CAPÍTULO 19

Dália Menezes


Franzo a testa, termino de descer a escada e paro em frente a Fernando.

— O que está fazendo aqui, Fernando? — Pergunto preocupada. — Nós íamos para Cancún amanhã e…

— Precisei adiar nossa estadia na praia, para conversarmos. — Ele comenta e troca o peso das pernas, aponto a sala para irmos até lá. — O certo seria um lugar privado, o assunto é delicado.

— É aqui, na sala ou lá na rua. Meu quarto está ocupado. — Aviso já nervosa, odeio essa enrolação, minha barriga dói de nervoso.

— Beleza, então. — Fernando se vira e caminha até o sofá, sento de frente pra ele, na mesinha de madeira no centro. — Lembra que eu te disse que a ex de Eduardo deu luz à um casal de gêmeos?

— Julia e Vinicius. — Comento e ele acena. — É claro que lembro, foi a única coisa que você me disse, Fernando! — Faço questão de deixar explícito a minha crítica e ele revira os olhos.

— Enfim, não era a minha intenção te contar isso, muito menos agora. — Ele esclarece verdadeiro como sempre.

— Está fazendo o que aqui, então? — Explodo, é uma patifaria sem limites, é o cúmulo que ele me conte as coisas em picadinho e eu precise me arriscar pra conseguir minhas respostas.

— A Alexa e o Eduardo brigaram feio e ela pediu o divórcio, ele não quis conversar, então assim que amanheceu, ela pegou os filhos e se mandou. — Fernando explica sério e eu prefiro ficar quieta só ouvindo pois o momento da revelação enfim chegou. — Só que o Eduardo percebeu e foi atrás, ele me disse que pegou a serra seguindo o gps do celular dela e à um certo momento o carro dela não se moveu e quando ele chegou perto, o carro tinha batido e capotou na pista.

— Ainda bem que ele chegou. — Murmuro inconscientemente, Fernando nega parecendo agora, desolado.

— Eduardo só salvou as crianças! — Fernando exclama parecendo ter um nó em sua garganta, o proibindo de falar. — Aquele louco deixou Alexa pra morrer!

— O quê? — Engulo em seco, ele deixou a esposa dele morrer ali, sem ter nenhuma piedade ou remorso, sinto um sufoco e tento me acalmar. — Como assim, Fernando? Isso nem de longe é uma ação humana!

— Tudo o que ele me disse foi que não tinha nem corpo pra salvar.

— Não faz sentido algum! — Exclamo bagunçando meu cabelo recém penteado. — Fernando? E se, o Eduardo sumiu com o corpo? — Pergunto sentindo um medo extremo tomar conta do meu corpo.

— Pois é, não sei! — Fernando nega e segura seus cabelos em agonia. — E aconteceu que depois do acidente, Eduardo como pai biológico ficou com a guarda e ninguém depôs contra, eu não tinha provas para dizer que meu irmão não era são para cuidar de duas crianças. — Fernando solta parecendo horrorizado, é como se estivesse revivendo tudo aquilo e sinto compaixão, ele devia ser bem próximo da cunhada, pego suas mãos e prendo entre as minhas. — Imagina só, dois recém-nascido, nas mãos e mente irregulares de Eduardo, não tinha como algo de bom sair.

— Não mesmo. — Digo lembrando do abandono de Vinicius e das duas lutas que tivemos.

— E foi nessa de tentar provar que é o melhor. — Fernando continua a explicação e por dentro, no meu coração eu já sei o quê vêm. — A Julia pegou uma anemia muito forte e já estava muito grave quando ela chegou no hospital, ficou meses e meses internada e Eduardo foi vê-la? — Sinto minhas lágrimas arderem no fundo de meus olhos, é doloroso ouvir isso tudo, dói saber que tantas pessoas estavam envolvidas nessa história e agora, não tem muitas pra dar a sua versão. — Eduardo não dava nem uma hora de sua vida pra ver a filha, era só eu! Os médicos começaram a ficar desleixados, a ponto da menina pegar o caralho de uma bactéria, um vírus que fez todas as minhas esperanças de que ela iria melhorar e sair do hospital, ir por água abaixo!

— Que… Bosta! — Comento tentando conter minhas lágrimas, passos as mãos nas bochechas as secando.

— A Julia pegou uma infecção pulmonar, por descaso dos dois! — Fernando exclama me encarando, os olhos vermelhos me demonstrando sua dor, que agora eu a compartilho. — Eduardo e os médicos!

— E… — Engulo em seco, esfrego os dedos de Fernando como um amuleto. — Como ela está? — Questiono sem querer esconder que sei do fato de Julia estar em coma. Fecho os olhos e sinto as lágrimas correrem livremente. — Como… Julia, está?

— Até ontem? — Ele parece estar em uma luta interna mas só consigo pensar na bebê sozinha, no frio do hospital. — Até algumas horas atrás Julia estava em coma.

— Estava? — Repito em um soluço e ele acena.

— Me ligaram ontem de noite, do hospital. — O moreno me explica, por fim, chegando ao assunto que veio me contar. — Julia saiu do coma induzido à algumas semanas. Depois de anos em recuperação e por não se desenvolver direito, deram uma última chance tirando ela do coma e ela ficou… Lutando por si só em um próprio coma mas agora… Agora, Dália. — Fernando chora e eu levanto pra lhe abraçar, passo meus braços por seu pescoço e apoio seu corpo. — Julia acordou!

Não consigo controlar minhas lágrimas, ainda abraçada a Fernando, nós dois choramos copiosamente. Ele, acredito que de alívio, chora de felicidade e eu choro pois ainda dói saber que tão nova ela já passou por tanto sofrimento, por tanta prova e só tenho a agradecer, Julia é uma guerreira e lutou diariamente por sua vida, já a amo e isso também dói, sentir a dor, o sofrimento de quem ama.

Pequenas mãozinhas passam por meu rosto e a energia positiva de Vinicius me dá força, abro os olhos e lá está ele, com todo o seu carinho me observando com cuidado e amor.

— Por que você está chorando, Lia? — Vini me pergunta confuso. — Foi o tio Fernando? — Pergunta e sorrio para meu menino protetor, me afasto de Fernando e sento novamente na mesinha, puxando Vinicius para meu colo.

Olho em direção a Fernando que encara Vinicius perplexo, seguro o riso e limpo minhas lágrimas. Esses dois me alegram muito, mesmo em situações tão desesperadoras e caóticas como saber que a menina que você tanto procurava e se preocupava está bem, está viva!  Vinicius é como uma âncora que sempre me puxa do fundo do poço!

— Ah! Qual é? Por quê eu tenho que ser o culpado por ela estar chorando, Vinicius? — Fernando pergunta com a voz grave pelo choro.

— Porque ela estava bem, foi só você chegar, que pronto! — Escuto a voz pesada em rancor de Christopher atrás de mim e fecho os olhos. Caralho! Meus dois peguetes no mesmo cômodo! Sinto sua aproximação e ao mesmo tempo sinto o olhar de Fernando sobre mim. Chris beija meus cabelos e Fernando segura ainda mais forte minha mão. Que situação! — Prazer, Christopher Gutierrez, o advogado! — Se apresenta e abro os olhos a tempo de ver os dois de mãos dadas.

— O prazer é todo meu! — Sinto o humor ácido na voz de Fernando. — Fernando Magalhães, o amigo! — A voz sugestiva de Fernando parece irritar Chris, engulo em seco e então Vinicius se move em meu colo.

— Que coisa mais chata! — Comenta meu pequeno herói, os dois se atirando labaredas desviam os olhares para nós dois. — Eu me chamo Vinicius e ela Dália, todo mundo já sabe!

Abro um sorriso ainda trêmulo pelo choro e levanto com Vinicius no colo.

— Vou lavar o rosto, licença. — Coloco Vinicius no chão, indicando que fique ali para não se matarem. Encontro minha mãe assim que saio da sala de estar, está encostada na parede e provavelmente ouvindo tudo. — Mamãe!

— Eu não fiz nada! — Exclama erguendo as mãos, uma com o pano de prato e a outra com um garfo. — Ia convidar todos para o almoço.

— Não acho uma boa ideia. — Sussurro imaginando a cena, de tudo o que preciso agora não é uma luta de testosterona.

Todavia, a porta se abre e meu pai entra, fecho os olhos pedindo clemência. O que está acontecendo? Por que isso é necessário? Por acaso isso é um tipo de teste de provação? Não sou obrigada! Não vou participar desse show! Abro os olhos e me preparo pra subir a escada, minha mãe me segura.

— Pode parar, não vai fugir, não hoje. — Dona Mónica sussurra e faço uma careta, abro a boca para explicar a situação.

— Boa tarde, moças. — Meu pai cumprimenta e coloco um sorriso meio torto no rosto me virando.

— Boa tarde, querido. — Mamãe o abraça e beija, desço o degrau que havia subido e beijo o rosto de meu pai. Estou fazendo de tudo para evitar um conflito.

— Boa tarde pai.

— Temos visitas? — Pergunta à nós duas, aceno relutante enquanto minha mãe está só sorrisos, só o fato de ter dois homens com quem me envolvi emocionalmente e fisicamente e ressalto, isso nunca aconteceu! Agora ela quer testá-los!

Olho para o lado, os três parados na entrada da sala e Daniel entrando com Alexander pela porta da frente, e pronto, a família está completa!

ßāßā


— Vou buscar a sobremesa. — Mamãe ainda sorri depois de toda a conversa de longos cinquentas e três minutos em que Fernando e Christopher se apresentaram como meus amigos íntimos. Daniel sorria o tempo todo pois sabe o que eu tenho com os dois.

— Eu vou aproveitar o momento e conversar rapidamente com Fernando. — Digo me levantando e puxando o moreno comigo, que larga o garfo no prato e levanta.

— Filha, não podem conversar mais tarde? — Meu pai questiona e olha no relógio caro em seu pulso.
Sorrio e ergo braço para afastar a manga imaginária, dobro o braço e olho para o relógio invisível em meu pulso.

— Puxa! — Exclamo dramatizando. — Já está tarde! — Olho para Fernando que está sorrindo e saímos pela porta de vidro até o quintal dos fundos.

— Vamos terminar de conversar. — Explico sentando em uma das espreguiçadeiras ao redor da piscina, indico a outra para que faça o mesmo. — Como está Julia?

— Não sei. — Diz somente e estou vendo que essa vai ser uma conversa chata.

— Quando vamos vê-la?

— É aí, que está o problema.

— E qual é o problema? — Pergunto já me preparando.

— Vocês não vão. — Abro a boca chocada e pronta para rebater. — Não adianta, você sabe que nossa viagem desde o começo era pra fugir de Eduardo, Dália.

— Já faz uma semana, Fernando!

— Não é o suficiente, você fica aqui, com sua família e seu advogado, estão protegidos por aqui. — Fernando não esquece de alfinetar e eu finjo que não ouvi.

— Fernando, escuta. — Seguro suas mãos e sorrio. — Não é justo que você veja Julia, primeiro que eu e Vinicius.

— É justo, sim. Justo pra caramba! — Ele rebate e solto suas mãos fazendo bico. — Eu sou o tio, vocês ficam aqui até estar seguro. Fim de papo! — Levanta da espreguiçadeira e me encara. — Vou ir comer a sobremesa, que sua mãe fez porque mais tarde estou voando para São Paulo.

— Não foi minha mãe que fez! — Grito em suas costas, minha mãe não sabe fazer doces quem fez foi a governanta.

— Vou comer da mesma forma! — Exclama de volta e mordo a boca.

Que saco!

Quem irão ficar felizes com essa notícia é Vinicius e Chris. Porque o que eu queria era ir ver a pequena garotinha e abraçá-la, dizer que ninguém mais vai largá-la e eu vou protegê-la. Porém, isso vai ficar para depois.


ßāßā


Fernando Magalhães

A chuva cai em gotas pesadas e forte na janela do táxi, que não andou nem um quilômetro desde que saí do aeroporto aqui de Guarulhos, o engarrafamento está enorme e não podia ser pior pra quem está com pressa, como eu. Estou nervoso e acima de tudo ansioso, desde que saí da casa dos pais de Dália ontem de tarde, quero ver minha sobrinha porque faz tanto tempo que não há vejo. Fico me perguntando se ela está parecida com a mãe, se puxou o bruto do pai dela ou é como o irmão. Pode ser que ela seja somente, Julia, a pequena e preciosa Julia Magalhães!

Olho pelo vidro e as luzes vermelhas e amarelas dos automóveis ao redor, ficam embaçadas pela chuva e o percurso que nem é tão longe parece ter se tornado muito maior. Solto um suspiro e o motorista me olha pelo retrovisor.

— Está com pressa? — Pergunta mudando de pista.

— Um pouco. — Murmuro balançando a perna.

— Que pena! — Responde sem qualquer vontade, reviro os olhos, é cada coisa que eu passo.

Vejo uma mulher parando o táxi ao lado e só consigo lembrar de Dália e todo o seu drama antes de eu sair, sorrio, gosto mesmo daquela mulher e isso me confundi, não sei se é o certo. É que faz tanto tempo, que eu não me afeiçoava com alguém, meu último apego amoroso não teve um final feliz, é triste de se lembrar porém é reconfortante voltar a sentir algo por alguém, principalmente alguém tão… Tão, fantástica como Dália! 

Lembranças Ativadas:     

— Vamos lá, Dália. — Seguro seu rosto entre minhas mãos e seus lindos olhos me encaram, me abaixo e uno nossas bocas, não há retribuição então me afasto. —  Quero me despedir, Lia. — Explico sorrindo e ela segura minhas mãos com as suas, tombando a cabeça para o lado. — Afinal de contas, é uma semana que vamos ficar longe um do outro. Longe de seus beijos…

— Não é como se você fosse sentir a minha falta, Fernando. — Ela aperta meus dedos e tenta retirar minhas mãos de sua pele, não recuo. Estamos no aeroporto, ela quis me acompanhar e no fundo eu sei que ela tinha esperanças de voltar para São Paulo comigo. — Admita, nem sei o que temos.

— Nós… Nós estamos nos conhecendo. — Comento sério e Dália me observa da mesma forma, é como se estivesse revivendo essa cena.          
— Então, estamos só ficando, certo? — Me pergunta segurando meus braços, suspiro resignado, não esperava por esse assunto agora. — Né? — Questiona novamente e no meu interior, é como se estivesse traindo-a…

"Passageiros do voo 354, destino Guarulhos, São Paulo, Brasil. Por favor se direcionar ao portão de embarque 5."

— Preciso ir… — Sussurro. Dália umedece os lábios e depois os aperta em um aceno, solta meus braços. — Não faz assim.

— Não fiz nada. — Ergue as mãos, olho em volta quando anunciam  meu voo de novo.

— Na volta a gente conversa, tá bom? — Passo meus braços ao seu redor a abraçando até ela retribuir. — Não fica chateada nem brava comigo.

— Não seja tão confiante, Fernando, posso acabar com seja lá o que temos, muito rapidamente! — Dália ergue a bolsa e acerta meu braço.

— Aí! — Exclamo massageando o local atingido a fazendo sorrir. — Pra que essa agressividade, mulher?

— Você merece muito mais que essa bolsada. — Murmura assustadoramente baixo e faz um sinal de tesoura e aponta para baixo, arregalo os olhos e me afasto.

— Quê? — Pergunto assustado e ela estreita os olhos e faz um gesto de que está de olho com a mão. — Não teria coragem! — Abro um sorriso para tentar me convencer.

— Quer apostar? — Dália sussurra. — Quer pagar pra ver? — Dá um passo pra frente e eu recuo sorrindo.

— Não, não quero. — Exclamo ajustando a alça da bolsa, me curvo e a beijo rapidamente. — Te ligo mais tarde, tchau!                 

Lembranças Desativadas.    

— Chegamos! —  O taxista fala me tirando de meus devaneios de idas e vindas com Dália.    

— Ah! — Olho pela janela e vejo que realmente chegamos ao hospital. — Obrigado. — Pago e saio do carro me vendo em um grande dilema. Não estou mais confiante para entrar e encarar um fragmento do meu passado. Mas como eu vou precisar encarar isso mais cedo ou mais tarde, melhor fazer de uma vez! Mesmo que eu vá lembrar e pensar a cada instante nela e que vá doer, é algo que preciso fazer!          

— Queria tanto você aqui… — Acabo falando alto o bastante para o taxista ouvir e então escuto a risada e em seguida o sussurro:

—  Só tem maluco nesse mundo!

— Maluco é você! — Grito enquanto o carro toma distância. — Enxerido! Bisbilhoteiro! Fofoqueiro! Vai cuidar da sua vida! — Continuo gritando e só paro quando sinto uma mão em meu braço.

— O senhor está bem? — Uma moça, aparentemente a enfermeira me olha preocupada.

— O que? Como assim? — Pergunto rindo. — Pareço doente?

— Não... Não é isso. — Ela me olha ainda preocupada e continua. — É que o senhor está aí, gritando para o nada, pensei que estivesse com febre, sabe? Delirando…

— Olha… Me desculpa mas eu tenho que ir. — Comunico me afastando e indo em direção a entrada do hospital.        

Consigo me informar na recepção e logo me encaminham por um corredor até uma sala, bato na porta e quando entro, vejo o doutor Tavares sentado atrás de sua mesa.              
        
— Boa tarde, Doutor Tavares.—  Comprimento enquanto fecho a porta e me sento na cadeira à sua frente.

— Boa tarde. Como vai, Fernando? — Pergunta tranquilo, passo a mão na calça para limpar o suor.         

— Nervoso e um pouco cansado, acabei de chegar do México. — Exclamo ansioso e ele abre um sorriso apaziguador, suspiro assombrado.     

— Então vamos acabar logo com esse nervoso! —  Tavares murmura e abre uma pasta, me entregando algumas folhas.

Direciono o olhar para as folhas e começo a ler, não entendendo nada. Acho que a ansiedade batendo na cabeça não ajuda. Ergo olhar para o médico que entende a minha confusão.

—  Okay. Olhe, aí está explicando o procedimento de Julia. — Tavares explica calmamente. — Como você sabe, ela esteve a muito tempo dentro de uma incubadora e isso não ajudou muito em seu desenvolvimento, por isso ela não tem o tamanho que uma criança de quatro anos deveria ter.

— Mas, ela está bem, não é? — Pergunto o interrompendo. — Depois de todo esse tempo em recuperação…

— Sim, sim ela está bem! — Ele exclama mais pra si próprio. — E posso lhe afirmar que isso é surpreendentemente curioso e confuso até mesmo para nós, médicos. — Tavares une as mãos em cima da mesa e me encara. — Como você sabe, nós não tínhamos mais nenhuma esperança em Júlia, todavia, ela nos surpreendeu.

Afirmo com um aceno, sei de todas as coisas que Julia passou e estávamos todos desesperançosos, eu mais do que ninguém.

— Júlia, não tinha nem doze meses de idade quando aderiu a anemia, grande parte por não ter consumido o leite materno. A anemia ferropriva que ela contraiu, trouxe consequências e a maioria só iremos ter certeza conforme o tempo… 

— Consequências? — Interrompo novamente. — Como assim? Como o que?

— Bom... Julia pode ter dificuldade com o aprendizado, a habilidade cognitiva com certeza foi afetado. E ou até mesmo, o que já está acontecendo que é o retardamento de crescimento, que pode causar a baixa estatura. — Explica concentrado. — Tudo isso é causa do agravamento que ela teve com a infecção pulmonar, mais conhecida como pneumonia infantil.

— Doutor por favor! — Exclamo nervoso — Fale a minha língua! Habilidade cognitiva?

— Olhe… Habilidade cognitiva é ela ter problemas de aprendizado como falar, ler, escrever, ou, afetando a memória e a atenção. As habilidades motoras, como andar, correr, pular. — Explica pontuando com os dedos. — Tudo isso são consequências das doenças que ela foi adquirindo e dos anos deitada na cama porém, se ela pode ou não ficar com essas sequelas, só teremos certeza no decorrer do tempo.

— Nossa! — Exclamo perdido. — E isso é estar bem? 

—  Sim, para uma criança que se desenvolveu dentro de um hospital, por meio de máquinas e tubos. — Murmura acenando veemente. — Sim, está muito bem!

— Então, posso vê-la? —  Pergunto já me levantando.

— Claro, mas com segurança logicamente. —  Tavares diz com o semblante sério. — Não queremos arriscar uma suposta recaída. 

Seguimos para fora da sala, logo para o elevador e enfim dois andares acima, sou direcionado para uma sala onde me explicam como colocar aquelas roupas de proteção e depois de pronto, me encaminham para um quarto e assim que entro, vejo a linda menininha dormindo agarrada com um urso de pelúcia.

Olho confuso para Tavares ao meu lado.

— Que urso é esse? — Questiono.

— Ela estava totalmente confusa e a única coisa que à distraiu foi esse urso. — Conta pacificamente. — A enfermeira chefe disse que mandaram entregar à ela. Claro que mesmo sendo um presente do pai dela, precisamos higienizá-lo como manda o protocolo.

— O pai dela? — Sussurro meio aterrorizado, como ele pode estar sempre um passo na frente?

— Sim, claro! — Tavares me encara como se eu fosse doido e devo estar parecendo mesmo. —  Eduardo Magalhães é o pai, não é? Seu irmão, Fernando. — Aceno tendo total certeza que Eduardo está mais próximo do que imaginamos e que o pesadelo ainda mais perto.        

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