Capítulo 3
Entramos no salão de baile do castelo que estava lindamente decorado. Ele estava repleto de azaleias, flores de cerejeira e prímulas, que são as minhas favoritas desta estação. Candelabros altos compunham as mesas dos nossos convidados forradas por toalhas de mesa branca e cobre manchas azul claro. A bela prataria do palácio deixava as mesas ainda mais exuberantes. Diversos garçons serviam bebidas e canapés entre os convidados vestidos elegantemente. Tudo perfeito para que o baile seja um sucesso! Os músicos iniciam a valsa assim que Herbes anuncia a nossa entrada que é aclamada pelos convidados. Inúmeros aplausos e reverências impulsionavam o início da dança real tão aguardada por todos. Eu e Dárius paramos no centro do salão, fizemos o cumprimento e iniciamos a valsa. Todo aquele clima refinado e todas as pessoas nos olhando deveriam ser grandes motivadores de um teatro entre nós, mas o fato é que em situações assim nós somos peças de um mesmo tabuleiro, o da realeza. E por mais raiva e ressentimento que eu tenha dos erros de Dárius, ele é um completo cavalheiro quando quer. Ele me conduz pelo salão ignorando completamente a todos que estão à nossa volta. Seu olhar fixado em meu rosto me faz sentir seu desejo e admiração já revelados anteriormente, mas mesmo assim é super prazerosa essa retenção de sua atenção sobre mim. No início, assim que me tornei rainha eu me forçava a contar os passos em minha cabeça para não errar: 1,2,3... 1,2,3... 1,2,3. Mas agora depois de quatro anos eu e Dárius dançamos como se um fossemos um complemento do corpo do outro, é leve, natural e fluido. Não existem mais medos ou hesitações, eu simplesmente vou aonde ele me levar e pelo menos aqui neste salão, eu não tenho preocupações em estar nos braços dele e confiar cegamente em seus passos. São de momentos como este que eu preciso lembrar para seguir em frente ao lado dele e ao mesmo tempo situar-me de que eu não sou uma tola por tê-lo desposado e que ele não é meu inimigo.
A segunda dança se inicia e os convidados se juntam a nós. É muito bonito ver todos aqueles casais dançando graciosamente enquanto trocam olhares sinceros ou ousados e até mesmo palavras em segredo. Engraçado ver como o simples ato de dançar pode dividir tão claramente os lados: os jovens flertando aproveitam a ocasião para se aproximar, fazer propostas e até mesmo curtir o toque mais próximo que somente a dança os proporciona de forma que a alta sociedade não enxergue isso com maus olhos. Em contraparte vemos os mais velhos aproveitando a oportunidade de fugir de uma situação desconfortável, provocar ciúmes em alguém ou até mesmo iniciar propostas de traições silenciosas. Nesta parte Dárius sempre se mostra enciumado e deixa bem claro a certos cavalheiros do salão que encostar em sua rainha é algo inalcançável para quem ele não julga digno. Mas para não quebrar as tradições eu sempre danço com os homens mais próximos a ele como os duques e viscondes que minha memória insiste em esquecer seus nomes com frequência. E como é o de se esperar, Dárius também só dança com as suas respectivas esposas, que conhecem bem o meu jeito e não ousariam olhar para alguma parte de Dárius que não fosse permitida.
Ao fim da segunda valsa, eu e o rei nos separamos e vamos conversar com os convidados. Antigamente nós fazíamos da forma tradicional, os anfitriões deveriam aparecer nos lugares sempre juntos, mas Dárius cansou de passar vergonha com as minhas enxurradas de opiniões nas conversas entre os cavalheiros e agora fazemos isso separadamente. Conhecida por muitos como uma rainha que fala tudo o que pensa, as pessoas tomam o dobro de cuidado com o que falam ou fazem na minha presença, o que torna tudo um tanto quanto tedioso. As duquesas e viscondessas da corte vem até mim puxar os mesmos assuntos de sempre:
— Que belo vestido, Vossa Magestade! Realmente digno de Vossa beleza! — Diz a duquesa de Bucareste.
— Muito obrigada!
— Vossa Majestade é sempre tão original! Podemos sempre esperar novidades em suas decorações de baile! Os guardanapos estão dobrados de uma maneira tão sutil e elegante! — Diz a princesa da Bulgária.
— Que bom que gostou! Pode reprisar em seus bailes se assim desejar.
Que diabos alguém viaja da Bulgária até a Romênia para observar a dobradura de um guardanapo de pano? A alta sociedade me entedia de tantas maneiras diferentes que ganhar um soco na cara seria até animador! Manter no rosto o mesmo sorriso falso já está me dando nos nervos! E agradecer elogios vazios sem dúvida nenhuma não é algo que eu vá fazer o restante da noite.
— Bem, vou pedir licença às senhoras e senhoritas. Preciso me retirar. Aproveitem o baile!
Todas se levantam e me reverenciam em despedida. Essa é uma verdadeira vantagem em ser rainha, ninguém contesta nenhuma decisão sua por mais visivelmente indelicada que ela seja.
Passo pelos corredores do palácio rapidamente, mas acabo observando os diversos casais se beijando às escondidas. Que tolice achar que as pilastras desse castelo vão impedir que os escândalos aconteçam! Bem, não é da minha conta! Decido me por a caminho da cozinha não suporto esses bailes que temos que ficar apenas bicando canapés como passarinhos enquanto tanta comida circula a nossa volta! A essa altura, todos os serviçais estão super ocupados para perceberem que eu desci até o espaço da criadagem. A senhora Thompson quase cai ao me ver chegando:
— Vossa Majestade! O que faz aqui? Algo na comida não lhe agradou?
Eu sacudo a cabeça em negação e lhe dou um sorriso tranquilizante.
— Muito pelo contrário, Senhora Thompson. Tudo o que eu comi estava divino, mas eu não queria mais ficar comendo de pouquinho em pouquinho. Sem falar na companhia daquela gente chata!
Ela tenta, mas não consegue se controlar e acaba rindo.
— Vossa Majestade é mesmo como nós! Quatro anos aqui nesse castelo e ainda continua a mulher de sempre. Isso é único! Não sabe o quanto eu fico feliz em tê-la como minha rainha! Mas bem, já que veio até aqui, eu vou montar um prato farto para que coma bem antes de subir novamente!
Ah! Finalmente!
— Obrigada!
Enquanto eu aguardo ela me servir, me sento à mesa e aproveito para perguntar:
— Senhora Thompson, sei que mora no povoado próximo ao rio. Como estão indo as obras por lá? Eles já concluíram?
Ela me entrega um prato com bastante canapés, mas também tinha alguns pedaços cortados de carne e frango, do jeito que eu gosto! Ela me serve um pouco de vinho e comenta:
— Obras? Não iniciaram ainda. O cobrador de impostos nos avisou que iniciará apenas no próximo mês. Parece que ainda precisavam arrecadar mais fundos e ele até aumentou um pouco o valor dos impostos.
Meu sangue ferve ao ouvir isso!
— Entendi, eu lamento muitíssimo. O rei anda muito ocupado e não me informou sobre esse ocorrido. Eu havia me encarregado pessoalmente em tratar desse assunto, mas ele tomou a frente. Vou falar com ele para que tudo se agilize.
Dou uma golada no vinho pra conseguir descer a minha raiva e indignação garganta abaixo! Ela me olha com gentileza e gratidão dizendo:
— Oh minha rainha, já faz tanto por nós! Não precisa se incomodar com esses assuntos. Creio que o rei irá resolver, essas coisas demoram mesmo.
— Preciso sim, senhora Thompson. Você sabe que todas as questões do povo são do meu interesse. Vou ver isso com o rei. — Engulo rapidamente um dos canapés e continuo — Bem, mudando de assunto, a senhora tem notícias do meu pai? Mais uma vez ele não veio.
Ela abaixa a cabeça e me responde com uma tremenda tristeza:
— Ele está do mesmo jeito. Se recusa a sair de casa,a não ser que seja o trabalho. O rapaz que nos entrega o leite que comentou do seu estado comigo, ele mora próximo a sua antiga casa, Majestade.
O vinho desce rasgando minha garganta com a notícia, da última vez eu achei que meu pai já estava melhorando. Mas eu procuro não passar alarde para a senhora Thompson, ela já tem trabalho demais!
— Irei visitá-lo amanhã. Obrigada pela informação e pelo delicioso prato. Preciso ir, já devem ter dado a minha falta.
— Claro! É sempre uma honra recebê-la em minha cozinha! Sei que gosta de se afastar daquele novo mundo de vez em quando. Saiba que estarei sempre aqui quando precisar, minha rainha!
Apoio a taça sobre a mesa, a agradeço e subo as escadas.
Disparo feito um furacão à procura do rei! Ele acha que pode continuar me fazendo de tola, mas vou garantir que ele pare de gracinhas e de desviar o dinheiro do povo para os cofres da coroa! Chego a sala de cavalheiros onde sei que ele estaria reunido com os mais nobres senhores da província, abro a porta e causo um senhor alvoroço naquela sala! Todos se levantam para reverência enquanto Dárius gela! Ele sabe perfeitamente que quando eu me ponho na frente dos cavalheiros fora dos momentos combinados é porque eu estou tramando algo. Ele coloca um sorriso disfarçado em seu rosto, caminha em minha direção enquanto diz:
— Minha amada rainha! A que devemos a sua presença? Estamos apenas entre cavalheiros aqui.
Ele segura a minha mão como se fosse me conduzir, mas eu a seguro como apoio para ir adiante.
— Resolvi aproveitar que estão todos reunidos para cumprimentá-los e comunicá-los de um grande projeto do rei! Iremos construir uma nova escola para as crianças do povoado a leste do castelo! Iniciaremos as obras no próximo mês! E amanhã mesmo já terão homens trabalhando para o acerto de toda a área danificada pela guerra às margens do rio.
Estou certa que Dárius fará um escândalo quando estivermos a portas fechadas, mas estou super curiosa para saber como ele irá reagir a isso agora!
— Mas isso é maravilhoso! Todos irão falar sobre esse grande feito do nosso rei! — Diz o visconde de Brasov.
— Nesse período pós-guerra precisamos mesmo pensar na educação de nossas crianças! Afinal de contas, muitas ficaram órfãs. Devo parabenizá-lo por isso, Vossa Majestade!
Adorei ouvir essas palavras saindo da boca de um príncipe! Sei do seu posto, mas não estou me recordando de qual reino ele vem. Dárius incorpora um verdadeiro ator e responde:
— Não há o que agradecer! Eu e a rainha vamos proporcionar a este povo tudo o que puder melhorar a qualidade de vida deles.
Eu pego uma taça que estava disponível na bandeja do garçom próximo a nós e a levanto dizendo:
— Proponho aos cavalheiros então, um brinde ao futuro!
As demais taças se levantam e assim eu acabo de garantir a execução do meu mais novo projeto! Dárius esvazia a sua taça com rapidez e em seguida diz:
— Bem, peço licença aos cavalheiros, mas devo acompanhar a minha rainha.
Todos assentiram e nós nos retiramos.
Ser puxada pelo braço por Dárius pelos corredores do palácio já era algo de se esperar depois daquilo, mas quando ele me trancou em sua biblioteca e empunhou a sua espada eu realmente fiquei com medo! Mas obviamente não deixei transparecer!
— Trouxe-me aqui para agradecer a minha grande ideia, meu amor? Ou iremos iniciar uma nova guerra em meio aos seus livros de história?
Ele responde:
— Não minha rainha, eu lhe trouxe aqui para lhe perguntar com bastante tranquilidade se você quer que eu arranque a sua cabeça!
Ele espetou a espada com força em cima da mesa, a deixando perfeitamente na vertical ! Claro que eu me assustei num primeiro momento, mas assim que pude, puxei forças de toda a raiva que eu estava sentindo dele e eu mesma a retirei de onde estava sem titubear!
— Todos vão ficar contentes em saber que a rainha teve a cabeça arrancada pelo rei na noite do baile de outono! — eu coloco o punho da espada na sua direção enquanto pouso a lâmina dela em meu pescoço — Vamos! Anda logo com isso! Estou farta das suas promessas sem fundo!
Ele puxa a espada com destreza sem me machucar e grita:
— Você sabe que eu não admito que ninguém encoste na minha espada! Como você consegue ser tão impossível? Além de zerar o cofre da coroa você quer me levar à loucura?
— Não antes de suprir todas as necessidades da Romênia! Aprenda de uma vez por todas que você não consegue me contornar! Eu passo por cima das suas manobras como uma cavalaria no campo de batalha!
Ele bate com a espada sobre a mesa enquanto grita:
— Você nunca vai saber o que é arriscar verdadeiramente a sua vida em um campo de batalha! Eu estive na frente de um exército e perdi meu pai durante uma guerra! Não há ninguém na Romênia que vai me dizer como eu devo governar o meu país! Muito menos uma mulher!
Ele coloca a espada em sua bainha, põe a mão em meu pescoço e grita:
— Eu juro pela alma do meu pai que empunhou essa espada em seu último dia de vida, que a próxima vez que você se meter nos meus assuntos ou chegar próximo da minha espada novamente, eu mesmo vou lhe matar com ela! A sua obra e a sua escola foram as últimas coisas que você conseguiu de mim com o seu joguinho sujo!
Ele me empurra e sai da biblioteca batendo a porta.
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