sonhos e irrealidade.

Eu decidi que minha energia negativa deveria ser levada para outro lugar no momento em que vi Clarke Griffin esquecendo todos os seus problemas e se divertindo.

Se aquela garota conseguia colocar tudo de lado e beber, havia algo muito errado comigo e enquanto eu não resolvesse, seria melhor para todos que eu me afastasse.

Estava fazendo vigia em frente a muralha que todos chamam de portão quando percebi passos. Mas eram passos de lá de dentro, então não me importei em checar quem era. Podia ser apenas um jovem querendo esvaziar a bexiga.

Mas é claro que não era. A vida não podia ser fácil desse jeito.

— Precisamos conversar.

Olhei para Bellamy que já não parecia muito feliz em vir até mim.

— Eu tô de boa, Blake — respondi, suspirando. — Pode levar todo esse drama para outro lugar?

Sei que ele respirou fundo e olhou para alguma direção lá de dentro antes de se voltar para mim, mas não pensei em retirar minhas palavras.

Ele não estaria aqui apenas para conversar sobre algo que aconteceu há uns três ou quatro dias atrás, apesar de parecer que está o afetando muito na hora de abrir os olhos até o momento em que ele envia ordens para pessoas aleatórias do acampamento.

Mas eu não queria saber, sendo sobre o beijo ou não, eu não queria me envolver em nenhum drama até o amanhecer do dia.

Mesmo parecendo que não queria, Bellamy decidiu respeitar a minha decisão e se afastar. Percebi mais tarde, naquele mesmo dia, que foi a pior decisão que eu fiz na minha vida até o momento.

Ao menos, se eu tivesse me envolvido nesse drama, não estaríamos de certeza discutindo sobre a provável chance de guerra.

Pelo o que me explicaram, Finn conseguiu uma reunião com os líderes dos terrestres e Clarke foi. Era pra ser sem armas, mas Bellamy, Jasper e Raven os acompanharam e, mais do que isso, armados.

Pelo o que Jasper disse, eles também tinham guardas armados com arco e flecha, escondidos através de árvores para atirar em Clarke.

Foi por isso que ele deu o primeiro tiro, justificou, cansado de ser acusado. Só pela gente, na verdade, porque tinha muitas outras pessoas do acampamento o admirando por ter atirado em um terrestre antes que esse fizesse mal a alguém do grupo.

Mas, além disso, tínhamos mais coisas para se preocupar. Como a nave da noite passada que caiu. A maioria acha que é a nave Êxodo, que estaria trazendo as nossas famílias, incluindo, meu pai.

Mas eu não acho. É impossível. Eles apenas tem que pensar mais.

Eram pra eles descerem apenas daqui três dias e tenho certeza que eles não adiantariam nenhum minuto a menos, usando todos os segundos que tem para ter certeza que não teria nenhum problema. Eles não desceriam três dias antes, no dia da União, sem nos avisar.

Eles não podiam.

Ainda assim, quiseram criar uma equipe de busca para irem até o local em que a nave caiu no dia seguinte. Não ia dar em nada, eu sabia, mas quis ir. Alguma parte de mim... não sei, eu precisava, assim como Clarke.

Aspen veio o caminho todo repetindo a mesma coisa e, ao chegarmos, não parou:

— Você não deveria estar aqui.

Por um momento, achei que ele tivesse razão. Era uma cena horrível de ossos queimados, partes do corpo jogadas longe demais, carbonizadas ou cortadas. Era um cheiro horrível de morte e combustível.

Mas então, eu lembrei que ele estava falando por achar — como os outros — que Kane estava aqui.

— Estou falando, Asp — disse mais uma vez, tomando cuidado para descer a região íngrime. — Ele não está aqui e nem a mãe de Clarke — apontei para a garota, que via aquilo com olhos diferentes dos meus.

Ela realmente acreditava que a mãe poderia estar ali, em meio aos ossos carbonizados.

— Fiquem atentos — avisou Bellamy, próximo de Finn e Raven. — Teremos retaliação dos terráqueos pelo que houve na ponte, é só questão de quando.

— Pode culpá-los? — Questionou Finn, ainda de mal humor por não ter sido ouvido na questão da parte "sem armas".

Os dois começaram uma discussão que Raven logo parou, defendendo o lado do Blake. Fiquei um pouco surpresa, mas ao decorrer dessa história entre Clarke e Finn, tento não desenrolar muitas esperanças para melhorias.

— Aspen — apontou Bellamy para o garoto ao meu lado com uma arma —, pro posto.

O'Connor revirou seus olhos para o garoto e lhe enviou um dedo do meio, conferiu se eu ia ficar bem e ao não ter nenhuma resposta minha, por eu estar procurando alguma coisa que ajudasse a sabermos o porquê da explosão — como pediu Raven —, ele se volta a ordem de Bellamy.

Esse que não demora para se aproximar, como se quem não quisesse nada.

Quis o enviar pra longe no mesmo segundo, mas não estava com saco para uma discussão agora, então deixei que ele fingisse que estava só de passeio por quanto tempo ele quisesse.

— Não comentou sua opinião sobre o que rolou noite passada — ele indagou, ainda sem olhar para a minha direção, quase como se nem estivesse falando comigo, de fato.

Torci a língua dentro da boca para não o responder de mal jeito. Não estaria sendo ignorante apenas por não gostar dele e sim pelo que rolou entre a gente. E se ele estava fingindo que nada aconteceu, não seria eu que reagiria com algum surto.

— Quis ficar fora do drama por um motivo — dei de ombros, fazendo uma careta ao passar por um
braço cortado. — Mas, se tivesse que opinar... — parei para o encarar e, pela primeira vez, ele fez o mesmo, estreitando os olhos pelo sol — a reunião nem deveria ter sido marcada.

Era o que eu pensava. Não tem essa de levar ou não armas. Não deu tempo da gente descobrir se iam mesmo atirar em Clarke, mas de uma coisa eu sei; se Jasper não tivesse reagido, se ele não estivesse lá, provavelmente descobriríamos da pior forma.

Não deveríamos ter levado armas. Mas eles também levaram, então não é essa a discussão que deveria estar em pauta.

Nem deveriam ter ido. Nenhum deles. Finn é um pacífico, tudo bem, eu respeito. Não quero guerra tanto quanto ele, mas pensar que uma conversa com o outro lado iria ajudar, é burrice e não bondade.

— Clarke, pare! — Advertiu Raven, chamando a atenção de todos para onde Clarke estava.

Ao aproximarmos, percebemos todo o combustível que estava vazando. Se aquilo pegasse em algo fervendo... eu não queria estar por perto. Raven mostrou que ninguém gostaria com um exemplo que, mesmo depois de ter sido avisado, teve vários gritos de surpresa.

Precisávamos liberar toda aquela área se não quiséssemos virar os próximos corpos carbonizados daquele lugar.

(...)

As coisas no acampamento não estavam boas quando chegamos, ao anoitecer.

Parece que o mais inesperado dos inesperados voltou, John Murphy. Bellamy, como o esperado, não gostou nada dessa notícia e Clarke seguiu o rapaz, tendo na cabeça o segurar para não fazer nenhuma merda.

Mesmo que fosse de Murphy que estivéssemos falando.

Eu só fui para pegar uma água e, talvez, quando ouvi por aí que ele estava todo arrebentado, queria tirar um aproveito disso. E, podem acreditar, as palavras que usaram para o descrever foram eufemismo.

Bellamy expulsou todos da base, deixando apenas Connor, Derek, Clarke, Finn, ele e eu.

Isso por ele não saber ainda que estou aqui. Estou atrás de todos eles, com uma garrafinha na mão. Sem sede alguma depois de ver o estado do adolescente que fora expulso do nosso acampamento.

Murphy foi acusado de tentar invadir, mas ele rebateu na hora, sem muita validação, por estar cheio de sangue. Estava fugindo dos terrestres. Sinceramente, em circunstâncias melhores, eu nunca acreditaria em suas palavras. Mas não tem como ser mentira. Olhe pra ele.

Bellamy apontou sua arma na direção do garoto encolhido no chão, tremendo de frio, medo e dor. Finn, o moralista, interrompeu o ato.

— Fomos claros sobre o que aconteceria se voltasse — afirmou Bellamy, decidido sobre o que fazer.

Tentando não focar na briga entre Bellamy e Finn, que estava tornando-se frequente, fechei os olhos com força ao me aproximar do ferido.

Foi quando os outros me perceberam ali, mas ninguém me impediu de me abaixar em frente ao Murphy, que recolheu mais as pernas para o peito e me olhou desconfiado enquanto eu esticava a garrafa de água em sua direção.

Achei que ele não pegaria, mas assim que a barreira de orgulho abaixou e a necessidade falou mais alto, ele retirou a garrafa da minha mão — não com brutalidade, mas sim com desespero — e bebeu do conteúdo como se não houvesse amanhã.

Me levantei aos poucos e me pus de frente para Bellamy. Clarke ocupou o meu lugar, como médica.

— Não gosto do rapaz tanto quanto você — comecei por aí, para ver se entrava de uma maneira mais precisa. — Mas não pode matá-lo assim.

Bellamy me encarou como se eu estivesse enlouquecendo aos poucos em sua frente.

— Não pode estar falando sério — disse, mudando o peso de perna, ainda portando a arma, apontada para o chão. — A Charlotte...

— Eu sei bem dela — o interrompi, as lembranças dos meus desvaneios com ela naquele não-abrigo sólidas. — Mas, no final, eu não a segurei. Então pode começar atirando em mim — ele fortificou o meu olhar por mais alguns segundos, até desistir e soltar a arma que ficou pendurada em seu corpo. — Foi o que eu pensei. Clarke? Fale com a gente.

Virei-me para ela, meu olhar transmitindo uma coisa completamente diferente do que minhas palavras há alguns segundos.

Eu estava falando sério. Odiava Murphy como qualquer um ali e, apesar de tudo, não era pena que eu tive dele. Era puramente benefício próprio. Ele sabia sobre os terrestres, mais do que a gente e se iríamos mesmo entrar nessa guerra, era melhor a gente saber algo sobre eles.

— Ele não está mentindo — informou Clarke, analisando as mãos sangrentas do rapaz. — As unhas dele foram arrancadas. Ele foi torturado.

Ao menos que ele tivesse um instinto diferente de todos nós, é claro que ele foi torturado e por mais motivos do que ele realmente os deu.

Murphy contou tudo sobre a gente e eu nem sei por onde começar a pensar das coisas que poderia começar a dar errado nesse momento.

Não tínhamos armas secretas sem ser um jovem torturado, com traumas e com raiva da gente, que mal conseguia se pôr de pé.

Ótimo. Nunca tivemos em melhores condições.

— Rayna — Clarke me chamou, antes de sair da tenda depois de declarar a sua decisão.

Ou Murphy nos ajudava ou ele morria. Ótimas escolhas, espero que o instinto de sobrevivência dele ainda seja sagaz.

— Oi?

— Pode cuidar dele? — Minha careta foi instantânea. — Preciso ver se Raven conseguiu contatar a Arca e já vi você em ação. É boa nisso.

Ela fica me encarando, esperando a minha decisão. Não, era isso que eu queria dizer. Mas parecia uma coisa bem egoísta de se responder nesse momento.

— Tá, claro — soltei, a contra gosto. Ela sorriu em agradecimento. — Não me encare assim. Não posso prometer que no final de tudo, aquele pano não esteja no final da garganta dele.

— Eu não a culparia.

É o que ela escolhe dizer antes de sair da base, deixando-nos sozinhos com os cachorros de Bellamy e o próprio.

— Derek, Connor — chama Bellamy. — Vocês ficam de olho nele. Não tirem os olhos dele.

Os dois concordam e eu reviro os olhos, pegando aquele balde com água limpa e um pano para começar a limpar Murphy.

Assim que eu me aproximei e invadi o seu espaço pessoal, ele se encolheu, mas não fez mais nada pra me afastar, visto que a única preocupação dele nesse momento era respirar de um jeito adequado.

Começo pelas suas mãos, dedo por dedo, sem nenhuma delicadeza. Essa última parte acaba arrancando muitos resmungos do garoto, pelos dedos sensíveis pela tortura.

Apesar da minha enorme desconsideração por ele, realmente tentei não pegar muito encima dos machucados. Aquilo... os machucados eram cruéis. Até mesmo para alguém como John Murphy.

Quando me inclino sobre a bacia para espremer mais uma vez o pano cheio de água e sangue, ele solta uma risada que mais parece um rincho, declarando seus pulmões afetados.

Sinceramente, não sei como ele sobreviveu pela floresta, no frio que dá toda noite.

— Qual é a graça? — O questionei, torcendo a cara para o encarar.

Era realmente, realmente feio de ver.

— Não vê a ironia? — Tosse após a frase completa, a voz rouca. Eu arqueio minhas sobrancelhas em sua direção. — Até então estavam tentando me matar e agora... estão me salvando.

— Para o nosso benefício — eu o cortei imediatamente, me aproximando exageradamente para que ele pudesse me ouvir bem. — Não confie no tamanho da sua significância pra esse acampamento depois que revelar o que queremos saber.

Identifico o seu nervosismo através do seu pomo de Adão que subiu e desceu de forma seca. Pedi que Derek pegasse um pouco de água para o nosso convidado, que me encarou com algo muito diferente do que gratidão.

Esperava que ele entendesse que eu não estava o ajudando por empatia. Estava lhe mostrando que, nesse estado, ele estava em nossas mãos e suas íris me diziam o que eu queria saber.

— Sabe, anarquia...

Ele nunca termina essa frase e, dessa vez, não é por culpa de ninguém. Murphy começa a tossir sem parar até que um líquido vermelho saia pela sua boca. Me assusto imediatamente e recuo, sem saber o que poderia ser aquilo, todavia, tendo consciência de que não podia ser nada bom.

— Rayna! — Clarke me chamou antes mesmo de passar pelas cortinas da base. — Saia de perto dele! Vá higienizar as mãos com álcool, agora!

Eu estava certa.

Descobrimos que Murphy não foi esperto o suficiente para escapar sozinho, por conta própria e que, na verdade, os terrestres haviam deixado a porta de sua cela aberta. Os terráqueos queriam que ele fugisse, que ele chegasse até a gente porque Murphy era uma maleta.

Confortável e compreensível por fora, onde vemos e ficamos curiosos e excitados pela primeira coisa concreta. Até abrirmos a mala e descobrirmos que em vez de nos ajudar a sobreviver, o conteúdo que estava dentro dela iria nos dizimar.

John Murphy era essa maleta, portando uma doença desconhecida que passava através de contato, sendo ele direto ou indireto.

— O que houve? — Exigiu Bellamy saber, mas seu olhar amoleceu quando recuou até mim. — Rayna... O quê...

Juntei minhas sobrancelhas de início, mas logo senti algo escorrer pelo meu rosto e pela expressão de todos que estava por ali e por Connor que estava próximo a mim e se afastou, ouso dizer que... Não conclui meu pensamentos.

O sangue não parou ao escorrimento dos meus olhos, senti uma enorme vontade de tossir e quando sucumbi à vontade, não consegui parar mais. Até estar inclinada sobre o chão, com gotas de sangue saindo da minha boca.

Não sei bem quando ocorreu, mas Blake estava ao meu lado, segurando o meu cabelo e se inclinando em minha direção, com algo mais do que curiosidade.

— Se afaste, Blake — consegui dizer, passando o meu antebraço pela minha boca e recuando do seu toque. Ele tenta vir até mim, mas eu nego. — Clarke também está infectada. Você não pode...

Totalmente irado com a situação, Bellamy levanta e explode na direção de Murphy:

— Essa é a sua vingança? Ajudar os terráqueos a nos matarem?

— Eu não sabia disso, juro! — Admitiu Murphy, sendo cuidado por Clarke.

— Pare de mentir! — Se descontrolou por um segundo.

Estava escrito na face de Bellamy que se houvesse uma brecha para ele atacar o rapaz, não hesitaria. Talvez seja por isso que Clarke esteja tomando conta mais dele do que dela, com os olhos vermelhos de sangue.

Em meio a discussão, Connor também fica doente e tenta se manter afastado de todos nós, sentado com sua arma ao lado, lidando com as próprias dores.

Eu me sentia exausta e parecia que todas as noites que eu não dormi desde que cheguei a essa Terra, colidiu com o meu corpo e estava me empurrado para baixo, para fechar os olhos e apenas descansar. Mas a maneira como eu estava me sentindo... tinha medo de não acordar.

Após a recaída do outro garoto que também já estava no chão ao lado de Connor, uma resolução perto de uma Quarentena foi decretada. O garoto morreu e a sensação que meu corpo estava passando era que eu morreria também.

Esse seria o meu fim. Eu conseguia sentir.

Mas não disse nada. Decretei a mim mesma que se esse será o meu último dia nessas terras, não passaria deitada em uma rede, sendo atendida por outras pessoas doentes. Eu seria essa pessoa doente que estaria ajudando outras.

Era o mínimo que eu podia fazer.

Ao descobrir que sua irmã estava entre os caras que acharam e tocaram em Murphy, Bellamy saiu disparado para achá-la e certificar de que estava tudo bem. Quis saber de Aspen também mas fui presumindo através das pessoas que entravam aqui. Ele não entrou. Eu só podia torcer para que ele estivesse em algum lugar seguro.

Logo Octavia estava aqui, sendo escoltada por seu irmão. Clarke pediu a minha ajuda — por eu estar parecendo a menos doente — para a examina-lá e ao terminarmos, ela não parecia ter nenhum dos sintomas da doença que os terrestres nos mandou.

Meus olhos recuaram para o corpo do garoto que estava coberto por uma lona preta. Se os terrestres podiam controlar aquela doença para chegar até aqui... quer dizer que eles obtém uma cura? E se aquilo tivesse uma cura?

— Acho melhor mantermos ela aqui — interrompo a conversa que estava aliviando Bellamy —, por segurança.

Ele não gostou da ideia tendo em vista que esse lugar era uma zona de perigo, mas concordou em deixá-la separada dos outros, apenas para caso ela apresente algum sintomas.

Clarke, que parecia ter pensado a mesma coisa que eu há muito tempo, começou a concordar comigo e relaxar mais o homem que estava severamente preocupado com a irmã, que não queria ficar, de jeito nenhum, aqui.

Por sorte, assim que Bellamy deu as costas, ela descobriu que não ficaria.

Assim como eu, Clarke pensou que seria uma boa Octavia ir encontrar com o terrestre que tinha ficado preso sobre o nosso comando. Ele poderia ter a cura, assim como ele tinha na outra vez, quando aconteceu com Finn.

Essa poderia ser a nossa única chance de sobrevivência. Claro que, depois, teríamos que se preocupar com a fúria de Bellamy, mas isso não era nada.

Depois que ela saiu, os doentes não pararam de chegar e só saiam daqui carregados por mais doentes, prontos para liberar espaço para os outros que não estavam mortos mas que estavam a caminho.

Era desesperador de ver e sentir. Era como se a cada passo que eu desse, meu corpo gritasse comigo e me refutasse através de dores como na cabeça e na lombar.

Teve um momento em que eu achei que morreria, meus movimentos pararam e eu havia caído. Ninguém tinha percebido. A dor se apossou de todo o meu corpo e achei que seria o meu fim. Queria gritar, mas isso atrapalharia as outras pessoas.

Consegui sentir o sangue escorrer pelo canto da minha boca e respirei com dificuldade, apertando os olhos. Eu não queria morrer.

— Rayna? — Ouvi no fundo, minha visão começando a ficar turva. — Rayna! Fique comigo. Aqui, cheire isso.

A tontura é chutada pelo álcool que eu ingiro através das minhas narinas. Minha visão começa a distorcer o real do que parecia ultrapassar a realidade.

Era Murphy me ajudando, uma das coisas que eu poderia jurar estar delirando.

Nos encaramos por alguns segundos, deixando a surpresa e o agradecimento rolar no ar entre nós dois. Mas logo a comoção de lá de fora foi passada para dentro e eu o dispensei, para que pudesse ajudar Clarke que estava sendo carregada por Finn.

Apertei meus olhos e obriguei ao meu corpo que me obedecesse, conseguindo me sentar no lugar. Logo estava de pé novamente.

Sem Clarke em pé, precisaríamos de mais pessoas. Murphy se curou e descobrimos que quem não morria, se curava.

A responsabilidade de sobreviver a isso pesou muito mais. Ou eu seria uma fraca e morreria ou seria forte e sobreviveria para continuar lutando em algo sem sentido contra os terrestres.

— Ei, Rayna — me virei lentamente para a direção, os olhos querendo fechar. — O que está fazendo de pé? Murphy me contou sobre o seu episódio mais cedo. Precisa deitar.

— Estou bem, Bellamy — disse de forma pegajosa. — Clarke está dormindo e ainda tem muitos feridos.

— Você precisa descansar — ele não desistiu e assim que eu lhe virei as costas, Bellamy me chamou e segurou o meu braço. — Ei! Você pode morrer.

— Não me toque.

Tentei recuar do seu toque, assustada com a possibilidade dele ser infectado como os outros. Mas acabei tropeçando na lentidão das minhas pernas e quando bati a cabeça no chão, não acordei mais.

No fundo, eu queria ser fraca. Então, deixei que a escuridão me levasse.


Espero que estejam gostando.

Me desculpem por qualquer erro e não se esqueçam de interagir!!!

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