CAPÍTULO 40
Dália Menezes
Apuro a audição e resolvo parar de ignorar o médico quando ele entra em um assunto que me interessa.
— A senhora tem uma gestação de risco por vários motivos, ter 39 anos, ser a primeira gravidez e claro, levar um tiro acarretando num princípio de aborto! — O olho rapidamente pelo canto do olho e subo minha mão para a barriga, meus dedos alisam a pele e abaixo a cabeça em culpa. — Então eu aconselho cuidado, responsabilidade e seguir a risca os procedimentos que seu obstreta indicar, para que não haja perigo para nenhum dos dois!
Sinto meus olhos se encherem de lágrimas. Fui tão estúpida! Como que eu pensei que ignorar iria fazer sumir? Ou que, só porque não dei ouvidos o meu bebê iria esperar até eu salvar seu irmão? Sinto as lágrimas caírem no lençol conforme faço minha promessa, mas uma promessa que faço ao meus filhos.
Prometo nunca mais colocar você em perigo, meu amor! Sinto muito por fazer você passar estresse todo. De agora em diante vou te proteger com a minha vida e nunca mais te ignorar!
Escuto um pigarreio e olho para o responsável enquanto cego as poucas lágrimas. Desvio o olhar para o relógio no pulso do médico, ignorando-o de propósito.
Eu acordei nesse hospital frio e extremamente branco, sozinha há meia hora e foi simplesmente aterrorizante! Eu nunca gostei de ficar sozinha, tanto que adotei Bolhota quando vim para o Brasil e agora, estou acostumada com as vozes altas, as correrias, pulos, ânimos, sorrisos e chamados dos meus filhos! Abraços e beijos quentes do meu Christopher e por um instante eu sinto que fui tudo um sonho, se eu não soubesse da gravidez, juraria com todas as minhas forças que nada nunca existiu e não quero isso!!
Fechos os olhos e desvio de novo a visão para o lençol branco, abraçando minha barriga com esperança e saudade. As lágrimas caem sem controle e cada segundo sozinha aqui, esse lugar fica ainda mais congelante!
Odeio esse frio!
A voz do médico continua e parece que está fazendo de propósito! Desde que despertei já me examinou não sei quantas vezes, fui picada e perfurada por agulhas diversas vezes e vários lugares! Fiz exames adoidado e agora ele fica falando, essa voz calma e contida me irrita!
Odeio hospitais, desde que passei muitos dias dentro de um com minha Julia e sinto tanta dor! Dor de cabeça, dor na coluna, nas costas e no corpo todo que ainda por cima não posso mexer! Estou toda doída e ainda tenho que ficar ouvindo o médico repetir o quanto fui descuidada e que quase matei meu bebê.
Aperto os olhos sentido as lágrimas arderem. Eu sei que tenho culpa mas nunca ia querer levar um tiro, nunca pedi pra isso acontecer! Como poderia? Quem pediria para um cara atirar no próprio filho, só para que eu me jogasse na frente da bala? Eu pelo menos não sou esse tipo de maluca, sou outro tipo de maluca! Sou a maluca que preza pela vida acima de tudo!
Não quero ouvir, quero somente a minha família! Cadê o Vinicius? E o meu Christopher? A Julia está bem? Ninguém veio me ver ou me avisar de nada! A última visão que tive antes de apagar foi a em pânico de meu marido e os gritos aterrorizados de meu filho! Quero saber que estão bem. Poder abraçá-los e beijá-los, pedir desculpa por ser inconsequente!
Solto um soluço alto, meu corpo começa a tremer conforme choro e as lágrimas descem feito cachoeira em dia de tempestade. Abraço a mim mesma e esfrego as mãos nos braços para afastar o frio.
— Senhora? — Escuto me chamarem e balanço a cabeça para que não me chamem.
Ergo a cabeça e olho para o médico que se aproxima da cama com a mão estendida, com tanta cautela que parece estar cuidando de um animalzinho ferido e indefeso.
Então perco o controle. Os aparelhos ao meu redor começam a apitar em descontrole e levanto ainda mais o rosto, gritando enquanto choro alto com os sentimentos conturbados entre medo e raiva de toda essa pressão.
— Sai daqui!! — Grito e tento secar as lágrimas ruidosamente, outro soluço escapa. — Eu não quero saber! Não quero ouvir!! — Grito jogando o lençol para longe e soluço de novo, vejo tudo embaçado por conta das lágrimas e escuto o médico pedir calma. — Não! Não tem calma! Não tenho!!
— Senhora, se acalme...! — Murmura a enfermeira ao lado do médico idoso e com cara de assustado.
— Não!! — Grito mais alto e aperto os olhos com força sentindo as lágrimas arderem feito brasa. — Quero a minha família!
Abro os olhos bem no momento que vejo a porta abrir e outra enfermeira entrar, as duas andam até mim e me seguram pelos braços. Sacudo o corpo tentando me soltar e então me prendem a cama e vejo a mulher injetar algo no soro ainda ligado a minha veia.
Abro a boca para gritar, pedir que parem e me deixem ir, que chamem meu filho para que eu possa abraçá-lo. Como não posso erguer os braços, ergo as pernas e sinto uma pontada na região onde levei o tiro e sinto os pontos repuxarem e agora choro de dor enquanto as forças vão indo embora e em segundos a minha visão se escurece e não sinto mais nada além da escuridão me engulir mais uma vez!!
Christopher Gutierrez
Depois de muita insistência, fui deixar Vinicius no hotel com meu sogro para que ele pudesse descansar enquanto a gente resolvia as pendências.
Nós só nos dividimos para ser mais rápido, meu pai já estava na delegacia resolvendo tudo por lá. Então minha sogra foi comprar algumas coisas, ela disse que precisava nos abastecer de coisas úteis, como roupas para Dália, Vinicius e comprar uma passagem para levar Vinicius pra casa com o meu sogro assim que Dália o visse. Decidimos que assim seria melhor, ele ficar em São Paulo com Julia até minha esposa ter alta.
Enfim, foi menos de duas horas até eu voltar para resolver as papeladas do hospital e então assim que passei na recepção, o médico Guilherme que me informou mais cedo, veio me informar que enquanto foi almoçar. Dália acordou, outro médico foi verificar e ela se estressou com as falas do homem e tiveram que a sedá-la novamente.
Tive que me controlar muito para não me estressar. Cara, é o cúmulo! As pessoas não tem um pingo de respeito e humanidade com o paciente que acaba de passar por uma situação estressante!
Todavia, Doutor Guilherme se desculpou em nome do outro médico e disse que ele foi descuidado e avoado mas que isso não iria se repetir pois ele que era o responsável pelo caso de minha esposa.
Agora estou aqui, sentado na poltrona ao lado da cama em que Dália dorme, enquanto Mónica foi buscar um café para nós dois. Respiro fundo e me arrumo no acento, estico a mão e aperto os dedos em torno dos de Dália.
— Tudo sempre acontece contigo, Lia. — Passo os dedos sobre os pelos claros em seu braço, a pele macia em contato com a minha me deixa mais calmo. — Eu sempre tento te proteger. Mas agora vou dar 110% de mim para proteger vocês quatro, a minha família! Amo vocês! Amo demais você, minha Dália!! — Troco as mãos e então acaricio sua barriga, onde nosso bebê repousa. — Estou com saudades...
— Também te amo... — Escuto o sussurro fragilizado de Dália acima de mim. — E estou com saudades! — Ela continua e eu a encaro sorrindo, feliz que finalmente estou a vendo acordada. — Cadê o meu menino?
Suspiro, sabia que ela logo perguntaria de Vinicius. Não tinha nem dúvidas e ainda bem que já não mandei Vinicius pra São Paulo como meu sogro queria.
— Vinicius? — Pergunto e ela assente com os olhos preocupados, ergo sua mão e beijo seus dedos. — No hotel com seu pai.
— Meu pai? — Questiona um pouco surpresa e confirmo, sorrio ainda mais e pouso minha mão novamente sobre sua barriga.
— E o outro está bem aqui! — Comento vendo seus olhos umidecerem e troco novamente de mão, subo uma para seus cabelos e acaricio. — Nosso bebê.
— S-Sim...! — Murmura com dificuldade e apoia o rosto em minha palma. — Me perdoa?!
— Não vamos entrar nesse assunto, amor. — Respondo com pesar, não quero ter que recordar, dói só de lembrar a cena de Dália ensanguentada no chão! — Só... Só vamos continuar nossas vidas, Lia. É o melhor!
— Por enquanto, tudo bem. — Dália se afasta e então coloca a mão sobre a minha em sua barriga. — Está tudo bem? Digo, com a nossa bebê? E o Vinicius? Quando vai vir aqui?
— Daqui a pouco eu peço para sua mãe ligar para o Rogério trazê-lo. — Explico e massageio sua barriga, ela sorri entre lágrimas. — Mas, como assim, nossa? No feminino?
— É! — Dália abre um grande sorriso e com a mão ligada aos aparelhos, seca as lágrimas. — Eu acho que é uma menina! — Ela funga, respira fundo e então me olha desconfiada. — É melhor ligar logo pro meu pai. Quero abraçar o meu menino.
— Dália. — Chamo baixo, ela precisa ficar calma porque se se estressar vão sedá-la novamente. — Meu celular está carregando, ali olha. — Aponto para um móvel com um jarra de água e copos do outro lado do quarto. Ela segue o olhar bem no instante que Mónica entra no quarto com os cafés.
— Mãe! — Ela chama eufórica, o aparelho ligado aos seus batimentos cardíacos começam a apitar loucamente. Mónica deixa o café no mesmo móvel onde está a água e chega até a cama. — Mãe, liga pro meu pai, sim? Eu quero ver o meu filho!
— Dália! Filha, se acalma. — Mónica chama sua atenção, deve estar tão preocupada com sua situação quanto eu. — Se estressar não vai resolver nada! O Vinicius tem quatorze anos e está bem, está com o avô comendo e descansando. Não é bom para ele ficar infurnado dentro desse hospital.
— Por isso, ele vai vir te ver, você mata a saudade e ele vai pra São Paulo com o Rogério. — Relato logo o que planejamos, melhor assim, dizer tudo de uma vez. Ela me encara chocada, a boca faz um completo Ô, sua mão tenta soltar a minha e seguro firme a encarando. — Você precisa admitir que ficar aqui só vai fazer ele lembrar o tempo todo o que nos levou até aqui.
— Tá! Tá bom! — Dália concorda por fim e eu e Mónica só podemos respirar aliviados.
Dália Menezes
3 horas mais tarde...
A porta se abre num rompante e abro os olhos erguendo a cabeça do travesseiro.
— Mamãe!!! — Vinicius grita e meu pai faz um shiii logo atrás, meu menino ignora e pula na cama me abraçando forte, o abraço de volta com todo o meu ser.
— Ai meu amor! Minha vida, que saudade!! — Exclamo o segurando entre meus braços, meus dedos presos em suas roupas e sinto suas lágrimas molhando meu ombro, as lágrimas descem da mesma maneira por meu rosto. — Você está bem? Está machucado?
— Estou bem. Obrigado, mãe! — Murmura ainda chorando e me apertando, consigo sentir seu alívio. É o mesmo que sinto, estamos juntos a anos, prometemos estar presente um para outro em todos os momentos e passar por isso foi difícil, não só para nossa família mas inicialmente, quando tudo era desconhecido e só mato, era só nós dois!! — Como está se sentindo?
— Estou bem, não se preocupe, meu amor. — Me afasto o suficiente para ver seu rosto, ergo uma das mãos e seco suas lágrimas. Massageio sua bochecha e sorrio. — Estou muito feliz que está de volta, senti muito sua falta. Não imagina o quanto!
— Também senti sua falta, mamãe. — Vinicius então me abre um daqueles sorrisos lindos e só deles, que me fazem sentir amor e carinho eterno. — Vou ir ver minha irmã.
— Eu sei. — Tiro o cabelo de seus olhos, que aliás precisa de um corte. Sorrio e ele me sorri de volta. — Dá um beijo e um abraço bem apertado nela por mim.
— Tá bom.
— E no seu tio Daniel e sua vó Cristina também! — Ele assente e alisa meu cabelo, meu menino carinhoso! — Esquenta minha cama que logo eu chego, tá bom?
Posteriormente, quando me despedi do meu silencioso pai, da minha preocupada mãe, do meu sogro atencioso e de meu carinhoso filho, todos se dirigiram para o aeroporto e foram para São Paulo.
Uma semana depois...
Eu e Christopher ficamos no Rio de Janeiro, presos no hospital com a minha agonia e mudança de humor constante. Eu culpo os hormônios da gravidez e somente os hormônios por me deixaren instável e com mudanças constantes de humor, sentimentos e vontades.
Estamos saindo do elevador, já no edifício que fica nosso apartamento, a casa que tanto almejamos para chegar e finalmente colher todo amor e felicidade possível de nossa família.
Olho para Christopher com nossas mochilas no ombro e sorrio, quando saímos daqui há uma semana a intenção era voltar o mais rápido possível e com o nosso Vinicius. Todavia como sempre, nada planejado saiu como esperado e, aqui estamos, abrindo e passando pela porta dias mais tarde e sem o nosso menino, porém agora tudo está como deveria estar!
Durante os dias internada, foi uma tremenda chatisse! Além de estar longe dos meus filhos e vê-los apenas por video chamadas, comer comida insossa de hospital, e sobreviver monotonamente cada minuto de cada longo dia, tendo enjoos engatilhados por cheiros como café, feijão e peixe. No segundo dia internada naquele quarto, eu não saia do banheiro, os médicos chegaram a pensar que estava tendo reação a algum medicamento, contudo era só o senhor que vendia café em um carro em frente ao prédio; no fim, tive que mudar de quarto.
Depois, descobri a minha segunda paixão. O ovo pré cozido quase cru, com a gema mole e amarelinha era tudo o que eu queria comer dentro daquele hospital. O meu amor por canela continuou em primeiro lugar, depois de conversar com o médico, descobri que a especiaria é abortiva, só que eu tive desejos e comi canela durante toda as primeiras semanas e não passei mal, por isso foi liberado com o aviso que caso eu tenha alguma reação negativa, é para parar imediatamente!
Outro ponto a se revelar é dos meus movimentos... Não tem! Simplesmente não posso me mexer com velocidade, elasticidade, praticidade ou de qualquer maneira involuntária porque me causa dor, fisgada, pontada na região do ferimento ainda em processo de cura.
Na verdade eu só consegui ter alta por pura chatisse, teimosia e persistência por minha parte para com os médicos, se não, estava lá até agora!!
Assim que entro em casa posso sentir um cheiro diferente, aquele perfume de comida caseira feita com amor e muito tempero e um falatório vindo da cozinha e sala de jantar, estreito os olhos desconfiada.
— Quê, que vocês estão aprontando? — Exclamo sem pestanejar. — Tão preparando um banquete? Uma festa de arromba? — Me viro para Christopher de sobrancelhas erguidas e sorrio, ele faz cara de desentendido e dá de ombros. Ainda sorrindo, largo minhas coisas no sofá e caminho para a cozinha. — Oiee, ô de casa!! — Cantarolo apoiando no batente e colocando a cabeça dentro da cozinha, o cabelo cai sobre o meu ombro esquerdo.
— Dália, cuidado! — Christopher murmura atrás de mim e nem sei como ele sabe que deu uma pontada esse mínimo movimento de erguer os braços.
Ignoro quando todas as conversas param e os rostos de meu irmão, minha mãe e meu sogro se viram pra mim surpresos. Daniel solta a respiração bruscamente, solta um pote em cima da bancada e bate as mãos nas coxas.
— Sabia! — Meu irmão reclama. — Ela sempre faz isso! Não se faz surpresa pra essa mulher!
— Mãee!! — Me viro e vejo meus filhos correndo em minha direção. Vinicius pula no sofá para cortar caminho e dessa vez deixo passar. Julia atropela meu pai na escada e solto uma risada.
Os braços de Vinicius rodeiam minha cintura e aperto os lábios para segurar o gemido de dor e Christopher balança a cabeça e vai em direção a mãe dele. Abraço meu filho e depois estico a mão pra receber minha filha.
— Meus pimpolhos!! — Exclamo sentindo os bracinhos me rodeando e as lágrimas molhando minha blusa. Acaricio as costas deles e apoio o queixo na cabeça de Vinicius, ele é maior que Julia. — Tudo bem, tudo bem. Não precisa chorar, tá tudo bem agora. Já estou em casa!
— Te amo, mamãe!! — Os dois falam e sorrio.
— Também amo vocês! Amo demais! — Eles se afastam e beijam minha barriga e me sorriem.
Ergo o rosto e vejo todos em volta da mesa, nos sorrindo emocionados. Dou um pulo assustada com o estrondo de confete, passo cada braço nos ombros dos dois e observo os detalhes da cena a minha frente enquanto o confete vai caindo entre nós.
Meu irmão segurando um bolo confeitado pela metade, ao lado do meu pai que segura um cartaz branco todo desenhado e caligrafado lindamente com a letra desenhada de Julia, "Seja bem vinda, mamãe!! Nós te amamos muito!!" Sorrio vendo todo o seu capricho e acaricio seus cabelos macios.
Sigo com meu olhar até observar meu sogro também segurando um cartaz, só que azul e definitivamente a cara de Vinicius. As letras curvadas e firmes feitos com canetões do seu repertório, "Felicidade ao novo integrante da família!!!"
Solto os dois e ando até minha mãe parada e sorrindo ao lado do meu pai, segurando um macacão infantil branco. Abraço ela e sinto as lágrimas em meus olhos, pisco para evitá-las e de nada adianta.
— Obrigada gente! — Exclamo apoiando o queixo no ombro de minha mãe e sentindo o tecido macio do macacão entre meus dedos. — Muito obrigada, mesmo!! Amo todos vocês!
Ainda abraçada a minha progenitora, consigo parar pra pensar e refletir. Todo o frio e vazio por ficar sozinha que um dia eu senti, não consigo mais sentir e nem visualizar! Todo o amor, carinho, aconchego e segurança que se consegue sentir ao amar e ser retribuído, esse sentimento que deixa o coração quentinho, a mente tranquila e relaxada, eu consegui nessa minha família cheia de defeitos e dificuldades!
Os meus filhos, que não nasceram do meu ventre mas sim do meu amor que é gigante e cresce cada dia mais com esse sentimento enorme e forte que construímos juntos!
De um emprego como babá eu ganhei dois filhos! O meu menino esperto e bondoso; e a minha garotinha inteligente e carinhosa. Cada um com seu espaço no meu coração à sua maneira especial. E de quebra, consegui o meu marido, Christopher sempre foi o meu caso de adolescente, nunca tivemos nada de sério mas estávamos sempre ali apoiando e ajudando toda vez que o outro precisava. Porém, nesse meio tempo em que a minha vida virou se cabeça pra baixo, Chris estava ainda mais presente e foi crescendo, desenvolvendo e amadurecendo até chegarmos onde estamos, casados mas sempre companheiros!!
Então, se para ter o que tenho hoje eu precisasse passar por tudo mais vezes, faria e com muito gosto! Em compensação ao cabelo colorido de antigamente, hoje é a minha vida que está colorida e devo tudo aos três!
Cinco meses depois...
Abro a porta do quarto e antes de sair, aponto a lanterna do celular na direção da cama e confirmo se não acordei Chris quando levantei. Sorrio vendo ele ainda esparramado na cama de bruços com as mãos embaixo do travesseiro.
Contente com meu feito me feito, me viro para sair e escuto a voz sonolenta, grave e rouca atrás de mim, fecho os olhos e paro no batente.
— Onde você vai? — Pergunta e escuto o fafalhar de roupa. — São quatro e dezoito da madrugada, Lia!
— Ai amor! — Resmungo e me viro, aponto a lanterna para meu rosto e o encaro me observando de olhos semicerrados e com os cotovelos apoiados no colchão. — É que eu vou fazer um doce de maçã, rapidinho! Eu já volto, pode voltar a dormir aí!
— Doce de maçã? — Assinto sorrindo. — A uma hora dessas? — Confirmo mais uma vez e o bebê se mexe na minha barriga dando o veredito. — Não pode esperar amanhecer? Temos o ultrassom para saber o sexo do bebê logo cedo, você não vai conseguir acordar!
Suspiro e troco o peso da perna, coloco a mão na lombar e respondo já me preparando pra sair.
— Não posso esperar! Acordei com muita vontade, minha boca está salivando só de imaginar! — Explico bocejando, estou com sono mas o desejo ganha. — Pode voltar a dormir, eu já venho.
— Tá. — Volta a se deitar e ainda escuto ele murmurar. — Nada de açúcar!
— Açúcar, sim! — Cochicho fechando a porta para evitar discussões e desço as escadas o mais rápido que a minha barriga e mobilidade deixa.
Acendo a luz da cozinha e coloco o celular na bancada, tiro o chinelo para sentir o gelado do piso e ando até o armário pegando a panela e tudo que preciso, quando escuto os passos na escada e então logo Christopher aparece na entrada.
— Você disse açúcar? — Pergunta desconfiado e sorrio sabendo que o cabelo esconde meu rosto enquanto termino de descascar a fruta. — Dália?! Sua médica já disse para você parar com essa mania, ter diabetes não vai ser bom.
— É só um pouquinho. — Respondo picando a maçã na panela em cima do fogão, agora ele já consegue ver meu rosto.
— Negativo!
— Vou por canela então! — Aponto a colher em sua direção e ele faz careta, não aguenta mais ouvir, ver e cheirar canela mas o que posso fazer? É muito bom!
— Esse bebê vai nascer com cheiro de canela! — Avisa se sentando em uma cadeira do outro lado e enchendo um copo de água.
— Que maravilha!
— Vou jogar essas canelas tudo fora! — Ameaça e solto uma risada enquanto mexo o conteúdo na panela.
— Com todo o trabalho que as pessoas tinham para adquirir essas especiarias antigamente. — Comento colocando o cabelo atrás das orelhas. — Chega a ser um desrespeito!!
— Dramática demais, senhor! — Resmunga e o escuto bocejando enquanto coloco o doce em um pote e caminho até ele. Chris afasta a cadeira e da espaço para eu me sentar em seu colo, era exatamente o que estava planejando! — Vou contar pra sua médica das suas escapadas noturnas para comer doce. Está avisada!
Reviro os olhos e levo a colher com doce para a boca, fecho os olhos e suspiro. Nossa! Tava com vontade demais, caramba!!
Escuto uma sirene de polícia passando na rua lá embaixo e abro os olhos, quando me vem uma questão em mente. Abaixo o pote na coxa e encaro Chris que alisa minhas costas.
— Christopher, esqueceu de me falar como foi o julgamento de Eduardo! — Aponto e ele franze a testa e o nariz mostrando sua irrelevância. — Eu esqueci totalmente!
— Esse era o intuito! Que você esquecesse mesmo! — Chris volta a alisar minhas costas e entorto a boca.
— Você sabe muito bem que não é fácil assim, Christopher! — Reclamo e ele me olha sério, sempre que entramos nesse assunto ultimamente acabamos discutindo. — Eu só esqueci por conta da gravidez e toda essa situação que me deixa aérea e ocupada!
— Meu, eu não entendo pra que você quer saber! Se estressar atoa! — Continua batendo na mesma tecla e respira fundo. — Por que ser tão teimosa?!
— Foi tão ruim assim? É isso? Por isso não quer falar sobre? — Questiono mexendo o nariz, ele suspira profundamente. — Se te incomoda tanto eu ligo para o Fernando e pergunto.
— Vai lá, liga!! — Ergue o braço e indica a bancada onde está meu celular. — A vontade! Ele não vai te atender, mesmo!
— Ué! Como assim? Por que não? — Pergunto e me lembro doce em minha mão, agora está morno e como mais uma colherada. — Como você sabe?
— Como, você, não sabe?! — Christopher debocha com as sombracelhas erguidas em desafio, tento não sorrir. — Não é você que vivia em contato com ele?
— Por puro interesse! — Respondo sem pensar e vejo Christopher se revoltar, a boca abre em surpresa e ele solta um ah indignado. — Não! Não assim! Queria ficar sabendo em primeira mão, caso a Alexa quisesse ver ou sei lá, pegar os meus filhos!
— Hunrum...! — Consigo ver a língua passando sobre os dentes e ele olha para a janela ao lado, me fazendo lembrar do assunto inicial, solto uma risada.
— Olha como você é safado!! — Exclamo revoltada, meu marido volta a me olhar. — Me enrolou, me enrolou! Desconversou total e agora tá fazendo drama! Me conta logo o que eu perguntei, Christopher!!
Christopher revira os olhos e apoia as mãos em meu corpo, uma em minha cintura e outra em minha coxa, ergo o pote e como mais do meu doce.
— O Eduardo foi condenado na primeira audiência, porque ele assumiu todos os crimes e disse que não se arrepende! — Exclama de uma só vez, arregalo os olhos, não esperava por isso. — Eduardo disse que, não mudaria nenhuma de suas escolhas, porque era isso que o definia, que se todos viam o seu esforço e busca por reciprocidade como crime, muito que bem! Então ele era sim, um criminoso!!
— Mas... — Engulo em seco, Chris assente entendendo minha confusão. — Ele, tipo, não negou ou se defendeu nenhuma vez?
— Não. — Nega com um aceno e suspira. — Já te disse foi surreal, a forma como ele descrevia cada ato, como defendia e justificada cada mínima coisa.
— E o Fernando?
— Tava lá, também. — Explica e passa os dedos na pele exposta da minha cintura. — Quando foi depor, deve ter sido difícil. O Eduardo o encarava impassível, sério o tempo todo como se estivesse negociando um lote importante. A pose fria encarando o irmão foi agoniante até pra quem estava de espectador.
— E a Alexa?
— Não foi e nem declarou nada, é como se pra justiça ele continuasse morta. — Chris explica e aceno entendendo, preferiram manter a história da morte que até hoje eu nunca entendi e nunca vou entender mas que deve ser uma confusão. — Fernando não informou e Eduardo muito menos. Mas o Fernando citou outros crimes hediondos contra a Alexa, que foram comprovados e adicionaram mais uns anos para a pena dele.
— Que barra...! — Sussurro sentindo que embaixo da relação desses três tem muita coisa que nunca vou saber. Christopher pode ter descoberto algo no julgamento mas não vai me contar. Termino de comer meu doce e coloco a tigela na mesa. — E como você sabe que o Fernando não vai me atender? — Questiono ao lembrar desse ponto que ele me enrolou.
Chris revira os olhos com um bico contrariado.
— Quando o julgamento acabou, estava saindo do tribunal e ele me alcançou e pediu desculpa por tudo. — Arregalo os olhos surpresa, ele assente mostrando que teve a mesma reação. — Avisou que estava indo embora com Alexa e que iriam recomeçar na Escócia. Desativar e cancelar tudo que envolvesse o Brasil para começar tudo de novo, ou seja, não querem ser encontrados!!
— Entendi... — Sussurro pegando sua mão e começo a girar a aliança em seu dedo. — Então, sem chances da Alexa aparecer e levar as crianças?
Resolvo colocar a postos meu maior medo e Chris franze as sobrancelhas, o encaro séria querendo minha resposta.
— Ela não tinha muitas chances de qualquer forma, amor. — Explica tentando me acalmar com um carinho nas costas com a mão quente entrando por baixo do meu pijama.
— Ela é a mãe biológica, no final das contas! — Retruco e ergo sua mão até o rosto, dou um beijo leve em sua palma. — Tem seus direitos.
— Você é a mãe adotiva por dez anos, foi com você que as crianças cresceram e se adaptaram. — Christopher continua e sobe a mão de minha coxa até o queixo me fazendo o encarar. — O juiz dá preferência para onde a criança é bem tratada, feliz e amada. A Alexa não teve nenhum contato com os gêmeos e agora ela largou de mão de vez!
— É né?
— É! — Concorda e sorri lindamente, me dá um selinho rápido e se levanta comigo nos braços, passo os braços por seu pescoço. — Vamos voltar pra cama, professora.
— Não sou mais professora, sabe? — Resolvo perturbar mesmo que esteja com sono e a cabeça apoiada na curva de seu pescoço.
— Vai ser sempre a minha professora, Lia! — Escuto ele responder mas estou cansada demais para dar uma resposta, então só suspiro sonolenta e volto para o mundo dos sonhos.
ßāßā
Acordo ainda me acostumando com a claridade e o sons a minha volta. Sinto uma mão apoiar em meu ventre protuberante e o bebê chutar o local indicado. Sorrio ainda de olhos fechados e escuto Chris falar.
— Parece que estamos com sorte hoje! — Resolvo nem responder, ainda estou com sono demais para raciocinar. A vontade é de falar que ele diz isso sempre e que a bebê não quer que saibamos o seu sexo, mas prefiro o silêncio então ele continua. — Ela está super agitada hoje, olha... — Meu marido se inclina e cola o ouvido em minha barriga, sinto sua bochecha em minha pele.
A verdade é que desde que confirmei minha gravidez há cinco meses, sempre tratei o bebê como ela e contagiei todo mundo! Todos acham que é uma menina e por isso a empolgação e ansiedade para saber o sexo, querem apenas confirmar o que já sabem!!
Chris ainda fica uns bons minutos conversando com a filha enquanto cou despertando e então, uma hora depois estamos descendo a escada. A longa e perigosa escada que comecei a desgostar, porém que ontem no auge da minha agitação e empolgação eu nem tive tanto trabalho para descer como estou tendo agora!
O que um desejo ardente não faz com uma pessoa!!
Paro no pé da escada e apoio no braço de Chris recuperando o fôlego e já escuto as risadas altas vindo da cozinha. Chris coloca as bolsas no sofá e seguimos até o próximo cômodo, assim que entramos vemos Julia se dobrando em sua gargalhada e Vinicius emburrado tomando seu leite.
— Bom dia, meus amores! — Exclamo sorrindo, indo até a mesma mesa de ontem e sentando ao lado de Vinicius.
— Bom dia, crianças! — Chris clama beijando a testa dos dois e depois vai para a geladeira.
— Bom dia! — Os dois respondem juntos e amo demais isso!!
— Está rindo do quê, filhota?
— Estávamos comentando das fantasias que vamos usar na festa da escola. — Vinicius começa mexendo seu leite mais uma vez com uma colher.
— Eu disse que vou vestida de dançarina louca! — Continua Julia na animação de sempre. — Aí, o Viih disse que vai se fantasiar de Coringa! E eu contei pra ele, que a fantasia da Milli, é da Alerquina! — Julia termina e meu Deus! Parece até que eles treinam para se alto completarem.
— Mas vocês sabem que o Coringa e Alerquina são um casal, né? — Christopher explica sentando ao lado de Julia com seu café preto e me entrega minha tigela de salada de frutas. — Mesmo que seja um casal problemático, mas são.
— Obrigada, Chris. — Pego uma colher em cima da mesa e misturo as frutas. — Agora eu entendi porque o Vinicius está com esse bico de pato.
— Isso mesmo, mãe! Não faz sentido! — Vinicius resmunga rasgando um pedaço de pão do seu prato e olhando pra Christopher continua indignado. — Não vai ser engraçado os alunos ficarem falando, que nós somos um casal!! — Resmunga e coloca o pão n boca, sorrio e como uma colherada.
— Super combina, não é?! — Juli volta a pular empolgada na cadeira e bate palmas sorrindo. — Os dois só precisam aceitar, que o futuro deles já está escrito! — Julia cantarola bebericando seu suco.
— Futuro!? Até parece, Julia! — Vinicius desdenha rindo ainda emburrado. — Não enche!
— Vamos parar os dois, não comecem logo cedo, hein?! — Reclamo parando as intrigas antes que piore.
Observo Chris cortar um pedaço de bolo de laranja da padaria e colocar um pedaço para Julia que sempre se empolga no falatório e esquece de comer. Depois pega uma maçã e coloca na frente de Vinicius, provavelmente para levar pra escola.
— Vamos terminar de comer, que está todo mundo atrasado! — Chris murmura e enrola uma fatia de mortadela mordendo e mastigando em seguida.
— É hoje né, mãe? Queria ir junto, mas tenho prova! — Julia para de comer mais uma vez e se estica para beijar minha barriga. — Bom dia, irmã!! — A bebê chuta com força onde Julia está que sorri realizada e me encara.
— Ela está tão animada como a gente! — Comento e arrumo sua franja e rabo de cavalo. — Está linda, filha.
— Obrigada, mãezinha!
— Então parece que hoje a nossa bebê está feliz! — Vinicius anuncia massageando também a minha barriga, se ergue dá um beijo e puxa a mochila, Julia faz o mesmo.
— Sim. — Sorrio e beijo seu rosto enquanto Julia se despede de Chistopher, e depois trocamos. — Boa aula! Boa prova! E se cuidem!
Os dois concordam e saem da cozinha rindo e implicando um com outro como sempre. Pela hora, Jaqueline já está lá embaixo os esperando. Normalmente é Christopher que leva os três pra escola, mas hoje temos o exame para enfim, confirmar o tão esperado e desejado sexo do bebê!
Olho para Chris e sorrimos um para o outro, mais uma etapa para vencermos juntos!!
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