CAPÍTULO 39
Christopher Gutiérrez
Após deixar Alexa para trás, sigo para os fundos da casa, o mato cobre boa parte do terreno e mesmo que eu saiba que a casa não estava sendo habitada, só de olhar já se percebe o descaso e o estado precário desse lugar!
Dou a volta na casa entre o mato, procurando uma entrada e durante a busca consigo ouvir os ânimos alterados lá dentro, até que acho uma janela aberta para dentro do que parece um quarto. Por ela ser grande, uso da força de meu braço bom para pular, mas ao passar tentando ser silencioso e rápido, bato meu braço baleado!
Cravo as unhas em meu antebraço e fecho os olhos contendo a vontade de gritar.
"Que inferno!"
Volto a mim quando a dor no braço diminui e caminho até a porta, pegando a arma no cós da calça. Aperto a maçaneta para abrir e puxo devagar, coloco a cabeça para fora e olho para os dois lados, como não vejo ninguém saio silenciosamente. Ando para o lado oposto as vozes e me deparo com uma cozinha.
Um tamanho médio, combina com o estilo rústico e acabado da casa mas é toda completa e com uma reforma ficaria um local até que confortável! Vejo que as janelas estavam trancadas por isso não consegui entrar por elas.
Volto pelo corredor de onde vim e abro uma segunda porta, avisto um banheiro muito fedido por sinal e encosto a porta para não fazer barulho. Ando pelo corredor e após abrir mais uma porta e não encontrar nada além de minúsculo quarto, resolvo abrir a última e mais complicada por ficar ao lado da sala.
Ando bem tácito pelo corredor e quando estou passando pela abertura da sala, vejo o estúpido do Eduardo andar até Dália enquanto grita com Fernando e a pegar pelos cabelos. Fecho a mão e me seguro para não ir interferir, esse era o meu medo, ela cair nas mãos dele desse jeito!
Resolvo seguir em frente para que a gente saia desse lugar o mais rápido possível! Acabar logo com esse martírio!
Assim que paro de frente a porta, já sei que Vinicius está aqui, o trinco trancando pelo lado de fora denúncia facilmente. Abro, empurro a porta e entro, vejo logo de cara ele tentar abrir a janela.
— Não adianta! Tem trava em todas as janelas daqui! — Sussurro para ele que pula de susto e assim que me reconhece corre em minha direção e me abraça pela cintura, sorrio. — Oi garotão, também estava com saudades!!
— Cadê a minha mãe? — Sussurra de volta e sei que está com medo.
— Conversamos depois, esse não é o melhor momento! — Saímos do quarto no exato momento em que Dália ofega com dor, seus olhos derramam lágrimas e sinto raiva e preocupação ao vê-la sendo enforcada e segurada pelos cabelos por aquele estrupicio!
Dália ergue as mãos para atacar tentando se soltar e então Eduardo saca a arma e posiciona bem no meio de sua testa! Um arrepio toma conta de todo meu corpo, um medo me assola, como se fosse pressentimento de algo péssimo estivesse preste a acontecer! Balanço a cabeça evitando esses pensamentos.
Vejo minha Lia arregalar os olhos com medo e no momento que Vinicius puxa a mão e corre, eu lembro que não era só eu que assistia essa cena mas o Vinicius também!
— Larga a minha mãe! — Grita e em seguida chuta a canela de Eduardo, depois pega impulso e pula em suas costas, os dentes cravam na orelha de Eduardo e ele larga Dália para se livrar do menino que continua gritando o quanto ele é ruim e nada legal.
Sinto meu coração acelerar e escuto os batimentos nos ouvidos, quando ele segura Vinicius pelos braços e o chacoalha. Começo a ir até eles enquanto grito junto com todos:
— Vinicius!
Eduardo não dá a menor importância com nosso chamado, mas então vejo ele ficar pálido e os olhos transmitirem pânico quando a voz ressoa por toda a sala feito eco!
— Eduardo!! Não faça isso!!! — Alexa grita parada no batente da porta e por isso, Eduardo larga Vinicius que se joga automaticamente para os braços de sua mãe que o abraça saudosa, sorrio e relaxo até ver que o estado de Eduardo é de puro descontrole.
— Alexa...! — Eduardo sussurra em pânico. — Você está MORTA! — Grita perdendo ainda mais o juízo e atirando ruiva parada na porta.
Tudo aconteceu muito rápido, vejo Fernando ficar sem ação por meros segundos e então o ódio e amargura toma conta de seu corpo, ele se livra de Mateus e corre até Eduardo, soca o irmão duas vezes e volta para a noiva baleada no chão e grita diversas, não, seu desespero é tanto que nunca imaginaria que nos próximos segundos eu é que sentiria essa mesma dor!
Aproveito que estão todos sobre a nuvem escura de suas dores e ando até Vinicius e Dália que sorri lindamente pra mim, sorrio de volta; contudo, antes mesmo de dar cinco passos, Eduardo se enfeza e na velocidade da luz se vira na direção dos dois ainda no chão. Mira em Vinicius, sem nem ao menos estar enxergando e aperta o gatilho!
Vejo Dália arregalar os olhos, abraçar Vinicius ainda mais apertado e se virar para ser baleada no lugar do menino. Paro no lugar, sua cabeça se vira pra mim, o grito perdido na boca aberta, os olhos arregalados de dor e culpa e as lágrimas transbordarem. Ela me pede desculpa ali, em meio a dor, medo e sangue, sinto minha vida ruir assim como minha racionalidade.
— Mamãe!?! — Vinicius grita em pânico e segura o rosto de Dália que pende para o lado perdendo os sentidos.
— Dália!! Não! — Grito correndo em sua direção. O corpo perde as forças e ainda que Vinicius esteja em suas pernas, os braços caídos ao redor do filho e a cabeça amparada pelo mesmo, seu corpo despenca no chão e perco tudo vendo a mancha de sangue aumentar em sua barriga! — Desgraçado!! — Eduardo gargalha me encarando e com toda a minha raiva, ergo o braço e aperto o gatilho da pistola prateada, a bala acerta em cheio seu ombro direito.
Seu sorriso congela e escutamos outro disparo, olho para o lado vendo Mateus traíra picareta, cair ao ser atingido no joelho por Fernando, que se vira ainda irado e atira sem pestanejar na perna de seu irmão, Eduardo cai no chão gritando e tenta atirar em Fernando com a outra mão, ergo o braço e atiro de novo, bem em sua mão e ele grita ainda mais! E agora, mesmo que eu queira sorrir por vê-lo sofrer um pouco do que já provocou nos outros, minha maior preocupação é Dália!
Corro na direção dos dois, chutando Eduardo para o lado e me agacho ao lado dos corpos. Vinicius ainda está sobre as pernas de Dália, a cabeça apoiada em seu quadril ao ponto que aperta as mãos sobre os ouvidos!
— Calma, Vinicius! — Tento em vão acalmar o menino que acena negativamente várias vezes. — Vai ficar tudo bem! Foi só um susto, a mamãe não vai morrer! — Aperto seu ombro para ele se afastar enquanto falo tudo o que meu coração sente, que ela vai ficar bem! Ela precisa ficar bem! Dália não pode morrer! E com isso ele se levanta, seca o rosto molhado mesmo que ainda esteja chorando e senta devagar no sofá ao lado.
Pego Dália no colo e me ergo para pedir o carro de Fernando emprestado, precisamos nos apoiar justamente agora que ambos estamos perdendo! Amparo o corpo pequeno e frágil de minha esposa entre os braços e começo a me mexer quando escuto as sirenes de polícia e ambulância chegando.
— É muita lerdeza mesmo!! — Resmungo vendo os policiais invadirem a casa pela porta que Alexa não está mais!
— O que aconteceu aqui? — Ferreira pergunta nitidamente confuso e revoltado.
— Se você tivesse chegado antes, saberia! — Fernando exclama segurando Alexa desacordada nos braços. Os paramédicos passam pela porta e ele posiciona a noiva na maca.
Tento passar com Dália por Ferreira e então ele segura meu braço, a contra gosto eu me viro e o encaro, por sua expressão ele está com raiva e quer explicações mas como ele pode muito bem ver, não é o momento!
Puxo meu braço de volta e sigo para fora da casa, encontro os paramédicos no meio do caminho enquanto mais policiais vão passando por nós e correndo para o local de diversos crimes!
Quando Dália é tirada de meus braços e deitada na maca, seguro a respiração vendo como ela está pálida, parece quase sem vida e isso me assusta, os lábios partidos e também sem cores não me sorriem e eu não sei o que pensar!
Olho em volta e vejo os carros de polícia parados por toda parte, e três ambulâncias no espaço aberto em frente a casa, solto um suspiro e giro rapidamente nos calcanhares, passo pelos policiais ao entrar de novo na casa e desviando de todo mundo eu chego até Vinicius, encolhido, com as mãos nos ouvidos e olhos bem fechados! Estico os braços e o acolho entre eles, ele me olha assustado e depois relaxa ao me reconhecer, encaixo sua cabeça em meu pescoço para ele não ver ainda mais o caos ao nosso redor.
Corro para o lado de fora sem olhar pra trás! Hoje de manhã estávamos em São Paulo nos preparando para vir resgatar Vinicius mas tudo saiu dos trilhos!
Minha esposa foi baleada juntamente com Alexa! As mães das crianças correndo risco de vida e eu não consigo pensar adiante! Meu emocional e subconsciente não quer imaginar possibilidades! Eu me bloqueie para não pensar no pior e é o melhor que posso fazer por hora!
Vejo os paramédicos entrarem em uma das ambulâncias com Dália e corro até lá, vou com ela e Vinicius! Todos juntos para não acontecer mais nada!
Chega de tragédias!
ßāßā
Aperto os braços na cintura de Vinicius, estamos sentados na enfermaria do hospital, na ala de medicamentos pois Vinicius teve que ser medicado!
O cateter preso ao seu braço só indica o começo do segundo longo soro que ele está tomando na veia, ele dormiu no final do soro anterior e mesmo que agora não tenhamos escolha e estejamos em um momento caótico e bem crítico, fico feliz que Vinicius confie em mim.
Sei de tudo que ele passou nos anos que viveu com Eduardo e como ele precisava e ainda precisa de amor e carinho, que precisa ser criança, adolescente e viver sua vida sem preocupação mas é o Vinicius e ele é desconfiado com tudo e todos, então estar aqui agora é uma conquista!
Ergo os olhos pela enfermaria e vejo Fernando encolhido em uma cadeira reclinável também tomando soro, mas não por ferimento externo e físico, é porque quando chegamos aqui no hospital para onde Dália e Alexa foram transferidas e estão sendo atendidas a mais de três horas! O Fernando ficou muito agitado, ele está ferido emocionalmente! Ver ele transtornado e externamente preocupado com Alexa me indica que ele realmente ama aquela mulher e seja lá qual for a sua história com ela, é verdadeiro!
Assim que a ambulância estacionou eu liguei lá pra casa, precisei avisar mesmo que todos fiquem assustados e preocupados. Quando avisei Mónica que estávamos no hospital, não disse tudo que tinha acontecido, só disse para ela vir pra cá, porque apesar de tudo ela é mãe e vó, pode ficar com Vinicius enquanto resolvo as coisas jurídicas.
Respiro fundo e arrumo Vinicius no colo, tanto ele como Fernando foram dopados para dormirem e não se preocuparem ainda mais!
Pensar que passamos dez anos nos preocupando e nos cuidando para que algo assim acontecesse e no fim, o destino foi inevitável! Sequestro, choros, dores, agonia, raiva, angústia e a cada minuto sentado nesse lugar sem cor, silencioso e sem notícia, minha mente fica mais bagunçada e pirada!
Não consigo me sentir em paz, a cada instante ou quando passam pela porta branca dupla no final da sala, eu torço para ser o médico me avisando que Dália está muito bem, que eu vou poder ver os olhos brilhantes novamente! Ou o sorriso debochado tão quente e carismático! Talvez sentir as mãos delicadas e decididas me acariciando... Mas tenho medo! Medo de que quando o médico passar pela porta, seja para me dar uma notícia ruim e eu não vou aguentar! Não sei onde vou arranjar forças pra continuar! Na minha cabeça é impossível eu me reerguer!
Penso em Eduardo e não tem como a angústia não mudar para desprezo! A culpa é toda dele e começo a pensar que vou precisar ser dopado assim como esses dois! Não sei se vou conseguir me segurar caso o médico me dê uma notícia ruim, porque consigo me visualizar claramente sendo preso depois de matar Eduardo dentro daquela delegacia!
Respiro fundo acalmando meu coração, preciso ser forte pelos meus filhos! Julia está em casa, pedi para não contarem o que aconteceu e para ela ficar por lá mas eu conheço a minha garotinha! Ela é tão esperta e ágil como Vinicius, só que não quero que Julia ligue os pontos! Não quero que ela chore e se desespere, não consigo lidar com mais uma pessoa que amo sendo levada para o hospital, por isso prefiro ela lá, sorrindo e pulando, amando todos igualmente!
— Christopher, querido! — Uma voz feminina me gritando me tira da escuridão de minha mente, ergo a cabeça na direção da voz e vejo Mónica, Rogério e meu pai. Imediatamente sinto um alívio, meu pai também é advogado e ele é criminalista nada melhor! Confio fielmente nele nesse momento turbulento que não consigo nem mesmo me defender! — Graças à Deus, você está bem!
Eles se aproximam da cadeira, meu pai me observa com olhos atentos, verificando se estou bem e aceno para despreocupá-lo, ele aperta meu ombro. Mónica se abaixa ao lado da cadeira e encara o rosto de Vinicius dormindo em meu colo, o rostinho com marcas roxa de dedos conta uma história, os braços parcialmente descobertos também com marcas de dedos só aprofundam a história!
Ela afasta minha blusa do corpo de Vinicius e me encara pedindo explicação com os olhos emocionados, respiro fundo, devo estar tão desleixado que assustaria qualquer um! Rogério me encara parado à minha frente e sei que devo estar com os cabelos apontando pra todo lado, sangue de Dália por toda a minha roupa, olhos inchados por desespero e choro silencioso, totalmente acabado!!
— Vinicius não estava com blusa de frio, então só dei a minha pra ele! Não tive tempo e nem cabeça pra sair daqui e tentar comprar algo. — Conto e vejo ela acenar entendendo. Meu pai senta na cadeira ao meu lado, também ouvindo minha explicação. — Tiveram que medicá-lo e o por pra dormir, Vinicius estava fraco e muito agitado! Ele presenciou tudo, no fim contas! — Olho para meu pai e pergunto com o coração na mão. — E Julia?
— Ficou com sua mãe e Daniel! — Explica e continuo sério, quero saber se ela está bem. — Ela não fez perguntas, se é o que quer saber.
— Ela só nos fez prometer voltar logo com o irmão dela. — Mónica dá continuação a explicação de meu pai, aceno entendendo bem como Julia é e fico aliviado que ela não se desesperou. Minha sogra aperta firme minha mão e a encaro, vejo as lágrimas descerem por seu rosto conservado. — O que aconteceu, Christopher? Com a minha filha!?!
Rogério se abaixa e abraça os ombros da esposa, sua voz é sossegada pedindo calma à mulher e então eu arregalo os olhos quando ela se enfurece, empurra Rogério e se ergue ainda chorando e revoltada.
— Calma?! — Ela soluça e aponta o dedo em seu peito, ele continua frio, parado a encarando. — Você percebe o que me pede? Entende a situação em que estamos? — Grita sem paciência, vejo as mesmas enfermeiras que doparam Fernando erguerem a cabeça para nós. — Calma!? Como que, calma? — Mônica exclama parecendo sentir repulsa pela palavra. — É a nossa filha! Nossa Dália! Para com esse orgulho estúpido imediatamente! Seja pai uma vez na vida!
— Caralho... — Meu pai murmura ao meu lado, aceno, estou chocado ma mesma proporção. Mónica nunca falou assim com o Rogério desde que os conheço!
— É... — Começo depois que a tensão parece que não vai sumir, os ânimos a flor da pele!
— Eu vou ir indo para a delegacia! Vou resolvendo as coisas por lá! — Meu pai exclama se levantando e só tenho a agradecer, no momento não tenho cabeça pra isso.
— Qualquer coisa, me liga. — Peço e ele assente.
— Você também! Qualquer novidade a gente vê!
Quando meu pai começa a se afastar, indo em direção a porta, meu sogro o chama e então todo mundo o encara, ele olha para Mónica já sentada ao meu lado e murmura.
— Eu vou ir com ele. Para ajudar caso precise! — Fala e então sai andando sem esperar resposta.
— Como é teimoso! — Mónica murmura com a voz embargada. — Não sei como não vê que nossos filhos puxaram isso dele!
No momento não estou afim de debater o quanto o meu sogro pode ser estúpido e cabeça dura em relação aos filhos e como ele consegue ser incoerente com suas ações a cada minuto! Por isso, cruzo a perna, apoiando o tornozelo no joelho e ajeitando Vinicius nos braços, respiro profundamente e me preparo para relatar o terror que vivenciei.
— Dália pulou na frente da bala que estava direcionada para Vinicius! — Conto fechando os olhos com força, vejo a cena se repetir diversas vezes e eu não fiz nada para impedir!
— Como assim? Por quê?! — Pergunta num soluço tremido.
— Eduardo atirou para acertar o Vinicius. — Digo entredentes, me seguro para não apertar o menino. — Mas Dália entrou na frente e foi baleada! Bem na barriga! E tinha tanto sangue...
Paro de falar em agonia quando vejo Mónica congelar. Os olhos apavorados e aterrorizados fogem para todo lado, menos pra mim e então começa a chorar, soluça como se sentisse dor. A encaro sem entender.
Meio confuso, solto uma das mãos de Vinicius e massageio seu joelho tentando passar conforto mesmo que eu não tenha conforto, e sabendo que só vou voltar a ter paz quando Dália estiver entre nós!
— Christopher...? — Chama de repente, seus olhos cheio de dor me encarando, sinto medo com esse olhar. — Eu acho... Não! Quer dizer... Eu tenho certeza que a Dália está...
A porta se abre e um homem vestido completamente de branco adentra a enfermaria olhando para todas as direções, olha de novo para as folhas em mãos e então lê em voz alta:
— Família de Dália Menezes? — Ele interrompe Mónica, mesmo que eu já não esteja ouvindo tem uns segundos.
Eu não posso levantar, já que estou com Vinicius, mas Mónica salta do meu lado e acena chamando o médico até nós.
— Aqui! — Quando o médico se aproxima, ela explica apontando. — Sou a mãe e ele o marido.
De onde estou consigo ler o crachá identificando o homem, Guilherme Pereira, ele acena e se pronuncia com uma voz equilibrada.
— A paciente foi baleada na região do abdômen. — Explica e olha para Mónica. — A bala ficou alojada entre o rim direito e o pâncreas, causando uma hemorragia torácica e afetando levemente o feto, por fazer pressão ao útero e então, tivemos que retirar uma parcela do pâncreas! — Ele agora abaixa o olhar e me encara. Estou perdido, quase posso afirmar que o ouvi falar de um feto. — A cirurgia foi longa, meticulosa e de risco para ambos, pois ela teve uma parada cardiorrespiratória decorrida de um choque hipovolêmico!
— Choque hipovolêmico? O que é isso? — Mônica questiona ainda abalada.
— É o que acontece quando perde muito sangue e líquidos. — Explica e após ler rapidamente alguma coisa, abaixa o papel e nos encara. — Mas agora está tudo bem, com ela e a criança!
— Aí senhor! Muito, muito obrigada! — Mônica recita seu mantra e depois me olha sorrindo entre lágrimas. — Eu sabia! Vou ganhar outro netinho!
Enquanto Mónica festeja, feliz da vida. A consciência me toma, e eu entendo o que o médico disse, Dália está grávida e para o meu desespero eu quase perdi os dois de uma só vez! Estremeço com a ideia e o encaro.
— Mas, doutor...? — Chamo para ter certeza, ele me analisa sucinto. — Bebê? Quanto tempo? — O médico me olha confuso por eu estar tão surpreso com a notícia e após conferir na ficha, ele explica.
— A paciente está em uma gestação de, 30 dias! Ou para ser mais preciso, quatro semanas e dois dias. — Relata atento e nos encara com as sobrancelhas erguidas. — Esse feto ainda estar vivo é surpreendente, pois como já havia dito, o risco da pressão no útero quase causou um aborto, pela gestação ser de poucas semanas. — Doutor Pereira explica e continua sua observação. — Não sou especialista nessa área, mas vocês precisam procurar um obstetra, pois tenho quase certeza que agora a gestação será um pouco complicada ou até mesmo de risco!
— Então ainda tem chance dela perder o bebê? — Mónica pergunta preocupada e estou na mesma.
— Sim senhora, e por isso e para não lesionar ainda mais o ferimento, a paciente está sedada! — O médico move as mãos em círculos na frente do abdômen. — Isso também ajudará a cicatrizar um pouco, o corpo está trabalhando na cura sem outras preocupações!
— Meu Deus! — Murmuro completamente chocado, queria poder levantar, estou precisando de ar puro.
O médico se despede, diz que qualquer podemos chamá-lo e me ergo, coloco Vinicius confortavelmente na onde eu estava sentado e o cubro com minha blusa. Me espreguiço para esticar as articulações travadas pelo tempo parado no mesmo lugar enquanto penso.
Estou feliz, realmente feliz! Mas estou tão preocupado e até decepcionado, porque agora todo o nervoso e medo que Dália estava sentindo, junto com os enjoos e desejos estranhos fazem todo sentido! E saber que Dália sabia e mesmo assim se colocou em risco é o que me decepciona, não é do seu feitio fazer algo assim. Se colocar em risco sabendo que vai afetar outra no caminho, não é algo que a minha Dália faça! Ela faz merda e se põe em perigo por conta própria!
— Nem pense em culpar Dália, por alguma coisa! — Mónica me recrimina apontando o dedo pra mim e ergo as sobrancelhas surpreso por ela saber. — Ela não sabia que estava grávida! Eu que desconfiava e plantei a semente da dúvida nela, quando ela acordar já vai se culpar o suficiente! Não faça nada estúpido! Sei que você a conhece e tudo o que ela pensava era em salvar o filho! — Minha sogra desata a falar os motivos e relaxo os ombros, confio na sua percepção e relevo sua observação. — Você não é mãe, não sabe como é desesperador perder um filho e...
— Mónica! — Interrompo e ela me encara puxando o ar. — Realmente mão sou mãe. — Sorrio oara tranquilizá-la e pego sua mão, beijando o dorço. — Só que eu sou pai e me preocupo tanto quanto! São dores parecidas e ao mesmo tempo distintas! — Relato e ela pisca aliviada. — Eu tenho que ficar chateado e com raiva porque agora já passou! Mas só eu sei como me sentiria caso eu os perdesse! Nunca me perdoaria! E seja Julia, Vinicius, Dália ou o nosso bebê, me importo e me preocupo com todos, pois são a minha família!
Mónica seca as lágrimas e sorri, um sorriso carinhoso e orgulhoso. Ela dá um passo e me abraça.
— Fico feliz que vocês se casaram! Um cuida do outro como merecem! — Ela comenta e sorrio emocionado.
— Por que estão chorando? — Escuto a voz do meu sogro atrás de mim e me afasto de Mónica.
— Se você estivesse aqui saberia, Rogério Menezes!! — Mónica responde amargurada o encarando. Eles ficam em batalha de olhares até que Rogério desvia o olhar primeiro com um longo suspiro.
— Me desculpe, querida! — Começa e anda até a esposa. — Sei que extrapolei!
— Sim! Extrapolou como sempre! Só que dessa vez foi demais, Rogério!
— Me deixa terminar, mulher! — Rogério puxa Mónica pela mão até as cadeiras, e se senta. Respira fundo parecendo pedir calma e coragem e então me encara. — Desculpa por ter agido daquela maneira ridícula com vocês, ontem lá em São Paulo! — Sua fala me faz entender que já passam da meia noite e que ontem foi um longo e crítico dia! Aceno meio sem ânimo, Rogério é assim a muito tempo e não vai mudar! — E me perdoe por ter sido um ogro, querida?
Mónica assente e parece tão crédula quando eu. Resolvo por fim me abrir, não faço muito isso para não criar inimizade, mas as vezes é necessário!
— Você tem que pedir desculpas principalmente à sua filha, Rogério! — Exclamo cruzando os braços sobre o peito.
— Sei disso! — Me observa com olhos afiados e nem me importo. — Quero a minha filha respondona, mandona e teimosa de volta e com saúde!
— E você vai ter! — Exclamo, Mónica sorri e completa.
— Dália e o bebê estão fora de perigo! — Exclama empolgada e se levanta animada. — Não é um máximo!?!
Aceno emocionado, não vejo a hora de ter mais uma criança correndo pela casa! Saio de meus pensamentos com a explosão repentina de Rogério.
— O quê?! — Ele grita e estou vendo a hora que as enfermeiras vão nos expulsar daqui sobre ameaça de injeção! Pisco confuso quando Rogério parte pra cima de mim, me segurando pela gola da camisa. — Você deixou minha filha se colocar em perigo sabendo que ela estava grávida!?!
Abro a boca para negar e tripudiar em cima dessa cena e máscara de pai preocupado que ele está fazendo, quando me desequilibro com o seu punho me atingindo em cheio!
— Rogério!! — Escuto Mónica chamar agoniada com as mãos na boca.
Olho surpreso para cima e massageio meu maxilar dolorido.
"Além de cínico, é caduco!"
— Não se preocupe querida! — Rogério sorri e encara Mónica. — Ele estava merecendo e isso não vai desmontá-lo!
— Você é completamente desequilibrado! — Sibilo entredentes me segurando para não xingá-lo.
— Rogério! — Mónica adverte. — O Christopher também não sabia!
— Não importa! — Ele continua ainda sorrindo. — Estou muito satisfeito! Queria ter feito isso quando soube do casamento!
Abro um sorriso sarcástico, cheio de malícia e respondo o encarando.
— Isso mesmo, o casamento! — Passo a língua sobre os lábios e volto a abrir um sorriso satisfeito. — Aquele que agora está comprovado que está mais do que consumado! — Vejo pelo canto do olho, uma enfermeira se aproximar. — Somos marido e esposa! Sogrinho! — Cantarolo a última palavra e ele pensa em avançar mas a enfermeira chega.
— Licença. — Ela olha para os meus sogros, um me olhando com ódio e a outra com preocupação. — Vou pedir que se retirem, estão tumultuando a enfermaria e agitando os pacientes. Somente o acompanhante do menor pode ficar!
Sorrio vitorioso para meu sogro e ele sai faltando bater os pés, sento ao lado de Vinicius e antes de Mónica sair, peço que ela vá comer algo e depois volte para acompanhar Vinicius pois tenho que resolver a papelada. Ela acena e sai pedindo desculpa por seu marido.
Espero ela sair e sorrio para a enfermeira que me olha insatisfeita e anda de volta para seu posto. Volto meu olhar para Fernando e ele já está acordado, conversando com uma enfermeira.
Por fim, direciono minha atenção para Vinicius e seu soro quase no fim, respiro aliviado e sorrio. Não vejo a hora de ver a minha Dália. De ver Vinicius e Julia se implicando novamente e observar as reações quando contar que vão ter um irmão ou uma irmã, pois a nossa família está crescendo!
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